Mostrar mensagens com a etiqueta libaneses. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta libaneses. Mostrar todas as mensagens

domingo, 29 de outubro de 2023

Guiné 61/74 - P24805: As nossas geografias emocionais (12): A fonte pública de Bafatá, construída em 1918, na zona conhecida como a "Mãe de Água" ou "Sintra de Bafatá", local aprazível e romântico onde chegou a haver almoços dançantes ao tempo do Esq Rec Fox 2640 (1969/71)

Foto nº 1 > Guiné > Região de Bafatá > Bafatá : A zona da "Mãe de Água" ou "Sintra de Bafatá" > c. 1969/70 > Um piquenique


Foto nº 2 > Guiné > Região de Bafatá > Bafatá : A zona da "Mãe deÁgua" ou "Sintra de Bafatá" > c. 1968/70 > Na foto, o Fernando Gouveia [ex-alf mil rec inf, Cmd Agr 2957, Bafatá, 1968/70; autor do romance Na Kontra Ka Kontra, Porto, edição de autor, 2011; arquiteto, transmomntano, residente no Porto]

Fotos (e legendas): © Fernando Gouveia (2013). Todos os direitos reservados. [Edição e legednagem complementar: Blogue Luís Graça & Caamaradas da Guiné]



Fotos nº 3 e 4A : Guiné > Região de Bafatá > Bafatá > "Fonte Pública de Bafatá, 1918" (e não 1948, como por lapso indicámos no poste P24803). Na foto, o Manuel Mata, ex-1º cabo apontador de Carros de Combate M 47 do Esq Rec Fox 2640.



Fotos nºs 4 e 4A : Guiné > Região de Bafatá > Bafatá > 1959 > "A fonte pública de Bafatá, 1918"  (e não 1948, como por lapso legendámos inicialmente no poste P24803 (*),

Esta belíssima fonte (Fotos nºs 3 e 4) , na zona da "Mãe de Água",  também conhecida na época colonial como "Sintra de Bafatá", é portanto do início do desenvolvimento urbano de Batafá, ainda no tempo da República. 

Segundo a entrada na Wikipedia, em "1906, o território guineense foi dividido num concelho (Bolama) e seis residências: Bissau, Cacheu, Farim, Geba, Cacine e Buba. (...) Cacheu continuava como capital do distrito de Cacheu, porém perdeu mais da metade de suas terras para a formação dos distritos de Farim (actual Oio) e Geba (actual Bafatá). Geba torna-se capital do distrito de mesmo nome.

"Em 4 de agosto de 1913 'Bafatá'  (primeiro registro com este nome) recebe o título de vila." (...). Foi elevada a cidade 67 anos depois  (em cerimónia que decorreu a 12 e 13 de março de 1970, com a presença do Ministro do Ultramar) (**), segundo o Manuel Mata.
  
Outro guia e especialista de Bafatá dos anos1968/70, o arquiteto Fernando Gouveia, que lá viveu em como alferes miliciano, com a sua esposa,  Regina, descreve esta zona num dos seus postes do roteiro de Bafatá (***), como  sendo a "Mãe d'Água" ou a "Sintra de Bafatá", local aprazível e romântico onde havia umas mesas para piqueniques e que, de vez em quando, "a esposa do comandante do Esquadrão organizava uns almoços dançantes em que eram convidados, além dos alferes, e alguns furriéis, "todas as meninas casadoiras de Bafatá, libanesas e não só"... 

 O Fernando Gouveia não quis identificar o Esquadrão, mas o último do seu tempo, foi o Esq Rec Fox 2640, Bafatá, 1969/71, cujo comandante era o cap cav Fernando da Costa Monteiro Vouga; reformou-se como coronel, e é autor de diversos livros sob o nome de Costa Monteiro.
 
A foto nº 4 foi-nos disponibilizada pelo nosso camarada Leopoldo Correia (ex-fur mil da CART 564, Nhacra, Quinhamel, Binar, Teixeira Pinto, Encheia e Mansoa, 1963/65); esta e outras fotos otos de Bafatá, de 1959, foram tiradas por um familiar do nosso camarada. "ligado ao comércio local (Casa Marques Silva), casado com uma senhora libanesa, filha do senhor Faraha Heneni".
____________


(***) Vd. poste de 12 de dezembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12434: Roteiro de Bafatá, a doce, tranquila e bela princesa do Geba (Fernando Gouveia) (10): A Mãe d'Água ou a 'Sintra de Bafatá', local aprazível e romântico onde se realizavam almoços dançantes para os quais se convidavam os senhores alferes, alguns furriéis e as moças casadoiras

segunda-feira, 21 de novembro de 2022

Guiné 61/74 - P23800: Memória dos lugares (445): O Xitole que eu conheci em 1971/72, no tempo da CART 3492 / BART 3873 e do "tio" Jamil Nasser (Joaquim Mexia Alves)


Foto nº 1



Foto nº 2


Foto nº 3


Foto nº 4



Foto nº 5


Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > Xitole > 6 de abril de 1972  > Um almoço de chabéu que o Jamil (fotos nºs 1 e 4)  me ofereceu no dia dos meus anos,  precisamente no alpendre da frente da sua casa (Fotos nºs 2 e 3). .Foram convidados o Capitão Godinho e a sua mulher, bem como os alferes da companhia a que se juntou , por ter vindo em coluna do Saltinho,  o alf Armandino (meu camarada de curso de Operações Especiais), que veio a falecer escassos dias depois na célebre emboscada do Quirafo  [em 17 de abril de 1972]. Está sentado na ponta da mesa, juntamemte  com  o Chefe de Posto (Foto nº  2 e 4, aqui junto ao cap Godinho)..

Fotos (e legendas):  © Joaquim Mexia Alves  (2022). Todos os direitos reservados.Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Zona leste > Região de Bafatá >  Setor L1 (Bambadinca) > Xitole > c. 1970 > Uma coluna logística, vinda de Bambadinca, chega a Xitole, atravessando a ponte dos Fulas, sobre o rio Pulom, ao fundo. A viatura civil, em primeiro plano, podia muito bem ser do nosso conhecido comerciante libanês Jamil Nasser, amigo de alguns dos nossos camaradas que passaram pelo Xitole, como foi o caso do Joaquim Mexia Alves.  Nessas colunas logísticas integravam-se viaturas civis de diversos comerciantes da zona leste. Foto do álbum de Humberto Reis, ex-fur mil op esp, CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71).


Foto (e legenda):  © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados.Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do Joaquim Mexia Alves, ex-alf mil op esp / ranger, CART 3492/BART 3873, (Xitole/Ponte dos Fulas); Pel Caç Nat 52, (Ponte Rio Udunduma, Mato Cão) e CCAÇ 15 (Mansoa), 1971/73, régulo da Tabanca do Centro (Monte Real):

Data - 21 nov 2022 10:09

Assunto . - Xitole: Serração do sr. Henrique Martinho, amigo do Jamil, que deixou a Guiné em 1962 (*)

Caro Luís

Como sabes o Jamil e eu tínhamos uma forte relação de amizade. Tratava-o muitas vezes por Tio Jamil! (**)

Enquanto estive no Xitole, praticamente todos os dias ia a casa do Jamil ao fim da tarde e, sentados no seu alpendre, bebíamos whisky com água Perrier acompanhado de bocados de tomate só com sal.

Ele ouvia as notícias em árabe e comentava comigo o que se ia passando no seu Libano.

Tenho para mim que a casa que na foto tem o alpendre em ruínas, era a casa do Jamil, só que essa vista é de lado ou seja é do lado que dava para o quartel e assim o David Guimarães terá razão.

A frente da casa tinha a continuação desse alpendre e dava para a estrada que vinha de Bambadinca.

Do outro lado da estrada, mais ou menos em frente da casa, e um pouco afastado da estrada, ficava o armazém de venda do Jamil, que poderia muito bem ter sido a tal serração de que fala Maria Augusta Martinho Antunes.

Anexo fotos de um almoço de chabéu que o Jamil me ofereceu no dia dos meus anos em 6 de abril de 1972, precisamente no alpendre da frente da sua casa. Foram convidados o Capitão e a sua mulher, bem como os Alferes da Companhia a que se juntou por ter vindo em coluna do Saltinho o Alf Armandino, (meu camarada de curso de Operações Especiais), que veio a falecer escassos dias depois na célebre emboscada do Quirafo, sentado na ponta da mesa, e também o Chefe de Posto.

A minha amizade com o Jamil era tal que numas férias da Guiné em Lisboa, por coincidência ele estava também em Lisboa, (ficava num hotel encostado ao então cinema Tivoli, Hotel Condestável?), e então fomos almoçar juntos, se bem me lembro.

Depois perdi completamente o rasto ao Jamil Nasser, mas a sua amizade e a sua companhia foram um bálsamo naqueles primeiros meses de Guiné.

Podes, obviamente, servir-te deste email para o que quiseres.

A foto nº 4 somos o Jamil e eu no dia do almoço.

Um abraço para ti e para todos do
Joaquim Mexia Alves

_____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 20 de novembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23799: Memória dos lugares (444): Xitole, onde cresci desde bebé até 1957, quando vim para a metrópole estuda... O meu pai, Henrique Martinho, tinha lá uma serração, e era amigo do comerciante libanês Nasser Jamil... (Maria Augusta Martinho Antunes)

sábado, 22 de outubro de 2022

Guiné 61/74 - P23728: Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte IV: Infância e adolescência


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de Dezembro de 2009 > 17h543 > Um das nossas conhecidas ruas de Bafatá, já ao entardecer... Foto do João Graça, músico e médico, 40 anos depois do foto da mesma artéria tirada pelo Jorge Tavares, a seguir reproduzida.

Foto: © João Graça (2009). Todos os direitos reservados    [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].



Guiné > Bafatá > 1968 > Guiné > Bafatá > 1968> Foto do ex-furriel mil radiomontador Jorge Tavares, CCS/ BCAÇ 2856 (Bafatá, 1968/70). (No livro, a foto é erradamente atribuída ao Humberto Reis, pág. 17).

Reconstituição feita pelo ex-fur mil op esp Humberto Reis, da CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, 1969/71): "Esta é (era) rua principal (alcatroada, como todas as demais) da doce e tranquila Bafatá, com as suas casas de arquitectura tipicamente colonial; ao fundo era o mercado e cortava-se à direita, para a piscina; na primeira à direita, ficava o restaurante A Transmontana; do lado esquerdo, no início da foto, ficava a casa do Administrador e os CTT; a meio, a rua era cortada pela estrada que ligava a Geba".

Legenda do Amadu Bailo Jaló: "Rua de Bafatá. Do lado direito, junto ao carro estacionado, era a casa do Chico Paulo, um comerciante europeu; a casa a seguir, pintada de branco, era de um libanês, Assad, one trabalhava o meu pai (in: Amadu Bailo Jaló -  - p. 17)

Foto: © Jorge Tavares (2005) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados


 

Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015)


1. Continuamos a reproduzir, aqui no nosso blogue, alguns excertos do livro de Amadu Bailo Djaló, "Guineense, Comando, Português" (Lisboa, Associação de Comandos, 2010, 229 pp.), de que o Virgínio Briote nos disponibilizou o manuscrito em formato digital. 

Em rigor, o livro (escrito na primeira pessoa, portanto autobiográfico) deveria ter como segundo autor, o nosso coeditor jubilado, Virgínio Briote (ex-alf  mil, CCAV 489 / BCAV 490, Cuntima, jan-mai 1965, e cmdt do Grupo de Comandos Diabólicos, set 1965 / set 1966),  que fez generosa e demoradamente as funções de "copydesk".

Como temos sublinhado, o livro, publicado em 2010, está esquecido, a edição está há muito esgotada, mas o Amadu Djaló continua na nossa memória e nos nossos corações.  Basta ler alguns comentários recentes dos nossos leitores.


(i) Carlos Silva:

(...) Convivi muito de perto com o Amadu Djaló, pois encontrava-o quase diariamente em Bissau II / Rossio onde sempre trocávamos uns "dedos de conversa ". O Amadu era um homem calmo, honesto, bom conversador. Contribuí para o seu livro com várias fotos a pedido do nosso amigo e camarada Virgínio Briote que estão publicadas no seu interior e a contracapa é de um slide meu que o Virgínio gostou muito. Estive no lançamento do livro que foi nas caves do Museu Militar. Paz à sua alma. (...) 

16 de outubro de 2022 às 12:48 (*)
 
(ii) António Graça de Abreu:

(...) Maravilhas estes textos do Amadu Djaló (...) Que nos valha, falar a sério, perto do coração, o Amadu Djaló, na sua e nossa, tão precária e inesquecível Guiné.(...)  

16 de outubro de 2022 às 12:48 (*)

(...) Palavras justas e sentidas do Amadu Djaló. Ainda tive o gosto de o conhecer e de lhe dar um grande abraço. Homem superior. Não o esqueço. (...) 

23 de setembro de 2022 às 01:59 (***)


(iii) Lucinda Aranha:

(...) Pelos vistos, o nosso Amadu, que conheceu o meu pai em Farim,  era muito namoradeiro. Não perdia tempo. (...)

20 de outubro de 2022 às 20:31 (*)

(iv) José Botelho Colaço: 

(...) Conheci o Amadu,  tenho o livro com autógrafo do prórprio, encontrei-me com ele algumas vezes, mas havia um inicio de um novo trabalho do Virgínio   [o II volume],só que o Amadu deixou de ter condições  [de saúde ].para o prosseguir. Pergunto ao amigo Virgínio será que esse pequeno esboço não tem algo de interesse principalmente para a nossa geração que possa ser publicado?  (...)  

5 de outubro de 2022 às 16:53 (**)

(v) Tabanca Grande Luís Graça:

(...) Sim, o Virgínio começou a trabalhar com o Amadu no II Volume (memórias do "exílio": Senegal, Portugal)...Só ele pode esclarecer em que ponto ficou o trabalho... Em princípio havia um manuscrito, original, sobre o qual os dois trabalharam em conjunto. Foi uma feliz parceria!... Nunca teríamos o livro publicado (o Volume I) sem a infinita paciência, generosidade e competência do Virgínio. (...)

6 de outubro de 2022 às 11:05 (**)

 (...) O que o nosso Amadu Djaló deve ter consultado em 1961, em Catió, foi um "mouro" ou "muru", um vidente... O seu antigo colega de escola Djá (que o tentou aliciar para o PAIGC) seria um vidente, alguém com "poderes mágicos" capaz de adivinhar o futuro e dar conselhos em matéria de saúde, amores, dinheiro, profissão... Proliferam em todos os tempos e sociedades... Em Portugal, há muitos de origem africana e brasileira... Parece que hoje na Guiné-Bissau se usa mais o termo "pauteiro" (do crioulo, "pautéru") para designar  vidente ou mágico. (...)
 
23 de setembro de 2022 às 12:08  (***)


2. Vamos reproduzir um excerto (ou melhor, dois) em que o Amadu fala dos seus primeiros anos de vida, entre 1940 (o ano em que nasceu) e meados dos anos 50 (em que empreendeu a sua primeira grande viagem, até ao país vizinho, a Guiné Conacri, terra dos seus pais, e onde se inicia no comércio ambulante). E depois até a idade, 21 anos, 1962, em que foi para a tropa, fazendo a recruta no CIM de Bolama (**).

Neste primeiro excerto, que publicamos hoje,  podemos ler a notável  descrição, em estilo oral africano,  que ele faz das suas andanças pelo território vizinho, ainda colónia francesa (até 1958), longe dos pais e em plena adolescência, com os seus 13/14 anos. Andou um ano e tal fora de casa, trabalhando com o irmão mais velho. Não tivemos coragem de cortar nada desta prosa saborosa...

Embora nos interesse sobretudo a história da sua vida militar, é importante conhecer  alguma coisa da infância, adolescência e juventudade do Amadu Djaló, para se perceber melhor a sua decisão de se alistar na tropa portuguesa, antes de completar os 22 anos (**). 

Futa-fula, muçulmano praticante, frequentou também, além da escola corânica, a escola católica de Bafatá onde conheceu o missionário italiano do PIME, Arturo Biasutti, e aprendeu a gostar de jogar à bola. Esta experiência, digamos ecuménica, teve seguramenet reflexos positivos na sua formação como homem e na sua conduta na guerra.

Neste primeiro excerto, vamos ver o jovem Amadau, com apenas 13 anos, em princípios de 1954, partir com o irmão mais velho para Boké, para casa de um tio, de onde era natural a mãe; viagem de nove dias, a pé, que o marcou na sua adolescência; o irmão levava uma série de carregadores com mercadorias (roupas) para vender em Boké.

Um ano e tal depois (!), em novembro de 1955, regressa à terra natal,  Bafatá, numa viagem longa, novamente a pé. Aos 16 anos vai conheceu, pela primeira vez, Bissau e um ano depois Bolama.

Verenos depois como, desde muito jovem, ele  luta para  ganhar algum dinheiro e ser independente:  organiza, por exemplo,  bailes e festas, juntamente com um primo, para a juventude de Bafatá, a quem cobra as entradas; as meninas de então chamavam ao Amadu o Mari Velo (ou Mari Belo, como me parece mais lógico, podendo haver aqui uma gralha de transcrição do parte do "copydesk": o Amadu tricava os b pelos v...)..

Mas seguindo o resumo curricular que o Virgínio Briote (foto à direita)  fez do seu amigo e camarada (vd. anexos do livro, pp. 287/288), o  Amadu, enquanto não é incorporado, vai trabalhando na construção civil, primeiro no Gabu, como capataz, um pouco mais tarde em Bafatá; estávamos em 1958. 

Nos princípios de janeiro do ano seguinte, regressa a Bafatá; como sabe ler e escrever, é chamado para a campanha da mancarra. Aos 20 anos quer dar um salto, tornar-se verdadeiramente independente, e consegue abrir uma banca para vender srtigos no mercado de Bafatá.

Mas a incorporação está à porta, como já vimos (**):  recenseado pelo concelho de Bafatá, sob o nº 21 em 1962, é alistado em 4 de janeiro de 1962, como voluntário, no Centro de Instrução Militar (CIM) de Bolama...

Já agora, ficam suamariamente, mais alguns factos relevantes da sua vida militar: depois da recruta em Bolama, segue-se o CICA/BAC, em Bissau, depois Bedanda na 4ª CCaç, a 1ª CCaç em Farim... Vai regressar à CCS/QG, depois vem os Comandos de 1964 a 1966, volta à CCS/QG, depois o BCav 757, BCaç 1877, BCav 1905 e BCaç 2856, todos sediados em Bafatá...

Em meados de julho de 1969, é transferido para a 15ª CCmds, seguindo-se então a 1ª CCmds Africanos, o BCmds da Guiné e a CCaç 21 (sediada em Bambadinca) até ao 25 de Abril de 1974.

E promovido a 1º cabo em 1 de janeiro de 1966 e louvado pelas atuações em operações nesse ano. É novamente louvado, em 1967, em Ordem de Serviço (OS) do BCaç 1877, de 30 de setembro de 1967, pelo seu comportamento em ações de combate  no período de 7 de janeiro a 24 de setembro de 1967.

É, entretanto, graduado em furriel em 6 de fevereiro de 1970 e em 2º sargento em 7 de novembro de 1971, tendo sido louvado pelas ações em que participou durante o ano de 1972. É ondecorado com a Medalha de Cruz de Guerra de 3ª Classe em 1973.

Segue-se a sua graduação  em alferes em 28 de junho de 1973. Pela sua atuação nas operações do ano de 1973 recebe novo louvor. Passa à disponibilidade em 1 de janeiro de 1975, devido à independência do território da Guiné: Mas aí começam os sobressaltos...

Em 1986 veio para Lisboa (depois de  se ter refugiado no Senegal, onde se estabelecera como comerciante). Em 2015 publica  o seu livro de memórias, gracas ao apoio do Virgínio Briote e da Associação de Comandos (capa  à direita). Morre em 15 de fevereiro de 2015, em Lisboa, no hospital militar,  aos 74 anos. (****)


Os primeiros anos da minha vida - Parte I: 
infância e adolescência (pp. 16-24)

por Amadu Bailo Djaló

Chamo-me Amadu Bailo Djaló, nasci em 10 de Novembro de 1940, em Bafatá, na freguesia da Nossa Senhora da Graça.

A minha família era da Guiné Francesa [1]. O meu pai, Tcherno Iaia Tata Djaló, nasceu em 1895, em Tata Fulamori, a meia dúzia de quilómetros de Piche, e a minha mãe, Ana Condé, que nasceu em 1904, era da vila de Boké.

O meu pai amava muito os seus filhos, era um homem que estou sempre a recordar. Trabalhou muitos anos como empregado de balcão numa loja de um libanês, de nome Assad.



Guiné-Bissau > s/l > s/d > Cerimónia do fanado. Fotos cedidas pelo autor, Ernst Schade [2] , reproduzidas no livro, nas pp. 18 e 19.

Os meus pais matricularam-nos, a mim e ao meu irmão mais velho,  na escola do Alcorão [3], que frequentei durante três anos. 

Em 1948 fui para o mato, com três irmãos e mais sete rapazitos para a circuncisão [4]. Ficámos num grande acampamento com um homem mais velho, que tomava conta de nós e que nos dava aulas de moral, lições de comportamento e como respeitar os mais velhos.

Dois meses depois regressámos a casa e passei a frequentar uma escola católica, mesmo em frente à nossa casa, onde jogávamos futebol com as bolas que os padres italianos nos emprestavam.

Havia lá um padre italiano, de nome [Arturo] Biazutti [e não Viazutti..., pág. 19] (*****), que gostava muito de mim, talvez por eu ter grande facilidade em decorar as orações. Hoje tenho pena de a ter frequentado só dois anos. O meu pai não me obrigava a ir e eu acabei por abandonar a escola.

Foi uma época que foi correndo feliz até 1954, quando o meu pai me deixou ir com o meu irmão mais velho a Boké, onde a minha mãe tinha família. (...)

Numa manhã desse ano  [de 1954],  parti de Bafatá, a pé, acompanhando o meu irmão Baba Galé Djaló, que levava três carregadores e as respectivas mulheres. Ia também connosco o nosso primo – irmão, Ussumane Indjai, a mulher dele e mais três carregadores, com grandes quantidades de camisolas pretas, então com muita procura na Guiné Francesa.

Em direcção à fronteira, a corta mato, a olhar para trás e a chorar, é assim que me lembro do início da viagem. Uma viagem muito longa, demorámos nove dias a chegar a Boké 
[hoje 5 horas, de carro, pela N3, cerca de 223 km. LG]- 

Durante o dia caminhávamos, à noite dormíamos em tabancas, onde nos deixavam passar a noite.

Em Boké tínhamos lá um tio, um irmão da nossa mãe, que não conhecíamos. Chegámos num dia à noite e passámo-la em casa de um homem que tinha uma mulher em Bafatá. De manhã, fomos para a praça, à procura do meu tio.

No passeio avistámos um homem, que fixou o olhar no meu irmão. Quando nos encontrámos deu a mão ao meu irmão e perguntou:

− Fula, de onde é?

− Da Guiné Portuguesa.

− De que parte?

− De Bafatá.

− Eu tenho uma irmã em Bafatá, chamada Ana Condé.

− É a nossa mãe  
− respondeu o meu irmão.

Era o meu tio, um homem alto, bonito, de cor clara. Agarrou-me na mão e levou-nos a casa dele. Apresentou-nos à família e aos vizinhos, que ficaram muito contentes por nos verem e terem notícias da família de Bafatá.

Os carregadores do meu irmão transportaram cerca de duas mil e quinhentas camisolas pretas. Levámo-las para Bofa, Doupurou, Colom, Mancunta, Colabui, Tamarance e Boké. Vendemos tudo o que levámos.

Eu estava na altura com cerca de 14 anos. Passado um mês, o meu irmão foi à Serra Leoa, comprar panos, lenços e contas, que passámos a vender nas ruas. Mas estes artigos não se vendiam como as camisolas e o meu irmão mandou-me com a mercadoria para a vender em Bintomodiá.

Dias depois fomos para a ilha de Baga e em fevereiro de 1954 regressámos a Bintomodiá. O meu irmão, que já estava em Boké, telefonou ao homem pedindo-lhe para comprar cola. Com o dinheiro que eu tinha juntado comprou 550 quilos de noz de cola e depois segui para Boké.

Acompanhado de Coto Bobo, três ou quatro quilómetros andados chegámos à estrada que ligava Conackry a Boké. Ficámos ali à espera de transporte e encontrámos um militar, que estava de férias, acompanhado de outro homem que lhe transportava a mala. Pouco tempo depois apareceu um jipe, com duas pessoas, um africano e um branco, que vinha a conduzir e que vim a saber depois que era americano. Pedimos boleia, o jipe parou e nós corremos para entrar. 

O americano disse logo que não podia levar três pessoas. O militar olhou para mim mas eu não quis saber de que assunto estavam a falar. Então, ele e o homem que o acompanhava saíram do jipe e fui só eu. Se soubesse não tinha ido, porque a boleia era só até Tamarance, que ficava a cerca de doze quilómetros de Boké. Eu não podia andar sozinho esses quilómetros todos, de noite, a pé, era ainda muito rapazito para uma viagem tão comprida.

Quando atingimos Tamarance, o americano parou o jipe e fez-me sinal para sair. E agora, onde é que eu estou? O sol estava a pôr-se, a noite ia cair não faltava muito. Condoído, talvez, por me deixar ali, o americano olhou para o relógio e fez um gesto para eu me sentar outra vez. Na minha ideia ele ia-me levar a Boké.

Pôs o jipe a andar e, passado pouco tempo, chegados a um monte, mandou-me descer e apontou com a mão uma tabanca ali em baixo. Agradeci-lhe e fiquei a ver o jipe desaparecer no meio do pó. Dirigi-me para a tabanca, onde à entrada das casas encontrei um homem com uma lata de mel.

− Mano, para onde vais 
  perguntei.

− Boké 
  respondeu.

− Eu também quero ir para lá, vamos juntos?

Disse que ficava essa noite na tabanca e que só ia para Boké na manhã do outro dia. Então, eu respondi-lhe que ia com ele.

Segui-o até uma grande morança, vedada com lascas de cana de bambu, com quatro palhotas, entrámos, vi as pessoas a cumprimentá-lo. Era muito conhecido ali, pensei. A certa altura, ouvi alguém perguntar-lhe para onde levava ele o rapazito.

 
−  Não sei de onde ele vem, disse que vai a Boké  − respondeu.

Aproveitei para dizer que vinha de Bintomodiá, que tinha apanhado boleia num jipe e pedi-lhes para me deixarem passar a noite com eles. O homem disse logo que não tinha vindo comigo, que só nos tínhamos encontrado na estrada.

O homem da tabanca mandou-me ir embora o mais depressa possível. Implorei-lhe, mas ele ameaçou-me com porrada, sempre a dizer alto, "vai-te embora, vai-te embora". Mantive-me sentado e quando o vi levantar a mão para me bater, levantei-me, abandonei a casa e fui para a estrada. Era noite, já estava muito escuro.

Fui a outra casa pedir para me deixarem dormir na varanda, mas responderam que fosse a casa do chefe da tabanca, que era o homem que tinha ameaçado bater-me. De casa em casa, a resposta foi sempre a mesma.

Atravessei uma ponte de ferro, para o outro lado, e dei com outra tabanca, onde só falavam sosso. Havia uma casa, um pouco afastada das outras, e, como não vi ninguém, entrei na varanda, que tinha uma maca. Pensei logo em aproveitá-la para dormir. Quando me sentei nela, a maca fez barulho e ouvi uma voz de homem a perguntar quem estava ali. Voltei a levantar-me, o barulho voltou a ouvir-se, a voz do homem também e eu saí dali sem dizer nada.

Vi a luz de um candeeiro a chegar, alumiou-me a cara, e uma voz perguntou-me quem eu era e o que estava ali a fazer. Que queria descansar um pouco, respondi. Era um velhote, que também me mandou ir embora, a gritar alto que fosse para a estrada, que era lá que se pedia boleia, na casa dele não.

Agora o único plano que eu tinha era chorar alto, para as pessoas ouvirem e ficarem incomodadas. Eu chamava alto pela minha mãe, mas ninguém se aproximou ou quis saber de mim. Estive ali a chorar até já não ter mais lágrimas.

De um momento para o outro, ouvi o ruído de um carro a aproximar-se, corri para a ponte e pus-me no meio. O condutor teve que parar e eu pedi-lhe boleia para Boké. Reparou que eu tinha a camisa toda molhada e mandou-me entrar e sentar-me na cabine, entre ele e o outro homem que o acompanhava. Contei-lhes o que se tinha passado nessa noite, enquanto rumávamos para Boké. Deixou-me perto da casa do meu tio, onde encontrei o meu irmão.


Guiné > Bafatá > Mercado local > c. 1968/70 > Foto de Fernando Gouveia (publicado a preto e branco no livro, pág. 32)


Em novembro de 1955 regressámos a Bafatá, também a pé, com os carregadores, outra viagem que nunca mais tinha fim. Às dez horas de uma manhã, entrei na minha casa. 

Depois de matar as saudades dos meus pais e da minha família, fui ter com um santomense, o Carlos Espírito Santo Rafael, que tinha um negócio de venda de fruta e uma taberna ao lado. Trabalhava lá um irmão meu, numa grande horta, com cana-de-açúcar, goiaba, limoeiros, mangos, bananeiras e ananases.

Na altura, com cerca de 15 anos, comecei a trabalhar lá também. Carregava a cana para os carros e levava-a para a destilaria onde se fazia aguardente de cana. Entrava às sete da manhã, fazia um intervalo ao meio-dia para almoçar e retomava o trabalho das 14 até às 17h00 
 [nove horas e meia de trabalho por dia... LG]  

Ganhava 4 escudos por dia [1,94 euros a preços atuais... LG] , que recebia ao mês. Mas raramente recebia o mês inteiro. Quando nos via a urinar ou a mastigar um pedaço de cana, o patrão descontava-nos cinco dias ou 20 escudos [9,68 euros a preços atuais... LG] , por isso raramente recebíamos o mês inteiro. Trabalhei lá, na horta do Rafael, durante um ano, ou nem tanto.

Num dia em que fui visitar o meu pai na loja do Assad, na praça de Bafatá, encontrei um sobrinho do patrão do meu pai, chamado Salimo, que me convidou a ir com ele, trabalhar como capataz, numa obra que estavam a fazer no Gabu [5]. 

De junho de 1957 a janeiro de 1958 fui o capataz da obra, o meu trabalho era contar, ao princípio da manhã e da tarde, os trabalhadores que estavam presentes e entregar a lista do pessoal ao Salimo, para ele fazer os pagamentos todos os sábados.

A seguir ao regresso a Bafatá 
[, no início de 1958], o Salimo encarregou-me de entrar na campanha da mancarra [6]. Nesse tempo, era costume adiantar dinheiro aos agricultores e eu passei a ir numa camioneta, às tabancas cobrar as dívidas, receber a mancarra correspondente ao dinheiro ou ao arroz que tinha sido adiantado. A seguir pesávamos a mancarra e procedíamos aos acertos. 

Depois da campanha da mancarra começámos com a do óleo de palma e depois a do mel e da cera, trabalho este que durou até Junho de 1958.  Salimo queria que eu continuasse a trabalhar com ele mas decidi não ir. O dinheiro que estava a ganhar neste trabalho não compensava, qualquer jila [7] ganhava muito mais.

Voltei para casa e, em julho 
[de 1958],  fui trabalhar com o meu primo, Ussumane, que se dedicava ao negócio do gado. Comprava em Piche, Canquelifá, Buruntuma, Pirada e Paunca e depois levávamos o gado, a pé, para o vendermos em Bissau.

Para o que estava habituado ganhava muito dinheiro mas era um trabalho muito árduo. De Bafatá a Bissau, nunca demorávamos menos de dez dias.

__________

Notas do autor (Amadu Djaló) e/ou do editor literário ("copydesk") (Virgínio Briote)

[1] Os Fulas da região do Gabú são originários da antiga Guiné Francesa. Os Futa-Fulas vieram do Futa-Djalon e territórios limítrofes (Labé, Boé Francês, Futa-Toro, Futa-Quebo…)

[2] Nota do editor: Ernst Schade (1949, Holanda), especialista em agricultura tropical, trabalhou durante cerca de 16 anos na Zâmbia, Zimbabué e Moçambique, com instituições governamentais e não-governamentais em programas de desenvolvimento rural. De 1989 até 1995 foi o representante em Moçambique da Organização Norueguesa “Save the Children”. Ernst é um amante da fotografia, agora a sua principal actividade. É representado pelas agências de fotografia Hollandse Hoogte (Holanda) e Panos Pictures (UK).

[3] Nota do editor: a religião seguida pelos Futa-Fulas é o Islamismo, herdado dos árabes, segundo as tradições escritas.

[4] Nota do editor: é aproximadamente entre os onze e os quinze anos que os rapazes Fulas vão ao “fanado”. No dia combinado entre as famílias e o “operador”, os jovens dirigem-se para o mato, onde são aguardados junto a uma árvore. Cada um leva uma pessoa, um amigo ou familiar (um irmão já circuncidado), para o segurar no momento da intervenção. Tiram as roupas e os corpos são cobertos com cinza. Os jovens dispõem-se numa grande roda, voltados para nascente e o “operador”, munido de uma navalha bem afiada, procede à circuncisão do prepúcio. O familiar ou amigo do jovem faz-lhe um penso, cuspindo um pouco da cola (que esteve a mastigar) sobre a ferida ou espalhando uma mistura de ervas e cola moída, após o que liga a ferida com uma tira de pano, em volta dos rins de forma a manter o pénis em posição horizontal. O penso é mudado ao fim de três dias e as lavagens são feitas com água a cair de uma determinada altura. 

Depois da cerimónia os jovens recolhem a uma barraca, onde permanecem trinta dias, sob a vigilância dos responsáveis. Durante este período recebem ensinamentos destinados a orientar-lhes o comportamento futuro, como membros da comunidade familiar ou da etnia. Dormem de costas enquanto a ferida não cicatriza e não lhes é permitido olhar para as mulheres ou raparigas nem tão pouco falar com pessoas estranhas à cerimónia. Durante o tempo que permanecem na barraca do “fanado”, a família prepara uma túnica de pano de cor branca ou azul e uns calções do mesmo tecido. No fim dos trinta dias regressam às suas casas, após o que se segue a festa da saída do “fanado”, aberta a toda a gente.

[5] Nova Lamego.

[
6] Amendoim.

[7] Vendedor ambulante.

[Seleção / revisão / fixação de texto / subtítulos / negritos, para efeitos de edição deste poste: LG. ]
___________

Notas do editor:

(*) Último poste da série > 16 de outubro de 2022 > Guiné 61/74 - P23713: Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte III: Colocado em Farim, na 1ª CCAÇ, em junho de 1963, fica logo encantado com as beldades femininas locais e convida-as para ir a uma sessão de cinema do senhor Manuel Joaquim

(**) Vd. poste de 5 de outubro de 2022 > Guiné 61/74 - P23671: Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte II: 1962, recruta em Bolama e instrução de especialidade no CICA / BAC, Bissau: o racismo primário do cmdt da CART 240

(ªªª) Vd. poste de 22 de setemebro de 2022 > Guiné 61/74 - P23638: Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte I: Não fomos todos criminosos de guerra: Deus e a História nos julgarão

(****) Vd. poste de 22 de fevereiro de  2015 > Guiné 63/74 - P14282: Os Nossos Camaradas Guineenses (41): Amadu Bailo Jaló (Bafatá, 14/11/1940- Lisboa, 15/2/2015): 13 anos ao serviço do exército português (1962-1975), "em perigos e guerras esforçado mais do que prometia a força humana" (Virgínio Briote)

(*****) Deve tratar-se de Arturo Biasutti, que esteve vinte anos na Guiné, entre 1946 e 1966. Pertencia ao PIME (Instituto Pontifício para as Missões no Exterior). Vd. aqui algumas das suas publicações sobre a Guiné-Bissau:

BIASUTTI (Arturo), Venti anni in Guinea Portoghese (1946-1966). Ricordi personali e privati del padre Arturo Biasutti del PIME. Marino, Villa Scozzese (Italia), 1967. Policopiado.

BIASUTTI (Arturo), Vokabulari kriol-purtguîs (Esboço -. Proposta de Vocabulário).
Bafatá (Guiné-Bissau), 1982. (1ª edição). Segunda edição, com o mesmo título, Bubaque (Guiné-Bissau), 1987.

BIASUTTI (Arturo), Jisus nô Salbadur. Esta obra foi escrita com o pseudónimo de PA BIÀS. Bubaque (Missão Católica), 1972.

Fonte:  Vd. Dioceses da Guiné-Buissau > O que diferentes Missionários da Guiné-Bissau escreveram sobre a própria Guiné-Bissau, Por Fr. João Vicente, ofm

sábado, 7 de maio de 2022

Guiné 61/74 - P23238: Bom dia desde Bissau (Patrício Ribeiro) (23): Bafatá... e as nossas "geografias emocionais"


Fot0 nº 1 > Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 28 de abril de 2022 > 7h42... Nascer do sol, tapado pelo que resta do monumento, sito no antigo Parque da cidade, ao Oliveira Muzanty (governador geral, 1907/09), defronte à Casa Gouveia, dois símbolos do "colonialismo português"... A estátua  foi apeada (e provavelmente destruída)...


Foto nº 2 >  Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 28 de abril de 2022, 7h41> Os célebres pombais de Bafatá... Hoje ainda existem alguns. Este está onde hoje é o tribunal.


Foto nº 3 > Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 28 de abril de 2022 7h41>  O que resta (a fachada...) do antigo mercado quando Bafatá era a doce princesa do Geba... Um belo exemplar da arquitetura colonial revivalista, que um dia destes cai de vez...


Foto nº 4 > Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 28 de abril de 2022, 7h41 > Rua para a 
Ponte Nova, diz o autor da foto. Na esquina, uma típica casa colonial, de sobrado. O Cherno Baldé diz-nos que era a antiga casa Ultramarina em Bafatá,  que controlava e abastecia toda a rede da zona Leste (Bafatá/Gabú). Pertencia ao BNU e era rival da Gouveia.


Foto nº 5 > Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 28 de abril de 2022, 7h33 > A sé catedral... Um exemplar de arquitetura colonial religiosa (de mau gosto, acrescento eu, tal como  a de Bissau, que me perdoem os cristãos da Guiné -Bissau) (LG)


Foto nº 6 > Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 28 de abril de 2022, 7h32 > O antigo edifício principal da administração do concelho de Bafatá, hoje direcção regional de educação de Bafatá... Fica na rua principal que vai dar ao rio Geba.


Foto nº 7 > Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 28 de abril de 2022, 7h36 > A avenida principal... Ao fundo, o rio Geba... Do lado direiro, a casa de sobrado das "manas libanesas" (que têm um mano, que foi nosso camarada, hoje coronel paraquedista reformado, e empresário na Guiné-Bissau, 
o Chauki Danif. Era alferes no nosso tempo, e tem aqui, no blogue, alguns amigos). A matriarca do clã era a Dona Rosa, cpmo bem dos recorda o Humberto Reis, amigo da família.  (LG).


Foto nº 8 > Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 28 de abril de 2022, 7h31 > Outra vista da artéria principal da antiga cidadezinha colonial... Há 6 anos o Patrício ainda apanhou algum alcatrão...


Foto nº 9 > Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 28 de abril de 2022, 7h34 >  Na avenida principal, do lado esquerdo de quem desce, antigas instalacões da administração colonial, incluindo a residência do administrador da concelho (o mais célebre nos anos 60 foi o Guerra Ribeiro). Depois da independência, passou a ser chamado "palácio do Governador"... Na ponta direita, a estação dos correios (não sabemos se continua a funcionar como tal)...


Foto nº 10 > Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 28 de abril de 2022, 7h34> Antiga residência do administrador do concelho e, por detrás, a torre que seria da polícia administrativa (cipaios).


Foto nº 11 > Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 28 de abril de 2022, 7h31> Mais uma vista da avenida principal...  Alguns dos nossos camaradas fizeram aqui as suas provas de perícia... no exame de condução auto.


Foto nº 12 > Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 27 de abril de 2022, 9h49  > Outra rua (... esta é para o arquiteto e autor do melhor roteiro de Bafatá, o nosso camarada Fernando Gouveia, identificar... TPC de fim de semana).

Foto (e legenda): © Patrício Ribeiro (2022). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem de Patrício Ribeiro (português, natural de Águeda, da colheita de 1947, criado e casado em Nova Lisboa, hoje Huambo, Angola, ex-fuzileiro em Angola durante a guerra colonial, "retornado", a viver na Guiné-Bissau desde 1884,  fundador,  sócio-gerente e director técnico da firma Impar, Lda; membro da nossa Tabanca Grande, com cerca de 120 referências no blogue; autor da série "Bom dia desde Bissau"; nosso colaborador permanente para as questões do ambiente, economia e geografia da Guiné-Bissau" (*)

Data - quinta, 28/04/2022, 09:04

Assunto - Bom desde Bafatá

Bom dia, desde Bafatá.

Luís, esta semana tenho passado uns dias em Bafatá.

Vou enviar umas fotos de hoje e desta semana, que terás que as organizar, vão directamente do meu telemóvel.

Na parte velha de Bafatá,  as casas coloniais são agora organismos públicos.

Muitos por aqui andaram há 50 anos de camuflado. (**)

Mantenhas. Patrício Ribeiro


2. Comentário do editor LG:

Obrigado, Patrício. Dizes bem, por aqui muitos andaram há 50 anos  de camuflado... E outros à civil... Ir a Bafatá, no meu tempo (1969/71), sobretudo ao fim de semana (quando o havia...) dava direito a ir à paisana... Ia-se às "meninas (do Bataclã)" e também matar a malvada em restaurantes como a Transmontana... E, no regresso, beber uma última cerveja no café do Teófilo, o "desterrado"... As manas libanesas também tinham um restaurante e café mas nunca lá fui.

Bafatá faz parte das "geografias emocionais" de boa parte de nós... Todos os camaradas que estiveram no Leste da Guiné passavam obrigatoriamente por Bafatá (elevada a cidade no tempo)... Era uma verdadeira placa giratória... Tal como Bambadinca e o Xime. Em Bafatá,  havia o "charme discreto" da civilização... Havia boas lojas, restaurantes, cinema e  até piscina. O resto da Guiné era "mato", ou seja, guerra. 

Desculpa, se meti alguma "argolada"... Achei que as tuas belas fotos, madrugadoras, mereciam uma legenda mais completa... Mas, para falar de Bafatá, "a princesa do Geba",  temos gente muito mais conceituada do que eu,  porque lá viveu durante a comissão  como é o caso do Fernando Gouveia, do António Azevedo Rodrigues  ou do Manuel Mata, por exemplo. Oxalá eles nos leiam e comentem este fim de semana, antes de eu ir à faca. Para a próxima semana, faço férias do blogue, mas conto com o Carlos Vinhal (e todos os demais coeditores, colaboradores e leitores) para continuarmos a ir "blogando & rindo", enquanto houver picada, pica e pernas para andar...

Da tua parte,  continua a mandar "lembranças" dessa terra, "verde-rubra" (sem conotações saudosistas, paternalistas ou neocolonialistas).  Boa saúde, bom trabalho, E que Deus, Alá e os bons irãs te protejam, a ti e aos nossos amigo da Guiné-Bissau.
___________


(**) Sobre Bafatá, temos mais de 380 referências... Vd. aqui, por exemplo:

8 de abril de 2020 > Guiné 61/74 - P20829: Bom dia, desde Bissau (Patrício Ribeiro) (11): Viagem a Mansoa e a Bafatá, onde estamos a levar a água potável aos hospitais... Este ano, muita gente vai morrer, não da COVID-19, mas de fome: o caju ninguém o vem cá comprar...

9 de abril de 2019 > Guiné 61/74 - P19662: Memória dos lugares (390): As três pontes de Bafatá, sobre os rios Geba e Colufe (ou Campossa): contributos de Fernando Gouveia, Humberto Reis, Manuel Mata, Luís Graça, Ricardo Lemos e Virgílio Teixeira
12 de novembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12284: Memória dos lugares (252): Bafatá ao tempo do Esq Rec Fox 2640 (1969/71) (Manuel Mata)

22 de março de 2013 > Guiné 63/74 - P11293: Memória dos lugares (226): Vistas aéreas da doce e tranquila Bafatá, princesa do Geba (Humberto Reis, ex-fur mil op esp, CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71) (Parte I)

7 de maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8236: Notas fotocaligráficas de uma viagem de férias à Guiné-Bissau (João Graça, jovem médico e músico) (10): Bafatá, 15/12/2009: "África é um cego em cima de um diamante" (Ali dixit)

(...) Anónimo disse...

Uma geração de jovens que, ao terem a sorte de sobreviver, mesmo sem ferimentos, ficou traumatizada de tal forma que só passados 40 anos consegue falar abertamente do tempo que lá passou. Hoje, já consigo ter saudades do Cinema, da Piscina, do restaurante do Teófilo, do Restaurante a Transmontana, dos comércios das Libanesas, do cheiro a terra, do cacimbo que caía de noite, da pista de Aviação, das noites que passava nas Tabancas, da Javi (miúda atrevida), da Mariana solteira e da Mariana mãe, saudade dos companheiros que já morreram (Sampaio, saudade dos companheiros que ainda não encontrei, Ernesto, etc.), foram 25 meses em Bafatá (de junho de 1968 a julho de 1970).Um muito obrigado ao jovem médico, por me trazer Bafatá ao meu consciente.

quarta-feira, 23 de setembro de 2020

Guiné 61/74 - P21386: Memória dos lugares (412): Ponta de Jabadá, na região de Quínara, sentinela do rio Geba, reconquistada ao PAIGC em 29 de janeiro de 1965

 

Foto nº 1


Foto nº 2


Foto nº 3


Foto nº 4


Foto nº 5



Foto nº 6

Guiné > Região de Quínara > 1ª CCAÇ / BCAÇ4612/74 (Cumeré, Jabadá e Brá, 1974) > 1974 > Aquartelamento de Jabadá > Fotos do álbum do ex.fur mil at inf António Rodrigues Pereira (do memso batalhão que o nosso coeditor Edurado Magalhães Ribeiro, fur mil ope esp /ranger da CCS).

Legenda:

Foto nº 1 > Aquartelamento de Jabadá, na margem esquerda do  rio Geba, 1974

Foto nº 2 > Aquartelamento de Jabadá > Edifício das transmissões, camarata do Comandante de Companhia, bar de sargentos e oficiais, cozinha e refeitório, e secretaria,  1974

Fotro nº 3 > Aquartelamento de Jabadá > Emfermaria, central eléctrica, bar dos praças e depósito de géneros, 1974

Foto nº 4 > Aquartelamento de Jabadá > Depósito de água, padaria e cozinha, 1974

Foto nº 5 > S/l (Aquartelamento de Jabadá ou do Cumeré) > Jipe Willis carregado com o Alf Mil Araújo e uma cambada de furriéis milicianos da companhia, 1974

Foto nº 6 >  Aquartelamento de Cumeré > Furriéis Martins, Olo e António Pereira, 1974


Foto (e legenda): © António Rordigues Pereira  (2010). . Todos os direitos reservados. (Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné).


1. Da ocupação da Ponta de Jabadá, em 29 de janeiro de 1965 (*) até à data em que foram tiradas estas fotos (já depois de 25 de abril de 1974), vai quase uma dezena anos.  

Da Ponta de Jabadá, o PAIGC flagelava a navegação do Geba.  Até que esta posição foi conquistada pelas NT, em 29 de janeiro de 1965, e montado lá um destacamento. O Gonçalo Inocentes, no seu livro "O cântico das costureiras"  conta como foi (pp. 76-79) (*). 

 De destacamento passou a aquartelamento: as instalações para o pessoal foram sendo melhoradas pelas sucessivas companhias de quadrícula que por lá passaram. Pertenciam em geral ao batalhão sediado em Tite.   A 1ª CCAÇ / BCAÇ 4612/74 (Cumeré, Jabadá e Brá, 1974) deve ter sido a última  a guarenecer esta posição, muito importante para a defesa da navegação do rio Geba.

A história da Ponta de Jabadá também está por fazer, como muitas outras  "pontas",  da Ponta Varela à Ponta do Inglês... 

Aqui o PAIGC até ao início do ano de 1965 era "rei e senhor", impondo ali o terror à navegação no Geba ?!... Os únicos que lhe faziam frente eram os nossos navios da Marinha (LFG, LDG, LDM)

Quando lá passei, ao largo, em LDG, no dia 2 de junho de 1969 (a caminho de Contuboel, via Xime e Bambadinca e Bafata, até ao Xime de LDG e depois  em coluna), o nosso medo era a Ponta Varela, logo a seguir, passada a foz do Corubal, já no Geba Estreito, antes de se aportar ao Xime... Recordo-me de termos tido cobertura aérea, por um T-6... E os fuzileiros fizeram fogo de morteirete sobre Ponta Varela... Muita malta, desprevenida. atirou-se para o fundo da LDG: foi o seu/nosso batismo de fogo, com 3 ou 4 dias de Guiné...

Os barcos civis, ou "barcos-turra", que prosseguiam até Bambadinca (ou que desciam de Bambadina a Bissau), defrontavam-se, no Geba Estreito, com outro temível ponto de passagem que era o famigerado Mato Cão onde se podia, da margem direita, lançar uma granada de mão para o meio do rio. (***)



Guiné > Região de Quínara > Mapa de Tite (1955) > Escala 1/50 mil > Posição relativa da Ponta de Jabadá, na margem esquerda do Rio Geba, a meia distência entre Bissau e Porto Gole (situados na maregm direita).

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2020)





A população de Jababá vivia da cultura do arroz, produziido na grande bolanha.  O aquartelamento das NT nunca foi em Jabadá (tabanca, mais a sul) mas na Ponta, que até ao início da guerra era um floresccente entreposto comercial. Por exemplo, o comercinte libanês Jamil Heneni,  com sede em Bafatá, tinha "grandes plantações de arroz em Jabadá «" (e não "Jabanda", gralha tipográfica). (**)

Fonte: anúncio comercial publicado em Turismo - Revista de Arte, Paisagem e Costumes Portugueses, jan/fev 1956, ano XVIII, 2ª série, nº 2.



Guiné > Comando e CCS/BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) > 26 de fevereiro de 1968 > Viagem de regresso a Bissau, atravessando as Regiões de Gabu e de Bafatá, em coluna militar, e depois de barco, a partir de Bambadinca. Até ao Xime e foz do rio Corubal ainda era região de Bafatá. Mato Cão ficava a seguir a Bambadinca, ainda no Geba Estreito (que ia até ao Xime).

A caminho de Bissau. na margem esquerda do rio Geba, no estuário do Geba, já muito depois da Foz do Rio Corubal  ficava Jabadá (foto acima) já na região de Quínara... Não era sítio onde a malta parasse, via.se apenas, de perfil, ao longe...


Foto (e legenda): © Virgílio Teixeira (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Setor L1 > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) > Subsetor do Xime > A temível Ponta Varela: restos do que parece ser um antigo cais acostável.

 Em 1963/65, ao tempo da CCAÇ 508 existia aqui uma tabanca e um destacamento onde morreram, em 3 de junho de 1965, quatro dos seus homens, a começar pelo seu comandante, o Capitão Francisco Meirelles, em consequência do rebentamento de uma mina. A tabanca e o destacamento foram abandonados, o PAIGC começou a partir dali a atacar a navegação no Geba, até porque em 29/1/1965 tinha perdido a posição da Ponta de Jabadá.

Foto do álbum do José Carlos Lopes, ex-fur mil amanuense, com a especialidade de contabilidade e pagadoria, especialidade essa que ele nunca exerceu (na prática, foi o homem dos reabastecimentos do batalhão).

Foto (e legenda): © José Carlos Lopes (2013). Todos os direitos reservados. (Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné).

(***) Último poste da série > 16 e julho de 2020 > Guiné 61/74 - P21172: Memória dos lugares (411): Sintra, Colares, Praia das Maçãs (Mário Gaspar, ex-fur mil at art, MA, CART 1659, "Zorba", Gadamael e Ganturé, 1967/68)