terça-feira, 24 de agosto de 2010

Guiné 63/74 - P6895: Blogoterapia (155): As horas de convívio na nova Tabanca de São Martinho do Porto foram das melhores coisas que me aconteceram neste Verão (JERO)


Tabanca de São Martinho do Porto > Casa de férias da família Scharwz da Silva > 21 de Agosto de 2010 > Convívio, já obrigatório, anual, com membros da Tabanca Grande > Da esquerda para a direita, o régulo da nova Tabanca, o Pepito; o JERO (que tem casa em São Martinho há mais de 40 anos, foi nesta pérola da Costa de Praia que arranjou a sua bajuda, professora do ensino básico);  e eu,  dono da máquina fotográfica que tirou esta foto (...mas o fotógrafo foi o Xico Allen, o seu a seu dono!).


1. Comentário do JERO ao poste P6882:

Caro Luís

Por estar envolvido na minha qualidade de jornalista de O ALCOA (onde faço tudo menos varrer o chão da Redacção) só hoje tropecei na tua excelente reportagem do convívio da Tabanca de São Martinho do Porto, onde estive graças ao teu convite. Mais uma que te fico a dever...

Foi um convívio excelente,  ficando, no que me diz respeito, marcado pela extraordinária Senhora Dª. Clara Schwarz, Mãe do Pepito. Foi emocionante reviver as histórias dos miúdos austríacos em Alcobaça, (no final da década de 40) de que ainda recordo os nomes - Hans e Helmutt.

Depois, como diz o Hélder Valério,  no seu comentário, a amizade que expontaneamente brota - e nos une - poucos minutos de nos conhecermos. Foi o que me aconteceu em relação ao Pepito e o Teco (e respectivas esposas). 

As horas de convívio na  nova Tabanca de São Martinho (*)  foram das melhores coisas que me aconteceram neste Verão.

Aceitem um abraço do tamanho da Baía.

JERO

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Nota de L.G.:

(*) Último poste da série > 22 de Agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6881: Blogoterapia (154): Encontrei no Blogue seres humanos extraordinários, que admiro, preso e considero amigos, apesar de só os conhecer virtualmente (Felismina Costa)

Guiné 63/74 - P6894: Recordações de umas férias numa biblioteca em fogo (8): Ébano Febre Africana, de Ryszard Kapuscinski (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 23 de Agosto de 2010:

Queridos amigos,
Não há melhor boa vida que estar em férias e ler, regressar, escrever e voltar para o folguedo.
Fui até à Arrábida no rasto do Sebastião da Gama e tive sorte com o tempo, a amenidade da paisagem, visitei o convento e andei à procura do Manuel de Oliveira, John Malkovich e Catherine Deneuve. Não os encontrei mas segui-lhes as pegadas. Para quem não conhece, aquele convento é uma jóia preciosa cercada de flora mediterrânica, vale a pena ir até lá. E acabei em Moura, com mais de 40º à sombra, também confirmei que a nova Aldeia da Luz é uma beleza.

Um abraço do
Mário


Recordações de umas férias numa biblioteca em fogo (8)

Beja Santos

Ébano, 40 anos de reportagens em África para entendermos os homens,
Sabermos ler da descolonização para o presente


“Ébano, Febre Africana”, de Ryszard Kapuscinski, é uma obra-prima, uma dissertação avassaladora sobre a situação africana ao longo das décadas que vão da descolonização ao presente, um recado e um contributo indispensável para entender os itinerários políticos por onde passaram aqueles que acreditavam na revolução, na vontade soberana, no bem-estar dos povos.

Seria impossível imaginar leitura mais poderosa para este final de férias em Casal dos Matos, ali na fronteira entre Pedrógão Grande, Figueiró dos Vinhos e Castanheira de Pêra. O dia despertou e sente-se no ar que caminhamos para uma frigideira, ouve-se a cega-rega das cigarras, recolho-me na biblioteca. Ontem, suspendi a leitura quando John Okello, de 25 anos, conquistou o poder em Zanzibar. Está cercado de jornalistas, mas também ali se acotovelam outras dezenas de pessoas no quartel do marechal de campo, era o mínimo que se poderia esperar deste jovem ditador. Vejamos como Kapuscinski descreve a situação: “Okello, que se encontra num grande átrio oriental, está sentado numa poltrona de ébano, a fumar um cigarro. Ele, que possui uma pele muito escura e uma cara larga de feições pouco delicadas, tem na cabeça um boné de polícia, que lhe está manifestamente pequeno – assaltaram uns armazéns da polícia onde encontraram umas carabinas e alguns uniformes. À volta do boné tem enrolado um pedaço de pano azul. Okello parece ausente, como se estivesse em estado de choque, e nós ficamos com a sensação de que nem dá pela nossa presença. Há muita gente à volta dele, as pessoas empurram-se, falam todas ao mesmo tempo, gesticulam, o caos é total e ninguém tenta contrariá-lo. Nós queremos apenas pedir-lhe autorização para prolongar a nossa estadia na ilha. Okello diz que sim, com a cabeça. Mas, de repente, alguma coisa lhe passa pela mente, pois apaga o cigarro e toma providências para nos mandar embora. Tem uma velha carabina ao ombro e outra na mão. Com a outra mão arranja a pistola que tem no cinto e, a seguir, pega ainda numa outra pistola. Depois, armado desta forma, empurra-nos à sua frente até ao pátio, como se nos quisesse fuzilar”. Chega entretanto uma notícia surpreendente: no Quénia, no Tanganica e no Uganda os exércitos fizeram golpes militares. Começa a odisseia de encontrar transporte para ir ao encontro do nosso manancial de notícias, parece que há coisas mais importantes que o marechal Okello.

Os golpes de Estado são acontecimentos comuns em África. Em 1966, Kapuscinski voa para a Nigéria onde caiu mais uma dinastia corrupta, uns abatidos à bala, outros são dados como desaparecidos, o povo bate as palmas ao militares que são bem aproveitar-se da ganância e da insaciabilidade dos políticos e a desilusão dos populares. A uma elite militar ou a uma guarda pretoriana sucede-se outra, o mesmo é dizer que em cada golpe de Estado acumula-se gente desocupada que sobrevive no gangsterismo e no simples roubo. O repórter põe-se a caminho no deserto, atravessa o Sara. Outra descrição impressionante: “Uma viagem através do Sara representa uma aventura perigosa, uma constante lotaria, uma eterna incógnita. Num percurso cheio de crateras, buracos, desabamentos de terras, coberto de pedras e rochas, dunas movediças e montes de entulho, os carros avançam a uma velocidade de caracol, de apenas poucos quilómetros por hora. Nestes camiões, cada roda tem tracção própria e, metro a metro, cada uma delas tem de encontrar o seu ponto de apoio; por isso, avança e pára logo depois, em face de um novo obstáculo, que tanto é um penedo como um buraco. Mas é a soma destes esforços e destas lutas, permanentemente acompanhados pelos gritos do motor sobreaquecido e pelo baloiçar arriscado da caixa, que permitem ao camião ir avançando”. E assim chegamos à Etiópia em pleno caos. Em Adis Abeba, à volta do repuxo onde a água cai num suave murmúrio, rodeado de viçosas buganvílias de tom vermelho escuro e forsítias amarelo-vivo, é difícil imaginar que a escassas centenas de quilómetros se morre em massa. Vive-se uma das maiores secas africanas de sempre, o gado morreu, não há pastagens, não há água, os nómadas vendem as peles que arrancam dos cadáveres dos animais. À volta de Adis Abeba instalou-se a pirataria, toda a gente reivindica dinheiro e pede esmola, a começar pela polícia. Por uma questão de prestígio, o homem que derrubou o imperador Hailé Selassié, o major Mengistu, um marxista muito estimado em Moscovo, recusa a ajuda internacional, numa altura em que já morreram um milhão de pessoas. É uma situação absolutamente indescritível. Mas o que é que em África não é indescritível? Quem é que pode acreditar em Idi Amin o tirano sanguinário do Uganda? Ou em Bokassa, na República Centro-Africana? A descrição de Kapuscinski, por abreviada, torna qualquer tirania um cenário de pechisbeque: “O domínio de Amin durou oito anos. De acordo com diversas fontes, o marechal terá assassinado durante a sua vida entre 150 000 e 300 000 pessoas. Depois foi ele quem se conduziu a si próprio para o abismo. Uma das suas obsessões era o ódio ao presidente da vizinha Tanzânia, Julius Nyerere. Em finais de 1978, atacou aquele país. O exército da Tanzânia reagiu. Os soldados de Nyerere invadiram o Uganda. Amin fugiu para a Líbia, depois instalou-se na Arábia Saudita, que o recompensou pelo seu esforço de divulgação do Islão. O exército de Amin desfez-se, uma parte voltou para casa, a outra passou a viver de assaltos. Nessa guerra, o que o exército da Tanzânia perdeu foi um tanque”.

Na aparência, todos estes actos violentos são corriqueiros, repetem-se com uma certa similitude, seja qual for o local em que ocorrem. É verdade que por detrás deles estão questões tribais, a partida precipitada das forças coloniais, a avidez dos novos dirigentes, incapazes de programar e fundamentar as bases sociais de apoio. Mas há acontecimentos que extravasam as dimensões da pura brutalidade: será o caso do que aconteceu no Ruanda, um morticínio que escapa a qualquer lei da compreensão das guerras étnicas. Kapuscinski descreve com rigor as castas de Ruanda, em poucas páginas ficamos a perceber o que separa radicalmente os tutsis dos hutus, como, a seguir à independência do Congo, o pesadelo ruandês se foi avolumando. Só por estas páginas alucinantes é indispensável ler o Ébano, ficamos a conhecer as mortandades, as ditaduras militares feudais, as explosões de ódio, as intervenções estrangeiras e o massacre de Abril de 1994. Esta a África dos feiticeiros, das superstições, dos políticos venais, da ajuda humanitária indecente, dos cooperantes que enriquecem à custa da miséria alheia. Mais umas horas, e ao fim do dia regresso. No término destas férias, a pretexto de uma canícula, embrenhei-me em leituras numa biblioteca onde ardi de curiosidade. Falta-me ainda ir ao Sudão, à Libéria e despedir-me na alucinante Eritreia. Não sei o que é um livro paradigmático. Mas se me perguntassem se existe um livro onde se fala das explicações do imobilismo africano, da permanente ameaça da sua ruína total, de como se chegou à desesperança e à corrupção incomportáveis, não hesitarei em sugerir a leitura de Ébano.

(Continua)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 19 de Agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6872: Recordações de umas férias numa biblioteca em fogo (7): Ébano Febre Africana, de Ryszard Kapuscinski (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P6893: Grupo dos Amigos da Capela de Guileje (13): Relação dos donativos recebidos até 26 de Junho de 2010 (Manuel Reis)

1. Mensagem do nosso camarada Manuel Reis (ex-Alf Mil da CCAV 8350, (Guileje, 1972/74), com data de 23 de Agosto de 2010:

Amigo Carlos:
Venho solicitar-te que publiques a relação dos camaradas que contribuíram com donativos para reconstrução da Capelinha de Guileje.
Não sei se te lembras, mas já tínhamos acordado neste ponto há cerca de um mês.
O Luís publicou a mini-acta que elaborámos, mas julgo ser da maior importância publicar a lista para que não surjam mais questões sobre o assunto.
Peço-te desculpa por esta maçada.

Obrigado.
Um abraço.
Manuel Reis

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Notas de CV:

(*) Vd. poste da série de 16 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5999: Grupo dos Amigos da Capela de Guiledje (12): Doação de imagem de Nª Sra. de Fátima, pelo António Camilio e o Luís Branquinho Crespo

Guiné 63/74 – P6892: Armamento (4): Metralhadoras Pesadas (Luís Dias)

1. O nosso Camarada Luís Dias*, ex-Alf Mil At Inf da CCAÇ 3491/BCAÇ 3872, Dulombi e Galomaro, 1971/74, enviou-nos em 18 de Agosto de 2010, a segunda mensagem desta série iniciada no poste P5690:

Camaradas,

Junto vos remeto a IIª parte (metralhadoras pesadas), que foram utilizadas na Guerra Colonial da Guiné, no período compreendido entre 1971 e 1974.

Desejos de continuação de boas férias, para quem as está a gozar e que as nuvens que às vezes atravessam as boas gentes desta nossa Tabanca Grande se desvaneçam e a paz e acalmia que tanto ansiávamos quando estávamos naquelas terras quentes da Guiné, prevaleçam e nos ajudem a esquecer as agruras dos incêndios que têm devastado o nosso país e a política que tarda em resolver a crise económica, que se reflecte em todo o nosso tecido social e nos traz amargurados e de mau humor.

Um abraço do tamanho do Rio Corubal para todos (em particular para os nossos sempre atentos editores; Luís, Vinhal, Virgínio e Magalhães).

Chegastes meninos! Partis Homens!
General António Spínola



O Alf Mil Luís Dias


Dedicado a todos aqueles que como combatentes palmilharam as matas, trilhos, bolanhas, picadas, estradas e rios das terras quentes da Guiné, durante a Guerra Colonial.

E ao II Grupo de Combate da C.CAÇ 3491, os meus dilectos camaradas de armas, de “Alma Forte” - os lenços azuis do Dulombi.
ARMAMENTO E EQUIPAMENTO DAS FORÇAS ARMADAS PORTUGUESAS E DOS GUERRILHEIROS DO PAIGC NA GUERRA COLONIAL

GUINÉ
1971 - 1974

IIª PARTE
1. ARMAMENTO MÉDIO E PESADO

1.1. AS METRALHADORAS PESADAS

1.1.1 AS FORÇAS PORTUGUESAS

Na década de 1860 e durante a Guerra Civil Americana surgiram em combate as primeiras metralhadoras, devido ao trabalho do norte-americano Richard Gatling (embora fosse licenciado em medicina, ele preferiu continuar a sua actividade de inventor, em vez de exercer a profissão de médico).
A sua Gatling patenteada em 1862 (cujo modelo terá tido origem no desenho da “mitrailleuse” do exército belga), perdurou durante muitos anos no exército dos EUA, tendo sido considerada obsoleta em 1911.
No entanto, não se tratava de uma arma automática, porque o seu sistema operativo era manual, com recurso ao uso de diversos canos, dispostos circularmente.
Mais tarde, o conceito da Gatling veio a ser retomado nos anos 40/50, devido à necessidade de se obter maiores cadências de fogo, em especial nas aeronaves, com posterior recurso a motores eléctricos para circular rapidamente os diversos canos.
De facto, uma arma de um só cano que tivesse uma cadência de 500/600 tiros por minuto (tpm) já era bastante razoável, mas a Gatling já podia fazê-lo com a mesma capacidade, mas com diversos canos (por exemplo 6x500 tpm).
Com a utilização moderna e com recurso a calibres que podem variar entre o 5,56 mm e o 37mm essa capacidade aumentou grandemente.
O canhão M61-Vulcan, de 20mm, de 6 canos, da General Dynamics, é capaz de lançar 6 000 projécteis por minuto. É também conhecido o canhão GAU-8 Avenger, no calibre 30mm, de 7 canos, colocado em aviões de ataque ao solo (A-10 Thunderbolt II – “Warthog”), utilizado para destruir carros de combate. O Gatling foi também uma referência na Guerra do Vietname, colocado em helicópteros, usando fitas de 4 000 cartuchos e também com a capacidade de disparar 6 000 tpm (Minigun M134, no calibre 7,62mm).
Napoleão III seguiu com interesse o progresso da arma Gatling, tendo mandado desenvolver em França uma metralhadora capaz de efectuar disparos múltiplos. Surgem, assim, as metralhadoras Reffye (com 25 canos de 13mm cada) e a Christophe-Montigny (com 19, 31 ou 37 canos).
Portugal, possivelmente depois de 1872, adquiriu algumas metralhadoras Montigny (há um modelo de 37 canos no Museu da Academia Militar - a Armada recebeu um modelo de 31 canos).
De notar que o conjunto da metralhadora, reparo de rodas e duas caixas de munições pesavam pouco mais de uma tonelada (!).
A arma, com pessoal bem treinado era capaz de efectuar entre 220 a 250 tpm. Enquanto a repetição do disparo, no caso da Gatling, se fazia através de um movimento manual de uma manivela ou alavanca, fazendo girar os canos envolta de um feixe central, conseguindo que os mesmos procedessem às diversas operações de extracção, introdução e percussão, outras, como no caso da Montigny, o efeito era o mesmo mas através de um feixe de canos fixos, sendo o disparo obtido por uma alavanca e no caso da Nordendelt (inventada em 1873, pelo engenheiro sueco Helge Palmcrantz), com recurso a canos dispostos em paralelo, o disparo dava-se, também, por efeito de uma alavanca, sendo que os cartuchos percutidos caíam pela força da gravidade (mais tarde a metralhadora ligeira dinamarquesa Madsen, usada no nosso país pelas unidades de cavalaria, iria adoptar um sistema semelhante na extracção das cápsulas detonadas).
Portugal adquire as metralhadoras Nordenfeldt, no calibre 25mm, em 1880, que foram aplicadas na corveta-couraçado Vasco da Gama, servindo como defesa contra torpedeiros.
Com o início das Campanhas de África de Pacificação na década de 1890, a Nordenfeldt, alterada muitas vezes para os calibres das espingardas (11mm, depois 8mm e mais tarde 6,5mm), foi usada quer por forças da marinha de guerra, quer pelo exército, conjuntamente com a Gardner e a Gatling (normalmente utilizadas pela Armada).
No período de renovação militar do tempo do final do reinado de D. Carlos, a metralhadora Vickers-Maxim é a seleccionada para o Exército Português.
A Maxim é já uma arma revolucionária, porque é a primeira metralhadora automática, de um só cano, com apenas 20 kg e capaz de disparar 600 tpm.
O seu inventor foi o norte-americano Hiram Maxim, que conseguiu tornar obsoletas as metralhadoras então existentes, com o seu modelo, introduzido em 1884.
A arma que veio para Portugal tomou o nome da Maxim m/906, no calibre 6,5mm e foi construída na Inglaterra, depois de Maxim se ter unido à fábrica inglesa Vickers.
Com a entrada de Portugal no primeiro conflito mundial a Inglaterra fornece a metralhadora Vickers à Força Expedicionária (1917), no calibre 7,7mm (m/917) ficando a Maxim na metrópole e sendo também enviada nas expedições que partem para África. Após a Iª Guerra Mundial a Vickers irá substituindo, definitivamente, a Maxim.
A Vickers foi evoluindo os seus modelos e Portugal foi acompanhando esta evolução adquirindo os modelos melhorados (m/930, no calibre 7,7mm, m/937, no calibre 7,7mm e m/939, já no calibre 7,9mm).
A partir de finais dos anos 30 inicia-se um processo de renovação para adquirir outra metralhadora pesada, mas a Vickers irá perdurar, especialmente em África, onde ainda será usada no início da Guerra Colonial.
Em finais dos anos 30, a partir do modelo da metralhadora pesada Breda de 13,2mm, esta fábrica italiana desenvolve um modelo que disparava o cartucho 8mm Breda para consumo interno e outro que disparava o cartucho 7,9mm para exportação.
Em 1938, o nosso país decide-se pela compra desta metralhadora pesada, com tripé, a fim de completar as armas que usavam o cartucho 7,9mm mauser (ou 7,92mm), como a metralhadora ligeira Dreyse e espingarda Mauser.

Metralhadora pesada Breda m/938

Características desta arma
  • ORIGEM: Itália
    CALIBRE: 7,92 mm
    DATA DE FABRICO INICIAL: 1937
    ESTRIAS: 4 no sentido dextrorsum
    COMPRIMENTO: 1, 270 m
    VELOCIDADE INICIAL À BOCA DO CANO: 776 m/s
    APARELHO DE PONTARIA: Linha de mira lateral, de alça rectilínea com cursor e ranhura em “V”, graduada dos 3 aos 30 hectómetros. Ponto de mira de secção trapezoidal
    ALCANCE MÁXIMO: 4000 m
    ALCANCE ÚTIL: 3000 m
    ALCANCE EFICAZ: 3500 m
    PESO: 11,30 kg
    ALIMENTAÇÃO: Lâmina/Pente com 20 alvéolos
    CADÊNCIA DE TIRO: 240 tpm (c/12 lâminas), mas podendo chegar a 400 tpm
    MUNIÇÃO: 7,92 mm Mauser, de percussão central
    SEGURANÇA: Imobilização do gatilho
    FUNCIONAMENTO: Arma automática, de tiro automático, com tomada de gases num ponto do cano e com regulador de tomada de gases
No final da Iª Guerra Mundial (1918), John Brownin, de origem norte americana, um dos mais famosos e produtivos inventores de armas de fogo, desenvolve, a partir do modelo da sua metralhadora ligeira M1917, que tinha o calibre .30-06, uma metralhadora para o poderoso calibre .50 BMG (12,7 mm), que será conhecida pelo alcunha de “La Deuce” ou “Fifty-cal”.
A arma foi usada em veículos, aeronaves, navios, desde 1923 e tomou em 1933 a designação actual de Browning M2HB, depois de ter passado da inicial refrigeração a água, para refrigeração a ar e ter sido redesenhada por Samuel Green. Com exclusão da pistola Browning M1911A1, no calibre .45, a metralhadora Browning é a arma que mais tempo se tem mantido ao serviço das forças armadas americanas.
A Browning 12,7 mm entrou na maior parte dos conflitos do século XX e XXI, como a IIª Guerra Mundial, a Guerra da Coreia, a Guerra da Indochina, a Crise do Canal do Suez, a Guerra do Vietname, a Guerra do Cambodja, o Conflito das Ilhas Falkland, A Invasão do Panamá, a Guerra do Golfo, a Guerra Civil da Somália, a Guerra do Iraque e a Guerra do Afeganistão.
A chegada da Browning M2 ao nosso país dá-se depois da nossa entrada na NATO e da assinatura do Acordo de Defesa de 1951.
Dado ter-se tratado da primeira arma que possuíamos neste calibre, implicou a revisão da tipologia de atribuição às armas. Por exemplo, a Breda passou a ser vista como metralhadora ligeira.
A arma foi recebida em múltiplas variantes (fixas, em tripé, em reparos AA, em veículos, em aviões e em reparos quádruplos) e tomou a designação de, metralhadora pesada 12,7mm m/955 Browning M2.
Mais de 50 anos depois de a termos recebido a M2 é ainda a metralhadora pesada padrão das nossas forças armadas.

Metralhadora pesada Browning M2HB m/955

Características desta arma
  • TIPO: Metralhadora pesada
    PAÍS DE ORIGEM: EUA
    CALIBRE: 12,7 mm Browning
    DATA DE FABRICO INICIAL: 1921
    NÚMERO DE ESTRIAS: 8
    ALCANCE MÁXIMO: 6 750 m
    ALCANCE PRÁTICO EM TIRO TERRESTRE: 2 380 m
    ALCANCE PRÁTICO EM TIRO ANTI-AÉREO: 700 m
    COMPRIMENTO DA ARMA: 1,650 m
    COMPRIMENTO DO CANO: 1,140 m
    PESO: 38,1 Kg
    VELOCIDADE INICIAL DO PROJÉCTIL À BOCA DO CANO: 893 mps
    ENERGIA DO PROJÉCTIL: Cerca de 17000 joules
    MUNIÇÃO: 12,7x99 mm Winchester
    CADÊNCIA DE TIRO: 400 a 600 tpm
    ALIMENTAÇÃO: Fita de elos desintegráveis com capacidade variada
    SEGURANÇA: Os modelos antigos não possuem, mas o ainda actual M2E2 tem junto ao gatilho um fecho manual de segurança
    FUNCIONAMENTO: Arma de tiro semi e automático com curto recuo do cano, disparando no sistema de culatra fechada
A metralhadora pesada Browning M2HB, colocada em reparo duplo, num navio de guerra
Em algumas unidades de cavalaria, em especial as que tinham blindados de origem inglesa existiu ainda a metralhadora média BESA, fabricada naquele país (baseada no modelo checoslovaco ZB-53, de 1936, desenhada por Vaclav Holek), no calibre 7, 9mm.

1.1.2. AS FORÇAS DO PAIGC

As forças de guerrilha do PAIGC estavam bem equipadas no que concerne a metralhadoras pesadas, especialmente fornecidas pela antiga URSS e países satélites; as Goryunov SG-43 e SGM, no calibre 7,62x54 mmR, que foram construídas durante a IIª Guerra Mundial e que se mantiveram ao serviço dos russos até aos anos 60, as Degtyarev DShK, no calibre 12,7mm, de 1938, reformuladas em 1946 (DShKM – m/38-46) e, especialmente, as Vladimirov KPV, no calibre 14,5 mm, que entraram ao serviço da URSS em 1949.
Metralhadora Pesada Goryunov SG-43
Características desta arma
  • ORIGEM: URSS
    CALIBRE: 7,62 mmR
    DATA DE FABRICO INICIAL: 1942
    COMPRIMENTO: 1,15 m
    VELOCIDADE INICIAL À BOCA DO CANO: 800 m/s
    PESO: 13,8 Kg, 41 Kg com reparo de rodas
    ALIMENTAÇÃO: Fitas de 200 OU 250
    CADÊNCIA DE TIRO: 500 a 700 tpm
    MUNIÇÃO: 7,62X54 mmR
    FUNCIONAMENTO: Arma automática, a funcionar por gases


Metralhadora pesada Degtyarev DShK

Características desta arma

  • ORIGEM: URSS
    CALIBRE: 12,7 mm
    DATA DE FABRICO INICIAL: 1938
    COMPRIMENTO: 1,625 m
    VELOCIDADE INICIAL À BOCA DO CANO: 860 m/s
    ALCANCE PRÁTICO EM TIRO TERRESTRE: 2000 m
    ALCANCE PRÁTICO EM TIRO ANTI-AÉREO: 1000 m
    PESO: 35,5 Kg
    ALIMENTAÇÃO: FITAS DE 250
    CADÊNCIA DE TIRO: 540 a 600 tpm
    MUNIÇÃO: 12,7X108 mm
    FUNCIONAMENTO: Arma automática, a funcionar por gases

Metralhadora pesada Vladimirov KPV
Características desta arma
  • ORIGEM: URSS (Krupnokaliberniy Pulemyout Vladimirova)
    CALIBRE: 14,5 mm
    DATA DE FABRICO INICIAL: 1944 (protótipos) ENTADA AO SERVIÇO DO EXÉRCITO EM: 1949
    COMPRIMENTO: 2 m
    VELOCIDADE INICIAL À BOCA DO CANO: 990 m/s
    ENERGIA DO PROJÉCTIL: Entre 30 a 32000 joules
    ALCANCE PRÁTICO EM TIRO TERRESTRE: 1100 m
    PESO: 49,1 Kg
    ALIMENTAÇÃO: Fitas 100
    CADÊNCIA DE TIRO: 600 tpm
    MUNIÇÃO: 14,5X115 mm
    FUNCIONAMENTO: Arma automática, de curto recuo do cano, com tomada de gases num ponto do cano e arrefecimento a ar

Metralhadoras Vladimirov KPV, constituídas em quadrupla (bateria anti-aérea – ZPU-4)
1.1.3. OBSERVAÇÕES

A Breda era uma arma que necessitava de rigorosa limpeza sempre que era disparada, em especial na zona de tomada de gases e também de cuidados com os seus pentes/lâminas de 20 cartuchos, que serviam para alimentar a arma, pois qualquer amolgadela ou deformação, mesmo que ligeira, poderia causar interrupções no tiro.
As lâminas transportadoras dos cartuchos podiam ser ligadas umas às outras, havendo a curiosidade de não ejectarem os invólucros detonados que eram cuidadosamente repostos na lâmina (uma preciosidade limpa e muito ecológica!).
Cada metralhadora vinha acompanhada de uma máquina de carregar as lâminas.
A Breda foi usada amplamente nas ex-colónias e ainda viu o início da guerra colonial, vindo a ser substituída por outras de munição NATO, a partir de 1963.
Na Guiné, embora a Breda possa ter sido utilizada anteriormente em viaturas (semi-blindadas ou não), a sua melhor utilização terá sido na defesa dos aquartelamentos. Nos anos a que me reporto (1971-74), existiam ainda metralhadoras Breda em alguns aquartelamentos, contribuindo para a sua defesa imediata.
A metralhadora Browning M2HB (.50 – cartucho de 12,7 mm desenvolvido pela fábrica Winchester), é uma das mais fantásticas armas de guerra fabricadas até hoje. Foi criada por John Moses Browning (um dos mais produtivos inventores de armamento de sempre) e, juntamente com a Kalashnikov, são consideradas das armas mais difundidas mundialmente.
A Browning pode ser utilizada como arma anti-aérea, terrestre e também naval, em tiro directo ou indirecto. Pode usar munições perfurantes, explosivas, tracejantes, incendiárias e perfurante anti-tanque.
Pode ser colocada em reparos e posições apropriadas para aviões, viaturas blindadas ou não e em diverso tipo de barcos/navios, etc.
Com larga utilização na IIª Guerra Mundial, a Browning M2HB, foi sendo actualizada e entrou em todas as guerras em que os EUA estiveram envolvidos, nomeadamente na Guerra da Coreia, do Vietname, do Camboja, das intervenções no Panamá e na Somália, nas Guerras do Golfo, do Afeganistão e do Iraque. Terão sido produzidas mais de 3 milhões desta fantástica arma.
Muito provavelmente a partir de 2011 uma nova metralhadora, a GD-LW50MG, com o peso de 18 kg (+ 10 kg com tripé), fabricada pela firma norte-americana General Dynamics será introduzida nas forças armadas americanas, para substituir as Browning.
A Browning foi utilizada na Guiné em posições de defesa de aquartelamento, em veículos semi-blindados, nas lanchas e nos aviões F-86 Sabre, que estiveram presentes no início do conflito, tendo sido retirados por pressão dos EUA, por serem considerados material NATO (os Harvard T-6 no teatro da Guiné e no tempo em referência, usavam foguetes de 37 mm ou serviam de bombardeiros de ataque ao solo, lançando bombas de 2x50 Kg ou 6x15 Kg. Em outros teatros operacionais (Angola e Moçambique) operavam também com metralhadoras Browning M30, no calibre 7,62 mm e em outros países utilizavam Brownings calibre 12,7 mm (esta preciosa informação foi-nos prestada pelo camarada Miguel Pessoa).
Em meados 1973, o meu Grupo de Combate (IIº GC da CCAÇ 3491) esteve colocado de reforço ao Batalhão de Piche onde, entre outras actividades, participávamos na escolta e protecção aos trabalhos da TECNIL, na estrada entre Piche e Buruntuma.
Nessas acções éramos acompanhados por elementos do Esquadrão de Reconhecimento de Cavalaria, com viaturas “Chaimite” e “White” e, nestas últimas, estava montada uma metralhadora Browning 12,7 mm em cada uma delas, para além de HK´s-21, morteiro 60 mm e dilagramas, se bem me lembro.
Operacionalmente pudemos apreciar a forma de trabalhar desta arma, quando numa emboscada do IN a uma coluna, ouvimos o seu cantar, enquanto as viaturas do esquadrão percorriam a área sob fogo do IN, ripostando com eficácia.
Num dos locais alvejados pela Browning, estaria um elemento do PAIGC, o qual ao sentir que poderia ser atingido, largou as calças, para se desembaçar das ramagens que, possivelmente, o prendiam e o não deixavam fugir mais depressa.
Na brincadeira, nós pensávamos, o que é que terão dito os outros guerrilheiros ao verem chegar o seu “camarada” sem as calças, em pelota. O barulho da arma era impressionante e galvanizava o nosso lado.
As metralhadoras pesadas do PAIGC foram mais utilizadas como armas anti-aéreas, mas também em defesa directa das suas bases e, nalguns casos, em ataques e flagelações aos nossos aquartelamentos.
Numa das operações que realizámos, já não me lembro se na área de Piche, se na de Nova Lamego encontrámos uma munição nova de 14,5 mm, num dos trilhos, sinal de que, pelo menos, o IN teria transportado uma arma desse calibre por aquela zona.
Das metralhadoras pesadas existentes a Vladimirov KPV, no calibre 14,5mm, era a mais famosa, em especial quando, constituída em posições duplas ou quadruplas [existiam as ZPU-1 (1 cano), ZPU-2 (2 canos) e ZPU-4 (4 canos)], atiravam contra os nossos aviões. Primeiramente foi construída como arma de infantaria, mas a partir dos anos 60 passou a ser utilizada como arma anti-aérea e, na versão KPVT (Tankoviy), como arma dos blindados BTR-60 e BTR-70 e dos BRDM.
Foi também utilizada em navios de patrulha e reconhecimento da marinha de guerra russa.
Recentemente a China melhorou a munição 14,5mm (núcleo em tungsténio), dando-lhe uma velocidade de saída entre os 1000 /1030 metros por segundo e com uma energia de 32000 joules (o dobro do calibre 12,7mm), capaz de perfurar uma chapa de 32cm de aço a uma distância de 500m e uma de 20 cm a uma distância de 1000m.
Estrada Piche - Buruntuma – 1“Chaimite” e 2 “Whites” do Esq. Rec. de Cavalaria, estacionado em Bafatá e em Piche-1973
Notas do autor:
  • Brevemente enviarei a parte respeitante aos morteiros médios e pesados e também sobre os canhões sem recuo.
  • Na recolha para este trabalho foram coligidos elementos, material e fotos, com a devida vénia, da Wikipédia/Internet; How stuff Works.com; Infantry Weapons of the World, da Brassens, Editor J.L.H. Owen; Guerra Colonial, de Aniceto Afonso e Carlos de Matos Gomes, Edição Diário de Notícias; Modern Firearms & Ammunition Encyclopedie; Armamento do Exército Português, Vol. I – Armamento Ligeiro, de António José Telo e Mário Álvares, da Prefácio; Armas de Fogo, seus Componentes, Capacidades e o seu Uso pelas Forças Policiais, de Luís Dias (PJ - Maio de 2004) e apontamentos e fotos diversas do próprio autor

Um abraço,
Luís Dias
Alf Mil At Inf da CCAÇ 3491/BCAÇ 3872
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Notas de M.R.:

Vd. a primeira parte desta matéria no poste:

23 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 – P5690: Armamento (2): Pistolas, Pistolas-Metralhadoras, Espingardas, Espingardas Automáticas e Metralhadoras Ligeiras (Luís Dias)

Vd. último poste desta série em:

31 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5736: Armamento (3): A célebre, irritante e temível costureirinha, a pistola-metralhadora PPSH, usada pelo PAIGC (Luís Dias)

Guiné 63/74 - P6891: Parabéns a você (143): António Fernando Marques, ex-Fur Mil da CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, 1969/71) (Editores)

Postal de aniversário de autoria do génio Miguel Pessoa



No dia 24 de Agosto do ano da graça de 2010, completa 64 anos de idade o nosso camarada António Fernando R. Marques, (ex-Fur Mil da CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71).

Não podia a Tabanca deixar passar este dia sem vir homenagear o nosso camarada Marques, que é um dos que ultrapassaram as dificuldades e o sofrimento causados por ferimentos graves em combate, da forma mais cruel, vítima de uma mina.

Porque merece mais que ninguém, vimos desejar-lhe uma longa vida junto da família que constituiu e dos amigos que granjeou.

Hoje o dia é de alegria, pelo que vamos todos beber uma taça pela saúde e longevidade do Marques, combinando que estaremos por aqui a acompanhá-lo nesta árdua tarefa de somar anos à vida, nunca tirando vida aos anos que nos vão faltando pela frente.

Aqui ficam algumas fotos do nosso aniversariante.


No passado, em Bambadinca, CCAÇ 12, 1970.  Da esquerda para a direita, os Furriéis Milicianos António Marques e Luís Graça (Henriques)

No presente, Lisboa, Janeiro de 2010, António Fernando Marques e Luís Graça de novo juntos.

Óbidos, 22 de Maio de 2010, 16.º Convívio do Pessoal de Bambadinca 1968/71. O António Marques e o Gabriel Conçalves (ex-1.º Cabo Cripto, CCAÇ 12, 1969/71).

António Marques acompanhado pela esposa, a sua companheira na vida.
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 23 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5698: Tabanca Grande (199): António Fernando R. Marques, ex-Fur Mil da CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, 1969/71)

Vd. último poste da série de 22 de Agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6879: Parabéns a você (142): José Luís Vacas de Carvalho, ex-Alf Mil, CMDT do Pel Rec Daimler 2206, Bambadinca, 1970/72 (Os Editores)

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Guiné 63/74 - P6890: Tabanca Grande (237): Jorge Silva, ex-Fur Mil At Art, CART 2716 (Xitole, 1971/72), e BENG 447 (Bissau, 1972/73)



Blogue do Jorge Silva, Amigos do Xitole... O Jorge foi Fur Mil, de rendição individual (1971/73), tendo prestado serviço na CART 2716 (Xitole, 1971/72) e no BENG 447 (Bissau, 1972/73).




Aspecto da passagem de uma coluna de reabastecimentos na estrada Bambadinca-Xitole, antes da Ponte dos Fulas. Vê-se uma viatura militar com tropas nativas (CCAÇ 12) e, de pé, à esquerda, um elemento da CART 2716 que fazia a segurança da estrada.  (JS)


Foto (e legenda): © Jorge Silva (2010). Todos os direitos reservados
1.  Mensagem de Jorge Silva, que vive em Ermesinde, Valongo, enviada no dia 18 do corrente: 

Assunto: Guiné - Xitole

Os meus melhores cumprimentos. Chamo-me Jorge Silva, ex- Furriel Miliciano, atirador de artilharia. Mobilizado em rendição individual, estive na Guiné entre 01/05/71 e 24/04/73.

De 1971 a 1972 estive no Xitole (CART 2716), juntamente com o David Guimarães, entre muitos outros. Como a CART 2716 regressou em Março de 1972, ingressei (milagrosamente) no Batalhão de Engenharia de Bissau (BENG 447). Depois de aceder ao seu blogue (e a outros que se lhe ligam) resolvi puxar pela memória e escrever algo, à medida que vai saindo.

Em breve terei fotos (minhas) e da época para partilhar. Como não sabia como fazer para utilizar o seu blogue (se tal é possível), resolvi criar um, Amigos do Xitole (http://cart2716.blogspot.com/) onde já publiquei 2 temas.

Caso tenham algum interesse,  poderá utilizá-los como bem entender. Não me lembro se nos encontrámos em terras da Guiné, mas creio que sim. Um abraço, Jorge Silva


2. Comentário de L.G.:

Meu caro Jorge (foto à direita):

É mais do que provável termo-nos encontrado, nomeadamente no Xitole (mas também em Bambadinca), na sequência de colunas logísticas da CCAÇ 12 e de operações conjuntas no Sector L1... Atravessei, diversas vezes, a Ponte dos Fulas que tu evocas tão bem no blogue que acabas de criar. Percebo o teu interesse em partilhar connosco as memórias desse tempo e lugar. E louvo a tua iniciativa de criar o teu próprio blogue, com um nome tão sugestivo, Amigos do Xitole: Em nome do passado, o Xitole merece ter futuro... 

É também o nosso lema: a Guiné-Bissau e os nossos amigos e irmãos guineenses merecem ter futuro... 

Vens juntar-te à nossa Tabanca Grande (*), de que o David Guimarães, teu camarada, foi/é um histórico, remontando a sua entrada logo ao início, em Maio de 2005, se não me engano... Conheces as nossas regras do jogo já que acompanhas tanto o nosso blogue como o blogue da Tabanca de Matosinhos... Gostaria, entretanto, que me mandasses uma foto tua actual.  Com a tua entrada, passamos a ter 439 tabanqueiros...

Entretanto, da CART 3492 (que foi substituir a CART 2716) temos muito mais camaradas, como tu sabes, a começar pelo Álvaro Basto, co-fundador e co-administrador do blogue da Tabanca de Matosinhos & Camaradas da Guiné.

Um Alfa Bravo para ti. Luis
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Nota de L.G.:

(*) Último poste desta série > 20 de Agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6875: Tabanca Grande (236): Bernardino Rodrigues Parreira, ex-Fur Mil da CCAV 3365/BCAV 3846 e CCAÇ 16 (S. Domingos e Bachile, 1971/73)

Guiné 63/74 - P6889: As minhas memórias da guerra (Arménio Estorninho) (17): Fotos da disposição dos edifícios do aquartelamento de Empada

1. Mensagem de Arménio Estorninho* (ex-1.º Cabo Mec Auto Rodas, CCAÇ 2381,Ingoré, Aldeia Formosa, Buba e Empada, 1968/70), com data de 22 de Agosto de 2010:

Camarada e amigo Carlos Vinhal,
Renovadas saudações guinéuas.

Estando a preparar um trabalho sobre fotografias, a fim de mostrar o Aquartelamento de Empada e o seu perímetro, e, de como se apresentava no pretérito ano de 1969, deparei-me com a leitura do texto inserido no Poste 6866, da autoria do ex-1.º Cabo Radiotelegrafista, José Pinto Ferreira, CCS/Bcaç 237 que se enquadra nos acontecimentos havidos no principio da subversão na Região de Quinara, nas Penínsulas de Cubisseco e de Pobreza (Darssalame, Caur, Cubisseco, Iangué, Pobreza, Canchungozinho e Empada).

Com um grande abraço
Arménio Estorninho
Ex-1.º Cabo Mec. Auto Rodas
CCaç 2381 “Os Maiorais de Empada”


AS MINHAS MEMÓRIAS DA GUERRA (17)

Fotos da disposição dos edifícios do aquartelamento de Empada

Assim, tendo a CCaç 2381, em 01/05/69 assumido a responsabilidade do Subsector de Empada e para melhor se compreender no mesmo a situação do In, necessário se tornara ainda que sucintamente, estudar a evolução do desenvolvimento da subversão no seu início. Para isso foi estudada toda a documentação existente na Unidade e no Posto Administrativo, além de terem sido ouvidos os elementos da população de há muito radicados em Empada e que foram protagonistas ou, pelo menos, testemunhas dos factos.

Conjugando os testemunhos já dados, com as acções havidas no Subsector de Empada, pela CCaç 153 – Fulacunda 1961/63 sob o Comando, ao tempo, do Cap. Inf. José dos Santos C. Curto. E, também da CCaç 417 - 1963/64, esta por ter sido colocada na sede deste Subsector sob o Comando ao tempo do Cap. Inf. Carlos F. Delfino.
“Por elementos da população também fora-me dito, que ao tempo as Autoridades Militares e Administrativas, condicionaram a população residente a ficarem controladas por nós ou a refugiar-se em Tabancas no mato, Sic.”
Entre outros fora o guerrilheiro Nino que escolhera refugiar-se no mato, ouvia-se dizer por ele ser de Empada e que ali tinha familiares não se lhe oferecia a flagelações.

Logo que eclodiu o terrorismo através de vicissitudes e peripécias várias. Assim, como nas Tabancas não controladas pelas NT, eram efectuadas operações com o fim de identificar elementos suspeitos de serem simpatizantes do PAIGCC. Da documentação existente tomou-se também conhecimento que houve destruição da nossa parte de Tabancas que apoiavam o In, destruição de Tabancas que nos apoiavam por parte do In, os campos foram-se a pouco e pouco estremando, refugiando-se a população que nos era favorável em Empada e arrebatando o inimigo para fora do nosso alcance as restantes populações, refugiando-se e organizando-se nas zonas da Península da Pobreza (Darssalame, Iangué, Aidará, Cã Beafada e Cã Balanta).

O In organizava-se fortemente nas regiões antes referidas, criando uma organização politico-administrativa suficientemente forte para controlar totalmente a população, doutriná-la e mentalizá-la, enquanto abria escolas, embora de baixo nível, e procurava dar à população uns rudimentos de assistência sanitária, com estabelecimento de enfermarias, que, embora de fraco valor intrínseco, não deixava de constituir elementos preponderantes de uma propaganda insidiosa.

Sabe-se que o In em Iangué se encontrava preso de um forte e estranho fanatismo, que o levava a lançar-se contra as NT sem qualquer receio de morte. Grupo In de 04 elementos ataca com pistola-metralhadora, avançando a peito aberto. Supondo-se que tal fanatismo se deve ao facto do responsável político da Pobreza “Né Né”  ter sido criado e educado por um antigo Chefe de Posto, aposentado, que se julga ter sido Pastor Protestante e foi tomado como tendo ligação com os terroristas. Contam-se “estórias” havidas sobre este e outros elementos, mas não consta quem as autorizou e/ou provocou. Em principio “Né Né” refugiou-se no mato como Aníbal, deve ter jurado “Ódio eterno aos Portugueses.” Este facto é subjectivo mas atribui-se-lhe grande valor.

Constatando-se que a área do Subsector de Empada coincide em linhas gerais, com a do Posto Administrativo, fácil nos é apreciar recorrendo aos arrolamentos existentes antes da subversão e verificar a situação desfavorável em que ficamos.
Segundo dados de 1963 o número de contribuintes era de 2388 e o total de habitantes com mais de 16 anos 8827. Por conseguinte quando efectuado este estudo existiam do nosso lado 437 contribuintes, sendo o número de habitantes das condições anteriormente expressas de 2798.

Verificamos assim facilmente que apenas 1/6 dos contribuintes e 1/4 da população estão controlados por nós. Por outro lado embora a área efectivamente patrulhada pela Unidade seja de 1/3 da área total, tendo o In se refugiado nas zonas agricolamente ricas e onde pode facilmente subsistir e apoiar outras regiões.
A população de Empada é na sua maioria de etnia Biafadas, apresentando no entanto também Mandingas, Fulas, Manjacos e algumas famílias dispersas de Balantas, Bijagós, Papéis e Mancanhos.

Assim, foram apresentados dados sobre um estudo feito em Empada, em 1969 e que serve para um melhor conhecimento do início da subversão (1963) nas penínsulas de Cubisseco, da Pobreza e área de Aidará, na Região de Quinara.

Do Aquartelamento de Empada – Região de Quinara, ano de 1969, o que me oferece apresentar são uma resenha de fotos da existência e da disposição dos edifícios contidos, bem como a sua zona limítrofe.

Foto 1 > Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > 1969 > Porta de Armas do Aquartelamento e casernas dos Praças.

Foto 2 > Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > 1969 > Aquartelamento, edifícios de Messes e Camaratas de Oficiais e Sargentos, e Comando. Ao fundo no centro/esquerda, vimos o Rio Buba e a zona do Cais.

Foto 3 > Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > 1969 > Aquartelamento, Porta de Armas virada ao exterior e Escola Primária.

Foto 4 > Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > 1969 > Aquartelamento, Porta de Armas, edifício prisional em construção e Enfermaria Militar. Ao fundo caminho para a Pista e Cais, e ao lado uma Tabanca.

Foto 5 > Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > 1969 > Aquartelamento, edifícios de casernas, cantina, arrecadações, balneários e no extremo direito o refeitório dos Praças.

Foto 6 > Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > 1969 > Aquartelamento, foto tirada no lado oposto dos edifícios mostrados na foto 5.

Foto 7 > Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > 1969 > Um dos sete abrigos tipo, dispersos pelo Aquartelamento e perímetro da Povoação.

Foto 8 > Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > 1969 > No perímetro do Aquartelamento, a Capela Campal, o espaldão de morteiro 81 mm e um abrigo

Foto 9 > Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > 1969 > Limite da Aquartelamento com duas fiadas de arame e pequena Tabanca.

Foto 10 > Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > 1969 > Parque da Oficina Auto e no exterior moranças ladeando a dita avenida.

Foto 11 > Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > 1969 > Posto de Assistência Médica e dada pelos Militares Enfermeiros e outros.

Foto 12 > Guiné-Bissau > Região de Quinara > Empada > 1969 > Avenida que em tempos fora iluminada e apresentava-se ladeada por moranças.

Assim, foram compiladas transcrições de documentos, ouvida a população e feita esta crónica, quanto às fotos do Aquartelamento de Empada, a muitos irá avivar a memória recordando alegrias e tristezas ali passadas.

Nomeadamente a Cart 2673 “Leões de Empada,” que renderam a CCaç 2381 “Os Maiorais de Empada,” em 24 de Fevereiro/70 passaram um mau bocado tendem sofrido várias baixas.

Camaradas estive onde vocês estiveram, andei por lugares que também andaram e apresento o que vocês encontraram à chegada. Não nos encontramos e deve-se ao facto de eu antecipadamente seguir para Bissau em 15 de Janeiro/70.

Com um grande abraço
Arménio Estorninho
Ex-1.º Cabo Mec. Auto Rodas
CCaç 2381 “Os Maiorais de Empada”
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 17 de Agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6865: As minhas memórias da guerra (Arménio Estorninho) (16): A chegada à Guiné e a terras de Ingoré

Guiné 63/74 - P6888: Em busca de... (140): Ilustração para a capa do livro Estranha Noiva de Guerra (Armor Pires Mota)

O nosso camarada Armor Pires Mota procura uma foto para ilustrar a capa do seu próximo livro "Estranha Noiva de Guerra". A ilustração deverá registar um acto de salvamento ou transporte de um militar ferido em combate, por um seu camarada.

Tendo sido contactado pelos camaradas Armor Pires Mota e Beja Santos para encontrar algo publicado e que estivesse dentro do pretendido, enviei algumas fotos retiradas do nosso Blogue. Em caso de escolha de algumas delas seria pedida a devida autorização aos proprietários das mesmas, como mandam as boas normas.
A escolha recaiu sobre a foto que se reproduz e que foi publicada no poste 5420, onde se vê, à esquerda, um militar levando aos ombros um camarada ferido em direcção ao heli de evacuação.

Não se sabe ao certo de quem é a foto (julgávamos que era do nosso camarada Alf Mil Pilav Jorge Félix), mas  a responsável pela Editora do livro rejeitou-a pela pouca resolução que tem.

Assim vimos solicitar aos nossos camaradas e leitores em geral para contactarem o nosso Blogue caso possuam fotos onde apareça um camarada numa acção de salvamento e/ou transporte de outro camarada.
Se o proprietário da foto escolhida e reproduzida ler este apelo e a quiser disponibilizar, contacte por favor o Blogue.
Será ressalvada a devida propriedade intelectual.

Deixamos agora a última troca de mensagens entre os camaradas Armor Pires Mota e Mário Beja Santos.

1. Mensagem, com data de 17 de Agosto de 2010, de Mário Beja Santos dirigida a Armor Pires Mora, a propósito da procura de uma ilustração para o próximo livro "Estranha Noiva de Guerra"* de autoria deste nosso camarada:

Meu prezado Armor,
Julgava que estava tudo esclarecido, vejo que falta o material básico para a ilustração da capa.
Aquando dos meus diários, entreguei praticamente todo o meu espólio ao cuidado do Luís Graça, quando eu bater a bota espero que enviem esse material para o Arquivo Histórico-Militar.
O que lhe posso disponibilizar já, na emergência, é a aguarela do pintor Manuel Botelho com o Unimog destruído. O meu amigo Jaime Machado ofereceu-me uma fotografia que tirou em Janeiro de 1969 com a recolha de um ferido grave numa DO. Se porventura esta imagem interessar, teremos de pedir licença ao Jaime Machado. Vou estar ausente nos próximos 3 dias. Se este material não for conveniente, terá de bater à porta novamente do Carlos Vinhal. Espero que tudo se resolva rapidamente e bem.

Um abraço do
Mário Beja Santos



2. Mensagem de Armor Pires Mota dirigida a Mário Beja Santos na mesma data:

Meu Amigo Mário;
Grato pela sua contínua disponibilidade. Realmente aquela fotografia excelente na força do conteúdo foi uma imensa pena não ter a resolução suficiente.
Quanto às que fez o favor de enviar, agradeço, mas a primeira é uma foto geral e a segunda é uma pintura que a editora não utilizará, porque prefere uma foto que seja documento.
Estou a fazer alguns contactos com camaradas do meu pelotão, que passaram pelo QG em Bissau na tentativa de uma solução.
Escrevi também ao advogado Carlos Silva no mesmo sentido.
Será pedir-lhe de mais lançar no site do Luís Graça, onde o Amigo é pessoa estimada e com voz activa, um apelo aos ex-combatentes, já que muitos milhares o consultam? Pode ser que…
Faça isso pela sua MULHER GRANDE, por todas as bajudas.

UM abraço de gratidão,
APM



Guileje > CCAÇ 726 (Out 64 / Jul 66) > O pessoal em operações militares: na foto, acima, transporte às costas de um ferido, evacuado para o HM 241, em Bissau, por um helicóptero Alouette II (versão anterior do Alouette III, que nos era mais familiar, sobretudo para aqueles que chegaram à Guiné a partir de 1968).

Fotos: © Alberto Pires (Teco)./ AD - Acção para o Desenvolvimento, Bissau (2007) / Jorge Félix (2009). Direitos reservados.
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 13 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6727: Bibliografia de uma guerra (57): Estranha Noiva de Guerra, de Armor Pires Mota, a publicar em Setembro de 2010 (Mário Beja Santos)

Vd. último poste da série de 16 de Agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6858: Em busca de... (139): Fur Mil Enf Carlos Alberto e outros camaradas da CCAÇ 2464/BCAÇ 2861, Biambe e Nhala, 1969/70 (Armando Pires)

Guiné 63/74 - P6887: Recortes de imprensa (27): Repressão da PIDE/DGS, em Cabo Verde, na sequência do assalto, feito por militantes do PAIGC, ao barco de cabotagem Pérola do Oceano, Ilha de Santiago, 19 de Agosto de 1970 (Nelson Herbert)

"
1.  Eis uma notícia que passou na imprensa de Cabo-Verde, em 19 do corrente, com a publicação de um comunicado ou nota de imprensa da Associação Defesa da Memória, ONG cabo verdiana (ainda pouco conhecida), assinalando uma efeméride, considerada importante para a história recente daquele antigo território português, o 40º Aniversário do maior número de prisões feita pela PIDE em Cabo Verde, num só dia... O recorte de imprensa foi-nos enviados pelo membro da nossa Tabanca Grande, Nelson Herbert (jornalista, Voz da América, EUA, foto à esquerda), natural da Guiné, filho do famoso, no seu tempo, jogador de futebol Búfalo Bill, o Armando Lopes, que celebra justamente hoje 90 anos, e a quem reiteramos os votos de parabéns (LG).


"Efeméride: 40º Aniversário de maior Prisão feita pela PIDE em Cabo Verde

"Há precisamente 40 anos, em 19 de Agosto de 1970 a PIDE, Polícia Internacional de Defesa do Estado Português, realizou a sua mais extensiva captura e aprisionamento políticos de militantes da resistência interna do PAIGC (Partido Africano para Independência da Guiné e cabo Verde) em Cabo Verde"!, diz a nota de imprensa distribuída pela Associação de Defesa da Memória.


"Essa acção da PIDE foi realizada na sequência do assalto ao navio Pérola do Oceano em Agosto de 1970, por um grupo de militantes do PAIGC de Santa Catarina, infiltrados por um informante da PIDE, José Borges, como sendo coronel do PAIGC, com intuito de irem buscar arma(s) na Guiné Conacry para a Libertação de Cabo Verde. Nesse ambiente repressivo e de movimentação da PIDE e das forças armadas portuguesas em toda a ilha de Santiago, mais de quarenta suspeitos foram aprisionados. Entre eles destacava-se Pedro Martins, responsável do PAIGC, estudante do 7º ano dos liceus, preso com grande aparato militar.

"Pelas informações arrancadas em outros detidos, particularmente no grupo dos assaltantes do Pérola de Oceano, a PIDE convencera-se que tinha capturado uma das cabeças mais importantes do PAIGC em Cabo Verde.


"Sujeito a uma tortura impiedosa de quase seis meses, Pedro Martins, de facto,  resistiu à PIDE, proeza a que poucos se podem gabar, considerando a impunidade e a barbárie dessa polícia colonial fascista. Nenhum segredo do PAIGC e nenhum nome de militante foram-lhe arrancados pela PIDE. Esse comportamento só poderá ser atribuído à sua firme convicção e dedicação à Luta para Independência de Cabo Verde.


"No então concelho de Santa Catarina viveu-se momentos de muita repressão e tensão políticas. “O ar tornou-se irrespirável",  como afirmaria um militante do Partido. Entretanto, os companheiros de Pedro Martins não desistiram e prosseguiram com a militância política em prol da Independência de Cabo Verde.


"Quarenta anos depois desse acontecimento histórico, do comportamento patriótico de militantes do PAIGC, como o do Pedro Martins, sentimo-nos na obrigação de assinalar a data histórica de 19 de Agosto de 1970 e de saudar a Luta pela Independência Nacional e particularmente dos que estiveram na resistência interna e enfrentaram o poder repressivo colonial".


A referida Associação exorta, por fim, os s professores de história para "que ensinem aos alunos o significado que foi essa data para o triunfo da Independência Nacional no dia 5 de Julho de 1975".

(Nota de imprensa publicado, pelo menos em: Expresso das Ilhas, Vision News, de Cabo Verde; mas também no Correio da Manhã. Reproduzida no nosso blogue com a devida vénia...)

2. Comentário de L.G.:

A Semana tem uma outra versão deste episódio, e aponta a data de 20 de Agosto de 1970, como eféméride, em artigo de opinião assinado por Emanuel C. D’Oliveira

(...) "Nesse dia ou melhor noite, do ano 1970, o barco recebeu carga e passageiros para S. Filipe e Furna, como habitual e rotineiramente fazia. Ninguém desconfiou, nem podia desconfiar, que entre os embarcados encontrava-se um grupo de assaltantes que, disfarçados de passageiros, iam com a intenção de sequestrar e apoderar-se do barco. O grupo ia protagonizar um feito inédito na história do arquipélago.



"!Os planos, porém, não correram como esse grupo, sob disfarce, tinha previsto. Afinal tratava-se de uma manobra da polícia política para desmantelar e capturar elementos afectos ao PAIGC que actuavam na clandestinidade, na ilha de Santiago, mais precisamente em Santa Catarina e Assomada. Veio-se a saber mais tarde que um elemento do grupo tinha montado uma armadilha aos restantes que, na sua boa-fé, pretendiam ir combater o regime português a partir do continente. A desventura do grupo, que acabou preso, é contada ao pormenor em duas obras literárias da nossa praça (Testemunhos de um Combatente,  de Pedro Martins e Tarrafal, Memórias e Verdades,  de José V. Lopes). (...)

(...) "Os assaltantes acabaram presos pela PIDE com a ajuda de militares e da Polícia de Segurança Pública. Nem todos foram encontrados no mesmo dia. Primeiro estiveram detidos na extinta Cadeia Civil que se localizava onde hoje se encontra o Hotel Trópico. Mais tarde transferiram-nos para Tarrafal, tendo sido libertados quatro anos depois, após a revolução portuguesa de 25 de Abril, em 1974". (...)


De qualquer modo, este episódio é pouco conhecido entre nós, e até mesmo entre os guineenses e os cabo verdianos. O nosso blogue é um ponto de (re)encontro de gentes e memórias. Faz por isso sentido evocar aqui esta efeméride. Em Maio passado foi estreado o filme "O Sonho de Liberdade", do cineasta Júlio Silvão Tavares,  baseado nestes factos históricos.

Ficha técnica > Realizador: Júlio Silvão Tavares;  Produtora: Silvão – Produção, Filmes;  Equipa artístico: Assaltantes do navio Pérola do Oceano, familiares e outros testemunhos;  Local de Rodagem: Cabo Verde – Ilhas de Santiago;  Data de início e tempo de rodagem: Abril / Maio de 2007, 25 dias Duração: 52 minutos. Estreia: Cidade da Praia, 9 de Maio de 2010.

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Nota de L.G.:
 
(*) Último poste desta série > 15 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6743: Recortes de imprensa (26): A morte do africanista Basil Davidson (1914-2010), amigo e admirador de Amílcar Cabral (Nelson Herbert / Luís Graça)

Guiné 63/74 - P6886: História da CCAÇ 2679 (38): Situação Geral durante o mês de Dezembro de 1970 (José Manuel M. Dinis)

1. Em mensagem de 22 de Agosto de 2010, José Manuel Matos Dinis* (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), enviou-nos mais um episódio da História da sua Companhia.


HISTÓRIA DA CCAÇ 2679 (38)


SITUAÇÃO GERAL DURANTE O MÊS DE DEZEMBRO DE 1970
(extraído da História da Unidade)


Durante o mês de Dezembro assinalaram-se várias manifestações de iniciativa IN no Sub-Sector da Companhia: duas flagelações ao Aquartelamento de Bajocunda e uma ao Destacamento de Copá.

A actividade operacional também foi neste período bastante grande. Efectuaram-se várias operações e patrulhamentos de contacto com a população e emboscadas nocturnas, sem que, no entanto, houvesse a registar qualquer contacto com o IN.

Neste período a Companhia foi reforçada temporariamente com 02 GComb da CArt 2762, devido à grande actividade operacional dispendida pela Companhia que, além disso, tem de continuar a dar protecção às tabancas de Amedalai, com o PEL MIL 269 e a TABASSAI, ora com GComb da Companhia, ora com os da CCav 2747.

O Natal foi celebrado com a armação de presépios, almoços melhorados e espectáculos de variedades organizados pelo pessoal. SEXA COMCHEFE visitou então o Aquartelamento de Bajocunda e os destacamentos de Copá e Tabassi (fim de citação).


Da actividade respigo as seguintes acções durante o mês:

Em Bajocunda: 7 operações; 5 emboscadas nocturnas; 5 patrulhamentos de combate; 5 patrulhamentos sociais; 3 patrulhamentos de contacto; 1 patrulhamento de reconhecimento.

Em Copá: 1 patrulhamento de combate; 1 patrulhamento de reconhecimento.

Em Amedalai: 1 patrulhamento de reconhecimento.


Minhas notas relativamente ao que antecede:

Sobre a visita de Natal que nos fez o ComChefe, no dia 27, o pessoal cortou-se a denunciar o descarado locupletanço dos xicos da Companhia, que no dia de Natal ignoraram o subsídio de vinte e cinco tostões para melhoria do rancho, e o que foi servido, foi a habitual bianda com estilhaços. Nessa ocasião, o pessoal revoltado no refeitório, não tomou especial atitude, mas dois ou três militares aproximaram-se da messe, onde os graduados e um civil comiam um frugal bife, mas bife, com batatas fritas, julgo que com vontade de dar umas bocas.

Eu estaria próximo da posição deles, e pediram para me falar. Quando me contaram a ocorrência no refeitório, nem quis acreditar, e dirigi-me ao local para confirmar. Ali chegado iniciou-se um burburinho, mas contiveram-se de seguida. Disse-lhes que, dada a circunstância, não me parecia viável fazer uma nova refeição, e aconselhei-os a comer o que era disponibilizado, mas chamei a atenção ao Jesus, o cantineiro, para que a seguir franqueasse o bar, e que o pessoal se servisse à minha ordem.

Regressei à messe e interpelei o capitão, dando conta do que vira e da minha decisão subsequente. E acrescentei que não tinha intenção de pagar qualquer despesa, nem me apetecia acabar a refeição naquela mesa. Peguei no prato e fui para o meu quarto. Seguiu-me um outro furriel, que já não consigo identificar, e sem preocupações perguntava: o que é que os filhos da puta fizeram?

Do caso não resultou nada, mas eu também não denunciei a atitude durante a visita do General. Pairava sempre a desconfiança da protecção que a tropa dava aos carreiristas. Talvez por isso, ninguém se manifestou. Deve salientar-se a falta de escrúpulos e fanfarronice do capitão, como dos sargentos, por terem registado a aldrabice na História da Unidade.

No fim de Novembro o Foxtrot deslocou-se para Copá. Ali permaneci apenas duas semanas, como a seguir revelarei. Encontrei o destacamento e a tabanca com falta de tudo. Falta de munições e falta de alimentos. Dei logo conhecimento da situação.

Era costume os graduados para ali deslocados manterem um negócio de géneros com a população, a quem vendiam arroz e vinho temperado. As provisões eram mínimas e eu fora avisado. Contratei um magarefe, a quem pagava um pouco mais, mas ia ao Senegal comprar vacas e cebolas, o que nos garantia uma alimentação quase de luxo, pois só ficávamos com o melhor da carne e as miudezas para petiscos. Havia farinha com alguma suficiência.

A falta de água era outra constante. Havia um poço muito pouco profundo, dois ou três metros, que de manhã proporcionava uma água argilosa, castanha, que, mais ou menos filtrada, aproveitávamos para a cozinha. Praticamente não tomávamos banho. O clima era o mais agreste que encontrara, com nítidas influências do deserto.

No destacamento havia um lugar de grande responsabilidade, o de encarregado pela tabanca dos géneros: se antes era um lugar da confiança dos graduados, que geriam a alimentação do pessoal e ainda negociavam com a população, actividade que rendeu uns Breitlihgs (relógios populares na época), agora, em regime de vacas magras, determinei a cessação das vendas, e era preciso alguém de muita probidade para ajudar à gestão equilibrada. Não era difícil entre o Foxtrot nomear alguém de aceitação tácita, e, se não me recordo do designado, a coisa funcionou. Tão bem funcionou, que ao fim do dia lá estava o chefe-de-tabanca na palhota que servia de comando, a reclamar por não terem sido atendidos os populares que demandavam por compras. Nunca fui entusiasta em alimentar a preguiça, e aqueles indivíduos eram preguiçosos. Não sei como arranjavam dinheiro suficiente para o supermercado, mas isso indiciava bons negócios com a tropa, pela venda de galinhas, cabritos, e pela prostituição das filhas. Nos arredores havia uma plantação de caju, que não exigia cuidados especiais e garantia rendimento certo.

Ao chefe referi que havia escassez de géneros, que não havia garantia de fornecimento para os próximos dias, e, por isso, estavam suspensas as vendas. Houve algum blá-blá em dialecto, entre o chefe e alguns populares surpreendidos pela novidade, mas a decisão estava tomada. Competia-me garantir a melhor solução para o meu pessoal, apesar de, aparentemente, atentar contra as regras da psícola que, francamente, ignorava, pois nunca tivera acesso a ordens ou instruções que clarificassem essa política de protecção (mais do que colaboração) às populações.

Outro aspecto que critico na política do Governador e ComChefe: a falta de meios para implementação e fiscalização de actividades, à semelhança da ribaldaria que resultava da descentralização de poderes nas companhias, sem que funcionasse alguma auditoria. Entendia eu, que para dar execução às vendas, seria necessário um stock generoso que não comprometesse o quotidiano do pelotão. Nem sabia, nem me interessava, se os géneros eram extraviados de Bambadinca até Copá. Se eu tivesse tido essa incumbência, muitos "rádios" teriam transmitido a situação.

Assim, limitava-me a gerir a presença militar. Mais uma vez manifestava uma atitude anti-social, que poderia vir a sair-me cara.
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 17 de Agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6861: (Ex)citações (92): A Guerra Colonial, todos querem ser heróis (José Manuel M. Dinis)

Vd. último poste da série de 13 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6589: História da CCAÇ 2679 (37): Como se pode ser vítima da sua própria armadilha (José Manuel M. Dinis)