terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Guiné 63/74 - P12618: Tabanca Grande (420): José Cardoso da Silva Almeida, ex-1.º Cabo Mecânico Electricista do BENG 447 (Guiné, 1971/73)

1. Mensagem do nosso camarada e novo tertuliano José Cardoso da Silva Almeida, ex-1.º Cabo Mecânico Electricista do BENG 447, Guiné, 1971/73, com data de 19 de Janeiro de 2014:

Caro camarada, Carlos Esteves

Sou o José Cardoso da Silva Almeida,
Ex-1.º Cabo Mecânico Eletricista do BENG 447 - Companhia de Construções.
Embarquei para a Guiné a 3 de Abril de 1971 e
regressei a 14 de Abril de 1973.

Mal tive tempo de pôr os pés em terra e já estavam a preparar a primeira de muitas saídas.
Nova Lamego com destino a Pirada.

Passei por Bajocunda, Bula, Piche, Buruntuma, Bafatá, Bambadinca, Contuboel, Cacine, Catió, Tite, Teixeira Pinto, Farim, Susana, S. Domingos, Aldeia Formosa e Buba. Em alguns locais estive mais do que uma vez e bastante tempo.

Terra nunca esquecida, Aldeia Formosa por ter sido mordido por uma cobra que estava dentro da sapatilha. Calcei uma e na outra, quando meti o pé, senti que tinha uma coisa mole. Então meti a mão e saiu ela agarrada ao dedo. Sacudi a mão e corri para a enfermaria, tentando com a outra mão fazer um garrote.

Apareceu um enfermeiro e o médico que me medicaram com três ou quatro injeções na cabeça do dedo e prognosticaram-me quinze minutos de vida.
A minha salvação foi um africano que se apercebeu, entrou na enfermaria e extraiu-me o sangue até ao sitio que tinha o garrote e depois foi só dormir até às 11 horas do dia seguinte.
A minha primeira reação quando acordei foi dizer: eu estou vivo, e correr até ao posto médico e mandar vir.

Desculpem ser tão maçador mas parece que estou no local certo.
Tenho mais algumas histórias mas ficam para mais tarde.

Bom trabalho.
José Almeida


2. Comentário do editor:

Caro camarada José Almeida, deixa que te diga que para quem teve um prognóstico de 15 minutos de vida, há cerca de 40 anos, estás com óptimo aspecto.

Já que estás vivinho da Silva, bem-aparecido nesta Tabanca de ex-combatentes da Guiné, onde poderás permanecer até aos 100 anos de idade. A partir desse marco é forçosa a passagem à reserva.

Muito obrigado por te juntares a nós. Pelo que descreves, foste um andarilho na Guiné, fruto da tua especialidade, mas deixa que te diga que não foste ao sítio mais importante da Guiné, digo eu, Mansabá. Se passasses por lá até Fevereiro de 1972 ainda me encontravas.
Se bem me lembro chegámos a precisar de técnicos especializados em geradores já que um deles, tínhamos dois, nos dava alguns problemas. Estivemos uns quantos sabichões à volta daquilo, mas nem sei quem resolveu o problema. Acho que o motor trabalhava mas o gerador não cumpria a sua missão de dar à luz.

Voltando a ti, ficamos então à espera das tuas histórias, que devem ser muitas, tais e tantas as deslocações que tiveste ao longo da tua comissão de serviço. Situações inesperadas como a que hoje nos contas, hás-de ter algumas, não tão trágicas, esperamos.
Se tiveres fotos dos locais por onde passaste, também as poderemos publicar.
E de Bissau, também queremos fotos e memórias. Tudo o que tenhas por aí tem valor para o nosso espólio.

Disseste no teu primeiro contacto que és inexperiente na informática. Não te atrapalhes porque com a prática chegas acabas por adquirir conhecimentos que farão de ti um óptimo utilizador destas máquinas infernais. E também poderás contar com a nossa ajuda. Não é que saibamos muito, mas dá para desenrascar.

Posto isto, queremos que nos saibas ao teu dispor para qualquer esclarecimento.
Deixo-te um abraço de boas-vindas em nome dos editores e da tertúlia.
O teu camarada e novo amigo
Carlos Vinhal
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Nota do editor

Último poste da série de 21 de Janeiro de 2014> Guiné 63/74 - P12615: Tabanca Grande (419): Duarte Manuel Sousa da Cunha, ex-Alf Mil da CCAÇ 16 e 3ª CART do BART 6523 (Bachile e Nova Lamego), 1973/74

Guiné 63/74 - P12617: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (7): As localidades por onde passei, sofri e amei (Veríssimo Ferreira)

1. Em mensagem do dia 18 de Janeiro de 2014, o nosso camarada Veríssimo Ferreira (ex-Fur Mil da CCAÇ 1422 / BCAÇ 1858, Farim, Mansabá, K3, e Bissau, 1965/67) enviou-nos a sua perspectiva sobre o seu percurso militar desde a Recruta até à sua promoção à alta patente de 1.º Cabo Miliciano.


AS LOCALIDADES POR ONDE PASSEI... SOFRI... AMEI 

E VAI DAÍ: 

Por edital, soube que me deveria apresentar em Mafra, na Escola Prática de Infantaria, a fim de frequentar o Curso de Sargentos Milicianos.
Saí de Ponte de Sôr, pela matina e no combóio. Chegado a Lisboa, pedi informações para ir para o Martim Moniz, local donde sairia a camioneta para Mafra.

A confusão, nesta louca cabecinha, era mais que muita (primeira vez na grande cidade) e habituado que estava a ver muita gente junta, aquando das feiras, pensei:
- Há por aqui uma como a nossa de Outubro!!!

Bom, mas lá fui ter e parti para o destino... e cheguei enquanto no entretanto comi as duas sandes que a minha querida mãe, preparara para a viagem.

Mafra, surpreendeu-me, quando logo ali mirei, o Mosteiro.
- Um quartel? - Duvidei.

Convento de Mafra

Na entrada, havia um enorme grupo de juventude de cabelinhos cortados à inglesa curta e que esperava e a eles me juntei.
Lá chegou a minha hora e preenchidos que foram, uns papéis, mandaram-me para o alfaiate que tirava medidas olhando-nos de alto abaixo, o que significou que recebi umas roupitas bem bonitas por acaso... um bivaque onde cabiam duas cabeçorras, duas camisas cinzentas nº 54 e eu até aí, usava 42, dois pares de calças que me chegavam dos pés à cabeça, duas botas 47 e eu calçava 41... e por aí fora.

Na caserna, assim chamavam ao quarto luxuoso, um 5.º andar e 183 degraus para subir, onde me colocaram, para me não sentir só deixaram-me acompanhado por mais 151 recrutas que se tornaram meus amigos.

No dia seguinte, reuniram-nos num espaço rectangular, que ainda hoje existe, lá atrás do convento e a que chamaram e chamam, "A parada".
Éramos, talvez uns três mil, que sairiam dali como Oficiais ou Sargentos Milicianos.
Juntaram-nos depois, sentados no chão e rodeando o Oficial Instrutor, cá fora... ali ao lado esquerdo de quem entra... e esclareceram-nos sobre as normas nem vigor, para contactos eventuais, com os residentes civis e também como distinguir os postos militares.

Escola Prática de Infantaria

Ficámos a saber, que a coisa começava desta forma:
- O início e por aí fora: - RECRUTAS; 1.º Cabo; Furriel; Sargento; Aspirante; Alferes; Tenente; Capitão; etc; etc; etc; etc; General; Marechal; e finalmente: 1.º CABO MILICIANO.

Contentíssimo fiquei. Então não é, que o filho do meu pai, iria alcançar o mais alto posto, lá para Agosto e já especialista de Infantaria...
E 1.ª classe em metralhadora Dreyse 7,9?
E 3.ª classe em espingarda 7,9?
E 1.ª classe em comportamento?
E atirador, terminada a instruçao complementar?

Aparvalhado ainda, com o facto de ontem ter visto, Lisboa... aviões dos grandes... e barcos a atravessar um rio a que ouvi chamarem Tejo e ter ainda a possibilidade, de e também, pela primeira vez, poder ir ver o mar... as praias da Ericeira e mais agora esta notícia... plena de responsabilidades...
Olhem... fiquei de tal maneira entontecido... que julgo não ter voltado a ser o humano normal de antes.

Continências e divisas, foram-nos sabiamente mostradas, bem como o manejo duma espingarda... o seu desmanchar em bocados... e a consequente limpeza com o escovilhão.

No 3.º dia e após o pequeno almoço, começou a preparação para que pudéssemos vir a ser militares disciplinados, bravos, heróicos e que acima de tudo, voltássemos inteiros.
- Corridinhas na tapada... rastejar no meio da trampa... percursos de combate... saltos para o galho... jogos de brutóbol... tiro na carreira do dito... actividades desportivas com vários empecilhos no meio... audição dos gritos estridentes e ameaçadores dos monitores do pelotão... enfim... toda uma panóplia útil que só mais tarde entendemos ter sido preciosa para que aqui e agora estejamos ainda semi-vivos e, ah, sempre acompanhados pela fiel Mauser e de capacete enfiado... no local próprio de enfiar capacetes.

Regressávamos depois e quase na hora do repasto. Íamos à suite tomar um banhito rápido e mudar de fato. Toca a corneta e ala que são horas de almoço.
Boas refeições sim senhor e até vinho havia e da cor que entendêssemos, embora eu achasse que aquilo era mais água... e cânfora... substância que e ao que diziam, transformava em eunucos, embora provisoriamente, quem bebia a zurrapa.

A 4 de Julho de 1964, após portanto 5 meses e 10 dias e com aproveitamento e todos os créditos alcançados, consideraram-me então, apto, ou seja, vais tirar a especialidade de "atirador" e como ordens não se discutem, decidi-me e fui para Tavira.

Vista parcial de Tavira

Terra linda que continuo a visitar.
Linda praia, onde até a água era e é, quente, comparada com a da Ericeira, de que tinha provado o sal.
Boas gentes, embora e nesse período, as tenha considerado más com'ás cobras, tendo em conta que quando os pobres militares, sedentos e até com alguma fomita, colhíamos algumas amêndoas, alfarrobas ou figos, ou ainda, lhes bebíamos umas gotas nos escassos poços existentes... iam de imediato participar ao quartel e algumas vezes desembolsámos os 25 tostões para compensar o prejuízo.
A miséria patrimonial deste povo algarvio era notória e justificava a queixa. O turismo mal começara e aquelas frutas e água eram o seu ouro.

No que se refere à instrução militar, foi o acrescento próprio, para quem já estava treinado.
Novidade apenas para o "DEITÁÁÁÁR" nas salinas. Lindo de se ver, creiam. E nós... vestidinhos... lavadinhos e engomados... calçadinhos... botas engraxadas e reluzentes, espelhando o sol quente desse mês de Julho... obedecíamos está claro, só para não nos considerarem desobedientes.
Saíamos enlameados, cheios de lodo até aos cabelos, mas mais fortes alguns, aqueles que engoliam alguma distraída enguia. Até nisso, a sorte me foi madrasta já que o único brinde que me calhou, foi uma enorme serpente que resolveu aninhar-se no bolso esquerdo das calças.

À tardinha dispensavam-nos e podíamos então confraternizar com as tascas locais, onde sempre comíamos generosas doses de grandes conquilhas, ou jaquinzinhos atados pelo rabo e em grupos de 5 ou 6, regados com aquele saboroso tintol carrascão de tal forma, que até os dentes ficavam coloridos.

Alguns mais afortunados, proporcionavam a outros, passeios e assim conheci, Quarteira, Armação de Pera, Albufeira e Faro.

E em 30 de Agosto de 1964, fui promovido a 1.º Cabo Miliciano, pois então...
Começa aí um percurso agitado, com constantes mudanças, assim estilo "faça férias cá dentro" e foi o que me valeu para ficar bem a conhecer, algum deste País, que eu julgava ser só o Alto Alentejo.
1.º - Amadora (Regimento de Infantaria 1);
2.º - Lamego ( Rangers);
3.º - Tancos (Minas e Armadilhas)
4.º - Lisboa (Grupo C. Trem Auto)
5.º - Abrantes (Regimento Infantaria 2)
6.º - Tomar (Regimento Infantaria 15)
7.º - GUINÉ.

(Continua)

OBS:- Imagens retiradas da internete pelo editor,
com a devida vénia aos seus autores
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Nota do editor

Último poste da série de 21 de Janeiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12614: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (6): Eu fiz "Tropa" em cinco cidades, em Portugal e ainda em Nhacra, Quebo e Nhala, na Guiné Bissau (Manuel Amaro)

Guiné 63/74 - P12616: Filhos do vento (26): A direcção da A Associação FIDJU DI TUGA: Fernandinho da Silva, presidente, e José Maria Indequi, secretário.


Guiné-Bissau  > Bissau > Associação Associação da solidariedade dos filhos e amigos dos ex-combatentes portugueses na Guiné-Bissau (FIDJU DI TUGA) > Dois elemento da direção: da direita para a esquerda, Fernandinho da Silva (telef + 5880597), Presidente, e José Maria Indequi (telef + 5218200 e  + 6612146), Secretário...

A foto foi-nos enviada ontem pelo Pepito, diretor executivo da AD - Acção para o Desenvolvimento. Segundo o Pepito, são "duas pessoas muito sérias que pretendem recensear os filhos dos militares portugueses que prestaram serviço na Guiné-Bissau, contar as suas estórias e pô-los em ligação com as famílias portuguesas que assim o entenderem".

Segundo a reportagem do Púiblico (vd. dossiê "Filhos do Vento"), da responsabilidade da jornalista Catarina Gomes (e sua equipa Manuel Roberyo e Ricardo Resende),  o Fernando Edgar da Silva, "nasceu em 1968, é camionista", e a sua "mãe era Sabadozinha Mendes, vivia junto ao quartel português de Canchungo (ex-Teixeira Pinto), onde o pai trabalharia na cozinha, enquanto esteve na Guiné, de 1966 a 1967"...Sabe que o pai "furriel". Realiza agora o seu sonho de "criar uma associação que represente todos os filhos que os militares portugueses "abandonaram" na Guiné.

Segundo a mesma fonte, José Maria Indequi é "técnico agrário, estudou em Cuba e na China. Acha que o seu verdadeiro nome, que lhe foi dado pelo pai, é José Carlos dos Santos. Nasceu a 1971, o pai talvez tenha voltado a Portugal em 1973 ou 1974". Maria Paula Indequi é o nome da sua mãe. Qunato ao pai esteve colocado no quartel de Pelundo, na região de Cachéu. Acha que pertencia ao Bcaç 2884.  "O pai vivia maritalmente com a mãe e tiveram mais uma filha, a sua irmã Elva, e uma outra rapariga, Manuela, que já morreu!. Queixa-se que os  filhos dos portugueses na Guiné são "cidadãos de segunda", "estão no meio da barcaça".

Publicámos em poste anterior (*) os estatutos da associação e lançámos um apelo à solidariedade de todos nós: amigos e camaradas da Guiné que se reunem sob o poilão da Tabanca Grande, leitores do nosso blogue, bem como régulos e membros das demais Tabancas (Ajuda Amiga, do Centro, da Linha, de Matosinhos, dos Melros, da Lapónia, de Candoz, de Guilamilo, de São Martinho do Porto...). Se cada um de nós se dispuser a dar um euro a esta associação, juntamos o dinheiro necessário para eles adquirirem o computador pessoal, a máquina fotográfica digital e o gravador que precisam para trabalhar na realização dos objetivos da associação, que nos parecem justos e nobres:  (i)  ver reconhecida a nacionalidade portuguesa, pelo Estado Português, de todos os filhos de ex-combatentes portugueses e dos seus descendentes; (ii) defender os valores da cidadania, de igualdade, justiça social e o carácter democrático, laico e pluralista da sociedade e do estado [da República da Guiné-Bissau]; (iii) reagrupar e fortalecer os Fidju di Tuga  na Guiné-Bissau com uma visão sociocultural comum que os unem;  e (iv) contribuir para o desenvolvimento humano, solidário e duradora entre os associados, amigos e a comunidade portuguesa residente e não residente na Guiné.

Quem quer, individual ou coletivamente, assumir a liderança deste projeto de ajuda e solidariedade em favor da Associação Fidju di Tuga ? Lançava o desafio ao José Saúde (da delegação de Beja da Tabanca Grande), que teve o mérito de grafar a expressão "filhos do vento"... Ou então a poderosos régulos como o José Teixeira, da Tabanca de Matosinhos, o Carlos Fortunato, da Tabanca Ajuda Amiga ou o Joaquim Mexia Alves, da Tabanca do Centro (agora a comemorar o seu 4º aniversário, realizando em 31 do corrente, um almoço-convívio,. em Monte Real,  que já esgotou o limite de lugares na sala, que são 80). Sem esquecer o Jorge Rosales e o seu ajudante campo, o Zé Manel Dinis, da Tabanca da Linha... Um alfabravo para todos. LG

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Guiné 63/74 - P12615: Tabanca Grande (419): Duarte Manuel Sousa da Cunha, ex-Alf Mil da CCAÇ 16 e 3ª CART do BART 6523 (Bachile e Nova Lamego), 1973/74


1. O nosso Camarada Duarte Manuel Sousa da Cunha, ex-Alf Mil Op Esp/RANGER da CCAÇ 16 e 3ª CART do BART 6523 (Nova Lamego e Bachile) - 1973/74, enviou-nos uma mensagem de apresentação nesta nossa tertúlia, acompanahda de algumas fotos do seu álbum de memórias.

Camaradas,

As fotografias são de Nova Lamego (7), do meu BART 6523 - 3ª Companhia que partiu para a Guiné de Penafiel. Junto também algumas fotos do Bachile (8), que foram tiradas quando fui colocado na companhia Caçadores Africanos 16, junto a Teixeira Pinto. 

Frequentei o curso de C.O.M. no C.I.O.E. em Lamego, no 4º turno de 1972, também tinha estado no terceiro, mas por abertura de uma fratura que tinha tido no pé esquerdo tive que ir para o Hospital Militar no Porto, onde estive internado durante quase três semanas.

Quando terminei o curso em Lamego, fui colocado em Penafiel no mês de Janeiro/73, mas como o batalhão só se iria formar em Abril, fui dar uma recruta a Espinho.

Vivo onde nasci, em Angra do Heroísmo.

Hoje envio as 7 fotos de Nova Lamego:








Um abraço camaradas, 
Duarte Cunha
Alf Mil Op Esp/RANGER da CCAÇ 16 e 3ª CART do BART 6523

2. Amigo e Camarada Duarte Cunha, quero, em nome do Luís Graça “patrão” deste sítio e demais Camaradas-de-Armas perfilados nesta grande tabanca, dar-te as boas vindas e, como é habitual aos periquitos aqui chegados, solicitar que se te lembrares de histórias da tua estadia por terras guineenses, aqui no-las contes, bem como se possuíres mais fotos as envies para publicação. 

Resta-me dizer que o teu batalhão é dos mais representados nesta tertúlia, estão já aqui, que me lembre, os nossos Camaradas António Barbosa, também ex-Alf Mil Op Esp/RANGER do 1º Pelotão da 2.ª CART – Cabuca -, o José Romeiro Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS (Nova Lamego e Gabu), o Ricardo Figueiredo ex-fur mil, 2ª CART - Cabuca -, Manuel Sousa da Silva da 2ª CART - 4º Pelotão (Cabuca), o Américo Marques, ex-Sold Transmissões da 3ª CART (Nova Lamego/ destacado em Cansissé ) e o falecido Alfredo Dinis, que foi 1.º Cabo Enf da CCS (Nova Lamego).

Fica bem com um abraço Amigo.

Mini-guião de colecção particular: © Carlos Coutinho (2011). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em: 


Guiné 63/74 - P12614: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (6): Eu fiz "Tropa" em cinco cidades, em Portugal e ainda em Nhacra, Quebo e Nhala, na Guiné Bissau (Manuel Amaro)

1. Mensagem do nosso camarada Manuel Amaro (ex-Fur Mil Enf da CCAÇ 2615/BCAÇ 2892, Nhacra, Aldeia Formosa e Nhala, 1969 a 1971) com data de 18 de Janeiro de 2014:

Eu fiz "Tropa" em cinco cidades, em Portugal e ainda em Nhacra, Quebo e Nhala, na Guiné Bissau.

Começando pelo Sul, estive em Tavira, cidade que já conhecia desde que nasci e gosto o normal que qualquer cidadão gosta da sua terra natal.

Em Beja quase não tive tempo para conhecer a cidade, pelo que não desenvolvi qualquer relação especial de "amor" pela Pax Júlia.

Já a relação com Évora foi diferente. E foi boa... muito boa.
Apesar ter estado duas vezes em Évora, ambas mobilizado para a "guerra".

Na primeira vez, era para Angola, mas não se concretizou, passado pouco tempo nova mobilização, agora para a Guiné, levada até ao fim.
Em Évora aproveitei algum tempo para visitar a cidade e a nossa relação permanece tão intensa, que periodicamente faço uma visita com ou sem pernoita. Numa das últimas visitas, aproveitei para levar a Florbela Espanca uma mensagem de Sebastião da Gama. (foto anexa).
Gostei muito de Évora


Évora, 18 de Abril de 2012

Lisboa. Quem não gosta de Lisboa?
Lisboa, eu também já conhecia desde o Grande Encontro Nacional da Juventude.
E a "tropa" levou-me à Estrela.
Ao Hospital Militar da Estrela.
Ao Jardim da Estrela.
Aos Fados.
Aos castelos e aos bairros típicos, às tascas, à verdadeira Lisboa.

Logo que terminei o Serviço Militar voltei à Grande Lisboa, em janeiro de 1972, até hoje.
Mesmo que uma parte do tempo seja passada no Algarve, Lisboa faz parte de mim.

Lisboa - Estrela

E Coimbra?
De uma forma diferente de Évora e de Lisboa, mas Coimbra foi tão ou mais importante para mim.
E nós, para não sermos ingratos, temos que amar as "coisas" importantes.
Assim que cheguei a Coimbra, em junho de 1967, fui visitar o Penedo da Saudade. Não vi tudo e voltei no dia seguinte. No regresso passei à porta do Liceu D. João III. Lembrei-me que tinha um exame "pendente" e os livros na mala. Talvez já com o espírito da cidade, prometi ali mesmo, a mim mesmo, que em Setembro, ao abrigo da lei militar, iria fazer aquele exame e iria ficar aprovado. E assim foi. 

Sempre que vou a Coimbra, assim que deixo a autoestrada, mas principalmente depois de atravessar a ponte, sinto uma mudança de espírito. Isto, penso eu, é amor. Eu fiquei a amar Coimbra. Até hoje. 

Coimbra - Penedo da Saudade

Guiné Bissau.
Eu gostei da Guiné Bissau.
Nhacra, a D. Carlota e os seus bifes de macaco.
O "Branco" do Cumeré e o seu camarão, mais barato que os tremoços nas cervejarias de Lisboa.
Eu gostei de Aldeia Formosa (Quebo).
Tudo aquilo era novo.
A minha Escola, os meus alunos.
A assistência médica em Pate Embaló.
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Nota do editor

Último poste da série de 20 de Janeiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12611: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (5): Quartéis, Cidades e Vilas por onde passei: Coimbra, Leiria, Trafaria, Tomar, Chaves, Viana do Castelo e Porto (Luís Nascimento)

Guiné 63/74 - P12613: Parabéns a você (680): João Graça, nosso amigo Grã-Tabanqueiro, médico e músico nos Melech Mechaya

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Nota do editor

Último poste da série de 19 de Janeiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12602: Parabéns a você (679): José Crisóstomo Lucas, ex-Alf Mil Op Esp da CCAÇ 2617 (Guiné, 1969/71) e Manuel Mata, ex-1.º Cabo Apont AP do EREC 2640 (Guiné, 1969/71)

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Guiné 63/74 - P12612: Tabanca Grande (418): Carlos Alberto Rodrigues Cruz, ex-Fur Mil da CCAÇ 617/BCAÇ 619 (Catió e Cachil, 1964/66)

1. Mensagem do nosso camarada e novo tertuliano Carlos Alberto Rodrigues Cruz, ex-Fur Mil da CCAÇ 617/BCAÇ 619, Catió e Cachil, 1964/66, com data de 8 de Janeiro de 2014:

Caro Luís Graça,
Permita-me que nesta data particularmente relevante para mim pessoalmente, bem como para todo o pessoal que fez parte do BC 619, CC 616, CC 617 e CC 618, ou seja, a comemoração dos 50 anos da partida destas unidades para a Guiné (08.01.1964), lhe venha manifestar a minha vontade de fazer parte da denominada Tabanca Grande, pelo que envio as duas fotos da praxe bem como 3 fotos (a preto e branco como era habitual na altura) e que foram tiradas naquele frio janeiro do ano de 1964, no cais de Alcântara, onde embarcámos no velho navio "Quanza", rangendo por tudo quanto era chapa e que se fez ao mar para nos levar até aquelas paragens.

As fotos que junto a estas representam, pela ordem em que são apresentadas:

Foto da despedida oficial 

Os últimos acenos de despedida já a bordo 

O nascimento do pilar norte da ponte sobre o rio Tejo que estava emergindo das águas. 

N/M "Quanza" - Com a devida vénia a Navios Mercantes Portugueses

Mas agora passemos a factos:

- Quem sou eu?
Sou o ex-Furriel Miliciano Atirador de Infª (vulgo Caçador) Carlos Alberto Rodrigues Cruz, tenho 72 anos de idade feitos em 26 de Maio de 2013, sou casado há quase 47 anos, tenho dois filhos, um rapaz com 45 e uma filha com 43.

Como disse anteriormente era comandante de secção do 1.º Pelotão da Companhia de Caçadores 617 (companhia operacional) tendo estado, primeiramente, em Catió e nos últimos 4 a 5 meses de comissão na ilha de Como, por troca com a CC 728 (os Palmeirins de Catió) onde conheci o malogrado Alferes Mário Sasso (que vim a saber mais tarde ter sido morto no decorrer de uma operação.

Conheci e participei em imensas operações onde o famoso João Bacar Djaló era o comandante dos milícias fulas, homem por quem tinha e tenho grande admiração e posso garantir ter sido para nós uma verdadeira bênção pois sem a sua sábia orientação a minha companhia teria tido grandes complicações, pois como deve saber a mata do Cantanhez não é para brincadeiras e na altura para irmos de Catió para Cufar era um "Deus nos acuda".
Por isso todos os 10 de Junho não dispenso ir até à sua lápide rezar uma breve oração pelo seu descanso eterno.

Quero também dizer que sou amigo do já tabanqueiro João Gabriel Sacôto Martins Fernandes, ex-Alferes Miliciano da minha Companhia, que me tem incentivado a escrever para o Blogue e com quem quero partilhar um próximo convívio com os Tabanqueiros da Linha, tendo já solicitado ao José Manuel Matos Dinis a devida autorização para nos juntarmos no próximo 16 de Janeiro em Alcabideche.

Gostaria, pois, que me fosse permitido juntar-me ao pessoal da grande família da Tabanca Grande, independentemente de poder vir igualmente a fazer parte da Tabanca da Linha.

Quanto ao relato de uma pequena história no decorrer da minha comissão (como nos é sugerido) penso que terá que ficar adiada para mais tarde, porquanto tenho de rebobinar velhas lembranças que os meus quase 73 já não ajudam muito a concretizar e até porque esta mensagem já vai longa talvez pela nostalgia que nos assalta quando nos damos conta da passagem de 50 anos sobre as nossas vidas.

Camarada Luís, vou ficar-me por aqui agora visto o relambório já ir longo e não pretender monopolizar a sua atenção para o meu caso já que deve ter muitos mais afazeres.

Despeço-me, pois, com amizade e se tiver o prazer de o encontrar no convívio da Tabanca da Linha no próximo dia 16, ficarei encantado e poder-lhe-ei então dar um abraço do tamanho do Cumbidjã.


2. Comentário do editor:

Caro camarada e amigo Carlos Alberto Cruz, bem-vindo à tertúlia da Tabanca Grande, mãe das muitas Tabancas de ex-combatentes da Guiné que proliferam de norte a sul do país, exemplo da Tabanca da Linha, que referes.
Os fundadores destas Tabancas "pequenas" são tertulianos do Blogue Luís Graça e Camaradas da Guiné e não pretendem de modo nenhum concorrer, se o termo é aqui permitido, com a Tabanca Mãe.
O nosso Blogue, ou Tabanca Grande, tem como missão principal o registo de memórias escritas e fotográficas, fruto da contribuição da tertúlia, enquanto que as mais "Pequenas" visam essencialmente o são convívio entre camaradas da Guiné, a nível regional, havendo o caso emblemático da "Tabanca Pequena" de Matosinhos que se transformou em ONGD, visando ajudar o povo da Guiné-Bissau.
Temos um caso inverso, de uma ONG que se dedica também a ajudar a Guiné-Bissau, que se transformou numa Tabanca, a "Ajuda Amiga".

É saudável o convívio e a catarse que se pode fazer ao escrever memórias, trocar impressões, desfazer equívocos, recordar acontecimentos já esquecidos, etc.
A Tabanca Grande serve para tudo isto e ainda promove o Convívio Anual, onde se podem encontrar todos os ex-combatentes da Guiné de norte a sul de Portugal, independentemente de pertencerem ou não formalmente à tertúlia.

Caro Carlos, falta só realçar a particularidade de o nosso relacionamento ser o mais informal possível, começando pelo tratamento por tu, independentemente da idade, antigo (ou actual) posto militar, formação académica, etc. Somos camaradas de armas, passamos pelas mesmas dificuldades, calcorreamos aqueles chãos, umas vezes alagados outras secos como pólvora, deixámos o nosso suor, alguns até o sangue naquele pequeno pais que nos marcou para sempre.

Antes de terminar, deixo-te o tradicional abraço de boas-vindas em nome da tertúlia e dos editores.
Pessoalmente fico ao teu dispor para qualquer dúvida que te possa surgir.

O teu camarada e novo amigo
Carlos Vinhal
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Nota do editor

Último poste da série de 29 DE DEZEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12519: Tabanca Grande (417): Joaquim Luís Fernandes (ex-Alf Mil da CCAÇ 3461/BCAÇ 3863, Teixeira Pinto, 1973 e Depósito de Adidos, Brá, 1974) (2): Informações complementares

Guiné 63/74 - P12611: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (5): Quartéis, Cidades e Vilas por onde passei: Coimbra, Leiria, Trafaria, Tomar, Chaves, Viana do Castelo e Porto (Luís Nascimento)

1. Mensagem do nosso camarada Luís Nascimento, (ex-1º Cabo Op Cripto da CCAÇ 2533, Canjambari e Farim, 1969/71), através da sua neta Jéssica, com data de 17 de Janeiro de 2014:


Quartéis, Cidades e Vilas por onde passei durante a vida militar

VISEU - Assentei praça no RI 14
No primeiro dia entrei na porta de armas e passado meia hora saí pela porta do Cavalo, o Cabo de Dia (João dos Remédios), era meu amigo, mandou-me apresentar no outro dia pela manhã.

COIMBRA - Destacado durante a recruta para o RSS - Regimento de Serviços de Saúde, durante os campeonatos de atletismo da 2.ª Região Militar (à noite, estágio na Rua Direita).

LEIRIA - RAL 4 - Regimento de Artilharia Ligeira, para formação de escriturário, secretariado amanuense e Serviço Postal Militar (gato preto).

TRAFARIA - BRT - Batalhão de Reconhecimento das Transmissões, especialidade de Operador Cripto, fadista (com João Braga), com tirocínio no Arroz Doce, Gingão no Bairro Alto (onde fui de cana pela PM sob o comando do Furriel ou Aspirante(?) Encarnação, jogador de basquetebol do meu SCP.

TOMAR - RI 15 - Regimento de Infantaria 15 - Quartel dos Desenfianços, de uma vez estive 31 dias em casa, só me apresentei para receber o pré.

CHAVES - BC 10 - Batalhão de Caçadores 10 - Recebi a mensagem, em Tomar, para me apresentar lá, bebi uns copos com o pai do falecido Pavão do FCP.

VIANA DO CASTELO - BC 9 - Batalhão de Caçadores 9, o inferno no Forte da Barra, paredes-meias com os estaleiros, pior que o porão do Niassa.

PORTO - Quartel General - De dia formação de Criptologia à noite (DERBY), onde as meninas fumavam e tratavam os militares por “TU” (mais uma vez com acompanhamento da PM até ao QG, com o prémio de mais uma carecada.

De seguida CP até Alcântara-Mar onde me esperava o pasteleiro do Niassa.


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Nota do editor

Último poste da série de 19 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12604: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (4): Sexo, História, muita fruta das Caldas da Rainha, e dois poemas do clássico do erotismo chinês Jin Pin Mei (António Graça de Abreu)

Guiné 63/74 - P12610: Blogoterapia (247): Reacções intempestivas dos ex-combatentes face a situações provocadoras de stresse (Abel Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Abel Santos (ex-Soldado Atirador da CART 1742 - "Os Panteras" - Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69), com data de 16 de Janeiro de 2014:

Meus caros camaradas
O que vos conto é verídico, pois fui o protagonista.

Em pleno dia, na baixa da cidade do Porto, nos tempos idos do mês de Junho de 1969, encontrando-me em gozo de férias, ainda sobre a responsabilidade do exército português, um dia fui ao cinema Batalha, sito na Praça com o mesmo nome, onde passei um bom momento de diversão, que me ajudou a esquecer um pouco as recordações ainda recentes que assolavam o meu espírito.

Finda a sessão, descia eu a rua então chamada de Santo António, hoje de novo 31 de Janeiro, e muito bem, em homenagem aos heróis revoltosos de 1891 que protagonizaram a primeira tentativa de implantação da República, pois o povo do Porto esteve sempre e continua a estar contra os tiranos, passava eu em frente à Igreja dos Congregados, mesmo defronte à Estação dos Caminhos de Ferro de S. Bento, quando de repente, sem que tal no momento o justificasse, me jogo para o chão em posição de defesa como se estivesse no teatro de guerra. Isto foi reacção a um estrondo ensurdecedor, vindo do lado da estação ferroviária, que mais me pareceu uma morteirada ou um obus em pleno bombardeamento.

Passados uns segundos que pareceram eternos, reagi e fiquei estupefacto quando me vejo rodeado por pessoas que não conhecia, preocupadas com o que me tinha acontecido. Eu próprio não soube responder, e gostaria que alguém me explicasse o porquê desta minha reacção. Seria ainda o stress ou trauma da guerra?

Fachada da Igreja dos Congregados, à esquerda e Rua 31 de Janeiro em frente. À direita, na penumbra, parte da fachada lateral norte da Estação de S. Bento.
Foto: Blogue Álbum de Viagens, com a devida vénia.

O certo, é que depois desse episódio não mais me aconteceu nada de parecido, fiz uma vida normal até agora, mas esquecer esta situação é que nunca consegui.

Este episódio que se passou comigo faz-me pensar em camaradas que estarão sofrendo com tal doença, mas sem apoio de quem tem responsabilidades no sector da saúde, esquecendo-se que foram os combatentes que morrendo, sangrando e ficando mutilados, os catapultaram para o estrelato, e que agora olham com indiferença para esses bravos heróis, apenas preferindo falar das relações com África, pobres coitados.

Por agora é tudo, um bom 2014 para todos.
Abel Santos

P.S. - Quero deixar vincado que nada me move contra África.
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Nota do editor

Último poste da série de 16 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12590: Blogoterapia (246): A Op Lança Afiada ou a Impotência da Escrita (Torcato Mendonça, ex-al mil art, CART 2339, Mansambo, 1968/69)

Guiné 63/74 - P12609: Notas de leitura (554): "Mudança Sócio-Cultural na Guiné Portuguesa", dissertação de licenciatura de José Manuel Braga Dias (3) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 16 de Agosto de 2013:

Queridos amigos,
Após a investigação marcadamente inovadora que José Manuel Braga Dias faz na sua tese de dissertação de licenciatura às atitudes e comportamentos dos guineenses perante o fenómeno da subversão e da luta armada, mostra-se igualmente importante o registo que faz aos Congressos do Povo da Guiné, à emergência da nova força militar africana, bem como a caraterização que faz à sociedade guineense tanto em meio urbano como rural.
O autor terá gozado de um acesso privilegiado a meios de informação, respigou comunicações de grande utilidade nas entrevistas, e também por meio de consultas de personalidades sobretudo no campo da administração civil, que lhe permitiram registar impressões e dados que não se encontram noutros documentos da época. Parece, aliás, surpreendente que este trabalho sobre a mudança sociocultural na Guiné Portuguesa não tenha sido objeto de qualquer referência na historiografia mais competente.
Mistérios!

Um abraço do
Mário


Mudança sociocultural na Guiné Portuguesa (3)

Beja Santos

Trata-se de uma tese de licenciatura apresentada no ISCPU com o título “Mudança Sociocultural na Guiné Portuguesa”, e o seu autor é José Manuel Braga Dias. Em jeito de síntese, procurou-se destacar o que o autor escreveu sobre a estrutura sociocultural da Guiné anterior à eclosão do terrorismo e, aspeto verdadeiramente inovador, o que ele escreve sobre as atitudes e comportamentos das etnias guineenses diante da subversão. Oferece-nos um quadro riquíssimo de dados que permitem, inequivocamente, perceber adesões a um lado e a outro, como o PAIGC se aproveitou de tensões étnicas, como os chefes políticos vencidos se refugiaram no PAIGC, como se cometeram erros de palmatória em nomeações pela administração portuguesa, disseca região por região, e, por exemplo, fica-se a perceber o que se passou no regulado do Forreá em que os chefes políticos se refugiram na República da Guiné e não tivessem sido os dignatários religiosos e islâmicos a tomar uma posição de resistência à subversão, a presença portuguesa ficaria ainda mais comprometida do que ficou depois dos acontecimentos de 1963.
No regulado de Fulacunda, a posição dos chefes políticos tradicionais, de uma maneira geral, foi de aceitação e colaboração com o PAIGC. Tratava-se de um território de grandes tensões étnicas, os chefes tradicionais dividiram-se, o PAIGC soube captar a adesão dos chefes tradicionais que viram no movimento subversivo um meio de reconquistar o seu anterior prestígio perdido frente aos Fulas. Analisando o concelho de Catió, fica-se a perceber o que se passou nos regulados de Cantanhez, de Guileje e Cabedu; em Cacine, escreve o autor, a população viu no movimento subversivo um meio de consumar vinganças na população Fula, e em Gadamael as tensões étnicas existentes entre Fulas e Beafadas constituíram fatores de adesão de alguns elementos da população ao movimento subversivo.

Mas a dissertação de licenciatura de Braga Dias não é só muito importante no trabalho de entrevistas e seguramente de documentação restrita a que ele teve acesso junto do Comando-Chefe, quanto às atitudes e comportamentos da população face à subversão. Ele procede a uma análise detalhada aos reordenamentos, aos congressos do povo da Guiné e ao nascimento da classe militar autóctone (comandos, caçadores africanos e fuzileiros). Spínola apostara nos reordenamentos como uma resposta lapidar à subversão, os reordenamentos acabariam com a insegurança entre as populações e criariam um novo estilo de vida já distante da sociedade tradicional de onde a generalidade das populações provinha. É também minucioso, explica ao pormenor os três tipos de casa dos novos aldeamentos e a lógica subjacente, procede a um levantamento das queixas dos povos que se sentiram lesados por viver em reordenamentos. Acresce que a habitação difere de etnia para etnia, há diferenças no tipo de povoamento, a casa dos povos do litoral apareciam em povoamento disperso, aqui de um modo geral, o reordenamento não suscitou problemas. Porém as pequenas povoações dispersas ao longo dos campos de cultura viram no reordenamento uma perda de acessibilidade às bolanhas e uma desintegração da estrutura social e cultural onde viviam.
O autor faz um levantamento de todas estas dificuldades, etnia por etnia, povos do litoral dos povos do interior e elenca os cuidados que devem ser ponderados antes da aprovação de um reordenamento, não esquecendo o regime jurídico tradicional da propriedade imobiliária e dá exemplos concretos. Lembra também que as casas dos reordenamentos tinham sido inicialmente concebidas em função da família nuclear do tipo europeu e não dirigida à família extensa africana. Descreve minuciosamente o reordenamento em si, o celeiro, a escola, o posto sanitário, o bebedouro e o fontenário e expende considerações sobre os reordenamentos como centros difusores da cultura portuguesa. E cintando Spínola, conclui: “As populações reagem diferentemente às exigências do reordenamento, consoante o grau de apego que têm ao chão onde nasceram e outros fatores variáveis de natureza local”.

Os Congressos do Povo da Guiné foram a nova resposta encontrada por Spínola para a luta contra a subversão desencadeada pelo PAIGC. Os congressos eram a exibição pública de uma nova política governamental alicerçada nas elites tradicionais e definida em cinco grandes princípios – “justiça social, respeito pelas instituições, fomento económico e social, participação na administração pública e segurança interna”. O número total dos congressistas aproximava-se dos 500, eram “cimeiras” de assembleias separadas consoante o grau de afinidade étnica e cultural. Sobretudo o segundo congresso obrigou o PAIGC a mudar de agulha, não era fácil encontrar resposta para este tipo de assembleias onde estavam presentes sobretudo representantes das populações integradas nas culturas tradicionais. O governo prometia basear toda a sua política social e económica nas elites tradicionais, as promessas seriam testadas no congresso seguinte. É no contexto destes congressos que Spínola se compromete a fazer a “africanização dos quadros”. Em substância, a organização destes congressos saldaram-se no renascimento do sentimento étnico, a revitalização de estruturas tradicionais, emergiram mesmo movimentos políticos como a Liga Popular dos Guinéus e o Bloco dos Fulas Nativos, a liga era um movimento racista que pretendia a execução imediata da “africanização dos quadros” e o bloco englobava os Fulas-Pretos e que tinha como objetivo afastar dos postos de chefia os Futa-Fulas e os Fulas-Forros.

A força militar africana apresentava-se como relevante na constituição da nova sociedade guineense. Os militares auferiam vencimentos não despiciendos, gozavam de prestígio, estruturava-se em moldes militares importados de Portugal europeu. Este conceito de força africana abrangia militares das tropas regulares, militares enquadrados na guarnição normal da província, milícias e elementos da população em autodefesa. Recorde-se que a africanização começara logo nos primeiros anos da luta armada, com a constituição de milícias, a preparação de populações em autodefesa e a criação de pelotões de caçadores nativos. Depois surgiram as companhias de caçadores nativos que traziam uma ideia nova, o critério étnico, as companhias localizavam-se no seu “chão”. As companhias de comandos africanas não tinham critério étnico mas o de bravura ou valentia comprovada. A força africana trazia orgulho: a farda passava a ser um sinal de promoção social entre a juventude, os desfiles militares eram sedutores para a juventude, havia depois o acesso ao ensino, saúde e assistência, benefícios que nunca são de enjeitar, e depois este serviço militar aparecia também como atividade profissional contra o desemprego. O autor previa que a chamada “africanização dos quadros militares da Guiné” tenderia à substituição normal e gradual de uma cultura dita autóctone por uma cultura portuguesa.

Caminhando para o seu termo, a dissertação de licenciatura de José Manuel Braga Dias aborda ainda a situação atual (ao tempo) da nova sociedade guineense, analisa o prestígio da elite tradicional islamizada, os centros urbanos como meio de acesso à sociedade moderna e os choques decorrentes entre o tradicional e a aculturação proporcionada pelo meio urbano onde são dominantes as forças modernas, refere ainda o imperativo de se encontrar uma forma de urbanização que acolha, com condições decentes de vida, a chegada do fluxo migratório sobretudo dos fugitivos da guerra.

Entre os muitos dados curiosos da tese, Braga Dias observa o seguinte: “Os indivíduos de origem cabo-verdiana apercebem-se que os lugares que até então era quase da sua exclusividade, começam a ser invadidos por guineenses, reagem procurando um isolamento perante os outros indivíduos de origem europeia ou guineense. Hoje, os cabo-verdianos residentes em Bissau tornaram-se uma comunidade fechada só admitindo relações com outros indivíduos de origem étnica diferente quando os unem estreitos laços familiares”.

O autor considera que o seu trabalho irá permitir uma melhor compreensão das mudanças sociais operadas na sociedade guineense, depois da subversão e da luta armada e da reação do governador Spínola após as medidas que envolveram reordenamentos, Congressos do Povo da Guiné, a constituição da Nova Força Africana e o clima de desenvolvimento económico a despeito dos focos de luta armada.

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Nota do editor

Último poste da série de 17 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12592: Notas de leitura (553): "Mudança Sócio-Cultural na Guiné Portuguesa", dissertação de licenciatura de José Manuel Braga Dias (2) (Mário Beja Santos)

domingo, 19 de janeiro de 2014

Guiné 63/74 - P12608: Locais e povoações onde gastámos dois anos das nossas curtas mas valiosas vidas - CCAÇ 675 (Belmiro Tavares)

1. Mensagem do nosso camarada Belmiro Tavares (ex-Alf Mil, CCAÇ 675, Quinhamel, Binta e Farim, 1964/66), com data de 15 de Março de 2013:

Caro Luís Graça:
Atendendo à tua solicitação para aumentar a lista de povoações da Guiné onde gastámos – bem ou mal – dois anos das nossas curtas mas valiosas vidas, envio o meu singelo contributo.

Quanto à longevidade, não tenho que me lamentar, pois tenho um acordo celebrado de boa fé com o S. Pedro, segundo o qual viverei, de boa saúde, até aos 120 anos, porque me foi confiada uma missão importantíssima – colocação de lápides nas sepulturas dos ex-combatentes da Gloriosa CCaç 675. 

Duas povoações da minha zona já constam da lista:
Binta, sede da companhia e Guidage que foi o alvo apetecido no aproximar do fim da Guerra.

Cito outros nomes da minha zona e de terrenos limítrofes:
- Uália
- Sambuiá
- Sambuiadim
- Malibolon
- Udasse
- Santancoto – aqui foi ferido o então Cap. Tomé Pinto
- Banhima *
- Mansália
- Fajonquito
- Quenhato
- Buborim – limite oeste da nossa zona
- Sansancutoto – aqui deixámos um cunhete de munições armadilhado; levaram-no mas nunca soubemos o que aconteceu
- S. João – nossa primeira operação com tiros
- Genicou Mandinga** – a dois passos daqui reconstruímos uma ponte onde deixámos uma placa informativa: “atenção – há armadilhas” – funcionou em pleno
- Genicon Mancanho **
- Lenquetó – o batismo de fogo da CCaç 675
- Massacundá**
- Caurbá
- Faer
- Temanto
- Dungal
- Ufudé
- Fodé Siraia
- Sanjalo
- Tambandinto
- Tambato
- Cansenha – aqui morreu o nosso guia Pathé Balde
- Caurdim
- Canicó
- Fátima
- Tancroal
- Olossato
- Safim
- Cuntima (colina do norte)
- Cajambari
- Barro

 * - já desactivadas quando lá chegámos
** - destruídas pelo PAIGC nas brigas intestinas

Nota: - As povoações que eles não destruíram, nós riscámo-las do mapa; em contrapartida, reconstruímos a Grande Binta – Vila Capitão de Binta – e repovoámo-la com as pessoas que se haviam refugiado no Senegal e que regressaram quando se aperceberam que nós dominávamos a situação; também (re)construímos Guidage.

Aquele abraço
BT

Guiné 63/74 - P12607: In Memoriam (176): Maria Manuela Pinheiro (1950-2014), natural de Torres Novas... Um abraço fraterno e solidário para o Carlos Pinheiro, com quem a Maria Manuela era casada desde 1974... O casal esteve presente nos nossos três últimos encontros nacionais, em Monte Real


Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real > 8 de junho de 2013 > VIII Encontro Nacional da Tabanca Grande > Almoço de convívio > O Carlos Pinheiro e a Maria Manuela, que vierasm, pela 3ª vez, em Torres Novas... Infelizmente foi a úlltima para a Maria Manuela que nos deixou a 15/1/2014, à beira de completar os 64 anos. Nasceu, em Torres Novas, em 3/3/1950.

Foto (e legenda): © Luís Graça (2013). Todos os direitos reservados.

1. Mensagem enviada ao Carlos Pinherio em nome de todos nós:

Querido amigo e camarada Carlos Pinheiro

Recebi ontem à noite, por mail do António Duarte, a triste notícia da morte, súbita, da tua esposa, Maria Manuela... É sobretudo um duro golpe para ti e para a tua família e para os teus/vossos amigos. Tens, desde já, o abraço fraterno e solidário dos editores, colaboradores e demais membros da Tabanca Grande. Todos os abraços são precisos, nesta hora, para mitigar a tua dor e ajudar-te a fazer o luto. Todos ficamos pobres e pesarosos pela perda da companheira de um camarada nosso. 

Discreta mas presente, a tua esposa acompanhou-te nos 3 últimos encontros da Tabanca Grande, em Monte Real, desde 2011 (VI Encontro Nacional). Foi a tua estreia, a vossa estreia.  Isso dá-lhe doravante o direito de ser recordada daqui para a frente, no nosso memorial. O nosso blogue é para os bons e para os maus momentos.  É umn blogue de partilha de memórias  e de afetos. É um blogue solidário. E por isso fazemos questão de, à semelhança da mensagem na página do Facebook da Tabanca Grande, dizer aqui no nosso blogue que sentimos a perda da tua companheira como uma perda pessoal. Porque as companheiras dos nossos camaradas nossas companheiras são!

Carlos, vamos guardar a memória da tua companheira, que passa a ser também membro desta comunidade virtual que a guerra da Guiné veio reunir. Ela vem juntar-se à Teresa Reis, que a morte também levou, subitamente, em 2011. 

Maria Manuela Pinheiro (1950-2014), até sempre!

Luís Graça, em nome da Tabanca Grande.

 2. Resposta do Carlos Pinheiro à emnsagem de condolências que lhe enviámos em nome pessoal, e de toda a Tabanca Grande:

Camarigos Luis Graça e Carlos Vinhal

Agradeço-vos as vossas palavras amigas. Como devem calcular estou completamente desorientado a ver se consigo reaprender a viver, mas isso irá demorar tempo. Foram quase 40 anos de vida em comum - tinhamos casado em 28 de Abril de 1974.

 Nos últimos anos, depois de nos reformarmos, éramos a bengala um do outro. Mas a vida prega-nos estas partidas para as quais nunca estamos preparados e neste caso pior ainda pela forma como tudo se desenrolou.

A Maria Manuela tinha nascido em Torres Novas no dia 3 de Março de 1950 e faleceu também em Torres Novas,  no dia 15 de Janeiro de 2014.

Faltam-me as palavras mas quero agradecer-vos sinceramente a vossa ajuda e o vosso apoio.

Obrigado.

Um grande abraço.

Carlos Pinheiro

[ex-1.º Cabo TRMS Op MSG, Centro de Mensagens do STM/QG/CTIG, Bissau, 1968/70]
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Nota do editor:

Último poste da série > 26 de dezembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12507: In Memoriam (175): António Carlos de Oliveira Machado, o Machadinho, 1º cabo especialista MARME da FAP, falecido em 12/7/1969, em Bafatá, na queda do helicanhão de que era apontador... Homenagem de Viseu, sua terra natal (Luís Nascimento)

Guiné 63/74 - P12606: Pedaços de um tempo (António Eduardo Ferreira, ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CART 3493) (7): Estórias de Mansambo onde a guerra foi outra

1. Em mensagem do dia 16 de Janeiro de 2014, o nosso camarada António Eduardo Ferreira (ex-1.º Cabo Condutor Auto da CART 3493/BART 3873, Mansambo, Fá Mandinga e Bissau, 1972/74), enviou-nos mais um Pedaço de um tempo.


PEDAÇOS DE UM TEMPO

7 - Estórias de Mansambo onde a guerra foi outra…


Esta era a parte de trás de um abrigo onde se pode ver umas pequenas aberturas que serviam para poder utilizar as armas em direção ao arame farpado que circundava o aquartelamento. Cerca de treze meses foi a minha residência, não era nada mau, mas isso deve-se aos primeiros camaradas que ali foram colocados, onde apenas existia mata, que muito tiveram de trabalhar para os construir. A única coisa boa que por ali havia era uma fonte, que viria a abastecer o aquartelamento, ainda que, para a ir buscar a água apesar de ficar a cerca de duzentos metros do arame, todos os dias esse trajeto era picado e a segurança feita por seis ou sete militares que ali se mantinham enquanto o Unimog 411 “o burrinho” ia fazendo várias viagens, abastecendo os chuveiros e os abrigos. Para além do condutor, que era sempre o mesmo, andava mais um camarada para ajudar na carga e descarga, que era feita com uma terrina da sopa.

O primeiro serviço que fiz em Mansambo foi segurança à fonte, no dia em que os velhinhos nos deixaram. Talvez o dia mais triste do meu tempo de Guiné. Outros mais dramáticos aconteceram, mas a maturidade já era outra…

Parte deste abrigo servia de alojamento à maioria dos condutores que lá estávamos, ali era a residência de sete, na hora das refeições juntava-se a nós o Ladeira, que tinha a especialidade de clarim ou corneteiro… mas tal especialidade não era necessária na nossa companhia. Os homens da corneta passaram a ser padeiros.

Como diz o povo, para aprendermos temos de passar por elas… Certo dia o jantar era bacalhau à Gomes de Sá, o bacalhau até era muito, mas as espinhas eram mais volumosas que a parte comestível -, comestível não é bem assim, porque para alguns humanos as espinhas também são comestíveis. Quando estávamos a começar a jantar o Ladeira lembrou-se de dizer:
- Se me pagarem uma cerveja, como as espinhas todas.

Eu achava que isso seria impossível, disse:
- Eu pago, tens é de comer tudo que está no prato.

O condutor Abílio “já falecido” disse também:
- Eu pago outra.

O amigo Ladeira demorou um pouquinho mais tempo que nós a comer, ao mesmo tempo que ia bebendo umas cervejas, mas o prato ficou completamente limpo.

Depois ainda disse:
- Se pagarem outra, como mais uma dose.

Claro que a resposta aí foi: agora se quiseres comer mais, terás de pagar tu a cerveja.

Foi uma boa lição, quando era mais novo e ouvia alguém dizer que apostava que era capaz de comer ou beber quantidades aparentemente impossíveis, lembrava-me logo do Ladeira… No que toca a comer ou beber, para algumas pessoas, quase tudo é possível.

A última vez que o vi foi no almoço da nossa companhia, a “CART 3493” há cerca de três anos, estava ótimo. Espero que assim continue. Para ele um abraço.

António Eduardo Ferreira
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Nota do editor

Último poste da série de 11 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12572: Pedaços de um tempo (António Eduardo Ferreira) (6): Cuidado com as aparências

Guiné 63/74 - P12605: Fragmentos de Memórias (Veríssimo Ferreira) (10): Fevereiro de 1967 - Aproveitamento dos tempos livres de Bissau

1. Em mensagem do dia 16 de Janeiro de 2014, o nosso camarada Veríssimo Ferreira (ex-Fur Mil, CCAÇ 1422 / BCAÇ 1858, Farim, Mansabá, K3, 1965/67) enviou-nos mais um episódio da sua série Fragmentos de Memórias.


FRAGMENTOS DE MEMÓRIAS

10 - APROVEITAMENTO DOS TEMPOS LIVRES DE BISSAU

FEVº DE 1967

Em Bissau, no poilão, conheci alguém que se dizia, irmã do Amílcar mas nunca me interessou saber se o era mesmo, só gostava de a ouvir dizer, que e tal como eu, nem o podia ver.

Ouvi a voz da Rádio Argel ou Portugal livre, sei lá... e não gostei, bem como a Rádio Moscovo e ena pá... era um fartote de dizer mal de nós, dos nossos governantes, tal como hoje alguns fazemos, dos actuais. Por isso e não valendo a pena estar desinformado, mudava de canal que já nessa época era possível zappingar manualmente a rádio.

Dediquei-me à nossa, das Forças Armadas e como o Durão houvera sido também do meu pelotão, sempre ia transmitindo umas musiquinhas a meu pedido.

Tendo tempos livres aproveitei para "tirar" as cartas de condução militares. Já fora chofer de tudo o que havia com volante, desde jeep's, Unimogs, GMC's, Daimler's, mas aqui na cidade convinha ter um papel assinado, qu'os gajos da polícia, limpos e perfumados, eram beras com'ó caraças e pouco inteligentes, porque se atreviam a ser não só provocadores, mas também abusadores dos poderes que lhes atribuíam e não poucas vezes assisti a situações que poderiam ter vindo a originar verdadeiras cenas violentas.

Eram a Polícia... bonitos e bem fardados... de lenço ao pescoço e tudo, e até conheciam o local, onde estavam aquartelados, comendo do bom e do melhor. Piores que cuspideiras, que destas sempre podíamos fugir, quando derrubávamos os cibes e as víamos, quase posso afirmar que perderiam a fanfarronice se tivessem de combater na mata.

Só se não metiam com os fuzileiros que a experiência sempre deu mau resultado.
Era lindo de se ver como fugiam a sete pés quando os bispavam.

Bissau, começava a ter muitas mulheres Portuguesas, esposas dos ilustres. Inicialmente olhadas como se d'outro Mundo fossem, agora misturavam-se com a pasmaceira citadina e andavam livremente, não sem um ou outro dixote mais atrevido.

Criei uma equipa de futebol na 1.ª Rep, onde fui treinador, jogador em qualquer lugar (sim porque o que eu queria era manter-me activo), os jogos eram marcados para as manhãs de Domingo e deviam terminar na confraternização almoçaral... e assim se ia passando o tempo.

Se repararem na foto, notarão que o dono da bola, sou eu.


De pé, a partir da esquerda: Veríssimo Ferreira, Aurélio, Mila Filipe, Brilhante, Pimenta, Silva e Nunes. Em baixo, a partir da esquerda: Silvestre, Paiva, V. Carvalho, Pinto e Sizenando


Não haviam chuvas agora e as tardes descambavam em passeios à piscina de Nhacra ou até em alegres petisqueiras de camarões em Quinhamel. O tiroteio ouvia-se cada vez mais estrondoso e perto.
Tudo caminhava bem para mim, mas roía-me continuadamente o meu próprio caminho feliz. Bastas vezes me apeteceu desistir e dizer com'ó meu pai: Vão pró Vatícano pázinhos (leia-se vatí, ou seja com acento no "i").

Mais tarde tive de lhe perguntar porque não Vaticano. Respondeu-me e percebi então que usava vatí pela mesma razão que carregava no primeiro "á" daquela palavra tão linda que define o órgão sexual masculino (?) e cujo nome não sei dizer nem ficava bem numa crónica deste estilo galhofoso, educativo e quiçá... quiçá... embora fosse palavra bem corrente na nossa linguagem.

Enquanto briosos militares qu'éramos, vulgar era o "vai pró... (isso). Era um intelectual o meu pai, creiam, aliás como sempre o foi e ainda hoje é recordado aqui perto, em Belas, onde como carteiro, cumpria a sua missão na tasca ali ao lado do rio na Rua Victor Córdon, onde fazia a distribuição, mas com regras que ele próprio estabeleceu, ou seja: quem queria saber se tinha correio, teria de pagar primeiro um copo de "três".

GANDA PAI, que pena tenho de não ser como tu foste.

Foram-me dadas hipóteses de conhecer gentes bem importantes, civis, e foram-se fomentando algumas boas relações entre quem ainda pensava Português, tanto que ainda hoje, quase 48 anos passados, embora poucos, somos amigos e contactamos.

Apreciávamos boa música, boas comidas, boas bebidas e as nossas conversas, foram-me dando conhecimentos que nunca poderia usufruir doutra forma.

Também começava a ser mensalmente possível ter contactos, com moças "verdianas" que ali vinham passar oito dias, em viagens de barcos comerciais que passavam por Cabo-Verde.

Musicalmente surgiu uma melodia que me obrigou até a comprar um "vira discos" e o próprio disco da "Aline," coisa bem linda cantada por um tal de Cristophe e eu que já julgava ter perdido a capacidade de sonhar, voltei a fazê-lo durante os momentos d'ócio.


Também o "Il Mondo" de Jimmy Fontana foi outro dos meus favoritos.


Depois veio o Gianni Morandi com o seu "Nom son degno di te" e lá se me agudizou o romantismo latente então.


Os versos mais pareciam terem sido escritos por mim e como que prestasse uma homenagem de despedida da Guiné, que fora minha nestes últimos 20 meses. Aquele verso "Num monte de pedras, pode nascer uma flor", que ainda hoje preservo ficou como um marco histórico e mais nenhum poeta me emocionou tanto ou escreveu, o que considero um grito de esperança.

COISAS, enfim, duma pobre mente, então e hoje ainda depauperada.

(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 12 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12577: Fragmentos de Memórias (Veríssimo Ferreira) (9): Novembro de 1966 - Qual guerra?

Guiné 63/74 - P12604: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (4): Sexo, História, muita fruta das Caldas da Rainha, e dois poemas do clássico do erotismo chinês Jin Pin Mei (António Graça de Abreu)

Sexo, História, muita fruta nas Caldas da Rainha, ou na Guiné 

por António Graça de Abreu [, foto atual à esquerda, com a esposa, a dra. Hai Yan, de quem tem dois filhos]Isto de ir parar às Caldas, terra de gente dura e tesa, tem toneladas de histórias para contar. 

Da minha parte, apenas dois apontamentos.

1. Os meus pais eram de Lisboa, a família lisboeta era, mas nasci e cresci (até aos 18 anos) no meu querido Porto, terra, amigos e cidade. Mas sou sportinguista, gosto do meu Sporting, de todo o Portugal, bem mais enriquecedor e bonito do que portos, benficas, mais uns tantos clubes regionais. Verde só há um, o da Natureza recatada e exuberante, e o das camisolas das gentes de Alvalade.

Os meus pais, bons portugueses, nos anos cinquenta e sessenta do século passado, vinham frequentemente a Lisboa, no nosso Renault Joaninha, depois num Austin A 35. E costumávamos parar nas Caldas, para atestar o carro com fruta e legumes de excepcional qualidade, comprados no Mercado da Fruta, ali na praça no centro das Caldas.

Nunca mais esqueci.

2. Há uma dúzia de anos atrás, fui convidado pela Associação Portuguesa dos Professores de História para, no seu Congresso Anual, realizado nas Caldas da Rainha, no Museu José Malhoa,  dizer umas palavras sobre a China Antiga, a propósito da inauguração de uma exposição de peças, vasos, recipientes, cálices em bronze, disponibilizada pela Embaixada da República Popular da China em Portugal. Eram tudo cópias recentes de elaboradas peças a apontar para um passado de 25 séculos. Lá fiz a palestra, o meu trabalho possível de divulgação entre os professores de História da maravilha dos antiquíssimos bronzes chineses. 


Museu José Malhoa [, foto da fachada principal, à esquerda, imagem do domínio público, cortesia da Wikipédia] 


Na inauguração da exposição, esteve presente o Embaixador da República Popular da

China em Portugal. Para chegar aos bronzes, atravessava-se parte de entrada do museu onde sobressaía num grande e excelente quadro do pintor Eduardo Malta, uma jovem impecavelmente despida, nua e doce mostrando todos os atributos que fazem do encantatório feminino o lado mais perfeito da espécie humana. Um corpo de jade e alabastro, um convite a todas as loucuras, reverências e silêncios.

O problema dos camaradas da Embaixada da China era o embaixador. Não podia chegar ao Museu das Caldas e dar de caras com a nudez asfixiante, esfusiante, entusiasmante da mulher no quadro do Eduardo Malta. Queriam que ele entrasse por outra porta e passasse ao lado, queriam que ele não lobrigasse a menina nua. 

Mas o senhor Embaixador da China avançou exactamente por onde devia e, pelo canto do olho, demorou-se quanto pôde, na contemplação do corpo perfeito da donzela lusitana.

A propósito de sexo nas Caldas, ou na China, das coisas do homem e da mulher, não resisto a transcrever dois poemas chineses, na minha tradução da金瓶梅Jin Pin Mei, a obra clássica do erotismo chinês, atribuída com muitas dúvidas a Wang Shizhen (1526-1590). Aí vai. Depois digam-me se isto tem ou não ver com as coisas das Caldas e com as coisas de todo o Portugal ou toda a Guiné, ou seja, com as coisas de todo o nosso vasto mundo:

A coisa, com seis polegadas

Há uma coisa, com cerca de seis polegadas,
às vezes mole, às vezes dura.
Quando mole, cai para leste ou oeste,
como um bêbado,
quando dura, viaja para cima e para baixo, 
como um monge enlouquecido.
Tem talento para esgravatar qualquer buraco,
habita sob a região do umbigo,
no reino das Virilhas Fumegantes,
por natureza, faz companhia a dois filhos.
Sim, quantas vezes, a felicidade na luta
com uma mulher formosa?

A coisa, como uma flor de lótus

Quente, firme, perfumada e húmida,
suave misteriosa e sensível,
tem lábios como flores de lótus.
Se feliz, mostra a língua,
abre a boca para sorrir.
Se cansada, adormece,
abandona-se ao desejo do homem.
Habita num antigo jardim,
numa encosta com erva,
no reino do Grande Regaço.
Quando encontra um macho possante
está pronta para a luta,
mas não diz uma palavra.

[Fonte: Jin Pin Mei. Tradução de António Graça de Abreu. Ilustração, acima:  edição chinesa de 1617, imagem do domínio público, cortesia de Wikipedia.]
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Nota do editor:

Último poste da série > 18 de janeiro de  2014 > Guiné 63/74 - P12599: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (3): Tavira, uma terra com história... (António Manuel Conceição Santos, ex-fur mil op esp, CCAÇ 4540, Bigene, Cadique, Nhacra, 1972/74)

63/74 - P12603: Caderno de notas de um mais velho (Antº Rosinha) (30): Só os diamantes são eternos... Ou: hoje ainda se esconde se são os "restos mortais" do Império ou do Eusébio que se votaram no parlamento, para o Panteão.

1. Mensagem de António Rosinha


Data: 11 de Janeiro de 2014 às 15:37

Assunto:  Diamang, Cmdt Vilhena, Cunha Leal - tanta coisa que não sabemos (*)


Amigo José M. Diniz (e penso que me estou a dirigir a C. Martins também),  eu andei na Lunda na tropa e a fazer uma estrada na região de Henrique de Carvalho.

E para a Diamang estive em Cafunfo (1970) a fazer uma picada entre uma futuro lavandaria e um rio que foi desviado para exploração.

Estive perto de um mês a conviver com algarvios exclusivamente, no refeitório dos solteiros, que trabalhavam numa lavandaria no Cafunfo.

Era um mundo à parte dentro de Angola e da própria Lunda.

Não havia minhotos, beirões, transmontanos nem das Ilhas, e o meu contacto profissional era com um homem chamado Bastos, alentejano, de Elvas (?) e conheci e trabalhei recentemente com um neto desse homem (há 10 anos, antes de me reformar).

Diniz, afinal também estavas informado e encostado,  meu malandro. Será que havia segregação nos seleccionados para funcionários da Diamang?

Mas só quero dizer aos dois amigos que,  antes da guerra em 1961, havia os portugueses brancos e mulatos em Angola,  da geração de Cunha Leal e Amílcar Cabral, que pensavam exactamente como já vos ouvi aos dois e a muita gente, que Salazar devia ter "aberto".

As palavras, "abertura", "autonomia", "independência" e no caso moçambicano falavam mesmo à maneira da África do Sul, os brancos no poder, eram conversas que putos leigos como eu, 18 anos em 1957 ouvia constantemente.

Então,  em 1959,  no curso de sargentos milicianos, a maioria eram brancos de 2ª,  como eles diziam,  e mulatos, massacravam a malta que tínhamos ido daqui, de facto muito desconhecedores do que se passava em política, ao contrário daqueles gajos que já tinham a escola toda, anti-colonial, anti-salazarista, anti-imperialista etc., e todos da Mocidade Portuguesa com todas as mordomias e luxos.

Só que, "abrir" achavam bonito, mas muitos deles já hesitavam, nessas ideias, porque havia no Quénia terrorismo e massacres,  embora a Inglaterra tivesse muita força, na África do Sul os boers era à cacetada forte e feia que se seguravam, e no Congo culminou com o desastre que se prolonga até hoje, quando em 1960 se dá a independência do Congo Belga, Ruanda e Burundi.

Sem falar que,  no caso de Moçambique, os boers da África do Sul e Ian Shmith precisavam e tinham essa intenção que aquelas praias e aqueles portos faziam-lhe muita falta.

E no caso de Angola, esses mesmos boers que detinham o ex-Sudoeste Alemão, Namíbia, precisavam das águas do Cunene, do rio Cuando e Cubango para regar aquele deserto.

E no caso da Índia, de Timor e de Guiné, sabemos o que se passava nos cornos do Sekou Touré, do Neru e dos Suhartos ou Sukarnos,  nem sei bem.

Ninguem tinha, nem tem, a mínima consideração por nós, e,  como diz,  o outro "cuidemos dos nossos cuzes".

E não devemos mentir nem esconder as realidades e Salazar sabia do que todos os nossos "amigos" pensavam, até o sacana do Franco nos atraiçoava e na ONU abstinha-se.

Numa altura destas em que passa na Televisão os 90 minutos do Portugal-Coreia na Inglaterra com uma selecção luso-africana, e não se diz que naquele ano, mensalmente na ONU,  Portugal era desmentido, na pessoa do nosso ministro dos negócios estrangeiros, que "Eusébio" não era português, antes pelo contrário era um explorado, escravizado e colonizado.

Foi em 1966 que Chipenda da Académica iniciou a frente Leste em Angola pelo MPLA.

Meus amigos, quando se fala que Salazar podia ter evitado a guerra se abrisse.. Se o fizesse, não existia nada, Guiné e Cabinda não eram PALOP, eram PALOF, um exemplo.

E,  mesmo hoje, só com asinhas é que podemos fiar-nos nos outros que é o que está a acontecer, neste momento com uma irresponsabilidade pueril e infantil de nós todos.

Nós somos mentirosos para nós mesmos ao esconder no jogo Portugal-Coreia que Franco Nogueira lutava contra o mundo inteiro nas Nações Unidas a afirmar que "Eusébio" era português.

E hoje ainda se esconde se são os "restos mortais" do Império ou do Eusébio que se votaram no parlamento, para o Panteão.

Essa portugalidade que existiu é que está a ser imortalizada no nosso muito profundo subconsciente com este fervor futebolistico, só que temos vergonha de o gritar.

Desculpem o jeito, Mas os diamantes ainda continuam lá.

Cumprimentos

Antº Rosinha (**)

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Notas do editor:


Guiné 63/74 - P12602: Parabéns a você (679): José Crisóstomo Lucas, ex-Alf Mil Op Esp da CCAÇ 2617 (Guiné, 1969/71) e Manuel Mata, ex-1.º Cabo Apont AP do EREC 2640 (Guiné, 1969/71)

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Nota do editor

Último poste da série de 18 de Janeiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12596: Parabéns a você (678): Luís Rainha, ex-Alf Mil, CMDT do Grupo Centuriões (Guiné, 1964/66)