quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Guiné 63/74 - P12085: "Memórias da Guiné", por Fernando Valente (Magro) (10): Actividades não oficiais

1. Continuação das "Memórias da Guiné" do nosso camarada Fernando Valente (Magro) (ex-Cap Mil Art.ª do BENG 447, Bissau, 1970/72), que foram publicadas em livro de sua autoria com o mesmo título, Edições Polvo, 2005:


MEMÓRIAS DA GUINÉ

Fernando de Pinho Valente (Magro)
ex-Cap. Mil de Artilharia 

10 - ACTIVIDADES NÃO OFICIAIS



Na esplanada do café Bento, em Bissau, encontrei o Inocêncio, que conhecia da Metrópole. Ele tinha sido funcionário da Câmara Municipal de Viseu e era genro de um capataz de obras públicas da Junta Autónoma de Estradas onde eu trabalhara.

Fez-me uma festa.
- O Senhor Engenheiro aqui, na Guiné?!

Expliquei-lhe a situação em que me encontrava como Capitão ao serviço do Exército.
Disse-me ele que estava colocado nos Serviços Administrativos da Tecnil, uma empresa de construções, especialmente vocacionada para a abertura e pavimentação de estradas, cujos donos eram oriundos de Viseu. Também me disse que, naquela altura, não tinham nenhum técnico qualificado na empresa e que o Governo havia adjudicado à Tecnil as pavimentações de diversos arruamentos de Bissau. Que iria telefonar à noite para Lisboa ao Engenheiro Ramiro Sobral (um dos donos), como diariamente fazia, e o iria informar que eu estava em Bissau.

- O Senhor Engenheiro não nos quererá dar uma ajuda?

Disse-lhe que me era impossível, uma vez que estava preso ao serviço militar praticamente das 9 horas da manhã até às 17 horas.
Respondeu-me que bastaria que passasse todos os dias pela obra às oito horas da manhã, no início dos trabalhos, para combinar com o encarregado a tarefa do dia tirando-lhe qualquer dificuldade que tivesse. Depois, durante o dia mesmo à hora do almoço bastava que passasse rapidamente pela obra para me assegurar que os trabalhos corriam com regularidade. E isso chegava.
Nessas condições disse-lhe que poderia contar com a minha colaboração.

No dia seguinte o Inocêncio apareceu-me no Batalhão de Engenharia comunicando-me que o Engenheiro Ramiro Sobral me pedia que entrasse imediatamente ao serviço da Tecnil e começasse por estudar os processos de adjudicação das obras e as condições em que as mesmas teriam de ser levadas a efeito para que, logo que possível, os trabalhos pudessem ser iniciados.

Assim entrei ao serviço da empresa sem sequer saber qual seria meu ordenado. Só o vim a saber passados três meses, quando o Engenheiro Ramiro Sobral se deslocou a Bissau e me perguntou quanto queria ganhar.
Informei-o do tempo diário que dedicava à Tecnil, tanto nos locais das obras como com os estudos dos projectos. E disse-lhe que ele sabia melhor do que eu, naquelas condições, quanto poderia valer o meu trabalho.
Adiantou-me um valor mensal que era sensivelmente o que auferia a tempo inteiro em Viseu, na JAE. Aceitei imediatamente a sua proposta.

Trabalhando para a Tecnil, orientei os trabalhos de arranjo e modificação do perfil da Avenida da República junto ao Largo de Nuno Tristão e ao edifício da Sociedade Gouveia e do Café Bento, local onde, quando chovia, se juntava muita água e cujo escoamento era difícil.
Orientei ainda os trabalhos de pavimentação das ruas de Angola e de Moçambique e da estrada de Bor, desde o Largo de Teixeira Pinto até à estrada de Santa Luzia.
Projectei e executei, quase completamente, o edifício das novas instalações da Tecnil junto à estrada de Santa Luzia.

Largo de Nuno Tristão

Também encontrei em Bissau o Dr. Moniz, que conhecia de Viseu como professor da Escola Industrial.
O Dr. Moniz, que possuía uma casa senhorial em Rio de Moinhos, em certa ocasião necessitou de umas árvores e arbustos e dirigiu-se à Direcção de Estradas de Viseu no sentido de conseguir o que pretendia dos viveiros da JAE na Queiriga.
O meu Director mandou-o entender-se comigo, uma vez que, na altura, além da responsabilidade da conservação da rede rodoviária nacional da área de Viseu, também geria o referido viveiro da Queiriga.
Facultei-lhe o que pretendia.
O nosso conhecimento teve origem nesse facto e ele ficou-me sempre agradecido.

O Dr. Moniz informou-me que era Director da Escola Comercial e Industrial de Bissau e que precisava de professores.

- O Senhor Engenheiro é que poderia resolver-me um problema. Não tenho professores de Matemática nem de Desenho.

Disse-lhe que era absolutamente impossível satisfazer o que pretendia uma vez que saía do Quartel cerca das 17 horas.

- Mas o meu problema é justamente no horário nocturno.

Retorqui-lhe que já tinha o serviço da Tecnil e que, depois do jantar, ficava por casa a fazer companhia à família e a descansar.

- No entanto, continuou o Dr. Moniz, o horário nocturno aqui em Bissau começa justamente às 18 horas e o serviço docente a partir dessa hora é pago a dobrar. Não quererá o Sr. Engenheiro ao menos leccionar duas horas por dia das 18 às 20 horas?

Nessas condições aceitei o que o Dr. Moniz me propunha e passei a ser professor de Matemática e de Desenho Geral na Escola Comercial e Industrial de Bissau, exercendo essa actividade durante dois anos lectivos (1970-1971 e 1971-1972).

Fiquei com o meu tempo completamente preenchido até às 20 horas.

Nos fins-de-semana, e em casa à noite, ainda tive tempo de realizar alguns projectos de engenharia civil, a saber:
- Projecto de um edifício misto, com snack-bar, apartamentos e armazém para a Sociedade Comercial Ultramarina de colaboração com o Arquitecto Fernando Pereira Morgado, Capitão miliciano como eu;
- Projecto das infra-estruturas de um bairro de casas económicas para a Caixa de Previdência dos Funcionários Civis;
- Projecto de um bloco de apartamentos com rés-do-chão comercial para António Amaro;
- Projecto de um bloco de apartamentos e das instalações para uma fábrica de camisas.

Algumas pessoas que me estavam mais ligadas começaram, a dada altura, a aperceber-se destas minhas actividades bem como dos rendimentos que auferia e, por isso, na área militar passei a ser conhecido como "Capitão Caça-níqueis".

(Continua)
____________

Nota do editor

Último poste da série de 18 DE SETEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12057: "Memórias da Guiné", por Fernando Valente (Magro) (9): Os reordenamentos populacionais

Guiné 63/74 - P12084: Agenda cultural (283): Fafe, Biblioteca Municipal de Fafe, a partir de 17 de outubro de 2013 e até 21 de novembro, às quintas-feiras, curso livre de história local: "O Concelho de Fafe e a Guerra Colonial (1961-1974)" (Jaime Silva)



Fafe > Monumento aos combatentes da guerra colonial, inaugurado em 5 de novembro de 2005.  Foto: Artur Coimbra  (2012) (`*)


1.  No àmbito das comemorações, em curso, do início da guerra colonial,  levadas a cabo pela Câmara Municipal de Fafe (**), vai realizar-se nos próximos meses de outubro e novembro, às quintas feiras e em horário pós-laboral, o II Curso Livre de História Local, sob o tema "O concelho de Fafe e a Guerra Colonial (1961-1974)".

O programa foi nos enviado, com pedido de publicação (***),  pelo nosso amigo (e camarada) Jaime Bonifácio Marques da Silva (, conhecido em Fafe por Jaime Silva), lourinhanense e ex-alf mil paraquedista (BCP 21, Angola, 1970/72),


II CURSO LIVRE DE HISTÓRIA LOCAL

O concelho de Fafe e a Guerra Colonial (1961-1974)


PROGRAMA

Quintas-feiras, 18h30/20h00

Biblioteca Municipal

17/18/10? - 1.º Módulo (Abertura Solene) – “A Guerra Colonial na vida e obra de Manuel Alegre” – Manuel Alegre – José Manuel Mendes (?)

24/10 - 2.º Módulo – “Uma abordagem à Guerra Colonial Portuguesa (1961-1974) ” – José Manuel Lages

31/10 - 3.º Módulo – “A participação de militares do concelho de Fafe no Ultramar” – Jaime Silva

07/11 - 4.º Módulo – “ A Guerra Colonial nas páginas da imprensa local” – Daniel Bastos

14/11 - 5.º Módulo – “O conflito contado por aqueles que o viveram: imagens e testemunhos da Guerra Colonial” – Artur Leite


21/11 - 6.º Módulo – “Memórias literárias da Guerra Colonial” – Artur Coimbra

______________

Notas do editor:


(*) Informação reproduzida, com a devida vénia, no blogue de Artur Coimbra, Sala de Visitas do Minho > 3 de julho de 2012 > Viagem pelos Monumentos da cidade de Fafe (VIII) > Monumento aos combatenets da guerra colonial

(...) "Da iniciativa da Delegação de Fafe da Associação Portuguesa dos Veteranos de Guerra, e em especial do activista Jaime Silva, o Monumento aos Combatentes da Guerra Colonial foi inaugurado em 6 de Novembro de 2005.

Localizado no jardim central da Avenida do Brasil, o monumento tem a assinatura da escultora Andreia Couto e consiste numa estátua em bronze, representando um soldado equipado conforme os militares portugueses operavam nas antigas colónias, em cima de um pedestal, de forma quadrangular, nos lados do qual se inscrevem os nomes dos 37 soldados fafenses que morreram na guerra.

O objectivo é exactamente prestar homenagem aos jovens oriundos deste concelho que tombaram para sempre ao serviço da Pátria nos confrontos que decorreram entre 1961 e 1974 nas províncias de Moçambique, Angola e Guiné.

A Câmara de Fafe contribuiu com 15 mil euros para que a associação conseguisse concretizar o sonho – que vinha já de 2001 – de erguer o memorial aos mortos da guerra colonial, orçado em cerca de 20 mil euros. As juntas de freguesia também colaboraram nesta iniciativa". (...)


(***) Último poste da série > 15 de setembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12044: Agenda cultural (282): Festival Todos 2013. Além do Intendente alarga-se agora ao Poço dos Negros e a São Bento, Lisboa, 12-15 set 2013

Guiné 63/74 - P12083: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (31): testemunho gravado em Gadamael, a história do Oh! Alexandre, que conheceu o alf mil Manuel Vaz, da CCAÇ 798, bem como o pessoal da CCAÇ 1659, os Zorba


Vídeo (1' 50''). Alojado em You Tube > ADBissau

1. Mensagem enviada em 19 do corrente, pelo nosso amigo Pepito, da AD - Acção para o Desenvolvimeneto, com sede em Bissau:

Luís

Assunto - Gadamael, testemunho

Repara no testemunho do Oh Alexandre!

http://youtu.be/KM5bpbU165M

É impressionante a memória dele para o número das companhias e anos...

abraço
pepito

2. Comentário de L.G.:

Este homem trabalhou como "assalariado no hospital" (sic) de Gadamael... Queria ele dizer: no posto médico... Seria uma espécie de "auxiliar" de enfermagem ou "ajudante" de maqueiro... Civil, presumo ele, não deve ter sido tropa, muito menos operacional... Conheceu o alf mil [Manuel] Vaz,  da CCAÇ 798 (Gadamael, 1965/67), nosso estimado amigo e camarada que tem vindo a dedicar-se, com paixão e rigor, à historiografia militar de Gadamael.

O Oh! Alexandre, um dos dois indigitados guias do futuro Núcleo Museológico Memória de Gadamael,  lembra-se inclusive do SPM da companhia,  SPM 4078 (se bem percebo as suas palavras...)!.

Descreve o alf Vaz: "não era muito alto, era um bocado baixinho, e um bocado forte"... E faz referência a uma ponte onde passavam as viaturas, que terá sido construída no tempo do alf Vaz e onde ele deixou o seu nome gravado...

Depois veio a companhia Zorba, a CCAÇ 1659 (Gadamael e Ganturé, 1967/68)...

O nosso homem ficou sempre conhecido por Oh! Alexandre, pelo pessoal das diversas companhias que passaram por Gadamael

Obrigado ao Pepito pela gravação deste pequeno vídeo e por esta deliciosa pequena entrevista em português. Julgo que vai ser uma surpresa, emocionante, para o Manuel Vaz... Reparem: são recordações de há quase 50 anos!...
___________

Nota do editor: 

Último poste da série > 24 de setembro de 2013 >Guiné 63/74 - P12077: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (30): Mais um vídeo com música do tempo da tropa colonial gravado recentemente em Gadamael Porto: Indo eu, indo eu, a caminho de Viseu...


terça-feira, 24 de setembro de 2013

Guiné 63/74 - P12082: Os nossos médicos (71): Guiões, brasões e crachás das unidades em que prestou serviço o alf mil méd Amaral Bernardo: BCAÇ 2930 (Catió, 1970/72) e BART 2924 (Tite, 1970/72)














Guiões, brasões e crachás das unidades (batalhões) e subunidades (companhias) por onde passou o alf mil médico Amaral Bernardo, nosso prezado camarada da Tabanca Grande, que esteve no TO da Guiné nos anos de 1970/72.


1. Este material já nos tinha sido enviado por email de 30 de março de 2011. Por lapso, só agora descobrimos o seu paradeiro: estava numa das nossas caixas de correio, pouco usadas... Pedimos desculpa ao autor e aos leitores.

O Amaral Bernardo esteve ao serviço de dois batalhões: BCAÇ 2930 (Catió, 1970/72) e BART 2924 (Tite, 1970/72), como de resto se infere dos louvores que lhe foram atribuídos:









Fotos: © Amaral Bernardo (2011). Todos os direitos reservados. [Edição: L.G.]

Guiné 63/74 - P12081: Memórias de Mansabá (28): Minas na estrada de Mansabá (Francisco Baptista / Carlos Vinhal)

1. Mensagem do nosso camarada Francisco Baptista, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2616/BCAÇ 2892 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72), com data de 19 de Setembro de 2013:

É muito difícil para mim falar da guerra da Guiné.
Porque eu não quis essa guerra nem as das outras colónias.


Um dia nos finais de 1971, o comandante da companhia mandou-me com o 4º pelotão da CART 2732, a Mansoa, esperar e trazer sob protecção uma coluna de reabastecimento com destino a Mansabá, K3 e Farim.

Mansoa, segundo a ideia que me vem à memória, era um quartel bastante grande com boas instalações quando comparadas com a maioria dos quartéis da Guiné. Não sei quantas companhias estariam lá aquarteladas, mas pelos alferes que eu encontrava no bar deveria lá morar um batalhão, não sei ao certo.
Porque havia sempre alguns tiques diferentes entre as diversas armas, ao tempo não sei se esses militares não seriam de cavalaria. Em todo o caso aqueles que contactei em Mansoa foram sempre afáveis e simpáticos.

Nesse dia mal entrei falaram-me numa mina que estaria na estrada entre Mansoa, Mansabá e o K3. Eles tinham recebido a informação no dia anterior, através dos serviços secretos. Agradeci a informação, que não tinha recebido em Mansabá e no regresso fomos com mais cuidado e atentos a possíveis minas, na estrada que era de alcatrão.

Até Mansabá nada encontrámos. Continuámos na direcção de K3 e chegados ao Bironque, num pedaço de estrada sem alcatrão, por causa do rebentamento duma mina, muitos meses antes, detetamos uma mina anticarro.

O meu pelotão não tinha especialistas de minas e armadilhas. O alferes Couto que tinha sido o primeiro a comandar o pelotão infelizmente morrera ao levantar uma.

Recordo-me de dois especialistas de minas e armadilhas que ou já estavam connosco ou vieram na altura do quartel que até era perto. Acho que teriam vindo com mais alguns soldados do quartel. Talvez porque o assunto era delicado eles pouco falaram, pois viriam concentrados a pensar na melhor forma de o resolver.

Decidiram que iriam tentar levantá-la. A decisão teria que ser deles, e eu só teria que a acatar mas fiquei apreensivo, porque cerca de um ano antes, na CCaç 2616, em Buba, tinha morrido o meu amigo Furriel Ferreira ao tentar levantar uma mina anti-carro, o alferes Couto, primeiro comandante do pelotão morrera também ao levantar uma e o alferes Queiroz que eu tinha rendido em Buba, também morrera ao pisar uma.
Seria muito mau que uma mina provocasse outra tragédia semelhante.

Hoje penso, recordando o porte e postura de um deles e de alguém que revi há cerca de 2 meses, que um dos especialistas de minas era o nosso amigo Carlos Vinhal. Só ele poderá confirmar se quiser.
Mandaram pôr o pelotão à distância regulamentar e fizeram o levantamento da mina duma forma eficiente e segura. Por mim confesso que respirei de alívio.

Depois fomos até ao K3 a verificar se poderia haver outras minas, que não encontrámos. O aquartelamento de K3 que ficava junto ao rio Geba, antes da travessia para Farim, ao contrário do de Mansoa era pobre, feito de troncos de árvores, que ladeavam um grande terreiro poeirento, onde talvez estivesse uma companhia.
Mais parecia um forte como o dos filmes americanos que víamos quando éramos novos. O pessoal não o recordo tanto como o de Mansoa, talvez por serem menos, talvez por eu ter ido menos vezes lá.

No regresso a Mansabá soube que a mensagem sobre as minas tinha sido recebida no dia anterior no aquartelamento mas não foi comunicada à CART 2732.
Foi uma falha humana, como infelizmente há muitas e havia muitas.
Felizmente não houve vítimas a lamentar.


2. Comentário de Carlos Vinhal, ex-Fur Mil da CART 2732

Não na qualidade de editor, mas como interveniente no acontecimento que o ex-Alf Mil Francisco Baptista aqui lembra, vou comentar e dar a mão à palmatória por em tempos ter sido impreciso, por lapso de memória.
Fica mais uma vez provado que há pormenores que nos vão escapando.
Passemos então ao comentário.

Em 9 de Julho de 2006 escrevi no Poste 948*:

Durante uma grande parte da comissão fui encarregue da gerência dos bares do aquartelamento. Por inerência do cargo ia quase todos os meses com o meu camarada Costa, Fur Mil Alimentação, a Bissau para acompanharmos no regresso os reabastecimentos da Cantina e Bares.

As colunas de reabastecimento eram compostas por um número elevado de viaturas de carga civis e militares, carregadas com víveres destinados a Mansoa, Mansabá, K3 e Farim. As viaturas militares de mercadorias eram pertença da Companhia de Transportes Militares e eram comandadas normalmente por um Furriel Miliciano que coordenava também as viaturas civis, alugadas para reforço. A protecção da coluna era assegurada entre Bissau e Mansoa pelas forças de Mansoa. A minha Companhia, por sua vez, esperava ali a coluna de onde fazia protecção até Mansabá e daqui ao K3. As viaturas de carga destinadas a cada aquartelamento iam ficando sucessivamente a descarregar, sendo apanhadas, mais tarde, no regresso da coluna para Bissau.

No dia 3 de Dezembro de 1971, num desses reabastecimentos, chegou, ainda em Bissau, uma informação de que teria sido montada, pelo IN, uma mina anticarro no trajecto entre Mansoa e o K3. Deram-me conhecimento do facto por eu ser o único graduado com o curso Minas e Armadilhas na coluna. Dirigi-me ao comandante das viaturas de reabastecimento, por sinal um Furriel Miliciano recentemente chegado à Guiné, para o avisar de que os condutores das viaturas de carga deveriam conduzir com cuidado, porque a todo o momento poderiam surgir complicações. Julgando que eu estava a amedrontá-lo por ele ser periquito, não me levou muito a sério.

Foram precisos sete anos para se saber a verdade. Não foi em Bissau que eu soube da possível existência mina, mas, segundo o testemunho do camarada Francisco Baptista, foi em Mansoa.
Se pensarmos bem, até é mais lógico porque ali era sede de Batalhão e era ali que começava o perigo.
Em Mansabá, ao tempo, estava activado o COP 6, logo estou em crer que a mesma informação também lá estivesse. Pelos vistos estava, mas dela não foi dado conhecimento a quem de direito, ao CMDT da coluna, Alf Mil Francisco Baptista.

A detecção da mina deveu-se à informação recolhida em Bissau e ao bom hábito de picar a zona da cratera sempre que ali passávamos.

Aqui também devia ter dito que a detecção da mina deveu-se à informação recolhida em Mansoa e acrescentar: ao especial cuidado do Comandante da coluna que mandou picar aquela zona com especial atenção.

Analisada a situação, afastámos toda a gente para uma distância de segurança e metemos mãos à obra. Por sorte a mina, uma TM42, que possui uma asa própria para transporte, tinha-a acessível sem necessidade de lhe mexer muito. Foi só afastar um pouco de terra com cuidado não fosse estar armadilhada. Atámos-lhe uma corda estendendo esta de modo a, por de trás de uma árvore, puxar a mina até ela se soltar. À conta de alguma força, lá a conseguimos soltar. Para a tornar inofensiva, removi-lhe a espoleta e ei-la em condições de ser tocada e fotografada para a posteridade.

Cabe aqui um pedido de desculpas ao camarada Francisco Baptista pela angústia que lhe causamos, que felizmente não notei. Claro que eu também estava tenso, pelo menos até saber como íamos dar a volta ao caso. Cabe aqui também uma palavra de apreço ao meu camarada de Minas e Armadilhas, Fur Mil Sousa. Foi um trabalho de equipa.

Para relembrar, ficam as fotos então publicadas, com legendas de hoje:

Bironque, 03DEZ71 - A mina AC TM42 momentos antes de ser levantada e neutralizada 

Parafraseando Francisco Baptista: "Mandaram pôr o pelotão à distância regulamentar e fizeram o levantamento da mina duma forma eficiente e segura".

Acabada a operação, e aproveitando a presença do fotógrafo, (quem seria?) fez-se a foto de família para a posteridade. O Sousa segura a menina com o prazer do dever cumprido. Agora reparo que saí para o mato com os galões de furriel nos ombros. Tal foi a pressa.
____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 9 DE JULHO DE 2006 > Guiné 63/74 - P948: Memórias de Mansabá (3): A angústia do minas e armadilhas (Carlos Vinhal)

Último poste da série de 15 DE ABRIL DE 2013 > Guiné 63/74 - P11396: Memórias de Mansabá (27): Naquele Domingo de Páscoa de 1971, festejei os meus 34 anos (Jorge Picado)

Guiné 63/74 - P12080: Um Amanuense em terras de Kako Baldé (Abílio Magro) (11): Djassi, o ordenança

1. Em mensagem do dia 21 de Setembro de 2013, o nosso camarada Abílio Magro (ex-Fur Mil Amanuense. CSJD/QG/CTIG, 1973/74), ao contrário do que costuma fazer, fala-nos muito a sério de um caso que se multiplicou por muitos, o abandono puro e simples dos nossos camaradas Guineenses.


Um Amanuense em terras de Kako Baldé

(Para quem não sabe, Kako Baldé era o nome por que era conhecido, entre a tropa, o General Spínola. Kako – (caco) lente que o General metia no olho. Baldé – Nome muito comum na Guiné) 


11 - Djassi, o ordenança

Como já referi em post anterior, prestei serviço na CSJD/QG/CTIG (Chefia do Serviço de Justiça e Disciplina do Quartel General do Comando Territorial Independente da Guiné) situado nas instalações militares de Santa Luzia.

Há quem, neste blogue, confunda o QG/CTIG com o QG da Amura. Aí estava instalado o QG/CCFAG (Quartel General do Comando Chefe das Forças Armadas da Guiné. Isto é: O QG/CTIG era o Quartel General do Exército, enquanto o QG/CCFAG era o Quartel General de todas as Forças Armadas em serviço naquele território.

No tempo em que por ali andei (1973/74), o primeiro foi comandado pelo Brigadeiro Alberto da Silva Banazol e depois pelo Brigadeiro Galvão de Figueiredo; o segundo pelo General Spínola e depois pelo General Bettencourt Rodrigues.

Em Agosto de 1974 na CSJD tínhamos um ordenança, o Djassi, soldado nativo que aparentava ter já ultrapassado os 30 anos de idade e que, enquanto operacional, foi gravemente ferido, tendo-lhe sido retirado um pulmão e integrado nos serviços auxiliares, sendo ali colocado para efectuar pequenas tarefas relacionados com aquele Serviço.

O Djassi apresentava invariavelmente um semblante carregado e raramente esboçava qualquer sorriso, denotando, porventura, algum sofrimento pelo seu débil estado de saúde, mas era um indivíduo afável, educado, disciplinado e prestável. Dava gosto lidar com ele. Nunca o vi aceitar com azedume qualquer tarefa oficial ou particular que se lhe solicitasse.

Nessa altura, Agosto de 1974, já muitas Companhias tinham abandonado os seus quartéis no mato e regressado à Metrópole, e outras encontravam-se estacionadas em Bissau a aguardar igual destino.
Por essa razão, estavamos assoberbados com papelada decorrente do "fecho de contas" daquelas Companhias o que indiciava que nós, os do "ar condicionado" seríamos talvez os últimos a "abandonar o barco".
A situação era confusa. Sabíamos que iríamos abandonar a Guiné, mas não sabíamos como, nem se o faríamos definitivamente, nem quando.

Começou a correr a informação de que a partir de finais de Agosto não seriam autorizadas férias a ninguém.
Ora, eu e o meu camarada Silva do Barreiro, nessa altura já os mais "velhinhos" da CSJD com excepção do Ten Cor e do Major, estávamos há já mais de um ano sem gozar férias e começamos logo a tratar da papelada para o efeito.
Lá viemos de férias em meados de Agosto e, entretanto, o "êxodo" continuava e com maior cadência.
Findas as férias, regressamos à Guiné exactamente no dia em que foi reconhecida a independência por parte de Portugal - 12 de Setembro de 1974.

As patrulhas na cidade eram efectuadas pela PM conjuntamente com elementos do PAIGC, muitos estabelecimentos tinham encerrado, a tropa que ainda restava era composta de "piriquitos" oriundos das Companhias mais recentemente chegadas à Guiné, na CSJD só o Ten Cor e o Major não tinham ainda sido substituídos, os bens escasseavam, na messe de Sargentos só se encontravam "piriquitos", etc., etc.. Ou seja: eu e o Silva estávamos completamente deslocados e se não tivéssemos a estúpida ideia de meter férias naquela altura, teríamos certamente regressado definitivamente, sem necessidade de desembolsar os "pesos" que nos custou a viagem.

Logo tratamos de, junto do Ten Cor, dar conhecimento da nossa "triste" situação e efectuar o "choradinho" adequado.
Fomos então incumbidos de queimar todo o arquivo morto da CSJD que ocupava totalmente uma daquelas pequenas vivendas tipo colonial e que era composto por processos instaurados desde o tempo em que ainda não havia guerra na "Província", após o que poderíamos "meter os papéis" para regressar à Metrópole.

A tarefa impunha alguma responsabilidade e cuidado pois não podia ficar qualquer fracção de papel por arder o que, nos processos mais volumosos, nos obrigava quase a arrancar folha por folha.
Ali estivemos quinze dias a queimar papel que, quando amontoado, nos obrigava a remexê-lo com um pau para que não se apagasse e, no fim de cada dia, só abandonávamos o local quando existissem apenas cinzas.
De quando em vez, um ou outro processo despertava a nossa curiosidade pelos objectos de prova que continha e cheguei mesmo à tentação de desviar alguns, mas o desejo de regressar a casa depressa e bem, falava mais alto.

A nossa vontade em terminar a tarefa o mais rapidamente possível era tanta que logo que o sol dava sinais de vida, lá íamos nós p'ra "incineradora" e um dia tivemos a sorte de nos cruzarmos com o Ten Cor que, talvez sensibilizado pela nossa madrugadora actividade, nos mandou chamar para que "metêssemos a papelada para bazar dali".

A tarefa ainda não estava terminada, mas o Ten Cor, face à nossa proficiência e empenho, achou por bem mandar para lá alguém mais "piriquito" e nós lá regressamos à Metrópole quinze dias depois de lá termos vindo no final das férias.

E foi numa deslocação a Bissau para, no mercado negro, "despachar" os últimos pesos que tinha comigo (na messe de sargentos de Santa Luzia já nada havia para comprar) que encontrei o Djassi, já civil e que me interpelou de uma maneira agressiva como nunca imaginei que fosse capaz, confrontando-me com a situação para a qual o Exército Português o tinha atirado e dando-me a entender que, naquele momento, para ele, eu era o representante daquele Exército e exigia-me explicações que eu não podia dar.

- Furriel, eu fui ensinado a respeitar a bandeira portuguesa desde que nasci, andei muitos anos no mato a lutar por Portugal, fui ferido várias vezes, fiquei sem um pulmão, sou português, sempre me considerei português!
- E agora, dão-me dinheiro e vão-se todos embora?! - O que vai ser de mim?! - O que é que o PAIGC vai fazer comigo?!

Naquele momento senti-me envergonhado por ainda pertencer ao Exército que abandonara à sua sorte o exemplar militar português que era o Djassi.
Emudeci e não me recordo de lhe ter dirigido grandes palavras de conforto para além de um lacónico: "Calma, vai correr tudo bem".

Cabisbaixo e algo deprimido retirei-me do local, mas confesso que, minutos depois, o egoísmo veio ao de cima e já só pensava nas "voltas" a dar no sentido de embarcar com destino à Metrópole.

Quando, tempos depois, já na Metrópole, comecei a ouvir os noticiários sobre os fuzilamentos de antigos militares portugueses da Guiné, muitas vezes me veio à memória (e continua a vir quando se fala no assunto) o exemplar militar Djassi e questiono-me sobre o destino que teria tido e se os capitães de Abril (na altura no poder) não teriam podido fazer mais por aqueles que combateram ao nosso lado.

Há muito que tinha em mente falar sobre o Djassi, ordenança da CSJD/QG/CTIG, mas como tenho o hábito de salpicar a minha "prosa" com tiradas pseudo-humorísticas (está-me no sangue), tenho alguma dificuldade de escrita para assuntos mais sérios como este. Dispus-me agora a fazê-lo, reconhecendo, no entanto, que este episódio era merecedor de uma escrita mais adequada ao fim a que me propus:

Prestar uma sentida homenagem a todos os "Djassis" da Guiné-Bissau.
____________

Nota do editor

Último poste da série de 25 DE ABRIL DE 2013 > Guiné 63/74 - P11466: Um Amanuense em terras de Kako Baldé (Abílio Magro) (10): Bombeiro (in)voluntário e outras histórias

Guiné 63/74 - P12079: Os nossos médicos (70): Amaral Bernardo, do Porto, foi o primeiro médico da açoriana CCAÇ 2726, que era comandada pelo cap inf David C. Gomes de Magalhães (Cacine, 1970/72)




Guiné > Região de Tombali > Rio Cacine a caminho de Gadamael > c. 1970 > O alf mil méd Amaral Bernardo esteve na CCAÇ 2726, uma companhia independente, açoriana, que guarneceu Cacine (1970/72). Amaral Bernardo pertencia  à CCS/BCAÇ 2930 (Catió, 1970/72), e passou cerca de um ano (1971) em Bedanda (CCAÇ 6).

Foto: © Amaral Bernardo (2011). Todos os direitos reservados. [Edição: L.G.]



1. Mensagem de Amaral Bernardo, acabada de chegar às 07:18:

Luís:

Há cerca de dois anos enviei-te os crachás das companhias por onde andei na Guiné (e que nunca foram referenciados neste blogue) e penso (mas vou verificar, e gostava que o fizesses também) que o da CCaç 2726 que hoje mostram,  pertence a essa colecção. (Caso não seja assim, este mail não existiu).

Essa foi a primeira companhia que tive na Guiné em conjunto com Gadamael. Depois estive os tais 11 meses em Bedanda com apoio ao Guilege e esporadicamente a Cacine.

Era comandada pelo capitão Altino (penso) de Magalhães[, não,  era o cap inf David C. Gomes de Magalhães] (**)

Dessa época não me lembro de nenhum colega de Coimbra que estivesse lá estado. O apoio a Cacine era feito pelos médicos de Catió, como é sabido. 

O Mário [Silva] Bravo substitui-me em Bedanda quando fui para Tite. Cruzámo-nos no "Aeroporto Internacional de Bedanda", na rendição.

Somos da mesma Faculdade [de Medicina do Porto] e amigos de longa data.

Desculpa este flashback.

Abraço rijo

Amaral Bernardo

2. Comentário de L.G.:

Obrigado, Amaral,  pela tua pronta resposta ao solicitado no nosso último poste,  P12078, de hoje (*).  Aqui tens mais uns elementos informativos sobre a tua primeira companhia,  onde  estiveste como médico.  O pessoal era açoriano. É pena que não tenhamos ninguém a representá-la aqui, na nossa Tabanca Grande.

Encontrei, no portal Dos Veteranos da Guerra do Utramar [Ultramar Terraweb]  um contacto de um militar dessa companha, o Luís Cândido Tavares Paulino, que organizou o 7º convívio do pessoal da  CCAÇ 2726, no Faial e no Pico, em 2011. Telefone: 214 102 686. Talvez esse camarada nos possa dizer quem, além de ti, foram os médicos que passaram por Cacine, entre 1970 e 1972, ao tempo da CCAÇ 2726.

Quanto ao mail que me terás enviado há cerca de 2 anos, com os crachás das tuas companhias, é bem possível que se tenha estraviado ou esteja algures, ainda por abrir,nalgumas das minhas caixas de correio que já não está ativas. Numa primeira rápida pesquisa não encontrei nada. Se ainda te for possível, reencaminha-me, por favor, esse mail. Saúde da boa para ti!... De Lisboa, com um alfa bravo. Luis.
_____________

Notas do editor:

(*) Último poste da série > 24 de setembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12078: Os nossos médicos (69): Quem foi o colega de Coimbra que em 1970 passou pela açoriana CCaç 2726 (Cacine, 1970/72) ? (Flávio Rodrigues, médico, Loures)

(**) A CCAÇ 2726, independente, foi mobilizada p'elo BII 18, partiu para o TO da Guiné em 11/4/1970 e regressou a 27/2/1972. Esteve sempre em Cacine. Era comandada pelo cap Inf  David Custódio Gomes de Magalhães.

Vd. poste de 16 de setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P4961: Histórias de Juvenal Candeias (4): Há periquitos no Quitáfine

(...) A CCaç 3520 tinha chegado ao porto de Cacine, a bordo da LDG Montante, em 24 de Janeiro de 1972, para render a CCaç 2726, companhia açoriana comandada pelo Capitão Magalhães, o homem que retorcia as pontas do bigode com cera e a quem o tabaco nunca faltava! Dizia-se mesmo, à boca pequena, que, quando o tabaco acabava em Cacine, o PAIGC deixava, no mato, uns macitos para o Capitão! Rumor ou realidade… ninguém sabe! Ficou por provar! (..:)

Guiné 63/74 - P12078: Os nossos médicos (69): Quem foi o colega de Coimbra que em 1970 passou pela açoriana CCaç 2726 (Cacine, 1970/72) ? (Flávio Rodrigues, médico, Loures)


Crachá da CCAÇ 2726 (Cacine, 1970/72). uma companhia açooriana, mobilizada pelo BII 18. Slogan: In hoc signo vinces (Com este sinal, vencerás!).


Foto: © Mário Bravo (2012) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados.


1. Mensagem de Flávio Rodrigues, nosso leitor (e camarada, médico, presumivelmente alferes mil médico; tem consultório em Loures e é de clínica geral):

 De: Flavio Rodrigues
Data: 14 de Setembro de 2013 às 15:16
Assunto: Quem foi o Médico de Coimbra que em 1970 passou pela CCaç 2726 em Cacine

Colega Luís Graça;

Se souber quem foi o colega de Coimbra que,  em 1970, passou pela CCaç 2726,  em Cacine,  agradeço que me diga para eu entrar em contacto com ele para recordarmos episódios.

Agradece, Flávio Rodrigues

2. Resposta de L.G.:

Camarada, não tenho a certeza, mas pode ser o Mário Bravo, cirurgião, ortopedista, hoje a viver no Porto ou Grande Porto, e membro do nosso blogue desde janeiro de 2007. Não sei se ele estudou em Coimbra. A imagem do crachá que acima reproduzimos, foi ele que nos mandou. Pode ser que ele possa responder à tua pergunta. (No blogue tratamo-nos por tu, na nossa qualidade de antigos camaradas de armas; aproveito para te convidar a ingressar na Tabanca Grande e escrever aqui algumas das tuas boas e menos histórias da guerra: presumindo que passaste também pela Guiné, pelo sul, nesta época conturbada de 1970/72).

Infelizmente, não temos ninguém dessa companhia representado no blogue. A CCAÇ 2726 era composta maioritariamenye por camaradas dos Açores, 

Pode ser que o Mário [Silva] Bravo nos possa dar alguma pista... O Mário Bravo, ex-alf mil médico, passou por Bedanda, neste caso pela CCAÇ 6, entre Dezembro de 1971 e Março de 1972 e depois por Teixeira Pinto, ficando o resto da comissão no HM 241, em Bissau.

Outro médico que te pode dar uma ou mais pistas é o [José Maria Ferreira do ]  Amaral Bernardo (ex-alf mil médico, CCS/BCAÇ 2930, Catió, 1970/72). 

Vamos também pedir ajuda aos nossos camaradas, que nos leem, e em especial aos açorianos...

Um abraço. Luis

Guiné 63/74 - P12077: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (30): Mais um vídeo com música do tempo da tropa colonial gravado recentemente em Gadamael Porto: Indo eu, indo eu, a caminho de Viseu...


Vídeo (1' 28''). Alojado no You Tube > ADBissau

 1. Mais uma gravação feita no princípio de setembro,  em Gadamael Porto, e enviada pelo nosso amigo e parceiro Pepito, diretor executivo da AD - Acção para o Desenvolvimento, com sede em Bissau. Depois do Piriquito (*), Rapazinho e Santa Luzia (**), temos agora a canção (infantil)... "Indo eu, indo eu, a caminho de Viseu"... Quem não se lembra de a cantar ou trautear ? Letra e música lá ficaram "perdidas" na região de Tombali...

Acompanhamento: gaita de beiços, palmas, vozes. (***)

Aqui fica a letra desta cantiguinha, Indo eu... [, retirada daqui, do sítio Alfarrábio]:

Indo eu, indo eu,
a caminho de Viseu;
indo eu, indo eu,
a caminho de Viseu,

Encontrei o meu amor,
ai Jesus que lá vou eu;
encontrei o meu amor,
ai Jesus que lá vou eu.

Ora zuz, truz, truz,
ora zás, traz, traz,
ora zuz, truz, truz,
ora zás, traz, traz,

ora chega, chega, chega,
ora arreda lá p'ra trás,
ora chega, chega, chega,
ora arreda lá p'ra trás.
____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de  11 de setembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12027: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (27): Vídeo "Piriquito vai pró mato", gravado recentemente em Gadamael Porto

(**) Vd. poste de 19 de setembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12058: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (28): Mais vídeos com música do tempo da tropa colonial (Rapazinho e Santa Luzia), gravados recentemente em Gadamael Porto

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Guiné 63/74 - P12076: Efemérides (144): O Acordo de Argel, celebrado em 26 de agosto de 1974 entre o Governo Português e o PAIGC







Texto do Acordo de Argel, de 26 de agosto de 1974, publicado no Diário do Governo (hoje, Diário da República), I Série, de 30 de agosto de 1974.

No ponto nº 25 do anexo ao Acordo, diz-se taxativamente que "o Governo Português pagará ainda as pensões de sangue, de invalidez e de reforma a que tenham direito quaisquer cidadãos da República da Guiné-Bissau por motivo de serviços prestados às forças armadas portugueses"... E o nº 26 é explícito quanto às responsabilidades do Estado português no que diz respeito à reintegração dos nossos antigos camaradas guineenses:

"O Governo Português participará num plano de reintegração na vida civil dos cidadãos da República da Guiné-Bissau que prestem serviço militar nas forças armadas portuguesas e, em especial, dos graduados das companhias e comandos africanos".
______________

Nota do editor:

Último poste da série > 17 de setembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12052: Efemérides (143): Passados 41 anos o reencontro com o camarada d’armas Eduardo Ferreira do 1º Pelotão da CART 3494 (Sousa de Castro)

Guiné 63/74 - P12075: Recortes de imprensa (67): a situação, em Portugal, dos nossos camaradas guineenses (Deutsche Welle Africa)


Recorte da página da DW - Deutsche Welle, a emissora alemã que emite em português para a África


1. Peça do jornalista João Carlos, correspondente em Portugal da DW África, disponível hoje na página oficial daquela estação de rádio, e já anunciada em poste anterior, P12065, de  21 do corrente. O ficheiro áudio (5' 55'') pode ser ouvido aqui, na íntegra.

Tomamos a liberdade de, com a devida vénia, reproduzir alguns excertos da peça:

(...) A propósito do quadragésimo aniversário da independência da Guiné-Bissau, que se assinala dia 24 de setembro, a DW África foi conhecer a história de alguns antigos combatentes guineenses que vivem em Portugal. Um deles é Racido Bari. Vive sozinho em Queluz-Belas, nos arredores de Lisboa. Foi soldado, telegrafista de Infantaria "na área das comunicações militares. Esta era a minha especialidade. Vim para aqui em 1989".

Veio de Bissau com o objetivo de reunir os documentos necessários e requerer ao Ministério do Exército a constituição de um processo sumário por ter sido ferido em combate. Mas a resposta dada pela instituição portuguesa foi que "não podiamos ter a documentação, como bilhete de identidade. Teriamos que ficar aqui 6 anos, como cidadãos estrangeiros", conta Racido Bari.

Já Julde Jakuité, outro dos feridos de guerra, mora com a mulher no concelho do Seixal, na outra margem do rio Tejo. "Sou furriel graduado no Exército Português e na altura, no tempo da guerra, diziam que o furriel recebe um ordenado compatível com o dos brancos". Jaquité faz parte da Associação dos Antigos Combatentes da Guiné-Bissau em Portugal. Como ele, há colegas seus que vivem também em situações difíceis. Conta que "muita gente está a morrer. Alguns estão com problemas de trombose por causa dos nervos". Outros sofrem "de traumas de guerra". Jaquité afirma que "é a dificuldade que faz isso".


(...) Mas, passados estes anos todos, os direitos de muitos dos soldados ou milícias recrutados localmente foram ignorados. Desprezados até, como nos diz Luís Graça, furriel do exército português na companhia africana, entre 1969 e 1971 [Foto à esquerda, com dois dos miliatres da CCAÇ 12, do 4º Gr Comb, 2ª secção, José Carlos Suleimane Baldé e Umaru Baldé, Setor L1, Bambadinca, Finte, 1969. Foto de L.G.].

 A falta de reconhecimento dos direitos dos militares guineenses é para Luís Graça " uma coisa que me doi a mim enquanto português e antigo combatente e amigo dos guineenses". Para ele "esse problema não foi resolvido e portanto, há muitas situações dramáticas lá e cá. Lá ainda pior..."


(...) Lamentam os militares guineenses que o Governo português não cumpriu o Acordo de Argel de 1974. O acordo diz que Portugal pagará as pensões de sangue, de invalidez e de reforma a quaisquer cidadãos da República da Guiné-Bissau por motivos de serviços prestados às Forças Armadas Portuguesas. Devido às alterações da lei ao longo dos anos, há casos de ex-militares portugueses, angolanos, moçambicanos e guineenses que não são considerados deficientes das Forças Armadas, consoante o grau de invalidez, refere Jakuité. "Alguns até não conseguem resolver os problemas da junta médica," porque apesar do hospital militar ter dado a confirmação na altura que essa pessoa esteve internada, o governo exige testemunhas.

Mas Jakuité questiona o motivo do governo as exigir, "quando a maioria dos comandantes já morreu, os sargentos, os alferes morreram", então "como é que esta pessoa vai resolver o problema dele?" E por este condicionamento, o antigo combatente afirma que "há algumas pessoas que ficam ali 4, 5, 6 anos à espera que a pensão seja paga".

 (...) Há companheiros há vários anos à espera que o Governo Português lhes atribua uma pensão de invalidez. Alguns recebem na ordem dos 400 euros mensais. É o caso de Racido Bari. "Eu vivo aqui com dificuldades enormes, porque eu pago a renda sozinho, só para mim, 150 euros. Mas o que posso fazer? Não tenho outra alternativa".

Jakuité vive com 530 euros e tem o seu processo arquivado na Procuradoria Geral da República. Considera que tem havido um tratamento de injustiça comparado com colegas portugueses. Conta que "hoje um posto de furriel ganha à volta de 1000 euros, e a mim, nem me pagam o posto que eu tinha. Estou mesmo revoltado com isso".

(...) Depois dos sacrifícios consentidos nos anos dramáticos de guerra, exigem ser tratados com dignidade. Luís Graça refere que não se pode generalizar o problema, mas reafirma que ainda existem cidadãos guineenses que lutam para serem reconhecidos os seus direitos. "O problema mais dramático, até por razões culturais, é o problema de integração dos guineenses, que foram antigos soldados portugueses e nunca houve uma política orientada para os ajudar, para os integrar, para haver um reconhecimento dos seus direitos" como "os direitos de reforma". Afirma que houve alguns que o conseguiram como "Marcelino da Mata, é um exemplo de um homem guineense, militar que acabou por ser integrado, e hoje é coronel do Exército Português." Contudo, Luís Graça sublinha que "o caso do Marcelino da Mata é uma excepção, não é a regra." 

(...) Entretanto, a DW África apurou, perante o impasse na solução destes casos, que um grupo de antigos combatentes guineenses está a preparar condições para interpor uma ação judicial contra o Estado português junto de instâncias internacionais, entre as quais o Tribunal de Haia.
(Itálico, negrito e realce a amarelo, nossos, LG).
________________

Nota do editor:

Último poste da série > 20 de junho de 2013 > Guiné 63/74 - P11735: Recortes de imprensa (66): Osvaldo Lopes da Silva, então comandante do PAIGC, e um dos principais responsáveis pela Op Amílcar Cabral, sustenta, na mesa-redonda, em Coimbra, no passado dia 23/5/2013, a versão do cerco total ao quartel de Guileje e afirma que as forças sitiantes dispunham de um dispositivo (do qual teria sido utilizado menos de 10%), com condições para actuar durante um mês (AngopPress)

Guiné 63/74 - P12074: Notas de leitura (522): "No Ocaso da Guerra do Ultramar", por Fernando de Sousa Henriques (2) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 31 de Maio de 2013:

Queridos amigos,
O nosso malogrado confrade Fernando de Sousa Henriques descreve neste texto de recensão o assédio brutal a Canquelifá.
Estamos num local e num tempo da guerra de guerrilhas da Guiné onde o PAIGC já se move como num teatro de guerra convencional, traz viaturas e despeja em rampas os foguetões sobre os objetivos. Pelo que ele tão discretamente narra, o abandono de Copá teve foros de dramatismo. Nos primeiros tempos, a aviação ainda se afoitou a procurar castigar as peças de artilharia que desfaziam Canquelifá. Depois atingiram um avião, as coisas mudaram. Até porque um mês depois chegou o 25 de Abril.

Um abraço do
Mário


No ocaso da guerra do Ultramar (2)*

Beja Santos

“No ocaso da guerra do Ultramar”, por Fernando de Sousa Henriques, já foi dito, é uma narrativa sem rival nesta literatura da nossa guerra. O autor prometera aos seus camaradas de Batalhão escrever esta crónica sobre a vivência de todos no Leste da Guiné, com fronteiras com o Senegal e a Guiné-Conacri, entre 1972 e 1974. E concretizou a sua promessa, dirigindo-se a um leitor não iniciado descreveu armamentos e equipamentos, a composição da máquina de guerra, as entidades civis intervenientes, como fizera e onde a sua formação militar, narrou detalhadamente as vicissitudes passadas pelo BCAÇ 3883 e particularmente a CCAÇ 3545, a sua companhia, que irá viver o terrível assédio de Canquelifá, perto do termo da guerra.

Nunca encontrei relato que se aparentasse com este, não é uma questão zelo burocrático, é a nítida vontade de inserir o leitor num ambiente de Piche e quartéis envolventes, deu-se ao cuidado de explicar o que era o reino de Pachisse, caracterizou Canquelifá, todas as instalações do aquartelamento, os usos e costumes de Fulas e Mandingas, as acessibilidades, as milícias locais, os guias e colaboradores, o sistema de informações naquela área tão sensível, dá-se mesmo ao cuidado de contar, em resumo, os principais factos relacionados com o Batalhão que foram render e como se processou o período de sobreposição. Igualmente minucioso com o quotidiano de todo o efetivo militar e assim chegamos à guerra propriamente dita.

O sector do BCAÇ 3883 tornou-se repentinamente explosivo em 1973. O PAIGC saíra beneficiado da retirada das tropas portuguesas do Boé, paulatinamente foi-se aproximando de populações hostis e urdiu uma estratégia de clara intimidação a partir de 1972, começou por privilegiar as emboscadas nos principais eixos de comunicações. Em Agosto de 1973, entre Piche e Canquelifá fez um ataque feroz e observa que depois destes acontecimentos nada ficou como dantes. O próprio capitão Peixinho de Cristo ficou abalado, ele que assistiu à morte de um dos seus soldados, atingido gravemente nos intestinos, conversou com ele até ao final, dele recebeu, entre gemidos, as últimas vontades. As minas anticarro começaram a proliferar. O moral da companhia baixou.

A partir de Novembro, não mais houve descanso em Canquelifá, repetiram-se as flagelações, os mísseis deram entrada nas flagelações frequentes, era nítido que os guerrilheiros queriam comprometer os reabastecimentos e acantonar as tropas aos seus quartéis. As emboscadas às obras da estrada Piche-Nova Lamego também se acentuaram. Em dezembro houve um relativo descanso mas os assaltos às tabancas deram frutos, as populações, ainda lentamente, começaram a fugir para os grandes centros.

No início de Janeiro, os ataques com foguetões a Canquelifá marcaram presença, o autor explica a natureza das destruições que as imagens, pela sua eloquência, desfazem todas as dúvidas. Mas não só Canquelifá, Piche e Buruntuma também foram contempladas. Nessa altura os efetivos do Batalhão levam quase 24 meses de Guiné, foi necessário pedir apoio à CCAÇ 21, uma companhia só de guineenses, comandada pelo tenente Jamanca. Em 7 de Janeiro a CCAÇ 21 surpreende uma força inimiga e traz dois corpos, um cubano e cabo-verdiano. As flagelações recrudesceram. Ia começar o martírio de Copá, um destacamento que irá ser abandonado por impossibilidade de defesa. As picagens tornaram-se um tormento. De 19 a 21 de Março, Canquelifá é sujeita a bombardeamentos consecutivos, a partir de diversas bases de fogos situados a Leste e a Norte do aquartelamento. Quartel e tabanca estão irreconhecíveis, o gerador elétrico inutilizado, muitos edifícios queimados, um dos paióis periféricos da artilharia escapou milagrosamente. O desgaste psicofísico das tropas é enorme. As tabancas vizinhas começam a desertificar-se, a própria população civil de Canquelifá começa a retirar. O autor escreve: “Canquelifá passara a ser o epicentro de um vulcão, pronto a explodir. Era a capital do reino de Pachisse, um território ancestral e carismático, o único com fronteiras com o Senegal e Guiné-Conacri. Canquelifá era um alvo a abater para maior projeção externa do PAIGC”.

Em capítulo separado, o autor descreve os derradeiros dias do destacamento de Copá: “A partir do início de Fevereiro, esse destacamento passou a estar sujeito a fogo de morteiro de 120 mm, com intensidade variável, mas algumas das vezes até inusitada. Dentro, não havia a possibilidade de levantarem a cabeça”. Na segunda quinzena de Fevereiro, depois de uns três dias seguidos de assédio a Copá, foram aparecendo aos poucos e em pequenos grupos os elementos provindos daquele destacamento. “O pessoal vinha todo sujo, camuflado, se existia, em desalinho, arma às costas ou ao ombro, desorientado e de olhar perdido. Enfim, uma lástima. Tinham fugido do inferno em que Copá se transformara. Sem o saberem, deixaram para trás o furriel, o operador das transmissões e talvez outros. Aquilo parecia deserção. Confrontados com a ideia de regresso, diziam que preferiam ser mortos”. Lá foram convencidos a juntarem-se a quem permanecera no posto de combate, juntaram-se ao furriel, e então regressaram todos.

Em 21 de Março, chega ao aquartelamento o major Raul Folques, vinha a comandar duas companhias de comandos africanas. Detetaram uma base inimiga, atacaram-na, veio a Força Aérea e rechaçou-os, o PAIGC terá tido 26 mortos, entre eles 2 cubanos, capturam-se 2 morteiros 120 completos e 2 incompletos. Os Comandos, no decorrer da refrega, sofreram 2 mortos e 20 feridos. A seguir, fez-se uma nova coluna de reabastecimento, os guerrilheiros apareceram em peso mas a resposta das nossas tropas foi enérgica. As minas prosseguiram, mesmo a seguir ao 25 de Abril.

O BCAÇ 3883 deixou a Guiné em Junho de 1974. Fernando Sousa Henriques descreve emocionado as despedidas de todos, enumera e louvores e distinções de todo o Batalhão, e ao longo dos anos, os convívios sucessivos. Procede à relação nominal dos efetivos e não descura o espólio fotográfico relacionado com o sector L4. São impressionantes as imagens de Canquelifá em fase de destruição, os aspetos desoladores da tabanca, vemos mulheres e crianças catando nas cinzas os seus pobres bens pessoais, vemos as colheitas a arder, um canhão sem recuo completamente destruído. Fernando de Sousa Henriques cumpriu cabalmente o objetivo a que se cometera, nada de mais minucioso, segundo sei, se fez à volta da história de um Batalhão, de uma Companhia, de uma vivência. O autor já não está entre nós, ainda voltou à Guiné, escreveu em 2011 “Picadas e caminho da vida na Guiné”, na mesma altura em que aderiu ao nosso blogue.
____________

Nota do editor

(*) Vd. poste de 20 de Setembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12061: Notas de leitura (521): "No Ocaso da Guerra do Ultramar", por Fernando de Sousa Henriques (1) (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P12073: Notícia dos nossos amigos da AD-Bissau (29): Efeméride: Há 40 anos era proclamada, unilateralmente, a independência da Guiné-Bissau... (Não em Cubucaré, no sul, como estava inicialmente previsto, mas no leste, na região do Boé... E aqui não foi em Madina do Boé, nem em Lugajole, mas sim em... Vendu Leidi, um lugarejo fronteiriço)






A independência da Guiné-Bissau foi proclamada, unilateralmente,  pelo PAIGC, em 23 de setembro de 1973, na região do Boé, não em Madina do Boé, como durante anos se fez crer, nem sequer em Lugajole, mas sim em Vendu  Leidi, localidade fronteiriça da zona leste... Esteve inclusive planeada para ser no sul, na península de Cubucaré  (setor de Bedanda)... Os planos do PAIGC foram sucessivamente açterados, à última da hora, pro razões de segurança. Havia sérios riscos de bombardeamentos pela Força Aérea Portuguesa.

Hoje o dia 24 de setembro é feriado nacional na Guiné-Bissau. Portugal, como é sabido, só reconheceu a independência da Guiné-Bissau, um ano depois, em 10 de setembro de 1974.

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2013).


 E a propósito desta iniciativa comemorativa, de um grupo de antigos combatentes do PAIGC do Cubucaré, na região de Tombali,  lê-se no sítio da AD-Bissau:

(...) Como jovem país, embora com conturbados desvios no seu caminho, [a Guiné-Bissau] procura recuperar a sua própria identidade e força para se afirmar como uma nação moderna e progressiva.

As sucessivas lideranças que fomos tendo, esqueceram-se claramente do pensamento de Amilcar Cabral e dos ensinamentos da Luta, embarcando em sucessivas aventuras militaristas e afastando-se dos ideais do Combate inicial.

Há quem chegue a pensar que a Luta foi uma operação militar e que por isso, todos os outros que a ela aderiram e que não pegaram em armas, não têm os mesmos direitos dos que vestem as fardas, grande parte delas apanhadas nos becos da História.

 (...) 
Todos contribuíram decisivamente para a vitória, incluindo mesmo aqueles que, durante estes 40 últimos anos, se esqueceram das tabancas onde vivem todos os seus antigos camaradas de Luta, para se sentarem a descansar em Bissau.(...)

______________

Guiné 63/74 - P12072: Parabéns a você (628): Tony Borié, ex-1.º Cabo Op Cripto do Comando Agrupamento 16 (Guiné, 1964/66)

____________

Nota do editor

Último poste da série de 21 DE SETEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12064: Parabéns a você (627): Coutinho e Lima, Coronel Art.ª Ref (Guiné, 1963/65; 1968/70 e 1972/73); Maria Teresa Almeida, Liga dos Combatentes e Raul Albino, ex-Alf Mil da CCAÇ 2402 (Guiné, 1968/70)

domingo, 22 de setembro de 2013

Guiné 63/74 - P12071: Inquérito online: 40 anos depois da proclamação (unlilateral) da independência da Guiné-Bissau, a 24 de setembro de 1973, como vês o futuro das relações (políticas, diplomáticos, económicas, sociais, culturais, etc.) deste país lusófono com Portugal ? Com pessimismo, indiferença ou otimismo ? Resposta até 27/9/2013

Amigos e camaradas da Guiné:

Há uma sondagem a decorrer a propósito dos 40 anos da procalamação (unilatertal) independência da Guiné-Bissau, efeméride que se comemora na próxima 3ª feira, dia 24 de setembro...

Queremos saber qual a vossa atitude em relação ao futuro das relações da Guiné-Bissau com Portugal... Pesimismo, indiferença, optimismo ?

Sejam gentis, respondam "on line"... A sondagem vem no canto superior esquerdo do blogue.... Respondam LÀ, diretamente, não aqui... Aqui, podem comentar, justificando ou fundamentando o vosso voto... Sejam espontâneos, sinceros, intuitivos... Não se trata de "acertar" mas de "adivinhar" o futuro... A resposta não é fácil... Há muitas variáveis em jogo...Mas a vossa "intuição", o que é que vos diz ? Até à data, já temos 20 e tal respostas...


Sondagem > 40 anos depois da independência da Guiné-Bissau, a 24 de setembro de 1973, vejo o futuro das relações (políticas, diplomáticos, económicas, sociais, culturais, etc.) deste país com Portugal  com...

[Resposta numa escala de 1. Muito pessimismo, 
a 7. Muito otimismo... Só se pode escolher uma hipótese de resposta. Na vigência da sondagem, a decorrer durante seis dias, a partir de 21 do corrente, pode-se mudar o voto, sempre que se quiser...]


1. Muito pessimismo
2. Bastante pessimismo
3. Algum pessimismo
4. Indiferença. nem pessimismo nem otimismo
5. Algum otimismo
6. Bastante otimismo
7. Muito otimismo


Um abraço. O editor, Luís Graça

Guiné 63/74 - P12070: Estórias dos Fidalgos de Jol (Augusto S. Santos) (14): A minha passagem pelo Depósito Geral de Adidos, em Brá

1. Em mensagem do dia 19 de Setembro de 2012, o nosso camarada Augusto Silva Santos (ex-Fur Mil da CCAÇ 3306/BCAÇ 3833, Pelundo, Có e Jolmete, 1971/73), enviou-nos mais uma história dos Fidalgos de Jol.

Olá Camarada e Amigo Carlos Vinhal
Antes de mais, que esteja tudo bem contigo e família, são os meus sinceros votos.
Já há algum tempo (quase um ano) que não te "brindava" com mais uma das minhas estórias, pelo que resolvi, mais uma vez, vasculhar o meu baú e "sacar" algumas memórias da minha passagem por terras da Guiné. Além do mais, importa continuar a "alimentar" o nosso blogue... 
Nesta perspectiva, junto estou a enviar ficheiro que relata a minha passagem pelo Depósito de Adidos em Brá, após ter deixado de pertencer à CCAÇ 3306/BCAÇ 3833, mas que por uma questão cronológica gostaria que continuasses (caso aches oportuno) a incluir nas "Estórias dos Fidalgos do Jol" sob o título "A minha passagem pelo DA".
Deixo ao teu critério.
Junto seguem também ficheiros com algumas fotos que poderás publicar de acordo com as minhas sugestões, ou fazê-lo como melhor entenderes.
Muito obrigado pela tua disponibilidade em continuares ao "serviço" das nossas memórias.

Recebe um Grande e Forte Abraço
Augusto Silva Santos


ESTÓRIAS DOS FIDALGOS DE JOL

14 - A MINHA PASSAGEM PELO DA

Depois da partida do BCAÇ 3833 para a metrópole no navio Uíge, que ocorreu em Dezembro de 1972, fui colocado no Depósito Geral de Adidos em Brá. Naquele Batalhão pertenci à CCAÇ 3306 colocada Jolmete, para onde fui em rendição individual.


Crachá do Depósito de Adidos

No Depósito de Adidos, para além do serviço na Secção de Justiça como escrivão, tinha também periodicamente, para além dos serviços inerentes à Unidade, a missão de fazer Sargento de Dia à Casa de Reclusão Militar.
Lembro-me que no primeiro dia em que isso aconteceu, no Render da Guarda tinham desaparecido 12 reclusos, que entretanto ao longo da semana foram voltando. Na segunda vez desapareceram mais 5, que mais tarde também voltariam a aparecer.
Esta era uma situação comum com outros camaradas que faziam esse mesmo serviço, que igualmente se queixavam e viviam o problema.

Brá / Depósito de Adidos, Fev1973

Nunca ninguém (pelo menos no meu tempo) chegou a saber ao certo por onde os presos fugiam, só sei que eles saíam para ir ao Pilão a Bissau (às “meninas”) e deliciarem-se com alguns petiscos, e que mais tarde voltavam sempre (alguns obviamente eram apanhados pela PM). Tive alguns dissabores (ameaças de levar uma “porrada” se os reclusos não aparecessem), pelo que a partir de determinada altura e, por sugestão de outros camaradas mais antigos (inclusivé de um 1.º Sargento), combinei com um dos reclusos (o mais velho, um Fuzileiro com a alcunha de “Grelhas” e que se dizia havia tido um “confronto directo” com o Cor. Paraquedista Rafael Durão, tendo este como consequência, partido uma mão), para fazer uma “escala de saída”, com a condição de todos estarem presentes ao Render da Guarda.
Remédio santo, ou seja, nunca mais faltou nenhum recluso quando estava de serviço.
A esta distância parece caricato, mas o que é certo é que a “medida” funcionou (para mim e para os reclusos).



Brá / Casa de Reclusão Militar, Mar1973 – Em convívio com alguns reclusos por ocasião de um aniversário. O camarada ao fundo, de óculos e barba, é o Carlos Boto, já aqui referenciado por outros camaradas

O meu relacionamento com a maioria dos reclusos era regra geral muito cordial e sem grandes problemas. Alguns eram considerados como “perigosos” por terem cometido crimes com alguma gravidade no teatro de operações ou no interior das suas unidades, mas sinceramente nunca observei nada que me levasse a acreditar nessa perigosidade ou a ter receio fosse do que fosse.
Relembro que, na sua maioria, eram camaradas nossos, que pelos mais diversos motivos haviam caído nesta situação. De qualquer forma não deixavam de o ser (camaradas), pelo que assim sempre os considerei, embora com as limitações a que a situação obrigava.

Brá / Depósito de Adidos

Quando já me faltavam escassos 3 meses para acabar a comissão, por ter discordado de uma ordem mal dada por um oficial (o que viria a ser confirmado) e chegado a via de factos, fui castigado com 5 dias de detenção. Só não apanhei 5 dias de prisão porque tinha dois louvores e tive vários Furriéis e Sargentos que presenciaram os factos a testemunharem em meu favor.

Foi-me na altura dito pelo então Comandante do Depósito Geral de Adidos, um tal Major Francisco Ferreira, de alcunha “o Galo” por andar sempre todo emproado (usava um boné à Hitler), que eu tinha razão, mas que a democracia ainda não tinha chegado à tropa (sic), e que a ordem de um superior, mesmo mal dada, era para ser sempre cumprida.
Como consequência, fui ainda castigado com o ter de fazer a guarda de honra ao General Spínola, na sua última deslocação a este aquartelamento, o que para mim na altura até foi mesmo uma honra.

Brá Depósito de Adidos – No dia em que fiz a última Guarda de Honra ao General Spínola, antes do seu regresso a Portugal

Lembro-me que, nos finais de 1973, era já grande a tensão entre as NT, principalmente por acontecimentos como os de Guileje e Guidaje (entre outros), factos dos quais íamos tomando conhecimento por relatos dos de camaradas que pelo Depósito de Adidos iam passando.
O facto de o PAIGC possuir os mísseis terra-ar Strela, passou a ser um grande problema para a nossa força aérea. Também me recordo de Bissau começar então a ser cercada de arame farpado e da colocação de minas nalgumas zonas da sua periferia, e de nos ter sido comunicada a possibilidade de podermos vir a sofrer em qualquer altura um ataque por terra ou por ar, por também constar que o IN já possuía os famosos MIGs.

Isto passou-se perto do final de Dezembro de 1973, altura em que terminei a minha comissão e regressei a Portugal.
____________

Nota do editor

Último poste da série de 7 DE OUTUBRO DE 2012 > Guiné 63/74 - P10495: Estórias dos Fidalgos de Jol (Augusto S. Santos) (13): Aventura com final feliz: O Cabo 'Bigodes', o Dandi e a mulher mais velha do Dandi...