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terça-feira, 15 de março de 2022

Guiné 61/74 - P23079: A nossa guerra em números (15): Segundo o investigador Ricardo Ferraz, do Gabinete de Estratégia e Estudos do Ministério da Economia, a guerra colonial (1961/74) custou ao Estado Português, a preços de hoje, e na moeda atual, cerca de 21,8 mil milhões de euros


Capa do 'paper' "Grande Guerra e Guerra Colonial: Quanto custaram aos Cofres Portugueses?" - Lisboa, Ministério da Economia, Gabinete de Estratégia e Estudos, junho 2019, 24 pp. (GEE Paper 122). Disponível aqui, em formato pdf, primeira versão:  http://www.gee.gov.pt//RePEc/WorkingPapers/GEE_PAPERS_122.pdf


1. Uma guerra, qualquer guerra, custa uma "pipa de massa": custos diretos, indiretos e ocultos... Sempre difíceis de avaliar com rigor, se não mesmo impossíveis de quantificar, no que concerne aos custos "societais", materiais e imateriais, ecológicos, demográficos, humanos, sociais, culturais, políticos, psicológicos, etc. 

 Na realidade, quanto custam as vidas humanas perdidas numa guerra? E o tratamento e a reabilitação dos feridos? E o sofrimento humano? E a violação de princípios e valores? E o impacto ambiental? E a destruição de património material e imaterial? E as sequelas que deixa todo e qualquer conflito militar, para a geração dos combatentes e as gerações seguintes? 

Mas o mais fácil é começar pelas "despesas militares"  e ver o seu  peso no PIB.

Segundo Pedro Marquês de Sousa, autor de "Os números da Guerra de África"(Lisboa, Guerra & Paz Editores, 2021, 381 pp.),  as despesas militares, quando a guerra decorreu simultaneamente nos três teatros de operações (Angola, Guiné e Moçambique), no período entre 1966 e 1971, chegaram a representar 6% do Produto Interno Bruto (PIB).

A preços da atualidade, a "guerra em África" terá custado, ao Estado Português, 24 mil milhões de euros (pág. 259).

O ano de 1973 foi particularmente dramático, para a economia portuguesa, devido à crise cambial (fevereiro de 1973), provocada pela desvalorização do dólar americano, e depois pela crise do petróleo (outubro de 1973). 

Recorde-se que o preço do petróleo quadriplicou (passou a 12 dólares o barril!), originando um aumento brutal do valor das das importações. Por sua vez, a crise económica nos países desenvolvidos (destino das nossas exportações e da nossa emigração) teve como consequência uma grande quebra das nossas vendas de bens e serviços ao exterior e das remessas dos emigrantes, originando fortes desequilíbrios  na balança comercial e depois na balança de pagamentos.

Inflação e redução da atividade económica (incluindo tremendas dificuldades no abastecimento de combustíveis), levaram o Govermo de Marcelo Caetano, para continuar a fazer face ao esforço de guerra, a alienar 10% das nossas reservas de ouro, entre outras medidas...

2. Ricardo Ferraz , no seu "paper", intitulado "Grande Guerra e Guerra Colonial: Quanto Custaram aos Cofres Portugueses?" (cuja capa se reproduz acima), procurando colmatar a inexistência  de estudos económicos sobre o custo das duas guerras em que Portugal esteve emvolvido no séc. XX, avançou em 2018 com a seguinte pergunta de investigação: 

a preços de hoje e na moeda actual (euro), qual terá sido o custo da Grande Guerra e da Guerra Colonial  para os cofres públicos portugueses?

Haveremos de voltar a este estudo, pioneiro, de que, para já, se publica o resumo (ou o "abstract") da primeira versão, disponível em formato pdf:

(...) "A Grande Guerra (1914-1918) e a Guerra Colonial (1961-1974) foram, sem dúvida, os dois conflitos bélicos mais importantes para Portugal no seu passado recente, tendo a sua despesa militar atingido valores recorde durante esses acontecimentos. De acordo com as estimativas apresentadas no presente estudo, o Estado português terá despendido com estas guerras - a preços de hoje, e na moeda actual -, 26,5 mil milhões de euros. 

Deste montante, 82% terá sido gasto com a Guerra Colonial e 18% com a Grande Guerra. Ao se disponibilizarem pela primeira vez valores concretos sobre os custos dos dois principais conflitos militares em que Portugal se envolveu no século XX, espera-se oferecer um valioso contributo à História Contemporânea de Portugal e estimular outros trabalhos de investigação sobre estes temas." (...)

A estimativas das despesas para o caso da Guerra Colonial é de cerca de 21,8 mil milhões de euros, ou seja, 10,8% do PIB atual (2018). Este valor representa um custo médio anual de aproximadamente 1,6 mil milhões de euros.

O autor é nvestigador doutorado, integrado no centro de investigação GHES / CSG da Lisbon School of Economics & Management (ISEG) da Universidade de Lisboa; professor adjunto convidado no Instituto Superior de Engenharia de Coimbra (ISEC) do Instituto Politécnico de Coimbra (IPC); ex-assessor económico na Assembleia da República.

(Continua)
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quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Guiné 63/74 - P15302: (Ex)citações (297): Quem disse que "100 pesos era manga de patacão" no nosso tempo? Em 1960, mil escudos (da metrópole) valiam hoje 428 euros; e em 1974, 161 euros, ou seja, uma desvalorização de c. 266 %... Recorde-se por outro lado que 100 pesos só valiam 90 escudos...


Guiné > Nota de 50 escudos (pesos), frente e verso. Banco emissor: BNU - Banco Nacional Ultramarino. No câmbio e no comércio, em relação ao escudo da metrópole, emitido pelo Banco de Portugal, havia uma quebra de 10%... Ou seja: 100 pesos (escudos do BNU) só valiam 90 escudos (do Banco de Portugal)... Recorde-se que o BNU foi criado em 1864 como Banco Emissor para as ex-colónias portuguesas (, tendo também exercido funções de banco de fomento e comercial no país e no estrangeiro; vd,. aqui a sua história).

Foto: © Sousa de Castro (2005). Todos os direitos reservados.



1. E se fosse hoje, em euros ? Quanto ganhávamos ? Quanto gastávamos ?  (*) Fui encontrar um conversor de escudos para euros, que nos permite fazer conversões desde o ano de 1960... Está disponível na página Pordata - Base Dados Portugal Contemporâneo:

"A funcionalidade permite converter um determinado montante (em euros ou em escudos) de um ano em preços de 2014, utilizando o deflator do Índice de Preços no Consumidor (IPC) 'base 2012'. Trata-se de transformar os valores a preços correntes (ou nominais, com inflação) de um determinado ano em valores a preços constantes (reais, sem inflação) de 2014."

Em matéria de comes & bebes, por exemplo, podemos ver quanto custaria hoje, em euros, os alguns dos artigos que consumíamos na Guiné por volta de 1969/70 (**):

(i) um quilo de camarões tigres ou lagostins, do rio Geba Estreito, comidos na tasca do  Zé Maria, em Bambadinca  custava 50 pesos ou escudos da Guiné, o quilo, cozidinhos)= 14,79 € (em 1969);

(ii) uma arrafa de whisky novo (J. Walker Juanito Camiñante de 5 anos, rótulo vermelho, JB): 48,50 pesos = 14,35 € (em 1969);

(iii) uísques mais caros: 12 anos, J. Walker rótulo preto, Dimple, Antiquary: 98,50 [=29,14 €]:  15 anos, Monkhs, Old Parr: 103,50 [=30,52 €] (estou a confiar na memória do Humberto Reis, acho que eram mais caros, os uísques velhos] (, em 1969);

(iv) um bife com batatas fritas e ovo a cavalo na Transmontana, em Bafatá, custava 25 pesos, vinho ou cerveja aparte = 7,40 € (em 1969);

(v) uma vaca raquítica, em Sonaco, comprava-se (quando fui gerente de messe, em 1970) 950 pesos = 269,36 €;

(vi) nas tabancas, fulas, por onde passávamos e onde ficávamos uma semana ou mais, de cada vez, em reforço do sistema de autodefesa, era costume comprar, mesmo a custo, galinhas e frangos, a sete pesos e meio por bico [= 2,22 €]:

(vii) um parto de ostras em Bissau, numa esplanada á beira rio,  em meados de 1970, custava 20 pesos [= 5,67 €];

(viii) um relógio da prestigiada marca suiça Longines, na loja libanesa Taufik Saad, Lda, em Bissau, custou ao Valdenar Queiroz, em 16/12/1970, 2950 pesos [=836,45 €].

(ix) coisas miúdas do dia a dia: um maço de SG Filtro 2,5 pesos [=0,74 €];  um uísque, no bar da messe, eram 2,50 pesos sem água de sifão [= 0,74 €]  e com água eram 3,00 pesos [= 0,89]; era mais barato que a cervejola...

(x) quanto à lerpa, ou ramim, uma noite boa, ou má, poderia dar (valor médio) 200 a 300 pesos para a lerpa e 50 a 100 para o ramim (, garantia um jogador como o Humberto Reis);

(xi) uma queca, dependia: 50, 100, 150 pesos... "Quando em Bissau, no Pilão, frequentei várias vezes a Fátima, que não era caboverdiana mas sim fula, e dava-lhe 50 pesos de cada vez" (, confessa o nosso camarada A.Marques Lopes, que é de 1967/68)...

2. O Sousa de Castro, por seu turno, diz-nos que "no meu tempo (1972/74) não era muito diferente: os preços que se praticavam eram mais ou menos os mesmos"... 

Quanto ao que o exército nos pagava... "Puxando um pouco pela memória, eu como 1º cabo radiotelegrafista ganhava 1.500$00, sendo 1.200$00 por ser 1º cabo e mais 300$00, de prémio de especialidade." [, tudo somado, 1500§00 em 1973  =305,10 €].

Segundo a mesma fonte, o Sousa de Castro, "a dita queca, se a memória não me trai, creio que era assim: para os soldados cinquenta pesos; para os cabos sessenta pesos; a partir daqui não me lembro quanto pagavam os mais graduados... Quanto às cabo-verdianas, a coisa era de facto mais cara, em final de comissão paguei cento e cinquenta ou duzentos pesos, isto em Fevereiro de 1974" [mais ou menos 24 ou 32 euros]...

"Por lavar a roupa, como cabo pagava 60 pesos [, em 1973]", informa o Sousa de Castro.[=12,20 ]

Em 1969, recordo-me que os soldados da CCAÇ 12 (que eram praças de 2ª classe, oriundos do recrutamento local), recebiam de pré 600 pesos/mês [=177, 51 €], além de mais uma diária de 24$50  [=7,25€] por  serem desarranchados. 600 pesos deviam dar para comprar duas sacas de arroz de 100 kg cada...

3. E um capitão miliciano, comandante de companhia, quanto é que recebia ao fim do mês? (Sabemos que um parte dos nossos vencimentos era depositado na metrópole)...

Temos as memórias (e os papéis) do Jorge Picado:

 (...) "Apontamento que resistiu ao tempo, referente ao mês de junho [de 1970]: Total abonos:13900$00; total descontos; 8967$00; a receber 4932$00. Nos abonos estão incluidos 4000$00, relativos aos abonos de família (já tinha os 4 filhos), de março, abril, maio e junho. [de 1970]". (...)

(...) "Vencimentos a receber em agosto em virtude do aumento: março-julho [1970]: 10500$00;
 Fev 1326$00; total 11826$00; descontos Cx Geral Aposentações; 710$00; Imposto de selo -12$00; a receber (líquido): 11104$00 [=3148,45€]...

4. E a viagem de férias à metrópole, na nossa querida TAP ?  

O António Tavares pagou, em meados de 1971,  à Agência Correia, em Bissau, um total de 6 430$80 [ = 1643,21 €]  pela viagem "Bissau- Lisboa.- Porto -Lisboa -Bissau "... Diz que pagou em três prestações "a importância total, que não ganhava, como explico: 4.430$80 em 03-08-71; 500$00 em 22-09-71 e finalmente 1.500$00 em 21-10-1971"... Na cópia do bilhete (que ele juntou, no poste  P15216] consta uma taxa de 110$80.... O pagamento foi em pesos. "O Escudo era trocado com uma agiotagem de 10%."...

É difícil fazer comparações com os preços dos bens e serviços que se pagavam nessa época, na metrópole, para não falar dos salários médios nos diferentes ramos de atividade...  No blogue A Nossa Quinta de Candoz tenho um pequeno apontamento sobre a estrutura e a evolução dos salários, num ramo muito específicio, a "construção civil de ramadas", nas décadas de 1950 e 1960, no Douro Litoral...

Numa pequena empresa que podia empregar em média meia dúzia de homens, pagos ao dia, o patrão, o "ramadeiro", podia ganhar no máximo 50 escudos (=21,41 €), o oficial mais qualificado 30 escudos (=12,84 €) e os serventes 20 escudos (=8,56 €). Fizemos esta conversão para os valores nominais de 1960.. Uma década depois (em 1970), com a inflação, estes valores (a preços constantes de 2014) seriam 14,18 €, 8,51 € e 5,67 €, respetivamente...

Vinte escudos (!) era quanto um assalariado agrícola, jornaleiro, não qualificado, podia ganhar no norte do país, durante os anos 50/60... Claro que os salários na agricultura vão começar a subir com a rarefação da mão de obra rural, devido ao êxodo do interior (industrialização e urbanização, emigração, guerra colonial)...

Enfim, e para acabar por hoje, lembro-me que em 1972, cá na metrópole, um carrinho Fiat 127 custava 62 contos [= 14.256,05  €], o que era muita massa...(1972 foi antes da grande crise de 1973, em que os salários levaram uma machadada de 25%!)...

 Mais massa ainda eram 200 contos, que dava para comprar um apartamento no final da década de 1960 (, arredondando, cerca e 60 mil euros, hoje): alguém me contou que foi quanto pagou uma avozinha,  a um oficial general médico,  para livrar o querido netinho da obrigação de ir defender a Pátria, "lá longe onde o sol castiga(va) mais"... Éramos todos iguais, todos os portugueses (menos as portuguesas...), mas havia uns mais iguais do que outros!... (Sempre foi assim, e sempre será assim, dizem os mais cínicos ou os mais realistas...).

Mas podemos fazer um apelo à memória dos nossos leitores; quanto custava, na época da guerra colonial, cá na metrópole, uma bica ("cimbalino" no Porto), o jornal "A  Bola", um maço de cigarros SG, um bilhete de cinema, uma imperial ou um fino, um uísque marado numa "boite" da  Reboleira,   o aluguer de um quarto em Lisboa ou Coimbra, um quilo de bacalhau e por aí fora  ?... E quanto é que a malta ganhava, em média, nas fábricas e nos escritórios, antes de ir conhecer os "resorts" turísticos, as rias, os rios, as matas e as bolanhas da Guiné ?...  LG














Fonte: Cortesia de Pordata - Base Dados Portugal Contemporâneo... O conversor é interativo... Brinquem um bocadinho com ele,,, e façam as vossas comparações entre o hoje e o antigamente... 

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Notas do editor:



12 de setembro de  2011 > Guiné 63/74 - P8767: O que se comprava em Bissau com o patacão da guerra? Os produtos e as marcas que não havia em Lisboa... ou eram "proibitivos" (3) (Augusto Silva Santos / Hélder Sousa / Juvenal Amado / Luís Borrega / Luís Dias / Rui Santos)

15 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8780: O que se comprava em Bissau com o patacão da guerra ? Os produtos e as marcas que não havia em Lisboa ou eram "proibitivos" (4) (Joaquim Peixoto / Beja Santos)