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quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Guiné 63/74 - P10480: In Memoriam (128): Laranjinha, Oliveira, Barreto, Monteiro e Soares, da CCS/BCAÇ 2912, vítimas de um manuscrito no dia 01OUT71 em Duas Fontes (António Tavares)

Manuscrito


1. Mensagem de António Tavares (ex-Fur Mil da CCS/BCAÇ 2912, Galomaro, 1970/72), com data de 1 de Outubro de 2012:


PATRULHAMENTO AUTO POR TODAS AS A/D DA CCS/BCAÇ 2912 

O original deste “manuscrito” tem 41 anos.

Manuscrito que nada tem a ver com uma obra escrita à mão mas um assassinato escrito à mão.

Manuscrito que traduz uma das ordens dadas (1970/72) nas matas do leste do CTIGuiné.
Poderes incompetentes! Poder que receberam e foram ensinados, na Academia Militar, para praticá-lo bem.

Manuscrito que levou ao encontro da morte cinco jovens emboscados em Duas Fontes/Bangacia na noite de 01 de Outubro de 1971.

Manuscrito que no Hospital Militar 241 (Bissau) originou mais mortes dos quatro feridos graves evacuados na manhã de 02 de Outubro.

Manuscrito igual a outros anteriores em que só mudavam os nomes.

Manuscritos que levaram diariamente militares (só Praças e Furriéis) em patrulhamentos (nocturnos) auto às tabancas em A/D da CCS e no regresso traziam informações.

Recordo que certa noite numa das tabancas em A/D sentíamos e ouvíamos os rebentamentos e o Homem Grande da tabanca dizia-me:
- Vai embora… vai embora…

Chegados ao quartel confirmamos que tinha havido um ataque na ZA de Nova Lamego.

Manuscrito escrito antes ou depois de ter havido informações de que havia vestígios que o IN andava na zona de acção das nossas tropas nesse dia 01 de Outubro. Movimentação de indígenas (POP e Milícia) foram vistos dentro do quartel antes da partida da coluna auto.

Coluna auto pronta a partir (20h00) e retardada para integração do Capitão. Elemento que foi o último a subir para um dos Unimogs mas o primeiro a chegar ao quartel depois de ter ouvido o tiro (IN) de sinal de que as NT estavam debaixo da área de fogo do PAIGC. Estes (posicionados) só tiveram de aguardar as viaturas e fazer fogo, felizmente atabalhoado para as NT. Caso contrário o número de mortos seria maior.

O Oficial, a chorar e desarmado, chega ao quartel com a justificação de que vinha pedir auxílio. Entretanto (no local) os guerrilheiros do PAIGC matavam, feriam e tentavam levar um prisioneiro. Prisioneiro que foi arrastado e uns metros à frente morto (à queima-roupa) e encostado a um poilão. Sentado com as pernas e braços cruzados e uma bala na boca (a fazer de cigarro) assim o encontraram.

Tudo testemunhado e narrado por quem viu nas Duas Fontes/Bangacia e confirmado no quartel pelos camaradas que trataram dos corpos.

Manuscrito que marcou tragicamente a família do BCaç 2912 e a história da Guerra Colonial.
Manuscrito inserido na página 39 do Livro: “Guineíadas - Memórias de uma Comissão – BCaç 2912 CCS – X Encontro - Tavira”.

Os corpos de:

Alfredo Tomás LARANJINHA,
José Peralta OLIVEIRA,
Leonel José Conceição BARRETO,
José Guedes MONTEIRO e
Rogério António SOARES

depois de recolhidos em Duas Fontes/Bangacia e arranjados em Galomaro seguiram (coluna auto) para Bambandinca e acompanhados (por um camarada da CCS) até Bissau onde embarcaram no “Carvalho de Araújo” até Lisboa.  O mesmo “Carvalho Araújo” que os havia transportado há dezassete meses e uns dias ao chão do Teatro de Operações da Guiné

Foram sepultados nas suas terras. Paz às suas almas!

António Tavares
Foz do Douro, 01 Outubro 2012

OBS:
- Título do poste da responsabilidade do editor
- Uma chamada de atenção para o camarada António Tavares porque a sua caixa de correio devolve sistematicamente as nossas mensagens.
____________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 1 de Outubro de 2012 > Guiné 63/74 - P10464: In Memoriam (127): António Martins, ex-1.º Cabo Enf.º da CCAÇ 675 - Presente (José Eduardo Oliveira)

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Guiné 63/74 - P4618: Estórias de Mansambo II (Torcato Mendonça, CART 2339) (9): Cansamba, subsector de Galomaro, 1 de Agosto de 1969

Guiné > Zona leste > Galomaro > 2º Gr Comb da CART 2339 (Julho/Agosto de 1969) > Fotos Falantes I (10, 11, 12) > Aspectos da vida do 2º Gr Comb, destacado em Julho/Agosto de 1969, para o reforço do subsector de Galomaro, incluindo a tabanca em autodefesa de Cansamba.


Fotos: © Torcato Mendonça (2009). Direitos reservados.




Estórias de Mansambo II > CANSAMBA I - O 1º de AGOSTO
por Torcato Mendonça (*)


Fotos Falantes I (10, 11, 12)


No dia 1 de Agosto de 69, fomos destacados para a Tabanca em autodefesa, de Cansamba [ subsector de Galomaro]. Mas como e porquê?

Façamos uma breve introdução.

A meio de Julho, dia 13, saímos de Candamã e Afia (**), tabancas em autodefesa, depois de uma estadia de um mês, e regressámos a Mansambo. Pouco descansámos, pois, dia 16 partimos em diligência para Galomaro em reforço da CCaç 2405 e do COP7.

Ficámos então dependentes da 2405, cerca de vinte e cinco militares do 2º Grupo e três ou quatro picadores. Trinta militares ou trinta e dois no total [vd. fotos].

Logo, no dia seguinte ou no outro, assistimos a uma operação, helitransportada, dos pára-quedistas. Efectivamente, era outra tropa. O treino, os meios, a autoconfiança. Isso e muito mais faziam a diferença.

Cerca de meia hora depois, da primeira saída dos helis com tropas já, no regresso, traziam material apreendido. Até uma gazela que o IN estava a esfolar veio... Assim valia a pena. Tinham, em comum connosco o sermos feitos da mesma massa. Óptimos militares a merecerem o meu respeito. Pena nós não termos mais meios. Mesmo com o pouco íamos cumprindo. Curiosamente cumprimos e detesto o termo – tropa macaca – porque não nos sentíamos diferentes dos que eram apelidados de bons… E gostávamos de certas operações. Vidas!

O IN estava muito activo na zona, quer a Sul/Sudeste de Galomaro quer, mais longe, para oeste, à volta de Mansambo. Atacou várias vezes Mansambo, Candamã e Afiá e, naquela zona, atacou Cansamba, onde estava um Grupo, creio que de uma Companhia de periquitos e Madina Xaquili.

Tínhamos acompanhado a Companhia que para lá foi, em 22 de Julho [de 1969], para trazer as viaturas para Galomaro. Não gostámos daquela Tabanca… já tínhamos mais de dois terços de comissão e o cheiro da mata era sentido de forma mais forte. Creio que antes do regresso, o dissemos a um alferes ou furriel, T-shirt de Operações Especiais, a memória pode falhar. Certo é que o IN foi lá experimentar… hoje, tanto tempo depois, parece-me ter sido a CCaç 12.

O IN, com os corredores abertos, mostrava-se com certo à vontade. Na margem esquerda do Corubal (zona leste) onde não haviam aquartelamentos nossos. Na margem direita, vendo a Carta da Guiné, sabendo as nossas posições, é fácil compreender a progressão das forças do PAIGC, aproveitando a época das chuvas. E não só, não só…

No primeiro dia de Agosto, fomos mandados para Cansamba a substituir o Grupo que lá estava. Saíram de lá felizes, os piras.

Antes trocámos breves palavras, recebemos algum material e eles foram-se. A partir daí era connosco. Vimos que era forçoso haver mudanças rápidas. Era uma Tabanca enorme. A cerca de quinhentos metros estava uma outra pequena. A razão era que esta era habitada por futa-fulas. A grande tinha uma mesquita, simples ou humilde, e uma escola (madrassa). Era uma povoação com alguma importância, resultado da junção de várias tabancas.

Assim, demos início ao trabalho.

Os Furriéis (só dois, o Rei e o Sérgio) deram uma volta, falaram com a população, viram as defesas e o que observaram não os agradou. Eu via o material que tínhamos, esperava pelo regresso dos africanos que iam connosco, a passear pela tabanca na obtenção de informações e ia tomando apontamentos.

Depois todos juntos, estudámos rapidamente os elementos que dispúnhamos e estabelecemos uma estratégia. Para o imediato tínhamos que falar com o Chefe de Tabanca, ver o armamento que estava distribuído à população, organizar minimamente a defesa. Na segunda fase, para os dias seguintes, teriam que ser abertas mais valas, colocado mais arame farpado, organizada a defesa e tentar modificar aquilo. Assim, como estava, era um perigo. Num ataque forte entravam por ali adentro com facilidade.

Mandámos chamar o Chefe. Estranhámos a sua ausência e mais estranhámos a sua demora. Estávamos na zona das suas moranças e ele devia já ter aparecido. Demorou. Demorou tempo demais. Quando chegou vimos estar em presença de um homem que nos ia dar problemas. Talvez por isso a alegria da saída do Grupo de periquitos.

Para grandes males grandes remédios. Tivemos que lhe dizer que, a partir daquele momento quem mandava éramos nós. Compreendeu à segunda. Como? Bem… certamente porque não era parvo. Viria a ser, no futuro, um óptimo colaborador. Após ter compreendido porque estávamos ali, respondeu ao nosso primeiro pedido e rapidamente reuniu todos os homens com armas distribuídas. Era uma loucura ver tanta gente com Mausers, G3, dilagramas e muitas munições. Um bando. Nós, à volta de trinta…

Falamos àquele exército, o chefe traduzia e os picadores (milícias) confirmavam com sinais, olhares... nós percebíamos. A linguagem gestual ou por olhares é óptima…

A noite aproximava-se. Mandámos toda a gente em paz e já não fomos à tabanca dos futa-fulas.

Achámos melhor dividirmo-nos em três grupos, separados a uma distância prudente, com possibilidades de entreajuda. Tínhamos bolsa de enfermeiro mas não tínhamos enfermeiro. Tínhamos operador de rádio mas sem aparelho. Claro que estávamos desfalcados, os meios eram os possíveis. Assim se fazia a nossa guerra. A falta de meios, a normalidade.

O Chefe ficava a dormir na sua morança (escolha dele, claro…) mas eu dormia lá também. Cá fora, no telheiro, dois homens, a revezarem-se. As sentinelas eram feitas pelos três grupos, aos pares. De preferência um picador e um soldado. Claro que os turnos cabiam a todos.

Comemos, arrumámos o material, montámos uma precária defesa e preparámos o descanso. De repente uma saída e começou o ataque. Vinham dar as boas vindas. As ordens eram responder o mais forte possível. Alguém já tinha montado a nossa pesada. Ou seja, um bidão aberto totalmente num lado e só metade no outro. Lá dentro uma simples G3 em rajadas curtas, mas a fazer um barulho dos diabos. Estava lá um 82, do IN, que funcionava com as nossas munições e as deles. Nessa noite foi a triplicar.

Mas o pior não foi o inimigo. O pior foi a população. Vinham á porta das moranças e disparavam as Mauser ou as G3. Gritávamos para virem para as valas, mas nada. Pedíamos ao Chefe, que estava ao nosso lado, entre dois militares, para mandar parar o fogo da população. Nada. Nós, no meio, à frente os inimigos, logo atrás os amigos, posição óptima.

Dois ou três militares levantaram o Chefe acima da vala e então, como estivesse a ser capado, berrou e bem. Calaram-se os amigos e pouco depois os inimigos, talvez a esperar melhor ocasião, fizeram o mesmo. Estavam dadas as boas vindas ou feito o teste aos recém-chegados. Por isso, logo no dia da chegada fomos recebidos assim. O nosso 1º de Agosto.

Um morto da população e um ferido. Disparar dilagramas com bala real era terrível. No outro dia começou a instrução, para a não repetição de situações daquelas e melhorar o uso e conservação do armamento. Além disso começámos a estudar onde e como abrir valas e abrigos. Antes visitámos a Tabanca dos Futa-Fulas. Tinham falta de munições e de outras coisas. Parece que tinham estado em Madina do Boé e vindo para a zona após a evacuação do aquartelamento. Gente habituada aos tiros. Se necessário podia contar com eles na protecção de um flanco. Assunto a ser tratado posteriormente.

Recebemos a meio da manhã a visita do Comandante do COP 7, creio que um Major Pára-quedista, porque em Galomaro ouviram o ataque. Não tinhamos rádio. Pusemo-lo ao corrente da situação e fizemos os pedidos de material.

Estivemos até ao dia quinze em Cansamba. Foram quinze dias óptimos. O apoio da 2405 foi excelente. Em Cansamba tivemos ocasião de contactar com a população, falar com Homem grande que ensinava árabe e o Corão aos miúdos. Era homem de grande sabedoria, talvez um marabú. Tive oportunidade e tempo, de falar com ele e assim aprender a compreender melhor aquele Povo e a sua religião. Eu tinha (tenho) o meu nome tatuado, em árabe, no braço esquerdo e sabia fazer as saudações ou cumprimentos. Isso fez com que a aproximação fosse mais fácil. Interrompida, infelizmente, porque estive dois ou três dias fora, em Galomaro, a curar o meu quinto ou sexto ataque de paludismo. Regressei e notei as benfeitorias.

Reforçou-se a auto defesa, a população teve melhor instrução militar, impedimos que a Administração, através de um Cipaio que por lá apareceu (em Galomaro estava um Chefe de Posto), interferisse com a população… perceberam… e foram-se. Certamente causava-lhes prejuízo a população não pagar o imposto!

Quase nos considerávamos em férias. Recebemos nova ordem: apresentar em Bambadinca no Batalhão. Assim foi. Reunião e saída para Candamã.

Missão: procurar onde era o acampamento do Bi-Grupo, reforçado com artilharia que tinha feito tantos ataques na zona em tão pouco tempo. O Comandante, Mamadu Indjai. Descobrimos a acampamento, os Paras destruíram-no e militares da 2339 (3º Grupo) emboscaram-nos fazendo dois ou três mortos e vários feridos, entre eles o Mamadu Indjai.

O Coronel Hélio Felgas não teve razão com a ameaça – só saiem de lá depois de os encontrar… Enganou-se. Pena foi ter-se acabado Galomaro e o sossego de Cansamba. Um mês bem passado, metade em Galomaro, a outra em Camsamba.

Até ao fim da comissão foi sempre a andar…

[Continua]

_____________

Nota de L.G.:

(*) Vd. postes anteriores desta série:

29 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4435: Estórias de Mansambo II (Torcato Mendonça, CART 2339) (7): Bissau, a caminho de Fá

4 de Junho de 2009 Guiné 63/74 - P4459: Estórias de Mansambo II (Torcato Mendonça, CART 2339) (8): Mussá Ieró, tabanca fula em autodefesa, destruída em 24/11/68

(**) Vd. poste de 11 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1167: Fotos falantes (Torcato Mendonça, CART 2339) (4): Candamã, uma tabanca em autodefesa

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Guiné 63/74 - P3162: Estórias do Juvenal Amado (15): Adeus, até ao meu regresso

1. Mensagem de Juvenal Amado, ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, (Galomaro, 1972/74), com data de 21 de Agosto de 2008, com mais uma das suas estórias (*), desta feita, com uma pequena ficção que ilustra a mágoa de quantos, já casados e com filhos, tudo deixaram para combater numa guerra que se travava naquelas longínquas e desconhecidas terras de África.

Caros camaradas Carlos, Virgílio, Luís Graça e restante Tabanca

Cá vai mais uma pequena estória, embora uma ficção, que se repetiu vezes sem conta ao longo dos anos de Guerra.

Como digo na introdução, ela surge da correspondência mantida com o nosso camarada Vasco Joaquim (**).

Ele pertenceu ao BCAÇ 2912 que nós fomos render. Algumas das fotos para além de ilustrarem a estória, servem também de documento histórico, onde são mensionados os nomes dos camaradas que morreram nas Duas Fontes, em 1 de Outubro de 1971.

Deixo ao teu critério as fotos que entenderes usar.

Um abraço a todos os camaradas que já eram casados ou não
Juvenal Amado



2. Introdução

Casado desde os vinte anos, ela com dezoito e após 40 anos de matrimónio, já com cinco filhos, a forma que ele fala do grande sofrimento que foi a separação durante os anos que esteve na Guiné, mais precisamente em Galomaro, (BCAÇ 2912 de 1970 a 1972), é elucidativa do drama que o atingiu com a separação.

Também me levou a recordar uma situação passada com o meu camarada Lourenço Periquito, que também já era casado e tinha um filho quando embarcou para a Guiné.

O Lourenço todos os dias escrevia e recebia carta da mulher. A dada altura essa corrente de escrita quebrou-se, pois o nosso camarada deixou de receber as cartas da esposa. O nosso camarada estranhou, mas lá ficou esperando sem dizer nada a ninguém.

Os dias e as semanas foram passando, o correio não chegava. O desespero levou a umas cervejas a mais, o nosso camarada soltou o seu drama dando largas à sua dor.

Falou-se com o Comandante e a partir daí, logo ele recebeu noticias de casa. Também a esposa estava aflita, pois não sabia como contactar o marido. (Telemóveis vieram muitos anos depois).

O incidente foi motivado pelo carteiro que fazia aquela zona ter ido de férias e o que o substituiu, nunca ter levantado o correio da caixa que ficava no pequeno povoado.

O Lourenço recebeu de uma só vez a correspondência de quase um mês, e era vê-lo devorar as cartas com a felicidade estampada no rosto.

Embora esta estória tenha sido gerada pelo testemunho do nosso camarada Vasco, que confidenciou que tanto ele como a esposa, numeravam os aerogramas para terem a certeza que não perdiam nenhum, é intenção minha dedicá-la a todos os que viveram situações semelhantes.

Os dois casos têm final feliz.

Fotografia de casamento do nosso camarada Vasco Joaquim, mas que podia ser de qualquer um dos muitos militares que deixaram as suas esposas para ir combater.
Foto: © Vasco Joaquim (2008). Direitos reservados.


3. Adeus até ao regresso
Mais uma estória de amor

Olho os teus cabelos espalhados na almofada.

Nunca te disse quanto te amo. Na penumbra, o meu olhar desce pela curva do pescoço, ombros até ao arredondado dos seios. Finalmente adormeceste, após a longa vigília que prolongou o amor feito de desespero e ansiedade, pela partida próxima.

O teu corpo nú, encostado ao meu, tão perto da despedida. Acaricio-te a pele macia, mexes-te ligeiramente sem acordar.

Volto a olhar a curva do teu rosto sereno, de vez em quando atravessado por um leve franzir, como se uma preocupação teimasse em não desaparecer.

Algumas horas nos separaram dos dois anos em que possivelmente nunca nos veremos.

Antevejo a dolorosa despedida, não com um até já ou um até logo, mas sim com um até qualquer dia.

Acordo-te suavemente. Abres os olhos e sorris, mas logo o sorriso é substituído pelo pânico:

- Já está na hora? - Perguntas aflita.

- Sim tenho que me preparar, não posso perder o comboio - respondo.

Tinha sido um acto de loucura termo-nos casado antes de eu ter sido mobilizado. Nem casa tínhamos, por isso o termos ficado em casa dos meus pais, ocupando o meu quarto de solteiro, rodeados dos meus livros e discos.

Depois da minha partida, voltará para casa dos pais dela, onde se sentirá mais apoiada.

São tempos conturbados estes. O nosso horizonte é limitado pelo o fantasma da guerra.

Aquele trocar de olhares no baile, o convite mudo para dançar, fez-me ficar preso à tua juventude e guardá-la para mim, nesse momento único.

Beijámo-nos sem parar. Os lábios sabem a sal.

- Vou-te escrever todos os dias.

Os sacos pesam como chumbo, ou se calhar são os meus braços que os não aguentam. A despedida é mais violenta que eu alguma vez imaginei.

- Não chores. Não quero guardar de ti esta ultima imagem.

- Todos os dias quero receber carta tua e eu todos os dias te respondo. Prometes?

- Prometo - respondo, não conseguindo afastar-me daquele abraço.

Fica à porta, parece mais pequena. Está frio, mas não parece dar por ele.

Terei esta imagem dela no combóio, nas árvores, nos rios, nas núvens e nos momentos de solidão.

Desejarei tê-la comigo ao deitar e ao acordar. A saudade vai-me perseguir cada dia e cada hora até ao intolerável.

O navio já está à espera nos Cais. O Tejo está cinzento e um manto de neblina paira sobre ele.

A cidade dorme.

Não avisei do dia do embarque. Não seria capaz de suportar outra despedida.

Entro para o barco, estou cheio de frio, não tem conta os cigarros que acendi. Olho para o Cais. Há muitos familiares dos meus camaradas. Foram mais corajosos do que eu.

O barco parece estar inclinado, pois todos nos agrupamos do lado do Cais. Ouvem-se as sirenes e aqueles cabos que ainda nos ligavam a terra já estão soltos. Os gritos e os assobios dos meus camaradas enganam a angustia.

Muitos dos pais vieram a Lisboa pela primeira vez. Uma ocasião para ser recordada pela tristeza.

Vejo o teu rosto em todas as jovens que se despedem com lenços a acenar.

Também eu aceno, despeço-me de ti em todas elas.

- Adeus até ao meu regresso meu amor

Juvenal Amado
_____________

Notas de CV:

(*) - Vd. último poste da série de 10 de Agosto de 2008 > Guiné 63/74 - P3126: Estórias do Juvenal Amado (14): Morteiro no meio da Parada de Cancolim

(**) - Vd. poste de 9 de Agosto de 2008 > Guiné 63/74 - P3124: O Nosso Livro de Visitas (23): Vasco Joaquim, 1.º Cabo Escriturário da CCS/BCAÇ 2912 (Juvenal Amado/Carlos Vinhal)

sábado, 9 de agosto de 2008

Guiné 63/74 - P3124: O Nosso Livro de Visitas (23): Vasco Joaquim, 1.º Cabo Escriturário da CCS/BCAÇ 2912 (Juvenal Amado/Carlos Vinhal)

1. Mensagem de Juvenal Amado com data de 1 de Agosto de 2008:

Caros camaradas Carlos Luis Virgilio e restante Tabanca.
Recebi este e-mail deste camarada que me deixou muito feliz, como é de prever.

Ele pede-me contactos de malta do BCAÇ 2912, eu penso que nada melhor que o blogue para os encontrar.

Um abraço para todos
Juvenal Amado


2. Mensagem de Vasco Joaquim de 31 Julho de 2008, dirigida a Juvenal Amado e reenviada por este nosso camarada ao Blogue:

Caro amigo Amado,
Permite que te trate por tú, pois fomos companheiros de armas, ou antes... tive o privilégio de ser substituído por alguém que preencheu uma vaga no mato, para que eu regressase à Metrópole. Pois bem, certamente que contactámos naquele espaço de tempo em que a CCS do 3872 rendeu a CCS do 2912 sita em Galomaro, já lá vão 36 anos.

Eu era na altura o 1.º Cabo Escriturário, Vasco de Jesus Joaquim com o NM 08190469, fazendo parte do BCAÇ 2912, formado em Abrantes (RI2), IAO em Santa Margarida e embarcado para a Guiné em 24 de Abril de 1970, no célebre "iate" CARVALHO ARAÚJO.

Ao analisar a tua corrida pelos locais que percorreste pelas terras da Guiné, dos quais a maioria conheço, agradeço o facto de me teres recordado através das fotos os locais por onde passei, tantas e tantas horas de solidão e saudade (pois na altura já era casado).
Reconheci o Restaurante Morte Lenta, os abrigos, a metralhadora destruída que infelizmente estava ao meu cuidado (embora fosse Amanuense), o morteiro 81 onde também tive instrução, o "Estádio", onde tantas caneladas apanhei, pois jogava pelos Sapadores.
A Cantina, onde tantas "81 e 60" emborcava... enfim o local que me servia de trabalho, pois era eu que fazia a Ordem de Serviço do Batalhão. Bons tempos.

Tristezas? Algumas.
Mortos em emboscada nas Duas Fontes (1) às 3 da madrugada, o Mecânico Auto Laranjina, o Sapador Barreto, o homem do rádio, Oliveira, e mais dois camaradas adidos, o Bolinhas e o Monteiro, bem como o meu amigo Milícia, Iderissa Candé.


Enfim... recordações que só são avaliadas por aqueles que palmilharam por aqueles locais.

Quanto aos castigos, eu também tive alguns (56 reforços à "benfica") e não sei quantas patrulhas nocturnas - e tudo por faltar às formaturas da refeição - e o capitão que era alentejano - que não me gramava, aplicava-me logo o "código ", só que quanto aos "reforços" fazia alguns porque o camarada Escriturário que fazia a Escala retirava alguns, pois dormiamos no mesmo abrigo.

Gostei de ver a foto do Filipe com a lavadeira, que também "era a minha", suponho que era fula ou balanta e que se chamava Binta?... não tenho a certeza... mas que me levava 50 pesos por mês lembro-me muito bem.

Quanto ao "Regala", conheci-o bem. Até lhe dediquei uns versos numa prosa que fiz do qual me recordo este:

Junto da nossa unidade
O Regala bem regalado
Pois não tem piedade
De tão caro vender ao soldado

A foto do Filipe com Esofe está boa. Gostei. Eu também tenho com ele, pois ele era funcionário do Regala e servia no bar/restaurante que eles tinham lá em baixo ao fundo.

Pois meu amigo, daqui a uns tempitos já cá não anda ninguém, daqueles que deram o coiro em terras desconhecidas para nós, mas que tivemos orgulho em cumprir a nossa missão.

Eu pelo meu lado, já estou reformado, traballhei na CP, como Chefe de Estação durante 32 anos, findos os quais me reformei aos 55 anos (já lá vão quase 5). Resido em Ovar onde trabalhei imensos anos, embora a minha naturalidade seja perto de Lamego.

Pronto meu amigo e camarada, obrigado por teres despertado em mim um pouco daquilo que eu já julgava ter esquecido, mas que num instante recordei com saudade, ao ponto de dizer aos meus filhos já casados:

-Olha por aqui andei eu.

Bem hajas e obrigado.
Um grande abraço e manda notícias.
PS. Se souberes de algum endereço da CCS do BCAÇ 2912, agradeço.



3. Mensagem enviada ao Vasco Joaquim em 8 de Agosto de 2008, com conhecimento a Juvenal Amado:

Caro Vasco Joaquim
O nosso camarada Juvenal Amado, elemento activo do nosso Blogue para o qual ficas desde já convidado a aderir, reenviou-nos a tua mensagem.

Sobre a CCS do BCAÇ 2912, à qual pertencias, não temos nada, mas temos alguns tertulianos das outras Companhias do teu Batalhão. Por exemplo o Fernando Barata da 2700, Tony Tavares e Manuel Melo da 2701.

No nosso Blogue podes encontrar muito sobre o teu Batalhão, basta escreveres na janela de pesquisa bcaç 2912 e aparecerá muita coisa para leres.

Entretanto fui à Página do nosso camarada Jorge Santos e no seu Ponto de Encontro encontrei camaradas teus a pedir contactos. São eles:

da CCAÇ 2699 - Adelino Fernandes (*)
da 2700 - Timóteo (*)
da 2701 - Manuel Melo, Tony Tavares e Lourenço (*)

Ficamos à espera de notícias tuas sobre os contactos que possas vir a concretizar.

Um abraço do camarada
Carlos Vinhal
Co-editor do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné

(*) - Retirados, na edição, os números de telefone e endereços
_____________

Notas de CV:

(1) - Vd. poste de 12 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2529: PAIGC: Emboscada a forças do BCAÇ 2912, na estrada Galomaro-Bangacia (Duas Fontes), em 1 de Outubro de 1970 (Luís Graça)

(2) - Vd. postes sobre BCAÇ 2912 de:

4 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1494: Tertúlia: Apresenta-se o ex-Alf Mil Fernando Barata, CCAÇ 2700 / BCAÇ 2912

22 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1541: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (1): Introdução: a 'nossa Guiné'

26 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1550: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (2): A nossa gente

15 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1595: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (3): minas, tornados, emboscadas, flagelações e acção... psicossocial

11 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1651: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (4): Historietas

30 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1795: Convívios (12): 16.º Encontro da CCAÇ 2700 / BCAÇ 2912 (Dulombi, 1970/72), Braga, 10 de Junho de 2007 (Fernando Barata)

Guiné 63/74 - P1796: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (5): A(s) alegria(s) do(s) reencontro(s)

12 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2260: Álbum das Glórias (33): Inauguração da exposição de fotografia do Américo Estanqueiro, hoje, na Fundação Mário Soares

10 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2743: Convívios (50): Convívio da CCAÇ 2700/BCAÇ 2912, em Fátima, no dia 26 de Abril de 2008 (Fernando Barata)

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Guiné 63/74 - P2529: PAIGC: Emboscada a forças do BCAÇ 2912, na estrada Galomaro-Bangacia (Duas Fontes), em 1 de Outubro de 1970 (Luís Graça)

Guiné > Zona Leste > Sector L5 > Galomaro > Dulombi > CCAÇ 2700 / BCAÇ 2912 (1970/72) > Em 1 de Outubro de 1970, duas secções da CCS do BCAÇ 2912, sediado em Bafatá, reforçadas por uma secção da CCAÇ 2700, sofreram uma violenta emboscada, na estrada Galomaro-Duas Fontes (Bangacia), de que resultaram 5 mortos, dos quais dois eram da CCAÇ 2700: Sold José Guedes Monteiro, natural de Marco de Canaveses, e 1º Cabo Rogério António Soares, natural de Nelas. Na foto, alinham-se os caixões que hão-de levar os restos mortais das vítimas...

Ficaram ecos desta terrível emboscada na memória dos vindouros. Leia-se por exemplo este excerto de um recente poste do nosso camarada Juvenal Amado (CCS/BCAÇ 3873, Galomaro, 1972/74)

"Duas Fontes: local onde abastecíamos de água perto de Bangacia. Era um local que inspirava confiança, mas não podemos esquecer que essa mesma confiança custou a vida a seis camaradas do Batalhão antigo [, BCAÇ 2912, 1970/72,]que ali foram emboscados.

Bangacia foi também destruída por um ataque durante a nossa comissão. Nós reconstruímos a povoação com ordenamento tipo Baixa Pombalina, com escola, posto médico e o PAIGC nunca mais atacou. Deve ter considerado que era uma coisa boa a manter para quando a paz chegasse. E tinham toda a razão".


Foto do álbum de fotografias do Américo Estanqueiro, com a devida vénia ao autor e à editora, a Fundação Mário Soares (*).

Fonte: Américo Estanqueiro (2007) / Fundação Mário Soares

Guiné > PAIGC > Comando da Frente Bafatá > Gabu Sul > 1971 > Comunicado, assinado por Constantino dos Santos Teixeira (Tchutchu), sobre os resultados da emboscada montada pela guerrailha a forças do BCAÇ 2912, na estrada Galomaro - Bangacia (ou Duas Fontes), em 1 de Outubro de 1971.

Cópia de documento do Arquivo de Amílcar Cabral / Fundação Mário Soares, reproduzido, na página 67, no catálogo da exposição de fotografia do Américo Estanqueiro (*). É um notável documento, objectivo, sucinto, escrito em português (quase perfeito), e revelador dos valores, da organização e da disciplina (revolucionária) dos combatentes do PAIGC...

Reprodução do documento (LG):

Comando Frente Bafatá. Gabu Sul, 7/10/71

Comunicado

Dia 10/1/71, os nossos combatentes numa emboscada feita na estrada Galomaro-Bangacia conseguiram destruiram dois camiões militar[es], maioria dos ocupantes liquidados; deixaram no terreno 6 mortos confirmado[s] pelo nosso c/ [camarada ou comandante ?], e apanharam 5 espingardas G-3 e alguns carregadores da mesma arma, e apanharam 2 relógios, (302$50) trezentos e dois escudos e cinquenta centavos e nove (9) vacas onde mandaram 5 para Quembera [ou Kambera] **, e ficaram com 4 no interior do país.

O c/ [comarada ou comandante ?] Paulo Maló (***) mandou-me dizer para pedir à direcção do Partido, para que o c/ [camarada ou comandante ?], M’ Font Tchuda (?) N’ Lona estava sem relógio[;], resolveram deixá-lo com um dos dois relógios apanhados durante a acção. Também trouxeram um prisioneiro, ele encontra-se con[n]osco.

Durante a operação tivemos dois feridos não grave[s], são eles Canseira Sambu, N’ Dankena (?) N’Hada.

Segue[m] com o portador as 5 espingradas G-3 apanhadas ao inimigo, e os outros objectos.

Saudações combativa[s].

Constantino dos Santos Teixeira (Tchutchu)



Guiné > PAIGC > Fevereiro de 1968 > Constantino dos Santos Teixeira, Tchutchu, um comandante que se distinguiu na Frente Sul, mas que em finais de 1971 liderava a Frente Bafatá / Gabu Sul. Foto: John Sheppard & Granada TV, in Liberation of Guine, Basil Davidson. Acedido em: A Brief History of PAIGC (com a devida vénia...). Foi primeiro ministro (ou ministro, não sei ao certo) da nova república, por um curto período de três meses, em 1978. (LG)

Guiné > Bissau > 1960 > "O 1º Curso de Sargentos Milicianos foi uma alfobre de quadros para o PAIGC... Alguns dos outros [, além do Domingos Ramos, ] que foram meus camaradas na recruta. De poucos nomes me recordo mas muitos também foram guerrilheiros. Dos dois que estão mais altos, o da direita é o Constantino [dos Santos] Teixeira, mais conhecido por Chucho [ou Tchutchu] ou Axon, que foi igualmente figura importante do PAIGC. Chegou a ser ministro da segurança interna, salvo erro, no tempo imediatamente a seguir à independência. Apareceu, algum tempo depois, morto dentro do carro numa rua de Bissau. Daquele gordinho de óculos escuros que está com a mão no bolso da camisa, só me recordo da sua alcunha que era Diblondi. O porquê de tal alcunha, não sei. Peço desculpa por omitir tantos nomes, embora me lembre das pessoas. Nunca tive o cuidado de ir anotando os acontecimentos nem de escrever no verso das fotos os nomes das pessoas. Péssimo hábito de que agora me arrependo. " (...) (****).

Foto e legenda: © Mário Dias (2006). Direitos reservados.

__________

Notas de L.G.:


Catálogo da exposição fotográfica de Américo Estanqueiro, ex-Fur Mil da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72).

Vd. postes de 12 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2260: Álbum das Glórias (33): Inauguração da exposição de fotografia do Américo Estanqueiro, hoje, na Fundação Mário Soares

Sobre a CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72), vd os seguintes postes:

22 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1541: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (1): Introdução: a 'nossa Guiné'

26 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1550: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (2): A nossa gente

15 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1595: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (3): minas, tornados, emboscadas, flagelações e acção... psicossocial

(...) Na noite de 1 de Outubro, quando 2 secções da CCS [do BBCAÇ 2912] executavam um patrulhamento nas Duas Fontes, foram emboscadas por um grupo inimigo estimado em 50 homens, causando 5 mortos às nossas tropas. Dois destes, pertenciam à nossa Companhia e estavam destacados no Batalhão [, sedeado em Galomaro]. Eram o Rogério António Soares e o José Guedes Monteiro. (...)

11 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1651: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (4): Historietas

30 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1796: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (5): A(s) alegria(s) do(s) reencontro(s)

(**) É bem possível que seja o Paulo Malú, hoje coronel, e quadro superior das alfândegas, em Bissau; na altura elere era o comandante ou chefe do bigrupo que emboscou, no Quirafo, forças da CART 3490 (Saltinho, 1972/74), causando mais de duas dezenas de mortos e um prisioneiro (o nosso António da Silva Batista, só libertado em depois do 25 de Abril de 1974)

Vd. poste de 12 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1947: O Coronel Paulo Malu, ex-comandante do PAIGC, fala-nos da terrível emboscada do Quirafo (Pepito / Paulo Santiago).

Sobre a tragédia do Quirafo, vd. também os seguintes postes de:

21 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1980: Blogoterapia (26): Os nossos fantasmas, os nossos Quirafos (Virgínio Briote / Torcato Mendonça/Luís Graça)

17 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1962: Blogoterapia (25): Os Quirafos do nosso Passado (Torcato Mendonça / Virgínio Briote)

15 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1077: A tragédia do Quirafo (Parte V): eles comem tudo! (Paulo Santiago)

28 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P1000: A tragédia do Quirafo (Parte IV): Spínola no Saltinho (Paulo Santiago

26 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P990: A tragédia do Quirafo (parte III): a fatídica segunda-feira, 17 de Abril de 1972 (Paulo Santiago)


25 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P986: A tragédia do Quirafo (Parte II): a ida premonitória à foz do Rio Cantoro (Paulo Santiago)

23 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P980: A tragédia do Quirafo (Parte I): o capitão-proveta Lourenço (Paulo Santiago)


Guiné- Bissau > Instalações da AD - Acção para o Desenvolvimento > Julho de 2007 > O Paulo Malu, antigo comandante do PAIGC, hoje coronel, e quadro superior da Direcção-Geral de Alfândegas. Foi ele que comandou, em 17 de Abril de 1972, o bigrupo (?) que montou e executou a terrível emboscada contra os militares da CART 3490 (Saltinho, 1972/74) que escoltavam um grupo de civis afectos à construção de uma estrada (Quirafo-Foz do Cantoro).

Foto: © Pepito/ AD - Acção para o Desenvolvimento (Bissau) (2007)

(***) Campo de Instrução e Preparação Militar de Kambera, do PAIGC, na República da Guiné-Conacri

(****) Vd. poste de 1 Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXCI: Domingos Ramos, meu camarada e amigo (Mário Dias)

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Guiné 63/74 - P2510: Estórias do Juvenal Amado (2): O boato: nós, o Sardeira e a Maria Turra (J. Amado, CCS/BCAÇ 3873, Galomaro, 1972/74)

Juvenal Amado
Ex-1.º Cabo Condutor,
CCS/BCAÇ 3872
(Galomaro, 1972/74)


1. O boato, uma estória de Juvenal Amado (*)

O bom do Sardeira (1) tinha por missão ir às Duas Fontes (2), local a 6 km do quartel, com o Unimog, mais conhecido por burro do mato, encher o autotanque de água.

E assim durante muito tempo, logo de manhã, com uma Secção de homens armados, lá ia picada fora aproveitando para dar boleia às bajudas (3) que, nisto de andar de carro, estavam sempre prontas.
Iam... e depois vinham.

O meu amigo Sardeira usava uns óculos que mais pareciam o fundo de duas garrafas, tal era a grossura das lentes. Mais tarde, no nosso primeiro almoço de confraternização, passados vinte anos, em Seia, reparei que ele não trazia os famosos óculos. Quando lhe perguntei por eles, com ar maroto respondeu-me que os tinha deitado fora, mal tinha saído do Niassa em Lisboa. Verdade ou não, deixa de ser sempre tema de conversa e brincadeira, entre nós quando nos juntamos.

Guiné > Zona Leste > Sector L5 > Galomaro > Quartel


Mas voltando atrás no tempo, o camarada ia encher o autotanque, duas vezes de manhã e duas vezes de tarde. Assim foram passando os meses e como foram passando, ele foi abrandando o cuidado e, de vez em quando, pegava na viatura e lá ia ele direito às Duas Fontes, sem escolta.

Escusado será dizer que, em situação de guerra de guerrilha, esta atitude era uma tonteira e era assunto de conversa entre nós. Até que ele passou a ir mais vezes sem escolta do que com ela.

Nós, meio a sério meio a brincar, dizíamos:
- Qualquer dia ainda te lixas - e ele respondia a gozar que éramos medricas e que não havia perigo nenhum.

O tempo foi passando. Um dia lá vinha ele a chegar do seu passeio, o Caramba gritou-lhe que ele estava a forçar a sorte. Ele riu-se e disse que não havia azar, ao que o Caramba retorquiu:
- Ah, pois, vai ter com o Narciso das transmissões que ele diz-te o que a Maria Turra (**) disse sobre apanhar o condutor da água de Galomaro à mão!

O Sardeira mudou de cor e num riso um bocado amarelo, ainda disse:
- Estás a gozar!

O Caramba disse muito sério, na sua forma falar de alentejano dos quatro costados:
- Não se está vendo? Andas brincando com a sorte.

Nós entretanto fartámo-nos de rir, mas a mentira passou a ser uma verdade e nenhum de nós se desmanchou.

A estória correu o quartel e à boa maneira de quem conta um conto, acrescenta um ponto, a peta alastrou.

O que foi certo é que o camarada passou a querer mais segurança e nunca mais lá foi buscar o precioso líquido, sozinho.

Juvenal Amado
Ex-1.º Cabo Condutor
CCS/BCAÇ 3872

_______

Notas do autor:

(1) O primeiro encontro entre nós, passado vinte anos, deve-se em grande parte ao trabalho desenvolvido pelo Sardeira que, a par com o Alfredo Chapinhas, fizeram um trabalho notável para que o almoço se realizasse. Ele veio de propósito encontrar-se comigo em Alcobaça, para que eu fornecesse os números de telefone dos camaradas que ainda estavam em contacto comigo.

(2) Duas Fontes: local onde abastecíamos de água perto de Bangacia. Era um local que inspirava confiança, mas não podemos esquecer que essa mesma confiança custou a vida a seis camaradas do Batalhão antigo, que ali foram emboscados.

Bangacia foi também destruída por um ataque durante a nossa comissão. Nós reconstruímos a povoação com ordenamento tipo Baixa Pombalina, com escola, posto médico e o PAIGC nunca mais atacou. Deve ter considerado que era uma coisa boa a manter para quando a paz chegasse. E tinham toda a razão.

(3) Bajudas: nome dado as moças solteiras da Guiné.

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Notas de CV:

(*) Vd. post de Juvenal Amado de 11 de Janeiro de 2008> Guiné 63/74 - P2430: História de vida (9): Um dia negro, na estrada Galomaro - Saltinho (Juvenal Amado, CCS/BCAÇ 3872)

(**) Maria Turra: A famosa locutura da Rádio Libertação, do PAIGC... Vd. poste de 1 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2235: Maria Turra, a locutora do PAIGC, que faz(ia) parte do vosso imaginário, era(é) a Amélia Araújo (Diana Andringa)

(...) "A Maria Turra era (é, porque está viva, em Cabo Verde) Amélia Araújo, natural de Angola, casada com o cabo-verdiano José Araújo, esse já falecido. No filme [As Duas Faces da Guerra]ouvimos a voz dela, em nova, a anunciar a emissão da Rádio Libertação e filmámo-la este ano, a ler, em estúdio, uma mensagem de Amílcar Cabral aos soldados portugueses" (...).

(...) Os Araújo (...) estavam em Portugal em 1961 e fizeram parte do grupo que, nesse ano, fugiu de Portugal, com o apoio de oganizações protestantes, do qual muitos se foram juntar aos movimentos de libertação dos respectivos países (...).

A Maria Turra era seguramente a locutora mais popular... entre os militares portugueses... Vd. poste de 27 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2223: A nossa Tabanca Grande e as Duas Faces da Guerra (12): A minha luta diária com a Maria Turra, no HM241 (Carlos Américo Cardoso)