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segunda-feira, 15 de fevereiro de 2021

Guiné 61/74 - P21902: Recordações dos tempos de Bissau (Carlos Pinheiro, ex-1.º Cabo TRMS) (8): Cenas de um carnaval em Bissau

Edifício do STM em Bissau

1. Em mensagem do dia 5 de Fevereiro, o nosso camarada Carlos Pinheiro (ex-1.º Cabo TRMS Op MSG, Centro de Mensagens do STM/QG/CTIG, 1968/70), fala-nos do Carnaval de 1970 em Bissau:


RECORDAÇÕES DOS TEMPOS DE BISSAU

PEDAÇOS DA HISTÓRIA DA GUINÉ
 
8 - Cenas de um Carnaval em Bissau

Estávamos em 1970, o Carnaval estava à porta e, apesar da guerra, em Bissau sempre havia algumas comemorações desse período que antecedia, e ainda antecede, a Quaresma.

Em Bissau tudo era diferente e tinha sabor a saudades da santa terrinha, mas havia sempre foliões, dentro dos condicionalismos que se viviam.

No QG, mais propriamente na CCS, havia um jovem sempre bem disposto, sempre com uma graça na ponta da língua, mas afinal de contas teria as suas razões para não se sentir assim tão bem. Constava que teria vindo de Angola, “premiado” com algum castigo, e andaria por ali à espera que os eventuais problemas tivessem solução. Era o Jóia, como era conhecido em todo o lado.

Assim, o Jóia, que era mesmo uma Jóia no trato do dia a dia, nesse dia de Carnaval resolveu vestir-se à Fula, embrulhou-se nuns lençóis, e lá foi até à cidade brincar e confraternizar com os amigos que tinha e eram muitos.

Mas o Jóia, amigo do seu amigo, nunca desperdiçava uma cerveja, de preferência das bazucas, e lá foi correndo todos os pontos de interesse de Bissau, a começar pelo Santos,  logo à saída da porta de armas de Santa Luzia, desde o Império, passando pelo Benfica, desde a Solmar até ao Solar do Dez, ao Portugal e ao Internacional, ao Zé da Amura, ao Bento, até que chegou ao novel Pelicano, cheio que nem um ovo dada a novidade daquele novo estabelecimento de dois pisos e com belas vistas sobre a Avenida Marginal e Ponte Cais de Bissau.

Porém, nessa confusão de gente, o Jóia, terá dado um encosto a um camarada à civil, que não gostou da brincadeira e o terá mimoseado com alguns murros e o Jóia, naquela circunstância não deixou cair a sua honra de combatente pelo que desatou, rapidamente, parte dos lençóis respondendo com as suas mãos à dita pessoa à civil que terá ficado deitado no chão do café.

Entretanto o Jóia terá dado mais umas voltas pela cidade mas regressou ao Quartel General onde já tinha recado para no outro dia se apresentar ao Comandante. Era a vida.

E o Jóia lá foi no outro dia ouvir o Comandante que lhe terá perguntado se sabia quem era a pessoa a quem tinha dado um sova no dia anterior. Claro que o Jóia não sabia,  ao que o Comandante lhe disse que o outro camarada era um Alferes paraquedista. Então aí o Jóia não se calou e terá respondido ao Comandante: 

- Não me diga,  meu Comandante. Se aquele era um Alferes paraquedista, eu vou lá acima e derreto o Batalhão todo.

O Comandante já teria falado com o médico da Companhia e o Jóia foi encaminhada para a Psiquiatria do HM 241. Chegou lá e a primeira coisa que terá feito, foi dar um murro no tampo de vidro da secretária do Médico, vidro esse se partiu em mil bocados.

Resumindo, passados poucos dias, o Jóia tinha regressado à Metrópole e corria por lá a notícia que os processos tinham sido arquivados e o Jóia passado à vida civil ainda durante a Quaresma.

Apesar de tudo, nesse ano o Carnaval foi a salvação do Jóia que andava por ali esquecido.

Carlos Pinheiro

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Nota do editor

Último poste da série de 12 de julho de 2018 > Guiné 63/74 - P18838: Recordações dos tempos de Bissau (Carlos Pinheiro, ex-1.º Cabo TRMS) (7): Recordações do STM/CTIG

quinta-feira, 12 de julho de 2018

Guiné 63/74 - P18838: Recordações dos tempos de Bissau (Carlos Pinheiro, ex-1.º Cabo TRMS) (7): Recordações do STM/CTIG

Aqui estou eu, compenetradíssimo, a passar a stencil a Presse


1. Em mensagem do dia 8 de Julho de 2018, o nosso camarada Carlos Pinheiro (ex-1.º Cabo TRMS Op MSG, Centro de Mensagens do STM/QG/CTIG, 1968/70), enviou-nos esta recordação do seu  tempo de Bissau:


RECORDAÇÕES DOS TEMPOS DE BISSAU

PEDAÇOS DA HISTÓRIA DA GUINÉ
 
7 - Recordações do STM/CTIG

Procurando rememorar o STM de Bissau, onde passei 25 meses, entendo dever procurar fazer um pouco de história acerca do STM que eu já conhecia antes de chegar à Guiné - comecei a fazer serviço como Operador de Mensagens no QG da 2.ª Região Militar em Tomar a partir de Março de 1968 - começarei por dizer que Transmissões sempre existiram em todos os Exércitos, em todos os tempos, com os meios e as técnicas que existiam, porque a troca de informações, para o êxito das missões, sempre foi considerada indispensável. Porém, diga-se em abono da verdade que Transmissões propriamente ditas, independentes das várias Armas, nomeadamente da Arma Mãe, a Engenharia, só começaram a existir no nosso Exército a partir da década de 50 com a criação do STM – Serviço de Telecomunicações Militares no antigo BT – Batalhão de Telegrafistas - na Graça, em Lisboa, e posteriormente com a instalação do Regimento de Transmissões, no Quartel da Arca de Água, no Porto.

No Centro de Transmissões de Tomar, para além do Centro de Mensagens, existia o Posto de Rádio com ligações ao Batalhão, às Unidades Militares da Região, incluindo o QG do Campo Militar de Santa Margarida e às outras Regiões Militares, existia ainda o Posto de Teleimpressores que tinha ligações directas com o Batalhão e com o QG do Campo Militar e também tínhamos um Posto de Fac-simile, um aparelho Siemens da 2.ª Grande Guerra, que todos os dias fazia exploração com o Batalhão para garantir e confirmar a sua operacionalidade. Fazendo um apelo à memória já cansada, penso que ainda me lembro de vários indicativos dos teleimpressores, RPFE, RPTB, etc., como me lembro de indicativos telegráficos como o TECOMUNICATERRA, Direcção do Serviço de Telecomunicações Militares, o CHEMILDOIS, Chefe do Estado Maior da 2.ª Região Militar, etc.

Entrando agora no STM de Bissau, começo por dizer que naqueles tempos longínquos, quando ninguém sabia o que eram telemóveis e a Rádio não era nada do que hoje é, algumas notícias ouviam-se em Onda Curta, mas sempre com má qualidade e normalmente a horas impróprias, sentia-se a falta de informação escrita, apesar de Bissau ter um periódico que saía de vez em quando.
Mas notícias chegavam todos os dias a Bissau, expedidas de Lisboa, para todo o mundo, em Morse. Havia que trabalhá-las.

Por isso, para suprir aquela falta de notícias, o Destacamento do STM do CTIG começou por organizar a sua recepção, a sua interpretação, a sua impressão e a sua posterior divulgação pelas Unidades Militares de Bissau.
Davam cara a este trabalho voluntário, como o 1.º Sargento Liberal da Silva gostava sempre de sublinhar, para além dele próprio, o 2.º Sargento Caldas da Silva, o 1.º Cabo RADIOT Irineu e este modesto escriba que fazia a interpretação do “apanhado”, o trabalho dactilográfico nas folhas de stencil, a impressão no duplicador Gestetner e muitas vezes até a distribuição pelos serviços do QG, pelas Messes do QG e Unidades de Bissau.

Era uma equipa pluridisciplinar digna de todo o registo, digna de ser recordada ao fim de todos estes anos, mas seja-me permitido dizer, o Irineu, o RADIOT era uma peça chave, por razões óbvias, mas acima de tudo pela sua grande capacidade de recepção.

Tudo funcionava sob o comando e orientação do Comandante do Destacamento, o então jovem Capitão João Afonso Bento Soares, hoje distinto General na reforma.

O 1.º Sargento Liberal Silva, coordenava a equipa, se bem que esta muitas vezes já funcionasse automaticamente como se estivesse em auto-gestão, o 2.º Sargento Caldas da Silva tratava da Expedição já que era o CMsgs, que ele chefiava, que tinha as viaturas e os estafetas.

Seja-me permitida uma palavra de saudade para estes dois últimos amigos que já nos deixaram há muito, e de uma forma especial para a memória do Sargento Caldas, grande amigo, que naquelas terras africanas passou grande parte da sua vida.

Como já tive oportunidade de referir, completava a equipa o Radiotelegrafista Irineu, este modesto mas atrevido escriba, os estafetas e os motoristas de serviço.

De vez em quando acontecia um ou outro contratempo. Era o stencil que se rompia e tudo tinha que voltar à primeira forma. Era a tinta que borrava o trabalho e tudo também voltava ao princípio, mas a noite era nossa e tudo acabava sempre em bem.

No outro dia de manhã, quando o serviço o permitia, eram dirigidos vários exemplares às 4 Repartições do QG, ao CEM, ao COMCHEFE, ao Palácio do Governador e a cada Unidade de Bissau, sendo que esse trabalho acabava sempre perto da hora da 2.ª refeição, tudo feito com recurso a Protocolo.
Como se pode imaginar, o STM, para além de ter posto no ar as 4 Redes de Rádio para o interior da Guiné e fazer a sua manutenção para que as mesmas estivessem sempre operacionais nas 24 horas de cada dia, mantinha também uma Rede para o Metrópole, no BT, para a Comando Chefe, para a Marinha e para a Força Aérea existiam também redes de Teleimpressor, como também para Mansoa, mas, por questões de segurança, por causa de algumas vulnerabilidades, só eram usadas em situações que não envolvessem matérias sigilosas, dizia o STM de Bissau para além das suas responsabilidades no contexto operacional que se vivia, também sabia colaborar em missões de informação geral como era o caso da distribuição da Presse Lusitânia como se pode constatar pelas reproduções.

Assim, por mera curiosidade, mas também para matar algumas saudades acumuladas com o andar dos tempos daquelas noites loucas, vão aqui dois exemplares, sendo o primeiro do dia 13 de Julho de 1969. Na 1.ª página fala-se da visita Presidencial ao Brasil, o Professor Marcello Caetano, da viagem no avião a jacto da TAP, da sua chegada e da calorosa recepção que teve à sua chegada aquele país irmão.


Nesta segunda página, como poderão verificar, temos a chamada VIDA DESPORTIVA, fala-se de futebol, da Taça Ribeiro dos Reis, de atletismo, da digressão do Vitória de Setúbal a Angola e a Moçambique e dava-se conhecimento da Chave do TOTOBOLA daquela semana, sendo que na semana em análise só pontificavam equipas secundárias, possivelmente devido a alguma interrupção do Campeonato Nacional da 1.ª Divisão, quem sabe se motivada por algum jogo da Selecção Nacional.
Mas esta da Chave do Totobola, não deixa de ser interessante recordar já que para além da Lotaria Nacional, naquela altura, o Totobola era o único Jogo Social explorado pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e era muito apreciado e procurado naquela época.

Na página seguinte reproduz-se a PRESSE do dia 31 de Julho de 1969.

Nesta 1.ª página, para além das notícias da política da altura, e muitas vezes eram exaustivas como convinha, regista-se a chegada a Lisboa do Paquete “Vera Cruz” com tropas de regresso do Ultramar, mas também se dá nota da VIDA DESPORTIVA que inclui ciclismo – VIII Grande Prémio Robbialac – dum acidente dentro desse Grande Prémio onde esteve envolvido o grande Joaquim Agostinho e termina a página com uma referência ao Campeonato Nacional de Juniores de Andebol de Onze.

Nesta página é dada nota de alguma dificuldade de ligação do grande Eusébio ao Benfica.
A página completa-se com notícias da chamada Vida Internacional.
Era assim que o Destacamento do STM do CTIG, colaborava na difusão das notícias do mundo junto das outras Unidades Militares.

É mesmo bom recordar, para que a memória não esqueça.

Carlos Pinheiro, no dia 4 de Dezembro de 2011, passados mais de 42 anos dos factos.
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Nota do editor

Último poste da série de 26 de dezembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9273: Recordações dos tempos de Bissau (Carlos Pinheiro) (6): Notícias da Guiné de 9 de Fevereiro de 1969

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Guiné 63/74 - P9273: Recordações dos tempos de Bissau (Carlos Pinheiro) (6): Notícias da Guiné de 9 de Fevereiro de 1969

1. Mensagem de Carlos Manuel Rodrigues Pinheiro* (ex-1.º Cabo TRMS Op MSG, Centro de Mensagens do STM/QG/CTIG, 1968/70), com data de 19 de Dezembro de 2011:

Camarigo Carlos Vinhal
Como tinha prometido, aqui vai mais um trabalho sobre Bissau, mais concretamente sobre o jornal "Noticias da Guiné".
Em anexo vão as 10 páginas deste número que tu trabalharás informaticamente como tu bem sabes.

Um abraço e votos de bom Natal para toda a Tabanca.
Que o 2012 venha a ser menos mau do que nos vão dizendo.
Um abração
Carlos Pinheiro


RECORDAÇÕES DOS TEMPOS DE BISSAU (6)

Pedaços de História da Guiné

“NOTÍCIAS DA GUINÉ”

Domingo, 9 de Fevereiro de 1969

Na minha qualidade de “privilegiado” por ter passado a minha comissão de 25 meses, 10 dias e não sei quantas horas na cidade de Bissau, tenho-me vindo a aproveitar desse “privilégio” para dar a conhecer, especialmente aos camaradas do mato, nomeadamente aos do meu tempo, algumas das realidades de Bissau que lhes passaram certamente ao lado.

Depois de recentemente ter relatado a “história” da “Presse Lusitânia”, dando à estampa alguns dos seus exemplares, que era trabalhada na “minha guerra”, o STM, quero hoje partilhar com todos os camarigos um exemplar completo do “NOTICIAS DA GUINÉ”, que, como diz o cabeçalho, era o Boletim do Centro de Informação e Turismo da Guiné, o SNI lá do sítio, em tamanho reduzido, como devem compreender.

São notícias daquela época, que têm que ser lidas dentro do contexto que se vivia naqueles tempos, mas que de algum modo merecem ser conhecidas e recordadas para que a memória não esqueça, como agora se diz, para memória futura, mas também porque as mesmas já fazem parte da história.

De entre todo o noticiário desta edição, permito-me salientar algumas notícias por razões óbvias, a saber:

- O 5º aniversário do Programa das Forças Armadas;

- As Visitas do Governador e Comandante-chefe das Forças Armadas na Guiné;

- Exposição de material capturado ao inimigo,

- A Noticia do Governo da Província da Guiné onde se relata a tragédia da jangada na passagem do Rio Corubal que provocou a morte de 47 militares, com a indicação dos seus nomes que eu sublinho por motivos óbvios e ainda,

- A publicação do Boletim Informativo das Forças Armadas, Boletim periódico, onde informavam somente o que queriam, para não se dizer que não informavam nada. Era a realidade daquela altura…

Mas passando página a página, logo na 1ª, para além de outras notícias, encontramos a evocação, um ano depois, da visita do Chefe do Estado à Província, as Comemorações do 5º Aniversário do Programa das Forças Armadas, o P.F.A. como se popularizou, notícia que continua depois na página 2 mais desenvolvida, permitindo-me ainda destacar a notícia acerca das “Visitas do Governador e Comandante-chefe das Forças Armadas da Guiné”, ao interior da Província, com seguimento também na página 2, onde se relatam visitas a Madina do Boé, Aldeia Formosa, estrada Buba - Aldeia Formosa, Piche, Ponte Caium, Camajabá, Bunane, Copá, Bajocunda, Sinchã Sambel, Canjufa, e Sinchã Sama.

Na 2ª página encontramos então a continuação das notícias da capa como anteriormente referi.

Na 3ª página temos “A cidade - pessoas e factos”, como sejam a Peregrinação a Meca, Mocidade Portuguesa, Numeração de Prédios, Conferência Feminina de S. Vicente de Paulo, Missa por alma de António Ferreira da Silva, Fomento Industrial, Arquitecto Licínio da Cruz, Associação Comercial, Industrial e Agrícola da Guiné sendo a última a anunciar a chegada de 200 Toneladas de Arroz Novo a Bissau que “começou a ser descascado nos complexos industriais da cidade”. Completa esta página o relato de uma exposição de Jota Álamo no Centro de Informação e Turismo e ainda a publicidade dirigida às Exmas. Classes Médica e Farmacêutica a anunciar a chegada das “modernas escovas de dentes JORDAN” fabricadas na Noruega e distribuídas pela PROQUIL – Bissau.

Na página 4 temos mais publicidade desde o “Grande Hotel” até ao “Dum-Dum” (Spray) distribuído em exclusivo pela PROQUIL, passando pelo “Baygon” em spray e em pó, à venda na Farmácia Higiene – Bissau, Restaurador para o cabelo “DOMINACÔR”, distribuído pela Soc. Com. De Representações, Lda.,Venda de uma máquina de costura e de um “Peugeot 404” em estado novo e Explicações de Inglês, sendo a mesma completada com uma certidão do Notariado Português - Comarca da Guiné onde consta a constituição da Sociedade Por Quotas, “Escola de Condução Gomes & Gomes, Limitada”, com sede na Vila de Farim cujo capital social é de cento e cinquenta mil escudos, totalmente realizado.

A página 5 é totalmente dedicada ao Desporto, Campeonato da Guiné cujos clubes eram a UDIB, o Benfica, a Sacor, a S.C.U., Nuno Tristão, Tennis, e o Sporting, Efemérides, Noticias Em Duas Linhas onde se refere que o Vitória de Setúbal ia jogar em Alvalade com o Newcastle porque o Estádio do Bonfim ainda não tinha luz artificial e ainda que Costa Pereira ia jogar numa selecção internacional com Torres, Eusébio e Coluna, a Taça das Feiras e a final em dois jogos, a chave do TOTOBOLA com os jogos União de Tomar - V. Setúbal, Braga - Sanjoanense, Belenenses - Leixões, Académica - Sporting, CUF – Guimarães, Boavista – Famalicão, A. Viseu – Mar, Covilhã - Salgueiros, Espinho – Penafiel, Valecambrense - Gouveia, Leões – Barreirense, Seixal – Torriense e Luso - Sesimbra, Passatempos desportivos e ainda uma pequena noticia acerca do novo Presidente do Município de Vagos, como podem ver.

Agora na página 6, para além de “Noticias do Estrangeiro” e “Várias Noticias”, de entre as quais vem a “Notícia do Governo da Província da Guiné” acerca da tragédia que foi o desastre da jangada no rio Corubal que transportava parte da CCAÇ 1790 e onde morreram 47 militares por afogamento, com a indicação completa dos seus nomes e ainda uma pequena noticia acerca de uma Exposição de material capturado ao inimigo levada a afeito de 9 a 16 de Fevereiro daquele ano na Fortaleza de S. José de Bissau (Amura) e outra do Conselho Administrativo do Fundo de Construção de Casas para Funcionários onde é anunciado que uma moradia tinha ficado vaga pelo que todos os funcionários civis da Província se podiam habilitar à mesma.

Na página seguinte temos NOTICIAS DA METRÓPOLE, noticias estas de Lisboa, de Fafe, de Valpaços, de Coimbra, de Castelo Branco, de Braga e de Santo Aleixo da Restauração (Moura) falando cada uma delas acerca de motivos do que por cá se passava naquela altura.

Passando à página 8, Anúncios e mais anúncios, do Médico Pediatra Heliodoro Guitana, Instalações eléctricas da S.T.E.I.A., Super VITABRIL creme para o penteado, Anúncios da Câmara Municipal de Bissau a anunciar a venda de terrenos a $40 (quarenta centavos, um cruzado, quatro tostões) o m2, HALAZON spray-oral, Brilhantina Africana, TOTOBOLA - entregue o seu boletim na Confeitaria Império, pedido de emprego, oferta para tratar de assuntos na Metrópole, Farmácia Higiene de Bissau, Secretaria Notarial da Póvoa de Varzim, Venda de Mobílias, de Sinca 1000 GI, Fiat 600, Aparelhagem de Laboratório, Prédio novo, Frigorifico eléctrico Kelvinator 170, Austin 1100, Taunus 12M Super, Aluguer de quarto a casal, de Moradia, de outro quarto, de Cervejaria-Bar, mais uma moradia, outra moradia, ainda outra moradia, Precisa-se de quarto, Compra-se frigorifico a petróleo, a Óptica Barros anuncia ter recebido grande remessa de napas, Sorteio de um Vauxall Velox, Ciclo Preparatório, pedido de emprego, Farmácias de Serviço e Padaria Transmontana no Bairro da Ajuda a anunciar o seu bom, pão, folar transmontano e arrufadas.

Na página 9 temos o Boletim Informativo das Forças Armadas – período de 27 de Janeiro a 2 de Fevereiro e outras notícias continuadas de páginas anteriores onde se inclui o Aniversário do PFA, Uma entrevista com o Dr. Luiz G. Barros e mais um anúncio da Farmácia Higiene de Bissau acerca do 2º DEBUT.

Na última página, a contracapa, temos várias notícias de informação geral como sejam “A viagem de três Toureiros portugueses através do Continente Africano”, “Animal angolano possuidor de dentes com virtude medicinais”, e mais duas notícias de Lisboa, “Condenado por ter atropelado mortalmente dois sexagenários”, e “Duas mulheres e dois homens condenados a prisão maior” e uma notícia de Luanda “Morto vivo causa pânico num Muceque Luandense”. A página termina com uma pequena “caxa” onde se informa, acerca do Dr. Oliveira Salazar, que na quarta-feira, pelas 15 horas locais, foi o eminente estadista transportado para a sua casa em S. Bento. O seu estado é satisfatório.

Por incrível que possa parecer nos dias de hoje, o jornal não indicava a sua ficha técnica e nem sequer o nome do seu Director.

Mesmo admitindo que todo este repositório de lembranças da Guiné e especialmente de Bissau daquele tempo, pouco ou nada possam interessar a muitos camarigos, no entanto quero admitir que os interessados pela História duma época e duma região, poderão encontrar algum interesse nestas recordatórias.

Mas como cada um pode e deve contar o que passou, eu não posso contar nada de tiros, até porque só tive uma arma distribuída por um período de 12 horas, mas entendo que posso e devo contar as peripécias do dia-a-dia duma comissão em que grande parte do tempo nem me apercebia de quando era noite ou era dia uma vez que trabalhava 12 horas e descansava 24.

De qualquer forma, penso que a publicação deste jornal poderá ter algum interesse especial para os sobreviventes da CCAÇ 1790 e para os historiadores o que ali é relatado, de forma muito reduzida, é certo, acerca da tragédia que foi o desastre do Corubal.

A quem tiver tido a paciência de ler este escrito, muito maior do que o habitual, os meus agradecimentos e desde já fico a aguardar os comentários.

Um abração do
Carlos Pinheiro
19.12.11


Nota: - Clicar nas imagens para as ampliar
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 5 de Novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8999: Recordações dos tempos de Bissau (Carlos Pinheiro) (5): Efeitos colaterais da crise académica de 1969

sábado, 5 de novembro de 2011

Guiné 63/74 - P8999: Recordações dos tempos de Bissau (Carlos Pinheiro) (5): Efeitos colaterais da crise académica de 1969

1. Mensagem de Carlos Manuel Rodrigues Pinheiro* (ex-1.º Cabo TRMS Op MSG, Centro de Mensagens do STM/QG/CTIG, 1968/70), com data de 2 de Novembro de 2011:

Camarigo Carlos Vinhal
Talvez porque este tempo de Inverno ajude a recordar memórias adormecidas.
Em anexo vai mais um texto, mais um "Estória", real e verdadeira das muitas passadas na Guiné.

Se entenderes por bem publicá-lo, estás sempre à vontade como é hábito.

Um abraço
Carlos Pinheiro


RECORDAÇÕES DOS TEMPOS DE BISSAU (5)

Efeitos colaterais da crise académica de 1969

Estávamos na Primavera de 1969. Era Abril. Já tinha passado 6 meses da Comissão na Guiné que se prolongaria por 25 longos meses.

Recentemente tinha partido o braço esquerdo num acidente sem história. Andava de “baixa” e frequentemente, depois do almoço, durante o chamado período da “sesta” desenfiava-me de Santa Luzia, do Q.G., até à cidade para conviver com a malta que também estava desenfiada em Bissau, à espera de transporte para o mato ou para a Metrópole.

Os sítios onde nos encontrávamos eram os habituais. O Café do Bento a que carinhosamente chamávamos a 5ª Rep., o ponto de encontro por excelência da malta do mato.

E eu tinha amigos no mato em todo o lado. Em Buba, em Tite, em Jabadá, Nova Sintra, em Catió, em Aldeia Formosa, em Bafatá, em Mansoa, em Farim, em Piche, em Bigene, em Bula, em Nova Lamego, no Cacheu, em Susana, em Varela, e depois até vim a fazer amigos quando a CCaç 1790 abandonou Madina do Boé, com a tragédia conhecida, uma vez que foram colocados na “minha guerra” dois dos sobreviventes.

Era rapaziada que tinha andado a estudar comigo na Escola Industrial de Torres Novas, era a malta da minha terra, Alcanena, era pessoal de Pernes e de Mira de Aire que frequentava de vez em quando nos bailaricos da época, eram colegas dos Serviços Médico Sociais para onde eu tinha entrado em 1964, era a rapaziada que tinha estado comigo na Escola Prática de Cavalaria em Santarém e que comigo tinha chumbado no Curso de Sargentos Milicianos e que também tinha sido “recompensada” como um comissão na Guiné, era malta que tinha estado comigo na Especialidade no Regimento de Transmissões no Porto, na Arca d’Agua, era malta que tinha ido comigo no UIGE em rendição individual, enfim era um conjunto alargado de companheiros e amigos embarcados no mesmo barco da Guerra da Guiné.

Mas também nos encontrávamos no Portugal ou no Internacional na Praça Honório Barreto, no Zé da Amura, nas Palmeiras em Brá, no Santos em Santa Luzia, na Solmar lá do sítio, no Café Pastelaria Império na Praça do Império, perto do Palácio do Governador, ou no Solar do Dez. Tudo isto de dia. De noite os encontros eram mais na Meta, no Chez Toi, na UDIB, no Sporting e até no Benfica a caminho da Sacor.

O caso que vou relembrar passou-se no Solar do Dez, talvez o melhor Restaurante de Bissau daquela altura. Mas como já tínhamos almoçado no quartel, porque o pré não dava para luxos, estávamos num mesa grande, a tomar café na esplanada e cada um ia contando as suas histórias, com muitas anedotas pelo meio.

Parece eu que estou a ver o Marques, que também tinha chumbado no CSM em Santarém. Na altura já era Regente Agrícola. Mas tinha chumbado. Era o Delegado em Bissau da sua Companhia. Namorava uma moça que estava em Medicina ou em Direito, já não me lembro bem. Volto a dizer. Parece eu que estou a ver o Marques, a ler em voz alta uma carta da namorada. E ela contava-lhe, e ele partilhava connosco, a invasão da Faculdade pela Policia e pela Pide com muita pancadaria e algumas prisões à mistura. Era a Crise Académica no seu auge, mas nós, que estávamos longe de tudo, desconhecíamos por completo. A Emissora Oficial só dava boas notícias, jornais não havia com regularidade, televisão nem vê-la, telefones nem sonhá-los e telemóveis nunca se tinha ouvido falar. Aquilo desta vez parecia uma sessão solene. O orador lia a carta pausadamente e nós caladinhos para não perdermos nada da noticia.

Ao lado, noutra mesa, estava um Major, o Comandante das Transmissões da Guiné, meu Comandante uma vez que o Destacamento do STM onde estava integrado, em última análise também dependia deste senhor, acompanhado de sua esposa, que apesar da sua posição importante e da nossa pequenês, nunca abriu a boca.

O pior foi à tarde. Eu como estava “de baixa”, passava o resto da tarde, até ao jantar, no meu quarto particular com mais de duzentas camas. Ouvia-se rádio, jogava-se à sueca e alguns descansavam porque iam entrar de turno à noite. Aparece o Sargento Caldas, entretanto infelizmente já libertado da lei da vida, bom homem e bom amigo. Era o meu Chefe directo. Vinha com mau aspecto. E de chofre perguntou-me onde é que eu tinha andado que o Major queria falar comigo e estava muito bravo. Contei-lhe tudo por onde tinha andado mas esqueci-me da leitura da tal carta, coisa que poucos de nós valorizámos, porque desconhecíamos os antecedentes da Universidade de Coimbra e a ebulição estudantil que havia naquela altura.

E lá fui eu, mas o Major já não estava. Ficou para o outro dia. Nessa noite nem dormi. O que é que o Major teria para estar tão bravo como tinha dito o Caldas. De manhã, bem cedinho lá estava eu, com o braço ao peito, mas de resto devidamente uniformizado e até com as botas bem engraxadas. Já eram mais de 10 horas quando ele chegou. Nem se sentou. Logo ali à entrada da porta dispara, perguntando-me o que é que estava ali a fazer ontem naquele “comício”? Fiquei perplexo. O que é que aquilo queria dizer? O que é que eu teria feito de mal? Fiquei sem resposta. Mas lá terei dito alguma coisa, atabalhoadamente, a tentar relatar o acaso do encontro. Levei uma rabecada das antigas. E ameaças quanto ao futuro foram as suficientes. O mato, nas piores condições e nos piores locais, tinha sempre vagas e estava sempre à espera.

Mais tarde, começou a constar, na caserna, que o senhor teria algumas ligações à Policia que tinha aquartelamento no Largo do Colégio Militar, junto à Avenida Arnaldo Shulz, em Bissau, a Policia Internacional e de Defesa do Estado, a tenebrosa Pide de má memória para o Povo Português mas também neste caso para o Povo da Guiné-Bissau. Nunca cheguei a saber se era verdadeira essa dupla função, mas lá que andei atrapalhado isso foi mesmo verdade.

Tudo se passou sem mais agruras. Mas andei mal durante muito tempo e com atenções redobradas. É que eu passava naquela Avenida de vez em quando e, às vezes, os tratamentos ouviam-se cá fora.

A guerra também tinha destas coisas. E é bom recordá-las para que a memória não esqueça.
Carlos Pinheiro
25.10 10
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 7 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8748: Recordações dos tempos de Bissau (Carlos Pinheiro) (4): As notícias em Bissau - A Presse Lusitânia

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Guiné 63/74 - P8748: Recordações dos tempos de Bissau (Carlos Pinheiro) (4): As notícias em Bissau - A Presse Lusitânia

1. Mensagem de Carlos Manuel Rodrigues Pinheiro* (ex-1.º Cabo TRMS Op MSG, Centro de Mensagens do STM/QG/CTIG, 1968/70), com data de 4 de Setembro de 2011:

Camarigo Carlos Vinhal
Depois de algum tempo de interregno, volto às lides e às recordações do meu tempo de Bissau.

Recordo hoje aqui o trabalho diário da difusão da PRESSE LUSITÂNIA, passados que são mais de 42 anos.

A reprodução dos documentos não é a melhor mas a possível. Os documentos estão manchados pelo tempo e eu também não sou grande técnico nas artes de utilizar o scanner. Mas a rapaziada compreenderá, até porque o que conta é a intenção e essa é a melhor.

Se entenderes que este trabalho merece ser publicado, estás à vontade.

Um abração
Carlos Pinheiro


RECORDAÇÕES DOS TEMPOS DE BISSAU (4)

Recordar nunca é demais, para que a memória não esqueça.

As notícias em Bissau – A PRESSE LUSITÂNIA

Naqueles tempos longínquos, quando ninguém sabia o que eram telemóveis e a Rádio não era nada do que hoje é, algumas notícias ouviam-se em Onda Curta, mas sempre com má qualidade e normalmente a horas impróprias. Por tudo isto, as notícias chegavam todos os dias a Bissau, expedidas de Lisboa, para todo o mundo, em Morse.

Era o Destacamento do STM do CTIG que organizava a sua recepção, a sua interpretação, a sua impressão e a sua posterior divulgação pelas Unidades Militares de Bissau.
Tínhamos ali uma equipa pluridisciplinar digna de todo o registo e digna de ser recordada ao fim de todos estes anos.
Tudo funcionava sob o comando e orientação do Comandante do Destacamento, o então Capitão João Afonso Bento Soares, hoje distinto General na reforma.

O 1º Sargento Liberal Silva, coordenava a equipa que muitas vezes já funcionava automaticamente como se estivesse em auto-gestão.

O 2º Sargento Caldas da Silva tratava da Expedição já que era o CMsgs, que ele chefiava, que tinha as viaturas e os estafetas.

Para estes dois últimos amigos que já nos deixaram há muito, vai um abraço de saudade e de uma forma especial para o Sargento Caldas, grande amigo, que naquelas terras passou grande parte da sua vida.

O Radiotelegrafista IRINEU era um especialista altamente qualificado para cumprir esta missão, por isso encarregado diariamente desse serviço. Tinha de facto uma capacidade de recepção muito acima da média e era um companheiro amigo do seu amigo que, mesmo depois do seu trabalho, muitas vezes ajudava a interpretar muitas das letras que escrevia apressadamente. Gostava de saber o seu contacto. Penso que era do Norte, mas não tenho mais referências.

Depois era eu, este modesto escriba, que se encarregava então da interpretação de todos aqueles rabiscos, que passava à máquina todo o trabalho naquelas folhas de stencil e depois era só colocá-las, uma a uma, uma de cada vez, no duplicador Gestetner, meter tinta suficiente, colocar o papel e dar à manivela para que o trabalho saísse.

De vez em quando acontecia um ou outro contratempo. Era o stencil que se rompia e tudo tinha que começar de novo. Era a tinta que borrava o trabalho e tudo também voltava ao principio, mas a noite era nossa e tudo acabava sempre em bem.

No outro dia de manhã, quando o serviço o permitia, eram dirigidos vários exemplares a cada Unidade de Bissau e esse trabalho acabava sempre perto da hora da 2ª refeição. Ia um motorista, normalmente do Recrutamento da Província, e um estafeta do Centro de Mensagens que fazia as entregas mediante Protocolo para que não haver lugar a reclamações.

Por mera curiosidade, para matar saudades e também para a rapaziada do mato que só vinha a Bissau de passagem, vão aqui dois exemplares, sendo o primeiro do dia 13 de Julho de 1969. Nesta primeira página fala-se da visita Presidencial ao Brasil, o Professor Marcello Caetano, da viagem no avião a jacto da TAP, da sua chegada e da recepção.


Nesta segunda página, como poderão verificar, fala-se de futebol, de atletismo, da digressão do Vitória de Setúbal a Angola e a Moçambique e dava-se conhecimento da Chave do TOTOBOLA daquela semana, onde só pontificavam equipas secundárias, possivelmente devido a alguma interrupção do Campeonato Nacional da 1ª Divisão, quem sabe se motivada por algum jogo da Selecção Nacional.
Mas esta da Chave do Totobola, não deixa de ser interessante recordar.


Agora é a Presse do dia 31 de Julho de 1969.
Nesta página, para além das notícias da política da altura, regista-se a chegada a Lisboa do Paquete “Vera Cruz” com tropas de regresso do Ultramar, mas também se dá nota da VIDA DESPORTIVA que inclui ciclismo – VIII Grande Prémio Robbialac – dum acidente dentro desse Grande Prémio onde esteve envolvido o grande Joaquim Agostinho e termina a página com uma referência ao Campeonato Nacional de Juniores de Andebol de Onze.


Nesta página é dada nota de alguma dificuldade de ligação do grande Eusébio ao Benfica.
A página completa-se com notícias da chamada Vida Internacional.
Era assim que a tropa, neste caso o Destacamento do STM, colaborava na difusão das notícias do mundo junto das outras Unidades Militares.

É mesmo bom recordar, para que a memória não esqueça.
Carlos Pinheiro, no dia 4 de Setembro de 2011, passados 42 anos dos factos.
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 19 de Junho de 2011 > Guiné 63/74 - P8448: Blogoterapia (182): A primeira vez! - Em Monte Real (Carlos Pinheiro)

Vd. último poste da série de 13 de Junho de 2011 > Guiné 63/74 - P8412: Recordações dos tempos de Bissau (Carlos Pinheiro) (3): Dia de Santo António de 1969

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Guiné 63/74 - P8412: Recordações dos tempos de Bissau (Carlos Pinheiro) (3) : Dia de Santo António de 1969

1. Mensagem de Carlos Manuel Rodrigues Pinheiro* (ex-1.º Cabo TRMS Op MSG, Centro de Mensagens do STM/QG/CTIG, 1968/70), com data de 8 de Junho de 2011:

Caro Carlos
Aqui vai mais um artigo recordatório. Desta vez a falar do Dia de Santo Anónio de 1969 em Bissau.

Deste assunto não tenho fotografias. Mas tu talvez consigas fazer o "milagre" de intercalares uma de Santo António e até quem sabe do Quartel do 600, do Quartel dos Bombeiros de Bissau e de alguma marcha popular.

Vê lá. Compõe à tua maneira, que ficará bem de certeza.

Um abraço
Carlos Pinheiro


RECORDAÇÕES DOS TEMPOS DE BISSAU (3)

Dia de Santo António de 1969 em Bissau

Era dia de 13 de Junho. Dia do Santo, como se diz em Pádua. Mas também era dia do Santo, mesmo em Bissau, onde a uma certa distância de Lisboa ou de Pádua, se vivia o clima da guerra.

Mas este dia estava a ser um dia igual a tantos outros, até que…

Eram 15 horas, 3 da tarde em ponto. Estava no Quartel-General, em Santa Luzia. O calor era abafador, próprio daquela terra. A humidade, como era hábito era elevada. A Parada cheia daquele pó encarnado, era um braseiro.

Mas àquela hora, ouviu-se um rebentamento enorme. Vê-se uma coluna de fumo por cima dos edifícios. Na Parada caiu qualquer coisa que de princípio não foi identificada. Mas a esse rebentamento seguem-se outros, cada vez mais fortes, cada vez mais repetitivos. Era a simpatia a funcionar.

Os operacionais que estavam de passagem no QG, fugiram. Alguns apareceram na cidade como estavam. Uns fardados, outros não e outros até em cuecas como estavam deitados em cima da cama, na chamada hora da sesta, como ali era habitual, sempre que possível.

Em pouco tempo soube-se que os rebentamentos vinham do “600”(1), o outro Quartel frente ao QG, onde estava instalada a Intendência que tinha vindo da Amura

Foi uma caserna que rebentou por inteiro. Mas não tinha sido atacada de fora. Foi tudo lá dentro e em pouco tempo não havia um tijolo em cima de outro tijolo. Mas havia fogo e os rebentamentos continuavam e já se começava a notar que eram cunhetes de munições a rebentar, para além de granadas de obus.

Os primeiros, foram bidões de gasolina que rebentaram e aquela coisa que caiu na parada do QG era o bujão de um bidão.

Ao lado estavam os depósitos subterrâneos dos vários combustíveis, especialmente muita gasolina que era o combustível das GMC, das Mercedes, dos jipes e até de alguns Unimogs.

Os Bombeiros Voluntários da cidade apareceram em pouco tempo e, destemidamente, à boa maneira dos Bombeiros, começaram a combater aquelas chamas imensas, para evitar que as mesmas se propagassem aos grandes depósitos e fizessem mais destruições.

Se eles rebentassem, quem sabe, até o QG poderia desaparecer como também a “Antula”(2) onde estavam as antenas das comunicações com o mato, com Cabo Verde e com a Metrópole.

A Policia Militar cumpriu a sua obrigação. Isolou aquele aquartelamento e a entrada em Santa Luzia passou a ser controlada como nunca se tinha visto. A tasca do Santos, logo ali às portas de Santa Luzia, nunca tinha tido tanta freguesia apesar da hora do almoço já ter passado há muito e ainda faltar muito para a hora do jantar.

Sentiam-se outras movimentações que nunca compreendemos. Depois veio-se a falar, especialmente na 5ª Rep (3), o Café do Bento, onde tudo se discutia e onde se trocavam informações, que aquela caserna tinha ali a Comissão Liquidatária de uma Companhia qualquer e, apesar de muitos boatos, nunca se chegou a saber como é que os rebentamentos começaram.

A tarde foi toda de uma confusão muito grande. As Repartições do QG mal funcionaram. Só os serviços essenciais é que não pararam. Mas as cantinas, nessa tarde, fizeram muito e bom negócio.


Os estragos bem visíveis após as explosões
Fotos gentilmente enviadas pelo camarada Manuel Carvalho da CCAÇ 2366, Jolmete, 1966/68

Com o aproximar da noite tudo foi acalmando.
E apesar de tudo, era dia de Santo António.
Estávamos longe de Lisboa mas a noite tinha que ser comemorada.

Havia festa na “Meta”(4) e no “Chez Toi”(5). Mas a grande festa desta vez era no Bairro da Ajuda e durou até às tantas. Havia marchas, improvisadas é certo, mas eram marchas, com arquinhos e balões a lembrar a Avenida em Lisboa. Havia sardinha assada e, claro, vinho tinto para animar a malta.

Foi portanto mais um dia assinalado naquelas terras de África, que por vários motivos, nunca mais se esqueceu.

Notas:
1) Quartel que tinha sido construído pelo Batalhão nº 600. Daí o seu nome de guerra.
2) Centro emissor do Exército do STM (Serviço de Telecomunicações Militares) do CTIIG - Comando Territorial Independente da Guiné
3) 5ª Rep. Como o QG tinha quatro repartições e como aquele café era onde a malta mais parava, foi baptizado de 5ª repartição a que sinteticamente toda a gente alcunhava de 5ª Rep.
4) “Meta” era um bar na cidade que tinha pistas de automóveis eléctricos onde a malta passava algum tempo, normalmente de copo na mão.
5) “Chez Toi” era outro bar que sucedeu ao “Nazareno” que era uma Casa de fado vadio.

Carlos Pinheiro
08.06.11
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 10 de Junho de 2011 > Guine 63/74 - P8400: Efemérides (50): Penamacor inaugura Memorial evocativo dos antigos Combatentes da Guerra do Ultramar (Carlos Pinheiro)

Vd. último poste da série de 7 de Junho de 2011 > Guiné 63/74 - P8382: Recordações dos tempos de Bissau (Carlos Pinheiro) (2): Pedaços históricos perdidos na Guiné

terça-feira, 7 de junho de 2011

Guiné 63/74 - P8382: Recordações dos tempos de Bissau (Carlos Pinheiro) (2) : Pedaços históricos perdidos na Guiné

1. Mensagem de Carlos Manuel Rodrigues Pinheiro* (ex-1.º Cabo TRMS Op MSG, Centro de Mensagens do STM/QG/CTIG, 1968/70), com data de 14 de Maio de 2011:

Camarigo Carlos Vinhal
Mais uma vez estou a enviar uma artigo, desta vez sobre pedaços históricos perdidos na Guiné no ano de 1969.

Se entenderes que o mesmo merece ser publicado, estás sempre à vontade.

Um grande abraço
Carlos Pinheiro


RECORDAÇÕES DOS TEMPOS DE BISSAU (2)

Pedaços históricos perdidos na Guiné em 1969

Só o facto de estarmos em guerra, só o facto de estarmos em África, mas também pelo facto das comunicações da altura não serem nada, nem de perto nem de longe, do que hoje dispomos, leva-me a relatar alguns factos, mais ou menos históricos, que não presenciámos, que não testemunhámos por estarmos forçadamente ausentes do nosso cantinho, da nossa família, dos nossos amigos, mas dos quais nunca duvidámos uma vez que, mesmo à distância, lá nos chegaram, dias mais tarde, ecos desses mesmos factos que hoje são mesmo históricos por razões diversas.

Logo no início do ano de 1969 foi lançado na RTP, a única televisão da época, um programa que foi marcante para a altura. Tratou-se do ZIP ZIP, um programa de Raul Solnado, Fialho Gouveia e Carlos Cruz que apareceu, certamente “permitido” pela primavera Marcelista, uma vez que Salazar tinha caído da cadeira no ano anterior e Marcelo já governava. Segundo rezam as crónicas, foi um programa audaz para a época, mas a malta do meu tempo que estava na guerra, perdeu-o pura e simplesmente.

Imagem retirada do site da RTP, com a devida vénia

Outro facto histórico, este de nível mundial desse período, aconteceu exactamente no dia 20 de Julho de 1969**. Foi a chegada do primeiro homem à Lua que a Televisão terá transmitido em directo e a que nós não tivemos oportunidade de assistir. Ouvimos falar, lemos nos jornais com alguns dias de atraso, mas não presenciámos o facto e o feito. É caso para dizer que lemos e ouvimos, mas não vimos.

Foto retirada da Wikipédia, com a devida vénia

Também perdemos outro acontecimento, marcante para a história de Portugal, que ocorreu no dia 27 de Julho de 1969. Foi a morte de António de Oliveira Salazar cujo funeral nacional foi efectuado de comboio de Lisboa para a sua terra natal, Vimieiro, Santa Comba Dão, tendo o país ficado de luto durante três dias. Até na Guiné esse luto foi garantido com a bandeira nacional a meia haste. Mas não presenciámos, só ouvimos falar, mais nada, para além de sentirmos mais algum rigor nas prevenções militares naqueles dias.

Foto retirada do site Fotos Sapo, com a devida vénia

Outro facto importante para a época e que a história regista e a que nós não assistimos e muito menos participámos, foram as Eleições legislativas de 1969***. As primeiras que se realizaram com Marcelo no Governo, precisamente no dia 26 de Outubro daquele ano e onde concorreram, para além da União Nacional, o partido do Governo, a CEUD Comissão Eleitoral de Unidade Democrática, a CDE Comissão Democrática Eleitoral e a CEM Comissão Eleitoral Monárquica. Soubemos depois que a União Nacional elegeu todos os 120 Deputados naquela espécie de acto eleitoral, como mandavam as regras da época, a bem da nação, a bem da evolução na continuidade.

Fotos retiradas do site do Parlamento, com a devida vénia

Cada um à sua maneira, foram factos perdidos devido à situação que estávamos a viver, no auge da guerra, quando os mísseis já eram uma arma dos nossos opositores no terreno.

Em contrapartida, para além do facto de estarmos na guerra, muitos sofrerem o horror dos combates e dos ataques, da fome e da sede, muitos morrerem na flor da idade e muitos outros terem ficado estropiados no corpo e no espírito, ganhámos o privilégio de podermos passar a consumir Coca-Cola, importada directamente de Inglaterra e até de Moçambique, bebida esta que na Metrópole era proibida. Aliás, já que estamos a falar de privilégios, na Guiné também podíamos beber água Perrier e Vichy vindas de França e até leite da Holanda da Twin Girls, uma vez que era difícil a entrada naquelas terras de águas ou leite da Metrópole. Vá-se lá saber porquê.

Relatar estes acontecimentos passados tantos anos, denota algum saudosismo, mas também serve para lembrar que a guerra deixou marcas das mais variadas estirpes. Hoje, nada disto aconteceria. Ou melhor aconteceria, acontece tudo, mas todo o mundo, Iraque ou Afeganistão, por exemplo, estaria informado no momento, em directo, em todas as televisões.

Carlos Pinheiro
29 de Julho de 2010
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 20 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8138: Memória dos lugares (152): A cidade de Bissau em 1968/70: um roteiro (Carlos Pinheiro)

(**) Vd. poste de 19 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXL: Estórias de Dulombi (Rui Felício, CCAÇ 2405) (3): O dia em que o homem foi à lua

(***) Vd. poste de 4 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5206: Efemérides (31): as eleições de 26/10/1969, as oposições democráticas (CDE e CEUD) e a escalada da guerra (João Tunes)

Vd. primeiro poste da série de 1 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7204: Recordações dos tempos de Bissau (Carlos Pinheiro) (1) : Dia de Todos os Santos de 1968

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Guiné 63/74 - P7204: Recordações dos tempos de Bissau (Carlos Pinheiro) (1) : Dia de Todos os Santos de 1968

1. Mensagem de Carlos Manuel Rodrigues Pinheiro* (ex-1.º Cabo TRMS Op MSG, Centro de Mensagens do STM/QG/CTIG, 1968/70), com data de 26 de Outubro de 2010:

Caro companheiro, camarada e amigo Carlos Vinhal
Prosseguindo o que prometi há dias, aqui vai mais uma artigo se saudade e de recordação dos tempos de Bissau.
Era ainda o 3.º dia dos mais de 25 meses que por lá passei. Era dia 1 de Novembro, dia de todos os Santos. Estávamos em 1968. Mas a história sendo de certo modo trágica, não deixará de ter a sua utilidade nem que seja para que a memória não esqueça.

Para melhor lembrar aqueles que por lá passaram e informar os que ainda nada sabem da Guerra, vai também em anexo uma "paisagem" de GMCs daquele tempo já com mais de 40 anos andados naquela altura. Eram viaturas fora de série. Iam e voltavam sempre.
Uma vez vi uma que regressava do mato a rebocar outras 3 ou 4. Tinham força que nunca mais acabava. E não gastavam muito. Talvez uns 100 aos 50.

Por mera curiosidade, a foto tirada no Dia de Natal de 1968 na Companhia de Transportes, no QG em Bissau, com este tabanqueiro armado em cinéfilo.

Se e quando isto for publicado (seria interessante que fosse no próximo dia 1) agradeço-te que me informes.

Vou continuar esta tarefa de colaborar para avivar as memórias.

Um abraço
Carlos Pinheiro
Tabanqueiro 455


RECORDAÇÕES DOS TEMPOS DE BISSAU (1)

Dia de Todos os Santos de 1968 em Bissau

Era dia de Todos os Santos. Era dia 1 de Novembro de 1968. Estava no meu terceiro dia de Guiné. Tinha chegado no UÍGE em 28 de Outubro. Estava “adido” nos Adidos, em Brá, porque tinha ido em rendição individual e o meu Batalhão, o 1911, regressaria no mesmo barco onde eu tinha ido. Coisas da tropa. Só que, mesmo depois da comissão terminada e o barco ao largo à espera, mesmo assim, o 1911 estava numa operação especial no Sul. E o UÍGE lá esperou mais de uma semana.

Por tudo isto, estava “adido” nos Adidos, um quartel de passagem onde as condições, ou a falta delas, eram inimagináveis. Uma cama? O que era isso para os “periquitos” (1))? Comida? Tenham calma. Podem lá ir fora e andar “desenfiados” que ninguém dá pela vossa falta. Devem ainda trazer algum “patacão”(2)) da Metrópole no bolso. Desenrasquem-se, era a ordem e assim íamos fazendo, conforme podíamos.

Tudo ali estava de passagem, à espera de um destino. Para os que chegavam, era a espera da guia de marcha para o destino. Para os outros, os que já tinham terminado a comissão, era a espera do regresso desejado. Portanto, como não havia tanta coisa, camas era o que mais faltava. Não havia mesmo. A malta desenrascava-se a dormir em cima daquelas caixas da tropa que na Metrópole serviam para guardarmos, debaixo da cama, as nossas coisas e especialmente o farnel de casa e as botas de sair, as botas engraxadas. Ali, não. Ali serviam mesmo de cama. A primeira noite foi horrível. Os mosquitos, aos milhares, dada a falta de higiene e de qualquer tipo de limpeza mais que evidente, e ainda por cima com as “bolanhas”(3)) ali à volta, sabiam escolher o sangue novo acabado de chegar. No outro dia ainda não havia feridas, mas tínhamos o corpo todo picado. Parecia que tínhamos rubéola. Havia portanto que arranjar um sítio para dormir e eu, à boa maneira portuguesa, acabei por ter sorte.

Ainda no cais, no dia anterior quando desembarquei, encontrei um conterrâneo, já “velhote” naquelas coisas da guerra. Era condutor na Companhia de Transportes. Tinha sido ele, e os seus camaradas que nos transportaram, na véspera, naquelas velhas GMC da 2.ª Grande Guerra, para os nossos destinos. Foi ele que no dia seguinte me procurou para me dizer que, provisoriamente, me arranjava uma cama, com mosquiteiro, na sua Companhia, no Quartel-General, em Santa Luzia. Foi uma pequena felicidade, já que a maior parte dos companheiros de viagem só muito mais tarde é que tiveram a tal cama com mosquiteiro. Sim, esta coisa do mosquiteiro era um pormenor mais que importante, porque assim os mosquitos não nos chegavam ao pelo.
Talvez por isso, talvez porque não conhecia ainda mais ninguém naquelas paragens, mas também com sentimento de agradecimento, convidei o meu amigo para um petisco nesse dia de Todos os Santos.

Foi ele que escolheu o sítio. Aliás, eu ainda não conhecia nada. E assim, lá fomos até Safim, nos arredores de Bissau, onde se comiam umas ostras que eu ainda não sabia apreciar, mas também se comia um bocado de leitão e se bebiam umas “bazookas” da Metrópole ou até mesmo de Angola, a Cuca ou a Nocal, ou de Moçambique, a 2M, salvo erro.

A páginas tantas, como soe dizer-se, a meio do repasto, começa a passar por cima de nós uma série de helicópteros, movimentos esses a que eu não estava habituado e certamente por isso perguntei a que se devia tal bailado. E o meu amigo não se fez rogado:

- Havia “ronco”(4)). Mas o que era “ronco”?

E ele lá me explicou. Havia “porrada” de certeza.

Mas nós lá fomos cumprindo a obrigação que nos tinha levado aquele sítio. A temperatura era elevada, a humidade era ainda maior. Havia portanto que refrescar o corpo com as bebidas frescas sem que notássemos que a mente ficava cada vez mais nublada.

Depois, lá voltámos ao quartel, a Santa Luzia, à procura do local do descanso. Mas qual descanso? Quando lá chegámos, de certo modo “alegres”, mandaram-nos calar porque a caserna estava cheia de feridos.

Feridos? Mas como? Foi como um balde água fria. O “calor” passou-nos de imediato. Caímos de imediato em nós. O que é que se tinha passado? Tinha sido só mais um caso. Dramático como muitos outros. Um “periquito”, talvez duma Companhia que tinha ido comigo no barco, ao subir para uma GMC na zona de Bula, a caminho do seu destino, deixou cair a sua bazuca armada e aconteceu um mar de dor e de sangue.

Nunca cheguei a saber quantos morreram, mas alguns acabaram ali a comissão que estavam a iniciar. Muitos feridos estilhaçados em tudo que foi sitio. Nos braços, nas pernas, tronco, na cabeça, onde calhou. Daí aquele bailado dos helicópteros. No meio dos feridos, alguns eram condutores da Companhia de Transportes. Por isso, o Hospital, o HM 241, o Hospital Militar de Bissau onde se fizeram autênticos milagres durante toda a guerra, pediu aquela Unidade para recrutar pessoal para ir dar sangue. Voluntários apareceram de imediato, como era habitual. O Unimog arrancou carregado, mas antes de chegar ao Hospital, despistou-se junto ao Bairro da Ajuda, já muito perto do Hospital. Mais feridos. Mais dor. Mais sangue. Mais sofrimento. Daí a razão de tantos feridos na caserna aquela hora. Eram os que estavam menos-mal. O Hospital estava cheio e teve que dar alta aos que inspiravam menos cuidados. Era a guerra na verdadeira acepção da palavra.

Foi assim o meu primeiro dia de Todos os Santos que passei na Guiné. Há dias que não se esquecem e aquele foi um deles.

1) Militar recém-chegado à Guiné.
2) Dinheiro.
3) Terrenos pantanosos.
4) “Festa”, pancada, algo de anormal.

Carlos Pinheiro
26.04.08
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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 25 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7173: Tabanca Grande (250): Carlos Manuel Rodrigues Pinheiro, ex-1.º Cabo TRMS Op MSG (STM/QG/CTIG, 1968/70)