segunda-feira, 14 de abril de 2014

Guiné 63/74 - P12982: Notas de leitura (581): Quem são os responsáveis pelo assassínio de Amílcar Cabral?, em O Jornal de Janeiro de 1976 e Jeune Afrique de Novembro de 1983 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 23 de Outubro de 2013:

Queridos amigos,
Junto comentários a duas entrevistas publicadas em 1976 e 1983, alusivas aos acontecimentos de 20 de Janeiro de 1973.
Não deixa hoje de surpreender o tom perentório com que se incriminaram a PIDE de Bissau e Spínola, sem apresentar uma prova material, como foi possível pôr muita gente a acreditar que pessoas com reconhecidas limitações como Momo Turé pudessem ter-se imposto à frente de larguíssimas dezenas de quadros conspirativos.
As provas materiais de quem mandou matar Cabral continuam em falta, os arquivos estão vazios, os processos efetuados em 1973 desapareceram. Vamos ter que aguardar que algumas das figuras determinantes estejam dispostas a revelar o que aconteceu.
Joaquim Chissano, por exemplo.

Um abraço do
Mário


Quem são os responsáveis pelo assassínio de Amílcar Cabral?

Beja Santos

O puzzle continua incompleto, quarenta anos depois são escassos os factos provados quanto ao assassinato de Amílcar Cabral pelas 22h30 de 20 de Janeiro, em Conacri: sabe-se que houve uma equipa que o abordou, que o primeiro tiro partiu de Inocêncio Kani e que alguém de nome Bacar deu o tiro de misericórdia; sabe-se como atuaram várias equipas a fazer prisões dos quadros cabo-verdianos; sabe-se que Sékou Touré foi abordado pelos sublevados, mandou fazer prisões e institui uma comissão de inquérito, cujos resultados nunca foram divulgados; sabe-se que houve inquirições de todos os presumivelmente sublevados, foram tomadas decisões de execução e desapareceram todas as provas materiais do processo; e sabe-se que alguns dos observadores de toda esta situação à volta do assassinato ainda não disseram a última palavra – é o caso de Joaquim Chissano. Há muita penumbra, muito fogo-fátuo, muita presunção, com ou sem água benta. Por isso, todo o envolvimento sobre os mandantes é um grande mistério. E à volta desse mistério escreveram-se acusações sem provas, sobretudo a seguir ao assassinato era de bom-tom apontar o dedo a criminosos longínquos: Spínola, a PIDE, Rafael Barbosa, por exemplo. Há que juntar metódica e incansavelmente tudo quanto se escreveu e perceber que está quase tudo por esclarecer.


Numa edição de Janeiro de 1976, o semanário O Jornal publicava um documento inédito: páginas de um livro branco do PAIGC. O jornalista achou por bem encontrar uma relação causa-efeito entre a invasão de Conacri, de Novembro de 1970, com o assassinato de Cabral. Chega-se ao cúmulo de dizer que as infiltrações nas fileiras do PAIGC teriam começado em 1966 e com o maior à vontade escreve-se: “Foi essa máquina, montada minuciosamente ao longo de alguns anos, que os governantes de Lisboa e o seu representante em Bissau, Spínola, decidiram pôr em funcionamento no dia 20 de Janeiro de 1973. A morte de Cabral, o rapto de Aristides Pereira e a prisão dos principais dirigentes do PAIGC constituíam a parte operacional de um plano que tinha por objetivo último a sobrevivência dos interesses colonialistas na Guiné e a manutenção das ilhas de Cabo Verde”. O jornalista cola-se ao tal livro branco preparado pela comissão de inquérito do PAIGC que, resumidamente, defende tais teses, que se passam a sintetizar.

Primeiro, os colonialistas elaboraram um plano que desembocaria na independência da Guiné ao mesmo tempo que recusariam qualquer abertura à autodeterminação de Cabo Verde. Segundo, Spínola criara secretamente um partido formado exclusivamente de guineenses, a FUL (Frente Unida da Libertação) constituída entre outros por Rafael Barbosa e Momo Turé, havendo mesmo uma ramificação no Senegal. Em dada altura, libertaram-se antigos quadros do PAIGC como Momo Turé e Aristides Barbosa para serem preparados e enviados para Conacri. Terceiro, conseguido o descontentamento e a franca adesão dos guineenses do PAIGC contra os cabo-verdianos, punha-se em marcha o golpe, que seria apresentado como uma revolta dos guineenses contra a direção cabo-verdiana, havendo êxito Sékou Touré primeiro e a Organização da Unidade Africana depois iriam apoiar as novas autoridades.

O documento da comissão de inquérito excede-se na imaginação: “Portugal não pode falar da independência da Guiné sob pena de ser obrigado a falar também da independência de Angola e Moçambique. Se conseguissem todos os objetivos almejados com o complô, os colonialistas portugueses começavam por desarmar os combatentes do PAIGC, em seguida desarmavam os seus comandos africanos, evocando o fim da guerra: reforçavam a sua guarnição militar em toda a Guiné e finalmente prendiam todos os dirigentes da FUL em Bissau”.

É esta a única referência que eu conheço à comissão de inquérito do PAIGC liderada por Fidelis Cabral de Almada, o mesmo que, após o golpe de Estado de 14 de Novembro de 1980, veio no Congresso do PAIGC pedir desculpa pelas barbaridades que tinham sido cometidas, nomeadamente as torturas praticadas durante os interrogatórios. Quando hoje se conhecem as profundas limitações intelectuais e políticas de Momo Turé (até desaparecer para Conacri, em 1972, era empregado de mesa no restaurante “Pelicano”), fica-se estarrecido como foi possível tentar fazer convencer que ele foi um dos autores da conspiração que envolveu largas e largas dezenas de quadros, muitos deles com elevadíssima preparação. Como foi possível ter criado tanta mistificação à volta de um processo de que hoje não há um só documento?

“Jeune Afrique”, num número de Novembro de 1983, volta ao assassinato de Cabral, trata-se de um inquérito de Sophie Bessis em Bissau, na Praia, em Lisboa e Paris. Pouco ou nada adianta. Refere o documento de Março de 1972, consagrado aos problemas de segurança, denunciado que está em curso um plano para a sua liquidação. Cabral diz que recebera estas informações através do Partido Comunista Português. A repórter não esconde a surpresa quanto ao silêncio à volta de dossiê que parece incomodar o poder político instalado. Não há prova determinante, passados dez anos do assassinato, para infirmar ou reforçar as suspeitas que pesam sobre uma série de personagens da época. Cabral tinha uma enorme relutância em fazer-se acompanhar de guarda-costas. Ana Maria, a sua mulher, revela que naquela noite, antes de partirem para o jantar na embaixada da Polónia em Conacri, ela viu Cabral inquieto. Durante a manhã desse dia, Cabral tinha recebido uma visita inopinada, a do embaixador da Guiné em Dakar, portador de uma mensagem de Sékou Touré, informando que havia qualquer coisa em preparação. Cabral chamou o responsável pela segurança, Mamadu Indjai, ao que parece um dos conspiradores, ao revelar-lhe que corria o rumor de um golpe pode ter dado azo a que os conspiradores acelerassem as movimentações.

A repórter descreve o que se passou nos momentos do assassinato e depois. A comissão de inquérito de Sékou Touré fez passar que a responsabilidade era dos portugueses, Spínola e a PIDE, mas que havia também africanos infiltrados. Lidas as sentenças, depois do processo organizado pelo PAIGC, um conjunto de sublevados foram executados, a repórter diz que morreram linchados. E volta a desenvolver a tese de que Spínola criara a FUL, sob a direção de Rafael Barbosa, que dera luz verde para a operação dos infiltrados guineenses em Conacri, etc. E citando “algumas fontes” diz que Spínola tinha projetado aproveitar-se dos guineenses para capturar Cabral e mantê-lo como reserva. Também releva o papel de Momo Turé, mas não deixa de insinuar que a morte de Cabral podia ter constituído um alívio para Sékou Touré que mantinha relações muito tensas com o pai fundador do PAIGC, a africanização do PAIGC permitiria a Sékou Touré ter um maior controlo sobre a futura nação independente.

Era dentro desta bruma e deste nevoeiro que se falava em 1976 e 1983 do assassinato de Cabral. Ninguém pediu provas, ninguém apresentou provas, acusava-se na base da especulação e das hipóteses. E aqui estamos, a aguardar que apareçam declarações ou depoimentos que tragam um verdadeiro esclarecimento a um dos imbróglios mais intrigantes da história da Guiné-Bissau.
__________

Nota do editor

Último poste da série de 11 DE ABRIL DE 2014 > Guiné 63/74 - P12964: Notas de leitura (580): "Os Portugueses Descobriram a Austrália? 100 Perguntas Sobre Factos, Dúvidas e Curiosidade dos Descobrimentos”, por Paulo Jorge de Sousa Pinto (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P12981: Agenda cultural (309): Reportagem do Porto Canal feita com a Tabanca Pequena será emitida hoje, dia 14 de Abril, depois do Jornal Diário das 20 horas

1. Mensagem da jornalista Joana Almeida Silva do Porto Canal, chegada ao nosso Blogue através da Tabanca Pequena:

Boa tarde,
a reportagem que realizámos convosco sobre a guerra colonial vai ser emitida amanhã, dia 14 ABRIL, no Porto Canal, depois do Jornal Diário, em "40 ANOS DEPOIS"

O trabalho ficará na terça-feira (15 Abril) disponível em:


Além da reportagem podem encontrar no site excertos extra das entrevistas que gravámos e conteúdos adicionais.

Os meus melhores cumprimentos,
Disponha sempre,
Joana Almeida Silva
Jornalista Porto Canal
____________

Nota do editor

Último poste da série de 10 DE ABRIL DE 2014 > Guiné 63/74 - P12962: Agenda cultural (308): O livro de Francisco Henriques da Silva e Mário Beja Santos, "Da Guiné Portuguesa à Guiné-Bissau: Um Roteiro" vai ser apresentado em Tomar no dia 12 de Abril

Guiné 63/74 - P12980: Manuscrito(s) (Luís Graça (25): Revisitar Bissau, cidade da I República, pela mão de Ana Vaz Milheiro, especialista em arquitetura e urbanismo da época colonial (Parte II): o Pavilhão de Tisiologia, mais tarde HM 241


Guiné > Bissau >  s/d > O antigo Pavilhão de Tisiologia, desenhado pelos arquitectos Licínio Cruz e Mário Oliveira, do Gabinete de Urbanização do Ultramar, Projeto de 1951/53. Passará a Hospital Militar, o HM 241, com o início da guerra, em 1963, Foto comprada na Feira da Ladra, pelo nosso infatigável Mário Beja Santos.

Foto: © Mário Beja Santos (2013). Todos os direitos reservados.


Guiné > Bissau > HM 241 > 1970 > Varanda do Hospital Militar de Bissau. Foto do álbum de Elias dos Anjos Rodrigues, ex-soldado atirador do 3.º pelotão (, comandado pelo alf mil Ravasco), da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72). O Elias mora em Vale de Anta, Chaves. Foi gravemente ferido em 10 de Agosto de 1970, numa mina A/C na região de Jifim.

Cortesia do blogue CCAÇ 2700 - Dulombi (1970/72), criado (em 2007) pelo nosso grã-tabanqueiro Fernando Barata. Foto reproduzida com a devida vénia.

Foto: © Elias Anjos Rodrigues (2012). Todos os direitos reservados.



Guiné > Bissau > 1972 > O edifício do Hospital Militar, o HM 241... Os horrores da guerra (os mutilados, os politraumatizados, os feridos graves...) eram ali despejados todos os dias, de helicóptero... Foto do Carlos Américo Rosa Cardoso que pertenceu aos Serviços de Saúde Militar, com o posto de 1º Cabo Radiologista.

Foto: © Carlos Américo Rosa Cardoso (2007). Todos os direitos reservados



Guiné- Bissau > Bissau > Novembro 2000 > Antigo Hospital Militar de Bissau, HM 241, num processo já de degradação irreversível...

Foto: © Albano Costa (2005). Todos os direitos reservados


1. Manuscrito(s), por Luís Graça

Nota de leitura >  Ana Vaz Milheiro – 2011: Guiné-Bissau. Lisboa, Circo de ideias, 2012, 52 pp. (Viagens, 5)

Parte II   

Recorde-se o que já dissemos em poste anterior sobre esta brochura da investigadora e professora do ISCTE -IUL, Ana Vaz Milheiro.

Este livrinho, profusamente ilustrado com fotografias da autora, a cores, resulta de uma singular viagem à Guiné-Bissau, de 2 arquitetos (entre as quais a autora) e de 1 sociólogo (Eduardo Costa Dias, nosso grã-tabanqueiro),  durante 10 dias, de 2 a 10 de outubro de 2011.

Com a promoção de Bissau a capital da colónia, em 1941, em plena II Guerra Mundial e em plena batalha do Atlântico, dificultando as ligações marítimas da Metrópole com as colónias africanas, agravam-se os problemas de habitação. A procura é maior do que  a oferta.

Em, 1944 chega finalmente a Bissau  uma "Brigada de construção de moradias", sob a cehefia do arq Paulo Cunha. E com ele vêm mais um arquiteto adjunto, um construtor, um desenhador, 5 carpinteiros e 8 pedreiros. Vão ser construídas casas de 3 tipologias. Por exemplo, as de 2 pisos custavam o triplo do seu valor em Lisboa. O que seria explicado por Ana Vaz Milheiros,  por 3 ordens de fatores: (i) escassez de materiais; (ii)  atrasos nas remessas financeiras da metrópole; e (iii)  falta de qualificação da mão de obra local. 

O trabalho da Brigada (1944-46) é objeto de críticas de um lado e outro. Mas, de entre os eliogios, destacam-se: (i) o desenho inovador dos projetos, superando o tradicional bangalô tropical; (ii) as preocupações de ordem estéstica que passam também a ser tidas em conta  pelos promotores imobiliários, públicos e privados; e (iii)  a atenção que é dada às condições locais de clima, luz e calor.

A volumetria de Bissau resulta em grande parte deste "padrão unifamiliar, impresso pelos projetos residenciais da Brigada", marcando a sua escala, e "contribuindo para acentuar uma fisionomia de tipo Garden City [,Cidade Jardim,] que continua a qualificar o actual ambiente urbano" e que remonta à I República (p, 12).


Do Pavihão de Tisiologia (1951-53) ao Hospital Militar 241 (a partir de 1963), com assinatura de um lourinhanense, o arq Lucínio Guia da Cruz

O antigo hospital militar, o HM 241, é hoje uma triste ruína.  Mas já fora um Pavilhão de Tisiologia, do   Hospital de Bissau  (hoje, Hospital Nacional Simão Mendes).

Localizava-se fora do perímetro urbano, a cerca de 6 km do centro. Tem risco dos arquitectos Lucínio Cruz e Mário Oliveira, ambos do Gabinete de Urbanizações do Ultramar. Data de 1951-1953. A sua localização fora da cidade, e longe do seu  buliço, obedecia às concepções higiossanitárias da época, ou sejam, as da luta antituberculose (que, na metrópole, impunham a localização dos sanatórios em altitude ou nas zonas marítimas, com "bons ares"). (A tísica, ou tuberculose pulmonar, ainda era então um grave problema de saúde pública, tranto noa metrópole como nos trópicos).

São arquitectos de regime, conservadores, mas com qualidade técnica e conhecimento da realidade local. Curiosamente, fico a agora a saber que o meu conterrâneo e vizinho arq Lucínio Cruz, já falecido, tem obra vária, edificada em  Bissau e outras partes do império. Por ex., a Estação Metereológica, em Bissau, também é dele (1952), bem como o edifício dos CTT (1950, alterado). Também fez o projeto para a Câmara Municipal de Bissau (1948, não construído). E, já agora: a Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (1952-58), o Departamento de Física e Química da FCT/UC (1956-1975), parte do projeto da nova Cidade Universitária de Coimbra, exemplo acabado da arquitetura estadonovista.

Tem também, o arq Licínio Cruz, obra espalhada por outros sítios, incluindo a sua terra natal (n. 1914 e faleceu em finais de 1990 ou princípios de 2000). Inclusive o prédio, onde tenho um apartamento, na Rua da Misericórida, Lourinhã,  foi desenhado por ele. Ao que soube, na altura, terá posto termo à vida, na presença na sua última companheira, de origem africana. Foi presidente da Câmara Municipal da Lourinhã (1969-74) e provedor da Misericórdia local, no pós-25 de abril. Também era conhecido por Licínio Guia da Cruz. Lamentavelmente não encontro, na Net,  uma simples nota biográfica sobre ele, contrariamente ao seu colega Mário Oliveira (1914-2013), "o arquiteto que morreu duas vezes", no dizer de Ana Vaz Milheiro, que também é jornalista do Público.

(...) "O desaparecimento do arquitecto Mário de Oliveira, que morreu na terça-feira [, 17/12/2013,]no Hospital de Vila Real, equivale a uma segunda morte. A primeira ter-se-á dado simbolicamente, quando, nos anos de 1980, decidiu retirar-se voluntariamente da vida pública e exilar-se no Hotel Mira Corgo, em Trás-os-Montes, para pintar.

A sua actividade ao serviço do Ministério do Ultramar e o esquecimento a que Mário de Oliveira e os seus colegas arquitectos estiveram votados durante os anos que se seguiram ao 25 de Abril talvez tenham, em parte, justificado a opção. (...)

"Quanto às ruínas do velho Pavilhão de Tisiologia, estas parecem desmentir  rumores que as descrevem como mal construídas e com problemas estruturais graves (...). O estado ruinoso é já  uma realidade pós-colonial" (p. 16).

Na prática isto é uma elogio a dois dos arquitectos que fizeram carreira no Gabinete de Urbanização Colonial (1944-51), e depois Gabinete de Urbanização do Ultramar (1951-57) e por fim Direcção de Serviços de Urbanização e Habitação da Direcção Geral de Obras Públicas e Comunicações do Ministério do Ultramar (1957-74).

Estes e outros são homens, hoje  injustamente esquecidos. Tal como a arquitetura que deixamos na Guiné-Bissau

O Pavilhão de Tisiologia (que com o início da guerra colonial em 1963 vai transformar-se em Hospital Militar 241, dramaticamente familiar a muitos de nós, e tornar-se um dos melhores de África, nomeadamente ao nível  da cirurgia ortopédica. É um edifício público, tal como outros da época, que seguia a "cartilha estadonovista" da arquitetura colonial: (i) funcionalidade, (ii) resistência; e (iii) adaptação ao clima...

Já em artigo publicado, em 2009, na revista brasileira "on line" Arquitectura e Urbanismo, do mestrado de arquitectura e urbanismo, da Universidade São Judas Tadeu, em São Paulo, Ana Vaz Milheiro e Eduardo Costa Dias chamavam a atenção para o facto de  "o trabalho do Gabinete de Urbanização Colonial – um organismo central dependente  do Ministério das Colónias, criado em 1944 e exclusivamente dedicado à execução de projectos  de arquitectura e de urbanismo para as colónias, nunca foi objecto de uma investigação monográfica, embora surja parcialmente citado em algumas investigações sobre arquitectura portuguesa em  África"... Os autores, neste artigo, elegem a cidade de de Bissau, capital da Guiné Portuguesa a partir de 1941, como um caso de estudo demonstrativo dos diferentes papéis que o Gabinete assume ao longo das suas  três décadas de existência".... Assim, e como "primeira etapa da análise dos princípios de actuação dos arquitectos  ao serviço do Gabinete e da cultura de projecto seguida, procura-se aqui conhecer a extensão dos  projectos efectivamente realizados, a datação de edifícios e a identificação algumas autorias assim  como verificar o estado de conservação em que este património actualmente se encontra"...







Gabinetes de arquitetura e urbanismo coloniais (1944-1974) > Bissau > Lista de obras (feitas e por fazer) e respetivos arquitetos 






Fonte: Milheiro, Ana Vaz, e Dias, Eduardo Costa - A Arquitectura em Bissau e os Gabinetes de Urbanização colonial (1944-1974). usjt - arq urb , nº 2, 2009 (2º semestre), pp.80-114 [ Disponível aqui em pdf ]

(Continua)

Guiné 63/74 - P12979: Documentos (27): Memórias dos últimos soldados do império (3): (Albano Mendes de Matos / Magalhães Ribeiro)



1. O nosso Camarada Albano Mendes de Matos, TCor Art.ª Ref, que esteve no GA 7 e QG/CTIG (Bissau, 1972/74), via e-mail, ajudou-me a ajustar memórias quarentonas e a ultimar a seguinte mensagem. 



2. Com foi dito no comentário final da primeira mensagem desta série “Memórias dos últimos soldados do império”, ficou lançado o desafio ao nosso último grã-tabanqueiro, nº 652 – TCor Albano Mendes de Matos, para abrir o "baú" das suas recordações e continuar a partilhar, connosco histórias e memórias do seu/nosso tempo... Recorde-se que ele terá sido o último militar português a vaguear pelas ruas de Bissau, na noite de 13 para 14 de outubro de 1974, antes de apanhar o último avião para Lisboa. 



3. Já eu, eterno "pira de Mansoa", também estou nesta lista dos últimos soldados do império, tendo regressado em 15 de Outubro de 1974, na última viagem do T/T Uíge, com as últimas tropas portuguesas que estiveram no CTIG. Os últimos a embarcar, não tendo deixado essa tarefa para mais ninguém, foram os comandantes e eu um dos penúltimos… nada importante a dizer mais sobre esta matéria! 

4. No entanto, lembrei-me de pedir ao TCOR Albano Matos, que me ajudasse a completar este “puzzle” e, acto que aproveito para agradecer aqui, recebi de imediato a seguinte e prestimosa resposta:

“Caro Amigo Eduardo,

Sobre a data da saída da Guiné, de facto, deixei Bissau antes da meia-noite do dia 14, portanto dia 13, e tomei o último avião militar da Guiné já no dia 14. Um navio estava ao largo para zarpar depois de os últimos militares terem saído de avião. Havia militares no forte da Amura, onde tinha a minha bagagem, que saíram de tarde. Fui o último a sair do Quartel-General do CTIG depois do meio-dia do dia 13. Só encontrei lá um comandante do PAIGC que me levou para a cidade. O meu condutor, embebedou-se no restaurante de um primo, que ficou em Bissau, e não pode ir buscar-me. ao QG. 

Almocei e jantei na casa de um antigo militar, que era locutor da Emissora, e ficava na Guiné. Passei o dia e parte da noite em Bissau, pelas ruas e não encontrei qualquer militar além do meu condutor. Os militares do QG foram, pela manhã, para a Base Aérea de Bissalanca. O que eu sabia é que estava um navio ao largo para sair logo que todos os militares deixassem o território da Guiné. Portanto, sairia em 14 de Outubro. Saiu em 15. Sempre pensei que tivessem saído em 14. Diziam que esse navio estava em Bissau, para sair com as últimas tropas porque poderia haver algum acontecimento.

É a razão por que eu digo que fui o último a sair das ruas de Bissau. No aeroporto, a despedirem-se de nós estavam dirigentes do PAIGC e o presidente da Câmara de Bissau.

Eu quis fazer uma reportagem sobre o último avião da Guiné, mas outro antecipou-se. Quando chegou o navio com as últimas tropas, o general Galvão de Figueiredo e alguns oficiais, que vieram no último avião, foram ao desembarque. A notícia dos últimos da Guiné, os que vieram de barco, está nos jornais. Creio que está esclarecido.

Eu vim no último avião, o amigo Magalhães veio no último barco, logo, depois de mim.

Abraço.”

5. Fui ao meu arquivo da Guiné dar mais umas voltas à papelada e acabei por descobrir, entre vária documentação do resgresso, 3 documentos que me foram entregues no UÍGE, que penso podem ser interessantes para quem gosta destas coisas e que passo a publicar para vosso conhecimento:

Normas internas - 1

Normas internas - 2


 Capa da ementa do dia 15 de Outubro de 1974

 Ementa do dia 15 de Outubro de 1974 - Messe de Sargentos
 Mensagem de despedida do dia 20 de Outubro de 1974 - Chegada ao cais de Alcântara.

Um abraço Amigo para todos e cada um de vós, 
Magalhães Ribeiro, Fur Mil OpEsp/RANGER da CCS/BCAÇ 4612/74
_______________
Nota de M.R.:

Último poste desta série em:



domingo, 13 de abril de 2014

Guiné 63/74 - P12978: Os Nossos Regressos (30): A nossa vinda foi, em Abril, há 40 anos (Jorge Araújo)

1. Mensagem do nosso camarada Jorge Araújo (ex-Fur Mil Op Esp / Ranger, CART 3494, Xime e Mansambo, 1972/1974), com data de 7 de Abril de 2014:

Caríssimo Camarada Carlos Vinhal,
Os meus melhores cumprimentos.
A pretexto de uma nova efeméride, esta referente à viagem de regresso à Metrópole ocorrida no já longínquo mês de Abril de 1974, aqui trago à memória colectiva da nossa Tabanca Grande, a narração dos meus últimos actos com ela relacionados que foram, pelas razões aludidas, um pouco diferentes dos restantes camaradas da minha companhia [CART 3494], mas que acabaram por ter um significado comum: o regresso às origens, depois do dever cumprido, agora que estão decorridos quarenta anos.
Considerando que o nosso regresso se realizou por via marítima, a bordo do N/M Niassa, a história ficaria amputada se não nos referíssemos aos que connosco viveram essa experiência. E foram mais de milhar e meio, incluindo os que vieram por via aérea, podendo o seu conjunto afirmar que: o nosso regresso foi há 40 anos.

Obrigado pela atenção.
Um abraço
Jorge Araújo.
07.Abr/2014.


____________

Nota do Editor

Último poste da série de 30 DE DEZEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12524: Os Nossos Regressos (29): Chegados a 2 de Abril de 1974, mal podíamos imaginar que a guerra estava a acabar (António Eduardo Ferreira)

Guiné 63/74 - P12977: Os nossos médicos (76): Memórias do Dr. Rui Vieira Coelho, ex-Alf Mil Médico dos BCAÇ 3872 e 4518 (9): O PAIGC no tempo do presidente Luís Cabral, perpetrou fuzilamentos sucessivos nos "Comandos Africanos"

1. Mensagem do nosso camarada Mário Vasconcelos (ex-Alf Mil TRMS da CCS/BCAÇ 3872 - Galomaro, COT 9 e CCS/BCAÇ 4612/72 - Mansoa, e Cumeré, 1973/74), com data de 7 de Abril de 2014:

Como habitualmente venho procedendo, junto o texto enviado pelo nosso Tabanqueiro n.º 624 - Rui Vieira Coelho, ex Alf. Mil. méd. do BCAÇ 3872 e BCAÇ 4518, sediados, que foram, em Galomaro - Guiné.
Ele, e eu, formulamos votos de boa recuperação para o camarigo Luís Graça e de amizade para todos em geral.

Um alfa-bravo para todos.
Mário Vasconcelos


MEMÓRIAS DO DR. RUI VIEIRA COELHO

9 - Fuzilamentos sucessivos nos "Comandos Africanos"

Rui Vieira Coelho

Costumo dizer aos meus doentes deprimidos, aflitos com o desemprego e a resseção económica, com a desintegração social e familiar e que dizem estar "no fundo do poço", pois olhe que eu já passei por situações muito piores quando estive na guerra da Guiné e depois de ter estado no Inferno, tudo aqui me parece o Céu.
Depois enumero algumas situações dramáticas por que passei e que assisti no teatro de guerra e a seguir começam a sentir que os problemas por que estão a passar, não serão tão graves, comparados com as descrições que eu lhes fiz.
Por fim é necessário, após acalmarem, enumerar soluções para os seus problemas de uma maneira prática, enlevando -lhes a auto-estima, o sentido de humor e a esperança de tempos melhores que por certo acabarão por vir, não deixando de afirmar sempre o apoio, o "ombro amigo" a disponibilidade de saber ouvir e o "tempo ao dispor".

Na Tabanca dos Melros, a recordação dos tempos bons e maus da Guiné, as conversas entre nós servem de terapia e de divisão de problemas antigos de lá trazidos, as saudades de locais e gente boa que conhecemos, e para as quais algumas não há retorno, como o meu amigo Tenente Jamanca, comandante (comando africano) da CCaç 21 de Bambadinca, injustamente fuzilado e que tantas vezes nos protegeu as costas em operações quer em Galomaro, Dulombi, Cancolim e Saltinho.

O PAIGC no tempo do presidente Luís Cabral, perpetrou fuzilamentos sucessivos nos "Comandos Africanos", que iludiram dizendo que estes iriam constituir a Tropa de Elite do Novo País agora libertado. 
Ouvi isso mesmo já em Bissau quando estava de urgência no Hospital Civil, hoje denominado de Simão Mendes, no período de transição e de viva-voz do Tenente Justo e do Capitão Saiegh, que acompanhavam o Dr Bualdi, responsável pela Saúde do novo País (angolano e era casado com a Dra Niquita Bualdi que estava nomeada para Comissionária da Educação) e que veio reunir com os médicos sediados em Bissau, pedindo para ficarmos mais algum tempo, dizendo que tínhamos um dever histórico para com o Povo da Guiné.

O Tenente João Bacar Djaló rodeado de pessoal da 1ª CCmds Africanos.

A maior parte de nós recusou o "convite" pois não estávamos em condições psíquicas, no fim da comissão de permanecer no território até à reorganização dois serviços de saúde.
Lembro-me de dizer ao Capitão Saiegh e ao Tenente Justo, que se fosse a eles, viria para a Metrópole, pois não me acreditava na ilusão criada pelo PAIGC e abarcaria com ambas as mãos a oferta de integração plena no Exército Português. Foi a última vez que os vi.

Posteriormente já cá, soube das atrocidades contra todos eles cometidas. A todos os massacrados do Batalhão de Comandos Africanos curvo-me com todo o respeito e rezo à minha maneira.

O Inferno que vos criaram, trará o CÉU para todos vós.  
Benditos sejam.

RVC
____________

Nota do editor

Último poste da série de 9 DE ABRIL DE 2014 > Guiné 63/74 - P12953: Os nossos médicos (75): Memórias do Dr. Rui Vieira Coelho, ex-Alf Mil Médico dos BCAÇ 3872 e 4518 (8): Colegas meus

Guiné 63/74 - P12976: Consultório militar, de José Martins (2): Respondendo ao cadete aluno cav Pedro Marçal Lopes: Tipologia das Unidades Mobilizadas pela Arma de Cavalaria durante a Guerra de África (1961-1974)

Brasão de armas de Portugal:  Imagem do domínio público.
Fonte: Wikipedia
1. Mensagem, de 4 do corrente,  do nosso leitor, Cadete Aluno Cav Pedro Marçal Lopes 09706, com pedido encaminhado para o José Martins


Boa tarde, caros Camaradas.
Devo felicitar-vos pelo vosso trabalho no blog dedicado a uma Campanha que tanto nos marcou e nos diz respeito. O meu nome é Pedro Lopes, sou Aspirante a Oficial de Cavalaria e venho por este meio pedir-vos auxílio na realização do meu trabalho final, com o tema: "A Tipologia das Unidades Mobilizadas pela Arma de Cavalaria durante a Guerra de África (1961-1974)".

Como podem deduzir do tema, o meu trabalho baseia-se apenas em unidades mobilizadas na metrópole e por unidades de Cavalaria. E após ter feito o levantamento das unidades, a minha busca agora direcciona-se para a estrutura orgânica das seguintes unidades: BCav, CCav (tanto pertencentes a BCav, como as Comp Indepentes), ERec, Pel Rec, CPM, Pel PM.

Pela dedicação demonstrada por vós, sinto honestamente que podem contribuir para que o meu trabalho se revele um tributo, tanto para a Arma de Cavalaria como para o Exército Português.

Agradeço desde já a vossa atenção e mais uma vez, Parabéns!

Com os melhores cumprimentos,
Pedro Lopes
Asp Cav


2. Resposta, dada no dia seguinte, pelo nosso camarada e colaborador permanente: José Martins [, foto atual à esquerda]:

Caro Pedro Lopes

Recebi do camarigo Carlos Vinhal o mail infra, e vamos colaborar no que nos for possivel.

Para tal agradeço que informe, mais concretamente, e que podemos ajudar. Creio que se refere a constituição orgânica das unidades e subunidades mobilizadas. Vou ver o que tenho em arquivo.

Refiro os links de um trabalho feito recentemente para o blogue, acerca das localidades e unidades militares, do exército, na altura das Campanhas de África, onde poderá encontar matéria de interesse:

2 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12534: Fábricas de Soldados - Localidades e Unidades Militares do Exército por onde passámos (José Martins) (1): Introdução, Biografia, Índice das Unidades, Estruturas Militares, Órgãos de Comando e Número de Unidades mobilizadas

4 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12542: Fábricas de Soldados - Localidades e Unidades Militares do Exército por onde passámos (José Martins) (2): G - Localização dos Órgãos, Unidades e Serviços do Exército (1961-1974) (1): Municípios de Abrantes a Coimbra

6 de Janeiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12550: Fábricas de Soldados - Localidades e Unidades Militares do Exército por onde passámos (José Martins) (3): G - Localização dos Órgãos, Unidades e Serviços do Exército (1961-1974) (2): Municípios de Covilhã a Linda-a-Velha

8 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12558: Fábricas de Soldados - Localidades e Unidades Militares do Exército por onde passámos (José Martins) (4): G - Localização dos Órgãos, Unidades e Serviços do Exército (1961-1974) (3): Município de Lisboa

10 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12570: Fábricas de Soldados - Localidades e Unidades Militares do Exército por onde passámos (José Martins) (5): G - Localização dos Órgãos, Unidades e Serviços do Exército (1961-1974) (4): Municípios de Mafra, Odivelas, Oeiras, Paço de Arcos, Penafiel, Penamacor, Ponta Delgada, Portalegre, Porto, Póvoa de Varzim, Queluz, Sacavém e Santa Margarida

13 de Janeiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12581: Fábricas de Soldados - Localidades e Unidades Militares do Exército por onde passámos (José Martins) (6): G - Localização dos Órgãos, Unidades e Serviços do Exército (1961-1974) (5): Santarém, Setúbal, Tancos, Tavira, Tomar, Torres Novas, Trafaria, Serra da Carregueira, Vendas Novas, Viana do Castelo, Vila Nova de Gaia, Vila Real e Viseu

Aguardo informações.
Sempre ao dispor

José Martins
Colaborador Permanente

3. Comentário de L.G.:

Apraz-nos saber que o nosso blogue é  lido e considerado últil, "como fonte fonte de informação e conhecimento", por professores e alunos da nossa Academia Militar, em particular, e mais em geral pelos militares portugueses no ativo,

Quanto ao pedido do nosso Cadete Aluno Cav Pedro Marçal Lopes,  permito-lhe chamar a atenção para a coluna do lado esquerdo do nosso blogue onde encontrará cerca de 3 milhares de entradas, referências ou marcadores, incluindo diversas relativas à arma de cavalaria:. Basta clicar sobre a hiperligação. Alguns exemplos, que podem ser úteis para o seu estudo:

BCAV [, seguido do respetivo nº de identificação]
Cavalaria
CCAV [, , seguido do respetivo nº de identificação]
Chaimite
CPM  [, seguido do respetivo nº de identificação]
EPC
EREC [seguido do respetivo nº de identificação]
Pel Rec Daimler [, seguido do respetivo nº de identificação]
Pel Rec Fox  [, eguido do respetivo nº de identificação]
Pel Rec Panhard [, seguido do respetivo nº de identificação]
PM - Polícia Militar...

Boa pesquisa. Bom sucesso, para si,  futuro oficial de cavalaria,  em termos escolares, pessoais e profissionais, Um alfa bravo.
Luís Graça

PS - Faça também pesquisas através do  Google Imagens. Por exemplo, Google Imagens=BCAV
______________

Guiné 63/74 - P12975: Memórias dos últimos soldados do império (2): A aventura do "Caderno de Poesia Poilão", de que se fizeram 700 exemplares, a stencil, em fevereiro de 1974, em edição do Grupo Desportivo e Cultural dos Empregados do BNU (Albano Mendes de Matos)



Foto nº 1 > Bissau > 1974 > Albano Mendes de Matos, a preparar o Caderno de Poesias «Poilão», no Clube Militar de Oficiais.


Foto nº 2 > Bissau > 1974 > Alguns membros do grupo «Poilão». Ao centro, à esquerda, o capelão da Leprosaria da Cumura, à direita, Aguinaldo de Almeida, do Banco Nacional Ultramarino, no dia do lançamento do Caderno de Poesias «Poilão». O Albano de Matos está à dierita do capelão.



Foto nº 3 > Bissau > 1974  > Capa do documento  policopiado do Caderno de Poesia Poilão", editada pelo Grupo Desportivo e Cultural dos Empregados do Banco Nacional Ultramarino



Foto nº 4 > Bissau > 1974 >  Cartão de sócio da UDIB - União Desportiva Internacional de Bissau

Fotos (e legendas): © Albano Mendes de Matos  (2014). Todos os direitos reservados. [Edição: L.G.]

1. Mensagem enviada, a 2 do corrente, pelo nosso Albano Mendes de Matos, ten cor art ref, que vive no Fundão [, ex-2 ten art, GA 7 e QG/CTIG, Bissau, 1972/74], enviou-nos a seguinte mensagem.


Luís,

Envio em anexos um texto sobre o Caderno de Poesias «Poilão» e 3 fotos: uma minha a fazer o «Poilã», outra do grupo «Poilão», onde estão o capelão da Leprosaria da Cumura e o Aguinaldo de Almeida do BNU, uma terceira com a capa da brochura, e uma quarta. do meu cartão de sócio da UDIB. Mando também duas fotos minhas, atuais.

Abraço, Albano.


2. Albano Mendes de Matos na Guerra Colonial > O Caderno de Poesias "Poilão"

[O autor, foto atual, à esquerda]

Como militar de carreira, durante 36 anos, tive, sempre que pude, uma actividade paralela: colaboração em revistas e jornais, explicador de algumas disciplinas liceais, fotógrafo amador, frequência de cursos e pesquisa de campo sobre Literatura Tradicional Popular e Antropologia.

Mobilizado para a Guerra Colonial, fiz duas comissões de serviço em Angola, de 1961 a 1963 e de 1965 a 1968, e uma na Guiné, de 1972 a 1974.

Posso dizer que fui o último militar português a vaguear pelas ruas de Bissau, de onde saí, na noite de 13 de Outubro, para o aeroporto de Bissalanca, para regressar a Portugal, no último avião da Guiné, na madrugada do dia 14 de Outubro de 1974.

Em Angola, tentei perceber o sistema de relações entre o colonizador e o colonizado, ou, antes, as relações entre o branco e o negro, e também as vivências de alguns povos angolanos, com relevo para Povo Quioco, da Lunda-Norte, sobre o qual fiz alguns trabalhos.

Na Guiné, foi diferente. Colocado em Bissau, sujeito a horários, não tive condições, nem disponibilidade para contactos com os povos negros. Em Bissau, passei a frequentar a UDIB - União Desportiva Internacional de Bissau, da qual fui sócio [, vd. foto nº 4, acima], o Grupo Desportivo e Cultural do Banco Nacional Ultramarino e a Associação Comercial. Na UDIB e no Grupo Desportivo e Cultural do BNU, colaborei na organização eventos culturais, como, concursos literários e sessões de teatro


Nos inícios do mês de Dezembro de 1973, ao ler o jornal «Voz da Guiné», deparei com um escrito de Agostinho de Azevedo, alferes miliciano, creio que chefe de redacção do jornal, insinuando que não havia poesia na Guiné. Respondi com um escrito, «O Despertar da Guiné», dizendo que havia poesia na Guiné e que, em breve, iríamos ter um Caderno de Poesias, com o título de «Poilão», a designação de uma árvore sagrada na Guiné. Depois da publicação do primeiro número, seriam publicados cadernos de poesia de um só autor.

No Grupo Desportivo de Cultural do BNU, conheci guineenses e cabo-verdianos que faziam poesias e pedi originais para colaboração em «Poilão», que ainda guardo no meu arquivo. Juntei 24 poemas de 4 poetas da Guiné, 3 de Cabo Verde e 4 de Portugal.

De modo artesanal, fiz 300 exemplares do caderno. Dactilografei os poemas, imprimi-os em duplicador, dobrei as folhas e agrafei-as em capa de cartolina, esta impressa em tipografia, com desenho do poilão da autoria de um alferes miliciano, do Batalhão de Transmissões.



Os 300 exemplares do Caderno de Poesias «Poilão», editado pelo Grupo Desportivo e Cultural do Banco Nacional Ultramarino, esgotaram-se na noite do lançamento. Sem preço de capa, cada pessoa dava a importância que queria. O preço por unidade foi de 20$00 a 100$00.

Por minha proposta, o dinheiro angariado foi doado à Leprosaria da Cumura, nas proximidades de Bissau. Preparei, então, mais 400 exemplares que se esgotaram num dia. Havia apetência para a Poesia na Guiné. Eu apercebi-me desse facto.

No jornal «Voz da Guiné», de 28-02-1974, Agostinho de Azevedo refere o lançamento de «Poilão":

«De uma assentada, dois livros com poemas vieram parar em cima da nossa secretária. Um, impresso, provinha de Angola, o outro, policopiado, é um caderno nado e criado na Guiné. É claro que neste apontamento, em que falamos de Bissau, com amor, nos interessa, sobremaneira, aquele que viu surgir a luz do dia aqui, ao nosso lado. Além do mais, nós pugnámos para que isso acontecesse. Não tivemos interferência na sua elaboração, mas sentimo-nos irmandos num mesmo sentimento. Aplausos para os seus dirigentes e os seus colaboradores. Não havendo outra forma de manifestarem as suas preocupações culturais, este caderno é um exemplo que pode dar bons frutos.»

Com um mês de licença, em Portugal, e com as antevisões do 25 de Abril, não foram publicados mais cadernos.


O Caderno de Poesias «Poilão» está referenciado, praticamente, em todas as Bibliografias, Dicionários, Histórias e Estudos da Literatura Africana de Expressão Portuguesa, sendo considerado como a primeira Antologia de Poesia na Guiné-Bissau. Tem sido referido em tertúlias, seminários e encontros culturais.



Em «Poilão», colaborou Pascoal D’Artagnam Aurigema, falecido em 1991, que foi um dos principais poetas da Guiné-Bissau. Um poema deste autor publicado em «Poilão»:

MÃOS

magras
desmazeladas
negras

mãos
entregues à bolanha
o pau de pilão

mãos
de canseira
abandonadas
na eterna lenga-lenga
do duro labor

mãos
de inferno
condenadas
fuliadas
p’ra lá
p’ra aquele espaço
longe
onde basbaco
e canseira
e pobreza
formam sociedade

mãos pendidas no vácuo
mãos porcas
ah! desprezadas mãos!

Pascoal D’Artagnam Aurigema
_______________

Nota do editor:

Último poste da série > 13 de abril de 2014 > Guiné 63/74 - P12974: Memórias dos últimos soldados do império (1): “Bate estradas” histórico, escrito à minha filha em 1973, e uma redacção da minha neta,  vinte anos depois (Albano Mendes de Matos)

Guiné 63/74 - P12974: Memórias dos últimos soldados do império (1): “Bate estradas” histórico, escrito à minha filha em 1973, e uma redacção da minha neta, vinte anos depois (Albano Mendes de Matos)

1. O nosso Camarada Albano Mendes de Matos, TCor Art.ª Ref, que esteve no GA 7 e QG/CTIG (Bissau, 1972/74), enviou-nos a seguinte mensagem.


Camaradas,

Envio um texto sobre o aerograma, o célebre «bate-estradas», que uma neta escreveu, numa aula de Português, quando aluna no Colégio Maristas, na Parede, para uma possível publicação na «Tabanca».

Abraço.
Albano Mendes de Matos


AEROGRAMA OU "BATE ESTRADAS" > UM DOCUMENTO HISTÓRICO E UMA REDACÇÃO



Em Janeiro de 2003, no Colégio Marista da Parede, onde estudava uma minha neta, uma professora de Português, pediu aos alunos que, no dia dos avós, levassem um objecto histórico que tivesse pertencido ou feito por um avô ou avó.

A minha neta falou com a mãe e esta mostrou-lhe aerogramas que eu lhe tinha enviado da Guiné, onde estive em comissão de serviço de 1972 a 1974, e que guardava numa caixa. A minha neta levou alguns aerogramas para o Colégio Marista, que foram objectos de curiosidade.



Aerograma, o célebre «bate-estradas».

Imagem digitalizada: © Albano Mendes de Matos (2014). Todos os direitos reservados.


A professora disse, então, aos alunos que fizessem uma redacção sobre os objectos que tinham levado.

A minha neta fez a seguinte redacção:


«O AEROGRAMA

No baú das recordações, encontrei uma caixinha de cartão muito bonita. A caixinha foi carinhosamente forrada com um papel brilhante enfeitado com grinaldas de flores, anjinhos e corações. Abri-a, curiosa, e lá dentro um laço de seda azul apertava um montinho de cartas amarelas. Escolhi uma, mirei-a de frente e no verso.

Dentro de um rectângulo, no canto superior esquerdo, li: “O transporte deste aerograma é uma oferta da TAP aos soldados de Portugal.” Então, percebi que a cartinha amarela se chamava aerograma. Foi escrito pelo meu avô para a minha mãe. E fiquei a saber que o meu avô tinha sido um soldado de Portugal!

Investiguei um pouco e fiz montanhas de perguntas sobre os simpáticos aerogramas.

Descobri que através deles os “soldados de Portugal” comunicavam com os familiares e os amigos. Antigamente, não existiam telemóveis, nem Internet e poucas pessoas tinham telefone em casa. Por isso, quando se estava longe, escreviam-se muitas cartas, neste caso, aerogramas. O avô, nessa época, encontrava-se em comissão militar, na Guiné-Bissau. Esteve lá dois anos e, durante esse tempo, só veio à Metrópole (Portugal) quatro vezes. Assim, longe, enviava muitas cartas, aerogramas e postais.

Os aerogramas tinham uma alcunha, contou-me o avô. Eram os “bate-estradas” porque chegavam a todo o lado onde estivessem soldados. Imagino que naquela época, visto do céu, o nosso país devia ser amarelo, pois eram tantos os aerogramas que voavam de um lado para o outro e eram tantos os soldados que estavam na guerra!

Ser militar devia ser muito doloroso! A avó confessou-me que, sempre que recebia uma carta do avô, fixava a data e pensava:“Pelo menos neste dia estavas vivo e de saúde; hoje, já não sei se estás bem.”

Também fiquei a saber que quem inventou os aerogramas foi o Movimento Nacional Feminino. Era um movimento de senhoras que apoiavam os militares do Ultramar.

Entretanto, pedi autorização ao meu avô para ler publicamente algumas das suas palavras»:

"Bissau, 25 de Setembro de 1973

"Querida Rita

"Como vais de saúde? Bem disposta?

"Tens trabalhado muito? Olha que a escola está quase a chegar e este ano já é mais difícil. (...)

"Aqui, vai tudo na mesma, só mais cansado e aborrecido. Enganei-me no emprego. (...)

"Muitos beijos do teu pai

"E assina."

Passados dezanove anos: nasci.

Passados mais onze anos: estou aqui a contar esta história.»
Lúcia Maria Matos Carreira

2. Comentário de do editor MR:

Fica aqui o desafio ao nosso último grã-tabanqueiro, nº 652, para abrir o "baú" das suas recordações e continuar a partilhar, connosco histórias e memórias do seu/nosso tempo... Recorde-se que ele terá sido o último militar português a vaguear pelas ruas de Bissau, na noite de 13 para 14 de outubro de 1974, antes de apanhar o último avião para Lisboa. Eu, "pira de Mansoa", também estou nesta lista dos últimos soldados do império, tendo regressado em 15 de Outubro de 1974, na última viagem do T/T Uíge, com as últimas tropas portuguesas que estiveram no CTIG.