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sábado, 4 de dezembro de 2021

Guiné 61/74 - P22779: Os nossos seres, saberes e lazeres (480): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (27): O génio de Almada Negreiros nas gares marítimas do Porto de Lisboa (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 2 de Novembro de 2021:

Queridos amigos,
Nestas gares marítimas do porto de Lisboa, Almada Negreiros trabalhou entre 1943 a 1949. Assombrou uns, desgostou outros, Duarte Pacheco terá dito desdenhosamente que teria sido um desperdício gastar aquelas centenas de contos com tais mamarrachos. Almada teve grandes defensores, logo no Arquiteto, Porfírio Pardal Monteiro, com quem já antigamente trabalhara na Igreja de Nossa Senhora de Fátima e na ampla sala do rés-do-chão do Diário de Notícias. Não deixa de ser curioso, cerca de três quartos de século depois, verificar a perfeita integração desta pintura naquele espaço, assenta como uma luva. O mundo da viagem marítima alterou-se radicalmente mas estas obras-primas da pintura modernista possuem tal vibração, deixam antever o olhar provocador do génio Almada, que é um gosto permanente aqui regressar. Para nós, antigos combatentes, nem sempre as recordações são boas, falando por mim, ali a umas centenas de metros, num lance de escada me despedi dos meus entes queridos debulhados em lágrimas, eu disfarçado de pimpão, era uma viagem de pouca mossa e com regresso assegurado, acreditassem todos. Foi grande a fezada e o regresso se assegurou, mesmo por debaixo dos painéis geniais de Almada, era agosto mas para mim era a primavera.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (27):
O génio de Almada Negreiros nas gares marítimas do Porto de Lisboa

Mário Beja Santos

Historiadores de Arte como José-Augusto França consideram que o trabalho de Almeida Negreiros nas gares marítimas da Rocha do Conde d’Óbidos e Alcântara é o ponto mais elevado das Artes Plásticas do chamado Modernismo Português, tal como ele se exprimiu entre os anos 1930 e 1940. Tudo terá começado pela necessidade de construir gares marítimas no Porto de Lisboa, era um apelo do início da década de 1930, a urgência consumou-se nas vésperas da II Guerra Mundial, entregou-se ao Arquiteto Pardal Monteiro a tarefa de executar o traçado das gares, pensou-se inicialmente em três, Alcântara, Rocha do Conde d’Óbidos e Cais do Sodré que nunca chegou a ser executada. Pretendia-se, dada a importância que as viagens marítimas tinham no tempo, de fazer um belo cartão de visita para um verdadeiro cais da Europa para os passageiros e para as malas postais da navegação marítima. Era indispensável dar uma boa impressão de conforto e igualmente de grandeza, era assim que se entrava no Portugal do Estado Novo. Porfírio Pardal Monteiro já trabalhara com Almada em dois projetos de tomo: a Igreja de Nossa Senhora de Fátima e a receção do Diário de Notícias, empreitadas hoje tidas como indiscutíveis pegadas do génio de Almada.
O pintor andou por aqui anos e anos, começou obviamente por Alcântara e arquitetou um espetáculo de cor e uma garridice temática que desgostou profundamente a Duarte Pacheco, felizmente que Almada tinha defensores de peso como António Ferro e o próprio Pardal Monteiro. No exterior, temos as linhas puras da Arte Déco, uma sábia entrada de luz e uma conveniente arrumação do espaço, naturalmente que não se suspeitava ao tempo ter ali na vizinhança a ponte sobre o Tejo. Há que recordar ao leitor que aqui se arribou em dia chuviscoso, pretendeu-se circunscrever a visita à gare de Alcântara. Para os interessados, chama-se a atenção que as gares marítimas são visitáveis nos sábados e domingos do último fim de semana de cada mês, com entrada gratuita.
Houve um apelo da memória, daqui se partiu em outubro de 1967 para Ponta Delgada, aqui o Uíge atracou em agosto de 1970, ao tempo o serviço de transporte de militares estava concentrado na Rocha do Conde d’Óbidos. Depois de contemplar o espaço do vestíbulo, hoje praticamente sem vida, sobe-se uma escadaria de linhas equilibradas, com uma bela entrada de luz, é-se rececionado por uma escultura dedicadamente patriótica onde não faltam o escudo com as quinas, e veio espreitar-se o dia brumoso por aquela janela e naquela varanda onde muitas lágrimas se devem ter vertido em dias de partida e aclamado com exclamações ululantes quem regressava para o convívio dos seus.

Ó mar salgado, que desta varanda guardaste a memória de dolorosíssimos acenos das partidas e júbilos de regressos, antes e depois de se erguer aquela ponte.
Aqui se fica em contemplação, atento aos pormenores, a entrada vigorosa da luz não se faz por acaso, o país era muito pobre mas o Estado era rico, havia que mostrar boa pedra marmoreada em todos os andares, em todos os espaços que o visitante trilhasse, como se se procurasse dar a sensação de se entrar numa infraestrutura quase apalaçada.
Outro pormenor que abona o talento do arquiteto, a relação entre o comprimento, largura e altura, a dimensão das portas, o espaço reservado para a pintura mural, as janelas rasgadas, a esplêndida iluminação do teto, é verdadeiramente uma sala de espetáculo, a voz ecoa, são pouquíssimos os visitantes, é uma vibração que enche de vida aquele enorme salão de espera ou boas-vindas e aonde era suposto que Almada Negreiros deixasse o traço resplandecente da grandiosidade do Estado Novo. Mas ele trocou-lhes as voltas, concebeu dois trípticos, um à volta da Nau Catrineta, uma lengalenga que recitávamos na escola e na continuação um mito, D. Fuas Roupinho e o milagre da Nazaré, a Aparição da Virgem, lá no Sítio; o outro fala-nos do Tejo, das embarcações do porto, as lides ribeirinhas e separadamente temos um par amoroso, talvez ele seja marujo e ela peixeira e há para ali uma festa campónia extremamente vistosa. É altura de irmos aos pormenores.
Tudo vai num reboliço a bordo na Nau Catrineta, os marinheiros têm umas solas para comer e há até quem insinue que a primeira vítima de antropofagia seja o capitão, vemo-lo afanoso no cesto da gávea, talvez aquele marinheiro ande à procura de terra à vista, e na vela enfunada vemos o espetro da morte em visita. Mas o mais belo de tudo é o ângulo em que Almada nos põe a ver a Nau Catrineta, de tresvês, como no segundo painel por ali anda a vista abismada por aquele longo mastro, também as velas enfunadas, do lado direito temos umas histórias de encantar, até prelúdios funestos, mas aquele anjo que parece caminhar na linha do painel tudo vai resolver a contento e daí o alvoroço do terceiro painel, as alegrias do reencontro, um esplêndido arraial em que Almada esmiúça os quadros da sociedade, em indumentária moderna. E lá temos o mural isolado com gente da Nazaré, a praia e os barcos e as lides que envolvem homens e mulheres, e milagre dos milagres um D. Fuas Roupinho transmudado em cavaleiro tauromáquico.
No outro tríptico, também de uma beleza extrema, e de um colorido quase efervescente, temos varinas descalças na descarga do carvão, um fabuloso painel com mastros, apetrechos marítimos e barcos, varinas dividindo o peixe e, separadamente, o que se pode chamar piquenique em dia de romaria, manifestamente Almada sentiu-se cativado pelo Tejo e exprimiu o realismo social, como é que aqueles senhores poderosos do Estado Novo não olharam enviesadamente as varinas descalças na descarga do carvão, não seria que o pintor Almada queria desconsiderar o que estava previsto como bonito bilhete-postal?
Perdoe o leitor este gosto pessoal de integrar a pintura de Almada em contexto arquitetónico, enche-me as medidas esta Arte Déco e não quero despedir-me sem pedir a vossa atenção para a natureza desta pintura mural, efetivamente ele trabalhou o fresco sobre a cal, mas introduziu imensos apontamentos pictóricos. Vêem-se para ali umas manchas de humidade, indispensável será o restauro dado que estamos a falar do que há de melhor da pintura portuguesa depois do génio meteórico de Amadeo Souza-Cardoso. E fica prometido um próximo fim do mês se irá visitar a gare da Rocha do Conde d’Óbidos.

(continua)

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Nota do editor

Último poste da série de 27 DE NOVEMBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22755: Os nossos seres, saberes e lazeres (479): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (19) (Mário Beja Santos)

terça-feira, 23 de agosto de 2011

Guiné 63/74 - P8696: O Regresso dos Heróis (Domingos Gonçalves) (6): O desembarque


O Regresso dos Heróis*

Por

Domingos Gonçalves
(Ex-Alf Mil da CCAÇ 1546/BCAÇ 1887)


DEDICATÓRIA
A todos os colegas da CCAÇ 1546 do BCaç 1887



VI - O DESEMBARQUE

Dia 2
Vinte e duas horas e quinze minutos... Lisboa à vista... Ao longe, quase no limiar do horizonte, vislumbram-se já as luzes da cidade, talvez as da zona mais alta. Vista de longe e do mar, a cidade mais parece uma cascata enorme, suspensa no horizonte distante. Hoje, ao longe, a bela cascata aparece diluída por entre uma ténue neblina que transmite às luzes uma beleza especial.

O jantar foi melhorado e houve discursos na sala. Discursos! Esta gente gosta muito de discursos... De abrir a boca... Falar... Falar... E não dizer, em rigor, praticamente nada... Mas isto faz parte da praxe. Uma viagem destas não pode terminar sem que os maiorais botem faladura.

O desembarque será pelas oito horas de amanhã.

Está previsto haver desfile às dez horas. A farda a usar durante o desfile já determinaram que será a seguinte:
- Camisa com manga arregaçada, desabotoada no pescoço, calça verde e botas pretas.

Estes parvos esqueceram-se que estamos no Inverno e que vai fazer muito frio. O tórrido calor da Guiné faz já parte de outro mundo e de outra realidade e o ar condicionado do barco não se pode levar para as margens do Tejo... Mas esta tropa pensa apenas na cerimónia que, se não se fizesse, ninguém se lembraria dela. Eles querem por certo mostrar aos jornalistas o regresso dos heróis... Mas os heróis preferiam que os deixassem em paz, poupando-os pelo menos ao incómodo de os exporem ao frio e à humidade de uma manhã de Fevereiro, aqui nas margens sagradas do Tejo. Continuam a ser burros até ao fim... Isto é incrível!

Vista nocturna da Ponte 25 de Abril, à época, Ponte Salazar
Foto: © Jaime Machado (2008) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados

Dia 3
A alvorada está perto. O barco desliza lentamente Tejo acima... Passou já sob a ponte e prepara-se para atracar.

Os marinheiros efectuaram já as últimas manobras... O barco já se encostou ao cais.

Em terra, uma grande multidão de pessoas aguarda a nossa chegada. Há emoção dentro e fora do barco. É um momento grande e indizível... Todo este ambiente, que aquece um pouco esta manhã fria, tem qualquer coisa de épico! São uns minutos longos estes que antecedem a ordem para desembarcar. Mas são também momentos feitos de grandeza... De tudo isto ninguém se poderá jamais esquecer. Os heróis vão ter uma recepção à altura dos feitos que praticaram...

No edifício da Alfândega agitam-se muitas bandeiras coloridas. Há, também, levantados no ar, cartazes, bastantes cartazes, com o nome das pessoas que estão para desembarcar. Há, também, uma multidão de pessoas que agitam no ar muitos lenços brancos. Dentro e fora do barco, há uma onda de alegria, uma onda enorme, que varre toda a margem do rio. Há uma grande multidão à nossa espera. Somos os heróis que muita gente quer ver chegar. Finalmente somos alguém... Alguém que merece aplausos... Palmas, muitas palmas...

No barco, a tropa está toda nos tombadilhos, do lado do cais. O Quanza está mesmo inclinado para o lado da margem do rio. A rapaziada dá gritos de alegria, de entusiasmo e de paz. Por entre esta neblina matinal, húmida e leve, vai crescendo uma onda de delírio e de festa. O ambiente é mesmo impressionante... Grande... Indizível... É um ambiente festivo, de alegria a transbordar dos corações de toda esta gente, quer dentro, quer fora do barco. Uma grande algazarra ecoa por toda esta zona, não deixando ninguém indiferente.

Já é dia. Nenhuma distância nos separa da muralha do cais.

Porto de Lisboa > Estação Marítima de Alcântara > Momento da atracação do navio

Porto de Lisboa > Placa da Estação Marítima de Alcântara > Multidão aguardando a chegada de Militares, em fundo a Ponte Salazar (hoje 25 de Abril)

Porto de Lisboa > Placa da Estação Marítima de Alcântara > Multidão aguardando a chegada de Militares.
Fotos: © Américo Estorninho (2010). Direitos reservados

Chegou a ordem para abandonar o barco. As bagagens também estão a ser descarregadas.

Finalmente estamos todos em terra.

Em mangas de camisa o pessoal formou para o desfile. Todos tremem de frio... Esta primeira manhã de contacto com o céu do meu país, é uma manhã gélida, repassada de humidade. Mas, que importa? É o último dia do martírio a que fomos submetidos. O último sacrifício que bem podia ser evitado... Para que uns militares de alta patente, dos que enxameiam o Estado Maior, ou os quartéis de Lisboa, ou talvez algum ministro mais madrugador, possam assistir a um desfile, corremos nós o risco de apanhar uma gripe, para a qual a tropa já se está lixando. Mas, para esta gente de cá, o desfile deve ser uma coisa muito importante.

Estes políticos adoram estas cerimónias, o barulho destas fanfarras, todo este aparato, que tem, queira-se ou não, um sabor a nobreza, algo de grande e impressionante. E esta população de Lisboa habituou-se já a estes passa tempos, sem os quais já se não habitua a viver.
Foi sempre assim aqui em Lisboa. São barcos que partem para longe... E são barcos que chegam, também de longe... E é uma população de curiosos para ver quem chega... E de “Velhos do Restelo,” para ver quem parte...

Este frio que estamos a suportar é para eles motivo de prazer... Talvez mesmo de êxtase...
O último sacrifício dos heróis enche-lhes a alma. Quanto maior é o sacrifício de uns, maior é o prazer de outros. Eles olham este desfile quase com delírio.

E tudo acabou...

O pessoal entrou nas viaturas militares e está a caminho da Amadora, onde vai ser desmobilizado. Já passa do meio da tarde... O espólio está feito. Todos entregaram os reles farrapos que já eram as fardas que lhes tinham sido distribuídas, faz já muito tempo, e que o muito uso há muito inutilizou. Mas na tropa ainda se controlam farrapos que não servem para mais nada.

...E cada um para a sua terra, os soldados lá foram partindo... Uns, no meio do afã da entrega do material, nem tiveram tempo para despedidas... Outros, até viajaram no mesmo comboio, para o mesmo destino...

E tudo terminou...

Depois do nosso desembarque vai ter lugar a descarga de tudo quanto é transportado nos porões do navio. Muitas coisas, por certo. E entre tudo o que é transportado como mercadoria devem chegar, ao que se diz, muitas urnas com os restos mortais de soldados mortos, que depois são enviadas para as localidades donde eram naturais, e onde se devem realizar as cerimónias fúnebres. Tudo deve decorrer sem dar nas vistas, como acontece com a generalidade das mercadorias transportadas. Para esses não vai haver a euforia, nem a consagração, nem as ovações a que os vivos tiveram direito. Eles vão fazer a última caminhada em direcção ao esquecimento final. É que para os mortos nada mais pode haver do que o esquecimento... Sim... porque os vivos raras vezes temos memória... E às vezes é mesmo conveniente que a memória não exista...
Quantos não desejarão, enfim, que a memória se apague! (1)

São muitos, pelas aldeias do país, os funerais quase incógnitos e despercebidos, que se vão realizando, em cerimónias simples, com o único ruído causado pelos tiros de pólvora seca, as salvas de tiros que precedem o repouso eterno dos seu restos mortais.
Soldados desconhecidos, heróis de um império agonizante, quem será capaz, amanhã, de os recordar?

Aos mortos da Companhia de Caçadores n.º 1546, que tombaram em condições diversas, por terras da Guiné, fica em homenagem ao seu sacrifício, esta modesta página de um livro, que eles também ajudaram a escrever.
Que tenha Deus em sua glória as suas almas!

E, a partir do Quartel da Amadora, a tribo muito unida que fomos espalhou-se rapidamente, em todas as direcções, num adeus de saudade.
Que não seja uma separação para sempre. De qualquer forma estes momentos foram o fim de uma longa e difícil caminhada que ninguém estará interessado em repetir, mas que também, por certo, ninguém jamais irá esquecer.

E guerra nunca mais. E que reste em nós apenas a memória de tudo quanto foi bom e de tudo quanto foi mau, porque tudo foi vida.

Que fique apenas a amizade construída na alegria e na dor de tantos longos dias que a tornam profunda e inesquecível.
Que ninguém mais esqueça o camarada que caiu a seu lado!
Que ninguém mais esqueça o amigo de todos os dias, junto de quem sofreu e lutou!
Que ninguém mais se esqueça, apesar de terrível, pelas suas lembranças, de uma terra chamada Guiné.

Sim... Porque foi por causa da Guiné que existiu um dia um grupo de homens, a que deram o nome de Companhia de Caçadores n.º 1546!

Se não fosse a Guiné, e a guerra, enquanto conjunto de homens, nunca chegaríamos a existir...
... E sem nós... Sim... Sem nós, Portugal e a própria humanidade, teriam menos história e seriam muito mais pobres! E até as nossas vidas teriam sido outras... Quem sabe... Até mais curtas e penosas...

(1) - Joaquim Vieira, na obra, “Portugal Século XXl,” Crónica Em Imagens, 1960-1970, Ed. Círculo dos Leitores, Pag. 52 e seguintes, num pequeno texto ilustrado com uma série de imagens, refere-se, de forma elucidativa, a este tema.

(FIM)


E não admito haja qualquer musa,
Feita mesmo de Whisky ou de bagaço,
Venha com sua voz de intrusa,
Cantar feitos de quem só foi palhaço.
É isto que em Guidage, agora, se usa,
Pois mais ninguém, aqui, já foi “bibaço.”
Fuzilarei as musas engenhosas,
Que apregoem feitos de outrem, mentirosas.
E vós, bebidas finas, desejadas,
Do meu verso fiéis inspiradoras;
Vós, bebidas santas, abençoadas,
Do patacão desta gente roubadoras,
Hoje, infelizmente, quase esgotadas,
E por quem choramos, belas senhoras.
As mãos possantes daqueles que vos bebem
Na guerra de medo nunca tremem.
E vós, ó bem firmada confiança, (2)
De Guidage perfeita liberdade,
Destruição do turra e sua esperança,
Etérea protecção desta cidade,
E do meu reino feliz segurança,
Grande maravilha desta idade,
Rogai a Deus que nos deixe cá ficar,
Até de todo o Whisky se esgotar.
E vós, ó capitão indesejado,
Das tropas lá de Binta comandante,
Muito temido, sim, mas não amado,
Que desejamos ver sempre distante
Do reino de Guidage tão sagrado.
Ficai por aí, alegre e radiante,
De tantas azelhices praticadas,
E deixai deste reino sossegadas
As tropas e as gentes generosas.
Se não vierdes cá nos chatear,
Com artimanhas tolas e maldosas,
Que sois tão hábil, sempre, a inventar,
As tropas de Guidage, volorosas,
Sempre de vós, senhor, se vão lembrar.
Ficai, senhor, em Binta sossegado,
P’ra serdes neste reino bem lembrado.


(2) Os Pernas D’aço, 3.º Pelotão da Companhia de Caçadores N.º 1546.

Guidage, em Agosto de 1966
____________

Notas de CV:

(*) O Regresso dos Heróis é um livro do nosso camarada Domingos Gonçalves (ex-Alf Mil da CCAÇ 1546/BCAÇ 1887, Nova Lamego, Fá Mandinga e Binta, 1966/68), edição de autor.

Vd. postes da série de:

8 de Agosto de 2011 > Guiné 63/74 - P8648: O Regresso dos Heróis (Domingos Gonçalves) (1): Muitos anos depois

10 de Agosto de 2011 > Guiné 63/74 - P8657: O Regresso dos Heróis (Domingos Gonçalves) (2): Guiné, 1968

13 de Agosto de 2011 > Guiné 63/74 - P8666: O Regresso dos Heróis (Domingos Gonçalves) (3): O último susto

16 de Agosto de 2011 > Guiné 63/74 - P8679: O Regresso dos Heróis (Domingos Gonçalves) (4): O último azar
e
20 de Agosto de 2011 > Guiné 63/74 - P8688: O Regresso dos Heróis (Domingos Gonçalves) (5): A viagem

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Guiné 63/74 - P2044: O cruzeiro das nossas vidas (8): Porto de Lisboa, Cais de Alcântara (Luís Graça)

Lisboa > 9 de Março de 2007 > Adninistração do Porto de Lisboa > Cais de Alcântara > A linha de caminho de ferro que nos levou ao navio (o Niassa, o Uíge, o Alfredo da Silva...) que nos levou à Guiné entre 1963 e 1974...

Lisboa > 9 de Março de 2007 > Administração do Porto de Lisboa > Cais de Alcântara, terminhal de cruzeiros> A linha de caminho de ferro

Lisboa > 9 de Março de 2007 > Cais de Alcântara> Locomotiva da CP.

Lisboa > 9 de Março de 2007 > Administração do Porto de Lisboa (que comemora 100 anos da sua fundação) > Gare Marítima de Alcântara.

Lisboa > 9 de Março de 2007 > O Porto de Lisboa. Cais de Alcântara.

Lisboa > 9 dce Março de 2007 > Doca de Alcântara > A ponte 25 de Abril reflectida num dos modernos edifícios de vidro da APL.


Lisboa > 9 de Março de 2007 > O Monumento ao Cristo-Rei, em Almada, na outra margem do Rio Tejo. a margem sul.

Lisboa > 9 de Março de 2007 > Porto de Lisbo > Cais de Alcântara, com o Monumento ao Cristo-Rei ao fundo.

Lisboa > 9 de Março de 2007 > A Ponte 25 de Abril vista do Jardim defronte ao Palácio das Necessidades.

Texto de L.G. (em férias):


Foi daqui que todos partimos (1, 2). Todos ou quase todos (os das ilhas adjacentes, partiam do Funchal ou de Ponta Delgad). Vocês ainda se lembram ? A Administração do Porto de Lisboa comemora 100 anos. No vídeo (promocional) O Porto de Lisboa há uma escassa referência ao passado. Mas não se pode ignorar ou escamotear os anos de brasa da guerra colonial... Há uma odisseia, há quase um milhão de homens a partir e a chegar. E depois de 1974, há mais meio milhão de homens, mulheres e crianças que retorna de África, com os seus parcos haveres. Por ar e por mar. Uma formidável muralha de contentores irá separar Lisboa e o Tejo, irá cortar o contacto visual dos lisboetas com o seu rio... Passei há tempos por lá... Muita coisa mudou... O edifício, arquitectura do Estado Novo, é o mesmo... As infraestruturas portárias e toda a envolvente é que mudaram... Hoje é um pomposo terminal de cruzeiros de luxo, por onde passam os maiores navios do mundo, como o Queen Mary II... Sntimentos contraditórios assaltam-nos quando voltamos ao passado...Enfim, façam os vossos comentários. L.G.

Fotos e legendas: © Luís Graça (2007). Direitos reservados.
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Notas de L.G.:

(1) Vd. último post desta série:

3 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2025: O cruzeiro das nossas vidas (7): Viagem até Bolama com direito a escalas em Leixões, Mindelo e Praia (Henrique Matos)

(2) 13 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1366: A galeria dos meus heróis (6): Por este rio acima, com o Bolha d'Água, o Furriel Enfermeiro Martins (Luís Graça)