quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Guiné 63/74 - P9398: Documentos (15): Situação Militar no TO da Guiné no ano de 1974: Relatório da 2ª REP/QG/CTIG: Transcrição, adaptação e digitalização de Luís Gonçalves Vaz (Parte III)

Relatório da 2ª REP/QG/CTIG (1975), p. 47. Sobre a emboscada do 9 de maio de 1974 na estrada Jugudul-Bambadinca, vd. aqui o poste do Jorge Canhão.

Relatório da 2ª REP/QG/CTIG (1975), p. 48





Relatório da 2ª REP/QG/CTIG (1975), p. 49. Segundo o nosso camarada José Zeferino, a violenta emboscada no itinerário Bambadinca-Mansambo-Xitole, junto à ponte do Rio Jagarajá, em 15 de maio de 1974, terá sido a última emboscada do PAIGC, com mortos (2) do nosso lado, na zona leste. QA 18 e a 26 de maio, ainda haverá duas emboscadas no itinerário Farim-Jumbembem, na zona oeste (de acordo com o presente relatório).




Relatório da 2ª REP/QG/CTIG (1975), p. 50




 Relatório da 2ª REP/QG/CTIG (1975), p. 51... Referência a Bobo Queta, ou Bobo Keita, do PAIGC,  que comandava  então a zona leste.



1. Continuamos a publicar páginas, digitalizadas,  do relatório da 2ª rep/CTIG, que nos foram foi gentilmente enviadas pelo Luís Gonçalves Vaz [, foto à esquerda], a partir de um exemplar pertencente ao arquivo pessoal de seu pai, cor cav CEM  Henrique Gonçalves Vaz, último chefe do estado-maior do CTIG (1973/74), entretanto falecido em 2001 (*).
Excertos do "Relatório da 2ª Repartição do QG do CTIG”, Relativo ao período de 1Jan73 a 15Out74... Reprodução das páginas 47-51 (Síntese da atividade de guerrilha, por zona (oeste, lestte e sul) > 1. Ações de guerrilha do PAIGC depois do 25 de abril de 1974; 2. Outras ações)... Neste período o aquartelamento das NT mais flagelado foi Jemberém, no Cantanhez: 7 vezes (a 1, 2, 6, 9, 13, 24 e 27 de maio de 1974).




Como já foi dito anteriormente, o relatório tem 74 páginas, é datado de 28 de Fevereiro de 1975 (data da sua publicação ?), não está numerado (seria um exemplar para o CEM?), mas é um original pelo aspecto, e está assinado pelo Major de Infantaria, Tito José Barroso Capela (que o Luís Vaz soube, entretanto, ter agora o posto de major general, reformado).

O relatório contem as seguintes indicações: "SECRETO [carimbo a vermelho]. Exemplar nº [em branco] . CL/QG/CTIG. 2ª Repartição. Lisboa. 2810hFev75... Relatório da 2ª Rep CC/FAG (Relativo ao período de 1Jan73 a 15Out74)"..



Imagens: © Luís Gonçalves Vaz (2011). Todos os direitos reservados.


2. Continuamos, por outro lado,  a publicar excertos que o Luís Vaz teve a gentileza de adaptar e transcrever:

(...) Análise da atividade de guerrilha:

Avaliado pelo quantitativo de ações,  a atividade de guerrilha da iniciativa do PAIGC em 1973  aumentou cerca de 35% em relação ao ano anterior. Por sua vez em 1974, no final de Abril, aquele quantitativo era 50% superior ao total registado nos primeiros quatro meses de 1973.


A ação do PAIGC vinha sendo caracterizada por um aumento significativo das ações de fogo, em detrimento das ações de terrorismo (raptos e roubos), orientando-se este, cada vez mais, para ações de terrorismo seletivo e sabotagens.


Pág. 13 do relatório: Síntese da atividade do PAIGC (ações de fogo, ações de terrorismo e outras): Ano de 1972, ano de 1973, ano de 1973 até 30Abr73, ano de 1974 até 30Abr874.... 

Fonte: Relatório da 2ª Rep /CCGAF [1975]



Era notória a evolução no sentido do abandono progressivo da atividade de guerrilha dispersa em superfície, em proveito das ações maciças contra objetivos definidos, obrigando a grandes balanceamentos de meios, por vezes, envolvendo elementos de todo o Teatro de Operações.


Estas características eram indicadores seguros do aumento de agressividade das FARP e da sua maior capacidade ofensiva, potencial e eficiência.








Em reforço da conclusão precedente, menciona-se o aparecimento de novas armas durante o período considerado (Míssil Strela e viaturas blindadas) e um maior emprego de outras (Morteiro 120 mm, Foguetão 122 mm, Canhão 85 mm, Canhão 130 e minas especiais).


Finalmente, a situação militar revelou nítido agravamento a partir de Dezembro de 1973, em especial nas Zonas Sul e Leste do Território [, como se pode ver nas páginas - de 47 a 51 - reproduzidas acima].

Estimava-se que,  em 1973/74, o potencial humano do PAIGC tenha atingido cerca de 7 500 combatentes, 4 500 integrados no Exército Popular e 3 000 nas Forças Armadas Locais. Além disso, os elementos disponíveis permitiam estimar que no princípio de 1974, se encontravam em instrução no CIPM de Kambera (dita Madina do Boé) cerca de 300 elementos por trimestre e que nos CI (centros de instrução) dos países de Leste da Europa e Cuba permaneciam 500 elementos dos seus quadros em diversos graus de preparação.

Durante a ofensiva de Maio/Junho de 73 e 1º trimestre de 1974, foi referenciado a presença de elementos estranhos ao PAIGC, provavelmente mercenários, de tez clara, não se conseguindo avaliar o seu efetivo nem determinar a sua nacionalidade (+).
A evolução do material inimigo continuava a processar-se em ritmo crescente e, ao longo do período, foram detetadas novas armas na posse do PAIGC e maior quantidade de outras já existentes de entre as quais se destacam: Míssil SA-7 STRELA (Soviético), Morteiro 120 mm, Foguetão 122 mm, Canhão 130 mm e viaturas Blindadas BRDM-2.
Quanto a meios aéreos, apesar de várias notícias o referirem com insistência, o PAIGC ainda não dispunha de Aviação para apoio aéreo eficaz. Sabia-se da existência de Aviões ligeiros na República da Guiné e era referenciado grande número de sobrevoos suspeitos, nomeadamente com MIG-17 [ foto à esquerda,]  e helicópteros.
Admitia-se, entretanto que a situação evoluísse, e que o PAIGC pudesse vir a dispor de alguns aviões (cedidos pela República da Guiné-Conacri). Sabe-se,  de fonte segura, que estavam na Rússia, para frequentar um curso de pilotagem (desconhece-se o tipo de avião), 28 recrutas do PAIGC.


Neste contexto, em Abril de 1974, face ao aumento do potencial militar do PAIGC, ao recrudescimento da guerrilha que se verificava desde Abril de 1973, a alguns êxitos espectaculares da mesma (abandono de Guileje, no Sul, e Copá, no Leste) e ao alastramento de atos de sabotagem ou terrorismo aos principais centros Urbanos, incluindo Bissau onde o próprio QG/CTIG não foi poupado (++), o anterior sentimento de proteção pela força existente no seio da população que se acolhia junto das nossas tropas estava muito afetado. Para isso muito contribuía a redução das evacuações por meios aéreos, originada pelo aparecimento dos mísseis Strela, e a fraca dissuasão obtida pela artilharia das nossas tropas face aos frequentes ataques com Foguetão 122mm [, foto acima, de Nuno Rubim].

Começaram a ser frequentes os pedidos, formulados por diversas povoações, solicitando melhor proteção e que as guarnições fossem dotadas de armamento mais eficaz, em especial artilharia de maior alcance que o Foguetão 122 mm. (...)
 
Continua


Adaptado por: Luís Gonçalves Vaz (Tabanqueiro nº 530)
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Notas de Luís Gonçalves Vaz:

(+) Vd nota do Coronel Henrique Gonçalves Vaz, Chefe do Estado-Maior do CTIG, de 7 de Janeiro de 1974:

 "(...) Soubemos hoje à noite, que em Canquelifá, foram mortos em combate, 6 Cubanos (?) e mais 6 Africanos do IN. Uma equipa fotográfica do Batalhão Fotocine seguiu de madrugada para lá, a fim de obter imagens" (...)."].

(++) Ver nota do Coronel Henrique Gonçalves Vaz, Chefe do Estado-Maior do CTIG, de 22 de Fevereiro de 1974:

   " (...) Cerca das 19h e 10 min, quando me encontrava na gabinete do brigadeiro Comandante Militar, com este e com o Brigadeiro 2º Comandante, rebentou um explosivo colocado na casa de banho que a destruiu, assim como algumas das dependências contíguas. A forte deslocação do ar rebentou a porta e os vidros que foram projectados em frente, onde se encontrava o Brigadeiro 2º Comandante, de pé, e que caiu na direcção onde eu me encontrava sentado. O Brigadeiro Comandante Militar sentado na minha frente ainda sofreu. O 2º Comandante foi levado para o Hospital de Bissau, visto sangrar bastante de uma ferida na parte posterior da cabeça. Eu tive leves arranhões, de que me tratei no posto de saúde da CCS.. Estavam também presentes, no Gabinete Central, o Major Ferreira da Costa e o Tenente Abrantes ….Ninguém ficou ferido gravemente. Foi um verdadeiro milagre!" (...)

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Nota do editor:


Guiné 63/74 - P9397: Em busca de... (179): Manuel Vaz, ex-Alf Mil da CCAÇ 798, procura fotos aéreas de Gadamael

EM BUSCA DE... FOTOGRAFIAS AÉREAS DO AQUARTELAMENTO DE GADAMAEL


1. O nosso camarada Manuel Vaz* (ex-Alf Mil da CCAÇ 798, Gadamael Porto, 1965/67) está a fazer um trabalho sobre Gadamael e precisava de fotos com vistas aéreas daquele aquartelamento para servir de auxiliar de memória. Assim solicita-se a quem eventualmente as possua, o favor de enviar ao nosso camarada (ou ao Blogue) digitalizações das mesmas.

O nosso tertuliano agradece desde já a boa vontade e disponibilidade dos camaradas pois estamos assim a contribuir para a feitura da história da Guerra na Guiné.


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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 8 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9329: Memórias da CCAÇ 798 (Manuel Vaz) (5): Uma perspectiva a partir de Gadamael Porto - 65/67 - V Parte - Defesa do aquartelamento

Vd.último poste da série de 25 de Dezembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9264: Em busca de... (178): Meus camaradas Leite, Lopes, Dinis, Ramalho, Veloso... da CCAÇ 2679 (Bajocunda, 1970/71) (Manuel Soares, ex-Sold Cozinheiro)

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Guiné 63/74 - P9396: Memórias de Manuel Joaquim (5): Raios e Carícias


1. Mensagem de Manuel Joaquim (ex-Fur Mil de Armas Pesadas da CCAÇ 1419, Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67), com data de 6 de Janeiro de 2012:

Meus queridos camaradas
Na sequência da resposta que dei à mensagem do Luís Graça, com data de 17/janeiro, envio este pequeno texto.

Um afetuoso abraço
Manuel Joaquim


Guiné, 1965/67 – RAIOS E CARÍCIAS

Raios das tempestades que nos cegavam e, ao som dos trovões, pareciam dizer que não éramos benvindos.
Raios de sol dourados, belos e acariciantes, furando a copa da floresta para beijarem o seu chão, mas impotentes para nos afastarem do medo, da dor e da morte.
Raios saídos da boca das armas violando, inesperada e despudoradamente, os silêncios da floresta ou das suas sagradas clareiras, feitas altares de sacrifício em favor de um qualquer deus desconhecido.
Raios dardejantes vindos do deus Sol para nos crestarem, raios sedentos e impassíveis que nos roubavam a água sem pejo em nos matarem.
Raios suaves do luar que, parecendo banharem-nos com carinho, nos abandonavam de repente, atirando-nos para a escuridão ameaçadora da noite.
Raios que fulminavam, mas não a triste solidão nem as espessas trevas que por vezes nos envolviam a alma.
“Raios” inesperados saídos do amor, da amizade e da camaradagem que nos davam força e coragem para aguentar.
“Raios” de palavras que tentavam atingir certas ideias, achadas estranhas e perniciosas.

Carícias que saravam, outras agravavam a dor.
Carícias inesperadas vindas de olhares inesperados, sinais de que ainda havia mundo para além da “nossa guerra”.
Carícias traiçoeiras vindas dos lodos do tarrafo ou da neblina da bolanha.
Carícias dos poentes flamejantes saturados de cores púrpura, vermelho e ouro que nos deixavam esmagados com tanta beleza.
Carícias do crepúsculo que em vez de apaziguarem nos aumentavam o temor da noite próxima.
Carícias das gotas de chuva escorrendo-nos pelas faces, lentamente namorando as de suor, envoltas nos aromas fortes e fecundos da terra.
Carícias ausentes quando delas precisava a nossa alma, ao ver-se vergastada por medos e angústias e mesmo pelo horror.
Carícias recebidas nas palavras dos entes queridos que nos amparavam em momentos de solidão e desamparo.

Raios e carícias, ainda me lembro bem. Foram um fortíssimo tempero naquela famigerada “comida” que me serviram na Guiné. E acho esquisito ver-me hoje a acariciar estas recordações. Com mil raios, aguentei e ainda por aqui ando!
Raios partam as guerras! Raios partam os governos que as alimentam! Raios me partam se não foi verdade tudo isto!
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 19 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9374: Memórias de Manuel Joaquim (4): Que parvo que eu fui, e uma mãe que apanhou um grande susto

Guiné 63/74 – P9395: In Memoriam (106): Está de luto a CCAÇ 3549, pelo desaparecimento do Mário da Conceição Guedes Teixeira, o "Porto" (José Cortes)



1. O nosso camarada José Cortes, ex-Fur Mil At Inf da CCAÇ 3549/BCAÇ 3884 (Fajonquito, 1972/74), enviou-nos mais uma triste e lamentável mensagem com data de hoje, dia 24 de Janeiro de 2012.


Faleceu o "PORTO"

Pois é companheiros, o meu companheiro da CCAÇ 3549 - Mário da Conceição Guedes Teixeira -, conhecido na companhia por PORTO, faleceu ontem dia 23JAN12, vítima de doença.

Perdemos mais um amigo e não voltaremos a ter a alegria do Porto nos convívios, nem o ouviremos a cantar “Piriquito vai no mato”.

À família enlutada endereço os meus sentimentos em nome da Companhia de Caçadores 3549.

OBRIGADO,  PORTO.

Em anexo uma foto do Porto a dançar com a sua esposa.

José Cortes
Fur Mil At Inf da CCAÇ 3549/BCAÇ 3884

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Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:


Guiné 63/74 - P9394: Tabanca Grande (318): Carlos Milheirão, ex-Alf Mil da CCAÇ 4152/73 (Gadamael e Cufar, 1974)

1. Mensagem de Carlos Milheirão (ex-Alf Mil da CCAÇ 4152/73, Gadamael e Cufar, 1974), com data de 12 de Junho de 2011:

Caro Luis
Fui combatente na Guiné na CCAÇ 4152 que esteve sediada em Gadamael Porto e posteriormente em Cufar. Fui contemporâneo do José Gonçalves e subscrevo em (quase) tudo o seu testemunho. Tenho algumas fotos e memórias que gostaria de publicar no Blog mas não sei como fazer. Por isso, gostaria que me enviasse as dicas necessárias para o efeito.

Abraço
Carlos Milheirão
ex-Alf Mil
CCAÇ 4152


2. No dia 9 de Julho de 2011 foi enviada mensagem ao camarada Carlos Milheirão nos seguintes termos:

Caro camarada Carlos Milheirão
As nossas desculpas por só agora virmos ao teu encontro.
Muito obrigado pelo teu contacto que muito nos apraz porque cada camarada que se nos dirige é um novo amigo e um novo colaborador do nosso Blogue.
Claro que teremos o maior gosto em publicar as tuas memórias, acompanhadas pelas tuas fotos.

Para fazeres parte integrante da nossa tertúlia, terás que pagar a respectiva jóia que é enviares uma foto dos teus tempos de Guiné, uma foto actual (ambas tipo passe de preferência em formato JPEG) e uma pequena história que servirá de apresentação. São elementos indispensáveis: nome, posto, especialidade, Unidade, locais de permanência na Guiné, datas de ida e volta, etc.

Todo o material para publicação deverá ser enviado para o editor Luís Graça - luisgracaecamaradasdaguine@gmail.com e para um dos co-editores: Carlos Vinhal - carlos.vinhal@gmail.com  ou Eduardo Magalhães - magalhaesribeiro04@gmail.com, isto para assegurar que a tua correspondência não passará despercebida entre as centenas de mensagens que se recebem.

As fotos deverão vir com um tamanho nunca inferior a 150kb para assegurar uma boa qualidade na publicação. Se vierem "maiores" nós faremos os ajustes necessários. Era óptimo o envio à parte das legendas de cada foto, com indicação do local, data e acontecimento.
Há camaradas que enviam as fotos e legendas integradas nos textos (em Word, nunca em PDF), mas poderão vir à parte, numeradas e com a indicação do local do texto onde as queres ver publicadas.
Depende tudo do conhecimento e da prática informática.

Não estranhes o tratamento por tu, mas na Tabanca, o antigo posto, a idade, a formação académica, a profissão, etc, não diferencia os camaradas que beberam a água das mesmas bolanhas, que pisaram aquela terra vermelha e suaram sob aquele sol naquele clima húmido e pegajoso.

Aguardamos as tuas notícias.
Até lá recebe um abraço dos editores
O camarada e novo amigo
Carlos Vinhal




3. Mensagem com data de 18 de Janeiro de 2012 do nosso camarada Milheirão:

Cumprimentos
A foto a preto e branco, onde me encontro em primeiro plano, foi feita em Bolama durante um desfile aquando da substituição do General Spínola pelo General Bettencourt Rodrigues. Passou-se em Janeiro de 1974, estávamos no I.A.O. e foi pouco antes da partida para Gadamael Porto.
A segunda foto é de Outubro de 2009 e foi tirada no dia das eleições autárquicas.

Carlos Milheirão


4. Comentário de CV:

Caro Carlos, bem aparecido na Tabanca Grande, onde a partir de hoje integras a tertúlia.

Já te disse quase tudo no que respeita à colaboração no Blogue. Falei-te no "tamanho" das fotos, e tens bem à vista o resultado. A tua foto à civil chegou com apenas 3K que não deu sequer para que te venhamos a reconhecer na rua. Se puderes repete o envio desta ou outra para teres uma foto tipo passe como deve ser a encimar os teus trabalhos. A foto militar (65K) também não dá para fazer uma tipo passe com a mínima qualidade.

Estás formalmente apresentado à tertúlia. Recebe um abraço em nome de todos os camaradas e amigos tertulianos.
Pelos editores
Carlos Vinhal
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Em tempo: Fotos da praxe incluídas nos poste em 07FEV13
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 12 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9346: Tabanca Grande (317): Anabela Pires, voluntária no projeto Ecoturismo do Cantanhez, nossa tabanqueira nº 536, aqui saudada pelo Hélder Sousa

Guiné 63/74 - P9393: Agenda cultural (184): Conferência "Voluntariado: Que futuro?" e Exposição de Fotografia "Rostos", fotos de rostos da crianças da Guiné-Bissau, a ter lugar no El Corte Inglês de V.N. de Gaia, dia 26 de Janeiro de 2012, pelas 17h00, na Sala de Âmbito Cultural, piso 6.

CONVITE

Para assistir à Conferência "Voluntariado: Que futuro?" a ter lugar no El Corte Inglês de Vila Nova de Gaia, dia 26 de Janeiro de 2012, pelas 17h00, na Sala de Âmbito Cultural, piso 6, tendo entre os oradores o nosso camarada José Teixeira da Associação Tabanca Pequena, assim como à Exposição de Fotografia "Rostos", uma colectânea de fotos de rostos da crianças da Guiné-Bissau.


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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 20 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9377: Agenda cultural (183): Lançamento do livro Recordações de África - Estórias da Guerra Colonial, de António Bacelar Antunes, ex-Alf Mil Médico, dia 28 de Janeiro de 2012 pelas 16h30 na Fundação Eng. António de Almeida, Porto

Guiné 63/74 - P9392: No 25 de abril de 1974 eu estava em... (15): Gadamael e tinha mais de 10 mil granadas de obus em stock... (C. Martins, ex-alf, cmdt do Pel Art, Gadamael, 1973/74)

1. Seleção de comentários, ao poste P9368 (*), do nosso leitor (e camarada) C. Martins (ex-Alf Mil, Pel Art Gadamael, 1973/74, hoje médico, participou no nosso VI Encontro Nacional, em 4 de Junho de 2011, vd. foto à dierita, ao lado de J. Casimiro Carvalho):Só vou falar do que vivi no terreno e com factos concretos e sem especulações.


Sobre Copá, onde se encontrava um conterrâneo meu e que foi ferido, foi inqualificável a irresponsabilidade do comando de sector, colocar apenas um pelotão sem quase meios de defesa junto à fronteira.

Jemberém, deixo ao critério do camarada Joaquim Sabido comentar, apenas digo que fizemos fogo de artilharia de Gadamael para o perímetro de Jemberém, o que surpreendeu, digo eu, o PAIGC.

(,,,) [Nunca ouvi falar em] insubordinação do aquartelamento de Jemberém 'devido a frequentes ataques em junho' [...]. Se houve algum ataque a Jemberém foi nos primeiros dias de maio. Eu ainda não estou senil e recordo-me muito bem. [ O Joaquim Sabido diz que, no decurso do mês de maio, ainda embrulharam pelo menos umas seis vezes].

Bedanda foi atacada com viaturas blindadas, mas sem grande êxito, diga-se. Mais uma vez uma estratégia imcompreensível dos altos comandos, visto que entre Gadamael e Mampatá-Quebo não havia qualquer aquartelamento, o que tornava fácil a infiltração até Bedanda.

Gadamael: aqui falo com conhecimento de causa...

Se tentassem o ataque directo, nem com 3 mil homens lá entravam, e seria uma carnificina de parte a parte. Tínhamos material de guerra em quantidades astronómicas. Granadas de obus tínhamos à volta de 10 mil em stock, e em cada espaldão em média 300 e prontas a disparar, isto é, já com espoleta colocada.

Quando éramos flagelados era sempre ou quase sempre do território da Guiné-Conacri.

Foram mobilizados muitos graduados de artilharia de costa para serem reconvertidos em artilheiros de campanha.

Desde de janeiro até abril entregaram-se vários guerrilheiros.

Quando das conversações para o cessar fogo,vários altos quadros do PAIGC me confessaram que estavam exaustos de tantos anos de guerra. Quase metade dos efectivos, na principal base no sul, junto a Kandiafara, tinham gonorreia (isso mesmo,  "esquentamentos").

(...) Não sei precisar o dia, mas na segunda semana de Maio [de 1974] acompanhei Pedro Pires e outros altos dirigentes do PAIGC a Cacine,  onde decorreram conversações sobre o cessar fogo e retracção das NT.Para mim,  em termos políticos,  a guerra já estava perdida antes de ter começado, agora afirmar que estávamos a beira de um colapso militar em 74 vai uma grande distância.

Nos primeiros dias de junho iniciou-se a retracção em Gadamael. [...]


Em Gadamael, a retração para Cacine e Bissau foi feita como estava programada e em boa ordem e segundo as normas militares. [...] Aceitámos o cessar fogo com o PAIGC sem sequer consultar o QG, quanto mais pedir autorização. Eu, por exemplo, fui à Guiné-Conacri apenas com o consentimento do Comandante Heitor Patrício. [...]

A propaganda, mas que era apenas e só propaganda, faz parte de qualquer guerra.

Com todo o respeito pela opinião de cada um, eu falo de factos, EU ESTAVA LÁ.

Termino dizendo que "ainda bem que acabou daquela forma", porque se não tivesse sido assim, não sei se ainda estaria no mundo dos vivos.

Um alfa bravo para todos.

Um artilheiro de Gadamael,

C. Martins



Guiné > Região de Tombali > Gamael > Maio de 1974 > A primeira visita do PAIGC à tabanca e aquartelamento de Gadamael: Em primeiro plano, ao centro, o Comandante do COP5 (Cap Ten Fuzo Heitor Patrício ); do seu lado direito está o comissário político do PAIGC, de cigarro russo na boca. O nosso camarada José Gonçalves está atrás, na segunda fila,  entre os dois. Por sua vez, o capitão Pimentel, comandante da CCAÇ 4152,  está ao lado do José Gonçalves, por detrás do Comandante Heitor Patrício. 


Foto (e legenda): © José Gonçalves (2010) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados


PS - Comentário a esta foto, feita pelo C. Martins, em 6 de julho de 2011:

(...) "A foto supra onde aparece o Comandante Patricío com um emblema do PAIGC, um oficial de marinha fuzileiro excepcional e considerado o 'pai' dos fuzos,  é bom que não se façam juizos de valor precipitados. Aquilo foi apenas circunstancial, resultou apenas e só da troca de 'galhardetes' entre as partes.. É que se o meu amigo e conterrâneo 'Pedras',  fuzo e guarda costas do Comandante Patrício na altura, com três comissões seguidas na Guiné, sabe que estão a pôr em causa a honaribilidade do Comandante Patrício,  ainda dá uma 'latada'...ah, ah, ah,  em alguém".(...)

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 18 de janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9368: Situação Militar no TO da Guiné no ano de 1974: Relatório da 2ª REP/QG/CTIG: Transcrição e adaptação de Luís Gonçalves Vaz (Parte I)

(**) Último poste da série > Guiné 63/74 - P9388: No 25 de Abril de 1974 eu estava em... (12): Bissau, Liceu Honório Barreto (Nuno Rodrigues / Luís Gonçalves Vaz)

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Guiné 63/74 - P9391: Turismo de saudade (1): Gostei de voltar à Guiné e ver pessoalmente algumas melhorias, mas a Guiné precisa de muita estabilidade para atingir o tão benéfico desenvolvimento (TCor José Francisco Robalo Borrego)

1. Mensagem de José Borrego (*), Ten Cor na Reserva, que pertenceu ao Grupo de Artilharia n.º 7 de Bissau e ao 9.º Pel Art, Bajocunda (Guiné, 1970/72), com data de 19 de Janeiro de 2012:

Há uns anos a esta parte, despertou em mim o desejo de voltar à Guiné, volvidos 40 anos, para matar saudades dos locais por onde andei e conversar com os guineenses de quem guardo boas recordações.

Era uma questão de tempo e de oportunidade para concretizar a minha vontade. Esse dia chegou e lá fui eu até Bissau de 4 a 12 de Janeiro do corrente ano.

Fiquei surpreendido pela positiva com o que vi: Bissau cresceu cerca de dez vezes mais. Muitas construções coloniais foram substituídas por construções feitas pelos chineses, nomeadamente, em Santa Luzia, para alojamento de militares.

A antiga messe de sargentos foi destruída, dando origem a outro edifício.

A antiga messe de oficiais é hoje o Hotel Azalai, uma das unidades hoteleiras mais importantes de Bissau, segundo fontes não oficiais. Bissau está uma cidade muito movimentada com os seus táxis de cores azul e branca e os autocarros de amarelo e azul conhecidos pelos “Toca-Toca”, os quais cruzam constantemente a cidade e os seus arredores, transportando as pessoas para os mais diversos sítios como Antula, Bairro Militar, Quelele, Enterramento, Empantcha e outros num grande frenesim.

Culturalmente, Bissau também me pareceu uma cidade bem servida de ensino básico, secundário e universitário a avaliar pela quantidade de alunos que vi junto dos estabelecimentos de ensino.

O uso do telemóvel também me pareceu mais ou menos generalizado.

O Mercado do Bandim, continua igual a si próprio, ou seja, sempre apinhado de gente e ali vende-se de tudo!

Do aeroporto de Bissalanca, hoje Aeroporto Internacional Osvaldo Vieira, sai uma via rápida, de três faixas de ambos os sentidos, até Bissau o que torna os transportes mais rápidos. Mas quem optar por outros destinos, também encontra estradas com bom piso.

Como não podia de deixar de ser, visitei, com alguma demora, a minha antiga unidade, em Santa Luzia, o Grupo de Artilharia N.º 7, herdeiro a partir de Julho de 1970, da Bateria de Artilharia de Campanha n.º 1. O aquartelamento foi adaptado ao ensino e hoje é a Escola Secundária Unificadora 23 de Janeiro desde o 1.º ao 12.º ano.

No meu planeamento, mencionei uma visita ao cemitério da Liga dos Combatentes em Bissau, o que fiz, prestando uma homenagem aos nossos camaradas ali sepultados até 1964.

Em resumo, gostei de voltar à Guiné e ver pessoalmente algumas melhorias, mas a Guiné precisa de muita estabilidade para atingir o tão benéfico desenvolvimento.

A má reputação da Guiné fora de portas, nada tem a ver com a realidade guineense. A Guiné é um País pacífico e os guineenses continuam afáveis e acolhedores, a quem desejo do fundo de mim mesmo a melhor sorte deste mundo!

Anexo: Junto 1 foto do antigo palácio do governador em reconstrução; 2 fotos do ex-GA7; 1 foto do cemitério da LC; 1 foto da antiga messe de sargtºs e uma foto da ex-messe de oficiais.

Um abraço amigo do
JOSÉ BORREGO

Antigo Palácio do Governador em reconstrução

Antiga Casa da Guarda do ex-Grupo de Artilharia N.º 7

Panorâmica do ex-Grupo de Artilharia N.º 7

Cemitério em Bissau da Liga dos Combatentes

Local da antiga Messe dos Sargentos de Bissau

Antiga Messe dos Oficiais de Bissau, hoje o Hotel Azalai

Fotos: © José Francisco Robalo Borrego (2012). Direitos reservados.
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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 21 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8144: Notas de leitura (231): A Última Missão, por José de Moura Calheiros - Gostei francamente do que li (José Francisco Borrego)

Guiné 63/74 - P9390: O Nosso Livro de Visitas (124): Relembrando o comandante da CART 1525 (Mansoa e Bissorã, 1966/67), Cap Art Jorge Manuel Piçarra Mourão (Afonso Silva)

1. Mensagem do nosso leitor (e camarada) Afonso Silva:


 De: Afonso Silva [ leonel.silva@netcabo.pt]
Data: 23 de Janeiro de 2012 20:05
Assunto: P-9385

Bom dia.


Relativamente  à  noticia relacionada no poste  P9385 existe a seguinte imprecisão:
É mencionado, certamente por lapso mas    indevidamente,   como comandante do BCAÇ 1876 o Ten Cor Inf Jorge Manuel Piçarra Mourão.

Segundo informação que consta no livro   Os Anos da Guerra Colonial, 1961-1975, de  Aniceto Afonso e Carlos de Matos Gomes, no respeitante às unidades mobilizadas para o TO da Guiné  no ano de 1966,  Jorge Manuel Piçarra Mourão  era  Capitão e comandante da CART 1525 (Mansoa e Bissorã) (*). [, Foto à esquerda, como9 comandante do RI 4, e,m 1989-1991; fonte: Sítio do Exército Português].


Sou  um leitor assíduo da  vosso blogue  e  pertenci a um Batalhão que esteve em Angola de 1973/1975 (COTI-2)   onde o Oficial de Operações do Batalhão era o Capitão Jorge Manuel Piçarra Mourão (já falecido).


Tenho um irmão que também esteve na Guiné   (Bambadinca),  nos anos de 1971 a 1973,  e que,  tendo chegado  pouco tempo antes  de eu partir para Angola  e sabendo que eu era atirador,  que me disse: "Tens sorte,  que vais para Angolam  pois  a  Guiné  está a ferro e fogo"... 


E na verdade quem vai lendo o vosso blogue  confirma tudo isso. (**)


Cumprimentos   
A. Silva
______________


Notas dos editores:

(*) Autor de Guiné, Sempre! Vd. recensão bibliográfica feita por Mário Beja Santos, em 20 de maio de 2010 (Poste P6361).


Nasceu em Vila Viçosa, em 1942. Terminou em 1962 o curso da arma de artilharia, na Academia Militar. Tem a Cruz de Guerra de 1ª Classe como comandante da CART 1525. Fez mais duas comissões, em Angola, em 1969/71 e depois em 1973/75 (a última como major de operações, BART 6322/73). Escreveu ainda o livro "Da Guiné a Angola: O Fim do Império" (2004). Foi comandante do RI 4, de 1989 a 1991. Tinha o poste de coronel quando morreu.
  
(**) Último poste da série > 22 de janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9386: O Nosso Livro de Visitas (123): Fernando Gomes Pinto da CCAÇ 4945/73 (Guiné, 1973/74)

Guiné 63/74 - P9389: Notas de leitura (325): Bordo de Ataque - Memórias de Uma Caderneta de Voo e um Contributo para a História, de José Krus Abecasis (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 6 de Janeiro de 2012:

Queridos amigos,
Estou seguro que “Bordo de Ataque” vai aguçar a curiosidade de muita gente.
O General Abecasis faz um relato minucioso da sua presença na Guiné, impressiona pelo seu desassombro e cativa pelo acervo de informação que disponibiliza, é o olhar da Força Aérea a complementar os meios terrestres e navais. Reconhece logo em 1963 que a guerrilha estava muito bem organizada e dispunha de um líder de mentalidade superior. Não esconde quezílias entre as diferentes armas, considera que Schulz esteve à altura dos desafios e é fortemente crítico da conceção da guerra na retaguarda. Confesso que me surpreende como estas memórias não fazem parte da bibliografia principal da guerra da Guiné.

Um abraço do
Mário


Bordo de ataque: memórias de um oficial general da Força Aérea (1)

Beja Santos

São quase 900 páginas de memórias em dois volumes ("Bordo de ataque, memórias de uma caderneta de voo e um contributo para a história", Coimbra Editora, 1985). José Kruz Abecasis é nome proeminente da Força Aérea, onde deixou um incontornável contributo. A Guiné foi-lhe familiar, sobretudo na década de 60.

No seu primeiro volume de memórias, a Guiné em guerra aparece na página 370 no seguinte contexto: “Durante o período em que exerci as funções de adjunto do comandante da 1ª Região Aérea, o General Resende incumbiu-me de visitar a zona aérea de Cabo Verde e Guiné. Entre 4 e 21 de Agosto de 1963 desempenhei-me desta missão, com vista a uma avaliação objetiva da situação militar e da colaboração prestada pela Força Aérea às Unidades de superfície”. Reuniu com o Governador, Comandante Vasco Rodrigues, e com o Comandante-Chefe, Brigadeiro Louro de Sousa. Cedo inferiu que o inimigo na Guiné era aguerrido e instruído e que o teatro de operações em nada tinha de comum com o de Angola, de onde regressara poucos meses antes. Na altura, já havia aviões abatidos, o Sargento Lobato fora capturado, e o Capitão Rebelo Valente morrera em combate, no Morés. Escreve que as forças portuguesas contavam com um grave desaire a partir do momento em que a operação da ilha do Como não tivera os resultados esperados. Transcrevo: “Nas visitas efetuadas às Unidades aquarteladas em pontos mais excêntricos e vulneráveis à ação do inimigo, tais como Bedanda e Catió, no Sul, e S. Domingos, no Noroeste da província, colhia-se a iniludível certeza do baixo moral que prevalecia nas nossas tropas”.

Descreve os reduzidos meios existentes e os atritos entre o Comandante da Zona Aérea e o Comandante da Base Operacional. Finaliza este apontamento acerca da sua missão de inspeção dizendo: “Na Guiné o inimigo era determinado e dinâmico, ousado e confiante, não descurando uma eficaz ação política externa e um esquema de organização social que, nem por ser uma miragem, deixava de ter impacto ideológico. Entre as nossas forças armadas e tanto nos comandos superiores como no âmbito da própria Força Aérea respirava-se uma atmosfera de tensões e choque entre oficiais que se hostilizavam. A guerra da Guiné poderia tornar-se no problema mais difícil das campanhas do Ultramar Português”.

Um episódio passado em Março de 1964 na Guiné é a rememoração seguinte. Tinha morrido o Alferes Piloto-Aviador Madureira Nobre e o seu corpo fora trasladado para Matosinhos. No percurso transitou pela Base Aérea 5 a ambulância com a urna, para se reabastecer de combustível, ele veio a saber que não lhe tinham sido prestados honras militares e criticou o procedimento, dirigindo-se ao Comandante da 1ª Região Aérea, lamentando a ocorrência não se ter prestado a devida manifestação de pesar por um camarada morto em combate.

Em Julho de 1965, Krus Abecasis partiu para a Guiné com as funções de Comandante da Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné e de Comandante da Base Aérea 12. Comenta assim: “Tão grave quanto insensata decisão fora tomada pelo Estado-Maior da Força Aérea que assim procurava, de forma simplista, contornar dificuldades da vida de relação entre oficiais. Mais uma vez se nos deparava a triste sina nacional da incapacidade de análise de experiências passadas que tão caro tinham sido pagas pelo país”. Ficamos igualmente a saber que ele classifica como incompetentes os sucessivos Comandantes da Zona Aérea anteriores, sem qualquer passado de fileira ao nível de Esquadrilha, Esquadra ou Grupo Operacional, e que, ignorantes, eram nomeados para funções que não conseguiam exercer.

O segundo volume tem largas referências às funções que exerceu como Comandante da Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné, a partir de 1965. Faz uma descrição da presença do inimigo, porventura mal informado, dá ênfase às forças da FLING, na altura inoperantes, já não passava de um simples lóbi em Dakar. Refere detalhadamente o dispositivo das nossas forças, tanto os efetivos terrestres como os navais e os aéreos. Gostou da condução que Arnaldo Schulz imprimia ao relacionamento interarmas. Apercebendo-se de que a tropa paraquedista vivia em compartimentos tanque e alimentava ostensivo elitismo, tomou as medidas mais convenientes. Desdobra-se em referências às atividades da Força Aérea e só a este nível o seu levantamento é complementar ao escreveu Hélio Felgas para o Exército e Sanches de Baêna para os Fuzileiros. No início de 1965 passava ao topo das prioridades estancar as infiltrações inimigas sobre Mansoa e Nhacra; mas o Sul era a grande inquietação, havia necessidade de encontrar meios aéreos para travar a presença civil e militar do inimigo, daí a chegada de novos aviões, sobretudo helicópteros. O Major-General Abecasis guardou inúmeras recordações, uma delas é mais do que uma mera curiosidade. Um cientista e sacerdote francês, René de Naurois, famoso ornitólogo, apresentou-se na Guiné para completar um estudo das espécies de aves existentes na região, nomeadamente algumas que sabia existirem em ilhas arenosas dos Bijagós e na ilha do Como. O oficial levou o cientista num DO, baixou o nível de voo para cerca de um metro de água rumo à ilha do Como, esta aproximação rasante era a única proteção que tinham, as forças do PAIGC eram apanhadas de surpresa e não podiam pôr a funcionar as suas antiaéreas. E René de Naurois pôde confirmar a presença no Como dos Pelecanus Rufescens. As antiaéreas no Sul eram igualmente um armamento que se pretendia neutralizar, havia já aviões alvejados e temia-se o pior. Em Dezembro de 1965 foi preparada a Operação “Resgate” destinada a garantir a liberdade de ação nos céus da Guiné, pondo o Cantanhez a ferro e fogo. Durante três dias consecutivos foram largadas bombas, primeiro em Cafine e depois sobre toda a área Cafine-Santa Clara-Catesse. Madina do Boé permanentemente fustigada, os ataques a Bachile, destacamento português na ilha do Como, são outras referências quanto à intervenção da Força Aérea no referido período.

Com o intuito de se apurar os resultados práticos da Operação “Resgate”, foi desencadeada a Operação “Safari” que, no entender deste General, redundou numa vergonhosa debandada das nossas forças mal o Capitão Carvalho Araújo ter ficado gravemente ferido, depois de um comportamento galhardo e valente.

Arnaldo Schulz, no início de 1966 dá conta aos seus diretos colaboradores que a situação no Sul se tem vindo a agravar, escrevendo mesmo: “Se excetuarmos a região de Bolama, os Bijagós, a zona de Aldeia Formosa-Contabane, as áreas de irradiação imediata dos principais aquartelamentos – Tite, Empada, Buba, Bedanda, Catió, Cufar, Cabedú e a linha fronteiriça Gadamael-Cameconde, os grupos IN encontram-se um pouco por toda a parte”. Reconhecia-se não haver meios para afastar o inimigo do Cantanhez. Entretanto chegaram novos helicópteros Alouette III, mas não havia ilusões que os meios continuam a ser insuficientes. É neste contexto que o novo Comandante da Companhia de Paraquedistas, Capitão Tinoco de Faria, executou brilhantemente a Operação “Relâmpago”.

(Continua)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 20 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9376: Notas de leitura (324): Passadas, recordações de um aluno do Liceu Honório Barreto, de António Estácio (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P9388: No 25 de Abril de 1974 eu estava em... (14): Bissau, Liceu Honório Barreto (Nuno Rodrigues / Luís Gonçalves Vaz)



São Tomé > s/d > Ensino - Liceu Nacional de D. João II, em S. Tomé, durante a época colonial. Esta foto poderia ter sido tirada no Liceu Nacional Honório Barreto, em Bissau. No dia 25 de Abril de 1974 dois filhos de militares portugueses estavam lá, o Nuno Rodrigues e o Luís Gonçalves Vaz (, este último membro da nossa Tabanca Grande). Foto, da Agência Geral do Ultramar,  de autor não identificado.

Copyright:  © 2008-2011 IICT [Instituto de Investigação Científica Tropical, Arquivo Histórico Ultramarino, Calçaada da Boa-Hora, nº 30. 1300-095 Lisboa,  Portugal. Fonte: ACTD [Arquivo Científico Tropical Digital Repositpry] (Reproduzido com a devida vénia...)

1. Comentário, de 15 de dezembro último, ao poste P9194 (*), assinado pelo nosso leitor Nuno Rodrigues que no 25 de Abril de 1974 tinha 12 anos, vivia em Bissau, andava no 3º ano do Liceu Nacional Honório Barreto e era filho de um militar paraquedista do BCP 12:


Caro LGV [ Luís Gonçalves Vaz]


Se a memória não me falha, a fuga do Liceu Honório Barreto foi logo no dia 26 [de abril de 1974]. Nesse dia fugi,  mais um colega,  em direcção à Câmara Municipal (onde a minha mãe trabalhava),  escoltado pelo meu pai. Lembro-me depois de chegar a casa (uma rua por trás da messe de sargentos praquedistas, corpo a que o meu pai pertencia) e de haver buracos de balas visíveis em alguns sítios.

Foi também esse o dia das primeiras manifestações com o slogan "Vivó Spínola" e da quebra e pilhagem de montras. No dia 27 faltou já na nossa turma um colega (o Martinho) cujo pai era agente da DGS. Pelo que se comentou na altura,  penso que quando o pai foi preso a família foi junto (não foi presa mas acompanhou-o).


Um Abraço

Nuno Rodrigues

2. Comentário de Luís Gonçalves Vaz, com data de 19 de de dezembro:



Olá,  Nuno. O que conta,  é muito familiar!!! Será que fomos colegas? Eu também tinha um colega que faltou no dia seguinte.... Não me lembro se era o "Martinho"! Sei que era de São Tomé e filho de um elemento da DGS, sei pelo meu pai, (na altura Chefe do Estado-Maior do CTIG,) que foram reunidos todos os Pides com as respectivas famílias no Cumeré (centro de instrução perto de Bissau)...

Pergunto: Tinha 13 anos e frequentava o antigo 3º ano do liceu, o Honório Barreto?

Aguardo uma resposta,  meu caro Nuno!

Outra coisa, na data de 26 de abril não houve libertação de presos... só em 27 ou 28!!! Brevemente enviarei essa "estória", mas fiquei a saber que mais colegas fugiram do Liceu, para "viverem na 1ª pessoa tais momentos históricos"!

Forte Abraço, Luís Gonçalves Vaz (Tabanqueiro nº 530)


3. Resposta de Nuno Rodrigues, de 26 de dezembro:

Caro LGV:

Às vezes a memória prega-nos partidas e reconstroi ela mesmo os eventos. Tinha para mim que a confusão havia começado logo a 26, mas pode muito bem ter levado mais um dia ou dois.


Tivemos necessariamente de ser colegas, pelo menos de Liceu (de turma já era pedir muito, mas não sei quantas turmas havia do 3º ano). 

No ano lectivo de 73/74 frequentava o 3º ano dos Liceus no Liceu Nacional Honório Barreto, em Bissau, mas tinha 12 anos (nessa altura andava um ano "desfasado"). Ainda por cá tenho, algures, a caderneta do Liceu se quisermos aferir a turma. A nossa sala ficava em baixo, com janelas para a rua (acho que todas tinham), mas já não sei identificar qual delas era, sei que não era logo a primeira. Dessa turma reencontrei cá dois colegas, um dos quais ainda contacto diariamente.

Na manhã do "estouro" (aquilo pareceu um estouro de pânico da manada) nunca percebemos o que lhe deu origem. Só me lembro do pânico irracional e da fuga subsequente, da malta a saltar aquele portão, liso e altíssimo, como se tivesse asas, só para depois voltar para trás porque, mais à frente, estavam uns miúdos ao pé do campo da bola a atirar pedras.

Mais tarde apareceu no largo do Liceu, penso que era a P.M. [Polícia Militar,] em jipes e com megafones a mandar evacuar as ruas. Foi nessa altura que o meu pai apareceu a pé, não sei de onde, e lá fugimos atrás dele,  direito à Câmara Municipal (atrás não será o termo correcto, quem ficou para trás foi o meu pai). Também me lembro de na altura dizerem que o pessoal da DGS estava detido no Cumeré com as famílias.

Fico a aguardar a "estória" com expectativa.
Um abraço
Nuno Rodrigues




Guiné > Arquélago dos Bijagós > 1974 > Luís Vaz, estudante, com 13 anos de idade,  na pista da Ilha de Bubaque


Foto: © Luís Gonçalves Vaz (2011). Todos os direitos reservados


4. Resposta de Luís Gonçalves Vaz:

Meu caro ex-colega Nuno Rodrigues:


É cada vez mais "nítido" que fomos colegas da mesma turma no Liceu Honório Barreto!!! Basta que me confirme que o nosso colega "Martinho" era ou não natural de S. Tomé?! Pois se me confirmar, era o mesmo colega que nós no dia 28 de Abril sentimos falta e ficámos a saber estava "retido" no Cumeré com a família para a sua segurança e da sua família ... (Lembro-me de ver várias "perseguições" a informadores da PIDE ... e no fim entregavam-nos à Polícia Militar...). Gostei da sua estória, conte outras neste blogue.

Sobre o episódio do "Cerco da Pide" que presenciei, já está publicado em no blogue da CART 3494  [, editado pelo Sousa de Castro]... Pois não sei se o editor chefe (Luís Graça) irá publicar aqui a minha História... (**)


Forte Abraço, Luís Gonçalves Vaz.
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Notas do editor:

(*) Vd. posted e 13 de dezembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9194: Tabanca Grande (310): Luís Gonçalves Vaz, professor, filho do Cor CEM Henrique Vaz (1922-2001)

(**) Último poste da série > 27 de outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7181: No 25 de Abril de 1974 eu estava em... (11): Lisboa a viver num apartamento com mais três estudantes (José Corceiro)

Guiné 63/74 - P9387: Parabéns a você (372): Augusto Silva Santos, ex-Fur Mil da CCAÇ 3306/BCAÇ 3833; Francisco Godinho, ex-Fur Mil da CCAÇ 2753 e José Albino, ex-Fur Mil do Pel Mort 2117

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 22 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9383: Parabéns a você (371): Rogério Freire, ex-Alf Mil Art MA da CART 1525 (Guiné, 1966/67)

domingo, 22 de janeiro de 2012

Guiné 63/74 - P9386: O Nosso Livro de Visitas (123): Fernando Gomes Pinto da CCAÇ 4945/73 (Guiné, 1973/74)

1. A propósito de um pedido que a nossa amiga Mafalda, filha do nosso camarada Armando Ramos, nos fez, publicado no Poste 9382, recebemos esta mensagem do nosso camarada/leitor Fernando Gomes Pinto (C.Caç. 4945-Guiné 1973/74):

Boa noite
Há quase 6 anos que sou assíduo leitor do vosso magnífico blog. Já o partilhei com muitos camaradas.

Hoje ao ler a referência a um documentário da RTP sobre uma senhora que gravou mensagens de combatentes destinadas aos familiares, devo referir que se trata do documentário "A Hora da Saudade".

Pode ser acedido no Youtube em: http://www.youtube.com/watch?v=jcpgEHNl04w

Um abraço
Fernando Gomes Pinto
(C.Caç.4945-Guiné 1973/74)

A Voz da Saudade, assim se chamou este documentário da RTP, dedicada a uma senhora, Maria Estefânia Anacoreta, que aos 47 anos levou a África mensagens das famílias, destinadas aos militares em campanha.

Pode-se ver o texto acima completo e aceder ao filme, através do site da RTP, a quem apresentamos as devidas vénias.


2. Comentário de CV:

Atendendo a que o nosso camarada Fernando nos lê há seis anos, e não existe na tertúlia nenhum representante da CCAÇ 4945, foi-lhe enviado convite para integrar a nossa Tabanca Grande.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 22 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9385: O Nosso Livro de Visitas (122): O meu batismo de fogo, nas férias grandes da escola, em jun/set de 1967, em Bula (Henrique Rodrigues, filho do 2º cmdt do BCAÇ 1876, 1966/1967)

Guiné 63/74 - P9385: O Nosso Livro de Visitas (122): O meu batismo de fogo, nas férias grandes da escola, em jun/set de 1967, em Bula (Henrique Rodrigues, filho do 2º cmdt do BCAÇ 1876, 1966/1967)

1. Em 20 de Janeiro, recebemos a seguinte mensagem de Henrique Rodrigues, filho do Major César Rodrigues, 2º Comandante do BCAÇ 1876.

BCaç 1876

Caro amigo: 

Tendo estado convosco em Bula entre Junho e Setembro de 1967, como prémio de ter ultrapassado o 4º ano dado pelo meu pai,  o então Maj César Rodrigues, 2º Comandante do Batalhão. Pelo facto de ter apanhado o batismo de fogo nos três ataques a Bula, durante esse período, foi importante para ter dado um rumo à minha vida. Sou militar há quarenta anos e estou na reserva. Por acaso não fiz nenhuma comissão mas recordo bem o meu batismo de fogo em Bula. 

Um abraço a todos
Henrique Rodrigues

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Notas de M.R.:

1.    Em nome do Luís Graça e dos restantes Camaradas desta grande tertúlia, gostava de transmitir ao nosso amigo Henrique Rodrigues, que nos congratularíamos muito se resolvesse integrar o nosso "quadro de pessoal". 

É simples juntar-se a nós, bastando para isso cumprir a simples e habitual praxe, que é enviar-nos uma foto actual do tipo passe e, pelo menos, uma foto do tempo da tropa ( que pelos vistos foi bastante). 

Mais gostava de convidar este nosso leitor, a partilhar connosco fotos desse tempo de Bula, e que nos contasse, com pormenores, as referidas "férias grandes" (Jun/Set 1967). 

2.    Recorda-se que o BCAÇ 1876 foi mobilizado pelo RI 2, seguiu para o TO da Guiné em 20/01/1966 e regressou a 04/11/1967. Esteve em Bissau e em Bula. Comandante: Ten Cor Inf Jorge Manuel Piçarra Mourão*. Companhias de quadrícula: CCAÇ 1496 (Bissau, Pirada e Bula), CCAÇ 1497 (Bissau, Fajonquito, Binar, Bissum-Naga e Bissau) e CCAÇ 1498 (Có, Binar e Bissau). 

     3.  Aproveito a oportunidade para retribuir o abraço Amigo que nos enviou.

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Em tempo:

Correcção a este Poste:

Mensagem de : Afonso Silva [ leonel.silva@netcabo.pt]
Data: 23 de Janeiro de 2012 20:05
Assunto: P-9385

Bom dia.
Relativamente  à  noticia relacionada no poste  P9385 existe a seguinte imprecisão:
É mencionado, certamente por lapso mas indevidamente, como comandante do BCAÇ 1876 o Ten Cor Inf Jorge Manuel Piçarra Mourão.

Segundo informação que consta no livro  Os Anos da Guerra Colonial, 1961-1975, de  Aniceto Afonso e Carlos de Matos Gomes, no respeitante às unidades mobilizadas para o TO da Guiné  no ano de 1966, Jorge Manuel Piçarra Mourão era Capitão e comandante da CART 1525 (Mansoa e Bissorã).

Sou  um leitor assíduo da  vosso blogue  e pertenci a um Batalhão que esteve em Angola de 1973/1975 (COTI-2)  onde o Oficial de Operações do Batalhão era o Capitão Jorge Manuel Piçarra Mourão (já falecido).

Vd. poste 23 DE JANEIRO DE 2012 > Guiné 63/74 - P9390: O Nosso Livro de Visitas (124): Relembrando o comandante da CART 1525 (Mansoa e Bissorã, 1966/67), Cap Art Jorge Manuel Piçarra Mourão (Afonso Silva)

Carlos Vinhal
28/12/2013

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Vd. último poste desta série em:


Guiné 63/74 - P9384: Estórias avulsas (118): Minhas (des)venturas na cidade de Bissau do pós-25 de abril... Ou a porrada que o Cor CEM Henrique Gonçalves Vaz não me chegou a dar... (Joaquim Sabido)

1. Uma saborosa história que merece honras de primeira página, escrita pelo nosso camarada Joaquim Sabido, em comentário ao poste P9372 (*)...

Recorde-se que o Joaquim Sabido, hoje advogado em Évora , foto à direita], foi Alf Mil Art, 3ª CArt/BArt 6520/73 e CCaç 4641/73 (Jemberém, Mansoa e Bissau, 1974):

Meus Caros Camarigos, Camarigo Luís Vaz:

No teu (o tu cá tu lá faz parte das NEP do Blogue) anterior poste, no último comentário que lá deixei, disse,  na resposta ao camarigo C. Martins, que invariavelmente trajava à civil, mas isto era lá no sul e lá no tal aquartelamento, digo buraco, [Jemberém,] onde ninguém ia, nem o correio, como disse, lá nos iam levar e muito menos os géneros alimentares, os morfes, o que valeu foi que havia trinca de arroz em reserva e muita raçãozita de combate.

Não posso deixar de corrigir o seguinte: no meu anterior comentário ou num teu outro poste, referi que na mata tínhamos detido 2 elementos do IN, mas, recordando melhor a situação, rectifico o que disse, na verdade mantivemos contacto visual com dois, mas de facto só detivemos um deles que depois entreguei em Cacine.

Bom, mas quando de lá regressámos, viemos para a zona de Bissau, para o Cumuré, aconteceu que eu recebi uma carta da então já, e ainda agora minha mulher, comunicando-me que um camarada alferes se encontrava em Évora em gozo das merecidas e que regressaria no dia não sei quantos de Junho, e que ele me levaria uma caixa com uns paios e chouriços caseiros, queijos, mais um bacalhau seco para poder elaborar as tão saborosas punhetas, enfim, uns mimos. De modo que, ficaram o dia e a hora aprazados, no sentido de eu me apresentar pela hora de jantar, na messe de oficiais, em Bissau, a fim de recolher o avio.

Nunca tinha estado na cidade de Bissau, nem sequer sabia onde se localizava a messe de oficiais, como é que haveria então de conhecer os costumes que por lá se praticavam ?

No Cumuré, pedi um jipe e arregimentei um camarada condutor que conhecia o caminho e conhecia Bissau, para lá me levar, eu jantaria e jantei na messe, enquanto ele se desenrascou por outro lado. Confesso que nesse dia utilizei bens públicos em benefício próprio, mas qualquer ilicitude disciplinar ou criminal já se encontrará prescrita.

Apesar de tudo,  e de já ter ocorrido o 25 de Abril, acautelámo-nos devidamente e metemos no jipe as nossas G-3, uns carregadores, uma Walter 9 mm e mais umas granadas, para alguma eventualidade, que, digo, não seria de esperar acontecer. Mas à cautela, o melhor foi mesmo não confiar.

Saí do jipe mesmo em frente ao bar anexo à messe, fui procurar o camarada que serviu de correio à encomenda e por lá jantei e estive,  até o que o condutor resolveu ir-me buscar. Ainda demos umas voltas por Bissau,  com paragem nos pontos obrigatórios e cerca da uma hora da manhã, do dia seguinte, quando nos aprestávamos para sair à porta do arame farpado que rodeava a cidade, um camarada furriel, que se encontrava de sargento da guarda ao COMBIS, não nos permitiu sair porque tinha ordens para me deter.

Levou-me ao gabinete do oficial de dia em serviço ao COMBIS, que se encontrava acompanhado do camarada alferes que estava de prevenção. Ambos estavam tomando uns uísques, para ajudar a passar a noite. O oficial de dia era o Cap de Cavalaria Bicho, alentejano de Ponte-de-Sôr ou de Niza, já não me recordo, que eu conhecia de Estremoz, quando ele estivera no RC3,  e da tasquinha do Ti Zé de Alter onde nos encontrámos muitas vezes a petiscos, daí que, quando entrei no gabinete ele me ter, de imediato, reconhecido, pelo  que requisitou logo mais um copo para eu também beber daquela garrafa.

Ainda veio pelo menos mais outra garrafa e aí pelas 3 horas da manhã, perguntou-me então o que é que estava ali a fazer...Respondi-lhe que estava com base no Cumuré e,  quando ia para sair de Bissau, tal não me tinha sido permitido pela guarda.

Foi aí que ele me questionou:
- Eh, pá, então foste tu que estivestes na messe a jantar fardado com o camuflado ?
- Fui - respondi-lhe e expliquei-lhe ao que tinha ido e se queria já ali provar alguma coisa.

Respondeu-me que àquela hora não, além do mais eu é que estava metido numa grande alhada, porque o nosso Coronel CEM do CTIG Henrique Vaz (creio que ele até me terá dito: "o nosso Cor Afonso Henriques" – seria que alguns oficiais, pelo menos de Cavalaria usariam tratar o Sr. teu Pai pelo nome do nosso Conquistador ?) viu-te na messe com essa fatiota e, como tal não é permitido, não gostou nada, porque ao jantar todos têm que ir ou à civil ou pelo menos com a farda n.º 2, além do mais, estão lá também as Senhoras a jantar e não é permitido o uso de camuflado, isso é só para a guerra. Vais apanhar uma porrada, tás tramado!

Não esmoreci logo e pedi-lhe para ver o que poderia fazer por mim, telefonou para vários locais procurando pelo Sr. teu Pai, mas já deveria estar a descansar, não sendo possível contactá-lo, então lembrou-se de telefonar para o Comandante do COMBIS, ou seja, o Sr. Cor comandante dele, cujo nome não me recordo. Este já se encontraria deitado, mas ainda assim atendeu-lhe o telefone e, após ter ouvido a explicação do caso e que se tratava de um gajo conhecido dele, Capitão, disse-lhe para tomar nota do meu número mecanográfico, a que Companhia eu pertencia, onde me encontrava, matrícula do jipe, e que me mandasse regressar ao Cumuré.
- No entanto, sempre sob a condição de que, se no dia seguinte ou num outro dia que o nosso Cor Henrique Vaz se lembre de perguntar por ele, sabemo-lo informar e vamos lá buscá-lo.

Assim ficou o assunto.

Felizmente para mim, o Sr. teu Pai não mais se lembrou de mim nem daquela situação, seguramente porque tinha muito mais que fazer, pois outras situações de maior gravidade surgiam-lhe diariamente. Depois quando vim mesmo para Bissau, ainda com ele contactei pessoalmente por umas duas ou três vezes, enquanto estive na guarda ao palácio do Governador. Mas sempre que o via, ao sr. Cor. na messe, eu metia o rabinho entre pernas e circulava para longe dele, de imediato. Isto porque nada estava definido e ninguém sabia quando regressaria e eu não queria lá ficar para dar ao interruptor e apagar a luz e muito menos poder vir a ser recambiado para Angola, conforme ainda por lá correram rumores nessa tão atribulada fase.

Foi apenas esta situação, mas com a qual então fiquei bastante apreensivo e muito à rasca. (**)

Abraços do Camarigo

Joaquim Sabido
Évora

2. Comentário do Luís Gonçalves Vaz:
 
Olá Joaquim Sabido:

Gostei muito da "estória" que partilhou aqui connosco e que envolve o Sr meu pai!Achei-a muito interessante, e típica dele, chamava a atenção... não era importante...era para esquecer e centrava-se então nos problemas mais graves!

No entanto a minha memória, bem como as fotografias da época, lembram-no quase sempre de camuflado... o que era natural, pois se deslocava periodicamente à linha de frente e quando rebentou a bomba no QG em 22 de Fevereiro de 74 e ficou apenas com algumas escoriações, estava de camuflado!..... a não ser quando se sentava à mesa para jantar com a família (quando podia,  é claro!), à mesa não devia haver "clima de guerra", sempre me disse que é um lugar sagrado!!!

Que azar,  meu caro Joaquim Sabido!!!!!
Forte Abraço:

Luís Gonçalves Vaz
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Notas do editor:

(*) Vd.poste de 19 de janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9372: Situação Militar no TO da Guiné no ano de 1974: Relatório da 2ª REP/QG/CTIG: Transcrição e adaptação de Luís Gonçalves Vaz (Parte II)

(**) Último poste da série > 6 de novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9004: Estórias avulsas (117): Posto avançado ou vala comum? (Carlos Filipe)

Guiné 63/74 - P9383: Parabéns a você (371): Rogério Freire, ex-Alf Mil Art MA da CART 1525 (Guiné, 1966/67)

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 21 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9380: Parabéns a você (370): João Graça, médico, músico e amigo da Guiné-Bissau