Mostrar mensagens com a etiqueta Delgadinho Rodrigues. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Delgadinho Rodrigues. Mostrar todas as mensagens

sexta-feira, 15 de julho de 2022

Guiné 61/74 - P23431: Guidaje, Guileje, Gadamael, maio/junho de 1973: foi há meio século... Alguém ainda se lembra? (9): relatório, de 15 pp., da Op Dinossauro Preto (BCP 12, Gadamael, de 2jun a 17jul73) - Parte I


Guiné > Bissau > Bissalanca> BA 12 > BCP 12 (1972/74) > O ex-fur mil paraquedista Manuel Peredo é o primeiro do lado direito, armado de RPG-2, seguido do 2º sargento Carmo Vicente e do furriel mil Fernandes, cabo-verdiano, todos do 4º Gr Comb da CCP 122 / BCP 12 (Bissalanca, 1972/74). Estes dois elementos também estão equipados com armamento capturado ao PAIGC. Em junho de 1973 (e até 25 desse mês, com BCP 12 destacado em Gadamael), o Carmo Vicente era também o cmdt do 4º Gr Comb / CCP 122 (comandado pelo cap pqdt Terras Marques).

O Peredo viveu (ou ainda vive) em França; tem 8 referências no blogue que integra desde 27 de julho de 2008. Disse-nos na altura que foi pela mão do Carmo Vicente que chegou ao nosso blogue. O Carmo Vicente, DFA - Deficiente das Forças Armadasa, é autor de vários livros (incluindo poesia, memórias e contos), com destaque para "Gadamael" (1ª ed., 1982; 2ª ed., revista e aumentada, 1986, edições Caso) (Vd. postes P2915, de 4 de junho de 2008, e P2917, de 5 de junho de 2008).(*)

Foto (e legenda): © Manuel Peredo (2008). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Guiné > Região de Tombali > Gadamael > Junho de 1973 > Foto do álbum do Rodrigues Delgadinho (**), na altura fur mil parquedista, da CCP 123 / BCP 12, força de elite que conseguiu travar a ofensiva do PAIGC contra aquele aquartelamento de fronteira. Gadamael faz parte dos três famosos G - Guidaje, Guileje, Gadamael... "Tremeu mas não caiu"...

Foto (e legenda): © Delgadinho Rodrigues / Manuel Peredo (2013). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem de Manuel Peredo [ ex-fur mil paraquedista, CCP 122 / BCP 12, Bissalanca, 1971/73, vive em França, ou vivia até há uns anos; tem 8 referências no nosso blogue: integra o nosso blogue desde 2008](***)

Data - 7 jul 2022, 19h00
Assunto - Gadamael

Olá, camarada Luís Graça.

O blogue tem relançado o tema dos três G (*) e não me parece que esteja a despertar grande interesse, o que é pena. A mim foi o que mais me marcou dos dois anos de Guiné.

Aqui há anos, quando o tema foi muito comentado e discutido e alguns já estavam saturados de tanto falar sobre Gadamael, também dei o meu contributo. Um dia o João Seabra enviou-me por email o relatório da atividade do meu batalhão, o BCP12, onde tudo está descrito ao pormenor.

Para mim tem muito valor este documento,mas não sei se terá algum interesse para o blogue e se alguma coisa poderá ser publicada. Envio o ficheiro PDF,mas talvez fosse melhor perguntar ao João Seabra se não há nenhum inconveniente em ser publicado.

Boa leitura e um abraço para o Luís Graça.

Manuel Peredo,
ex furriel pára da CCP 122.


2. Comentário do editor LG:

Obrigado, Manuel Peredo, por nos teres facultado cópia do relatório da Op Dinossauro Preto (onde em 15 páginas se conta a odisseia do BCP 12, na defesa de Gadamael, entre 2 de junho e 17 de julho de 1973).

Sei agora, ao ler o documento, que foste ferido (mas também louvado) em Gadamael nesta altura (veremos isso na Parte III). Se mais razões não houvesse, esta bastava para reproduzir o documento que nos mandas, no todo ou em parte, no nosso blogue.

Não há problema em fazê-lo, o documento foi, em devido tempo, desclassificado, de acordo com os carimbos nele visíveis, na cópia que o João Seabra obteve diretamente do Arquivo Histórico-Militar. 

O João Seabra, hoje advogado, foi alf mil, da martirizada CCAV 8350, "Piratas de Guileje" (Guileje, 1972/73), é também merecedor da nossa gratidão por ter-te feito chegar, em tempos, esta cópia que tu agora partilhas com a Tabanca Grande. (O João tem 14 referências no nosso blogue, é pena que não nos dê notícias há muito, tal como outros "Piratas de Guilje").

Devido à sua extensão (15 páginas), vamos publicar o documento em 3 ou 4  partes. Um parte já foi transcrita no Poste P23415, a partir dos excertos da CECA (2015) (**). 

Nas primeiras cinco páginas do rekatório, verifica-se que falta, no entanto, a página 4 (relativa ao período entre 14 e 18 de junho de 1973, em que se realizaram a Op Bisturi Negro e a Op Diamante Preto), informação essa que se reconstitui aqui, a partir dos excertos da CECA (2015) (**):

- Operação Bisturi Negro - 14 e 15jun

A CCP 121 saiu em patrulhamento apeado, rumo Leste, flectindo para NWe depois para Norte. Em Cacoca 6E4.94 foi flagelada durante 45 minutos com armas autom, LGFog RPG-2 e RPG-7, canh s/r, por um grupo lN estimado em 80 elementos que se deslocavam na direcção Leste/Oeste.

As NT sofreram 1 morto (guia) e 2 feridos ligeiros. Da batida efectuada verificou-se que o lN sofreu 4 mortos confirmados e elevadas baixas prováveis dada a forma como procurou reter as NT com uma segunda linha de fogo com nítida intenção de retirar mortos e feridos, o que foi confirmado por sinais de arrastamento de corpos e abundantes rastos de sangue.

Foram referenciados elementos de tez clara e o lN utilizou esp autom G-3, metr lig HK-21 e dilagramas.

A CCP 121 regressou a Gadamael Porto para evacuar os feridos. Dois GComb voltaram a sair, rumo Leste flectindo depois para Norte. Montaram uma emboscada nocturna. Não houve contacto com o lN.

- Operação Diamante Preto - 17 e 18jun

A CCP 122 a 3 GComb saiu em patrulhamento. Em Cacoca 6F8.65 foi detectado um grupo lN estimado em 20 elementos ao qual foi montada uma emboscada imediata. O lN sofreu 1 morto confirmado e feridos prováveis; foi recolhida uma pá articulada, uma pica e uma granada de LGFog RPG-2 com carga.

Reiniciada a progressão o agrupamento foi flagelado do lado da fronteira com 3 granadas de canh sr/, sem consequências.

Foi montada uma emboscada nocturna. Não houve contacto com o lN
.


3. Relatório de Operações nº 16/73 | Operação Dinossauro Preto | Período: 2jun73 - 17jul73 | Região: Cacine / Gadamael | Referências: Carta [Cacoca] 1/50.000 | Exemplar nº 4 | BCP 12 | Bissalanca| 31jul73| 15 pág. Assinado: Sílvio José Rendeiro de Araújo e Sá, ten cor paraquedista.

Documento desclassificado. Cópia proveniente do Arquivo Histório-Militar. Cortesia de Manuel Peredo / João Sebra.

De assinalar a observação, na pag 1, ponto 3e: "Alteração à organização regulamentar: 2. Armamento: Utilizados LGF RPG 2, RPG 7, Met Lig Dectyarev, Esp Aut Kalashnikov e Mort 60"... Os páras reconheciam que o armamento do PAIGC era melhor que o nosso... Ou era "fetichismo" ? Afinal, os tipos do PAIGG também não desdenhavam da G3, dilagrama, HK 21 (capturado às NT)... 

Como diz o povo, "a galinha do vizinho é sempre melhor que a minha"... A "kalashnikovmania" é um velho tema aqui debatido no blogue...





Falta a página 4 (vd. comentário do editor LG, ponto 2, acima)



(Continua) 
___________

Notas do editor:

(*) Vd. postes de:

4 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2915: Com os páras da CCP 122/ BCP 12, no inferno de Gadamael (Carmo Vicente) (1): Aquilo parecia um filme do Vietname

5 de junho de  2008 > Guiné 63/74 - P2917: Com os páras da CCP 122/BCP 12 no inferno de Gadamael (Carmo Vicente) (2): Quase meia centena de mortos... Para quê e porquê ?

sábado, 9 de fevereiro de 2013

Guiné 63/74 - P11079: Álbum fotográfico do Delgadinho Rodrigues (cap pára ref, CCP123/BCP 12, Bissalanca, 1972/74): Gadamael, junho de 1973 (Manuel Peredo, ex-fur mil, CCP 122, 1972/74, hoje a viver em França)


Guiné > Região de Tombali > Gadamael > Junho de 1973 > Foto nº 1



Guiné > Região de Tombali > Gadamael > Junho de 1973 > Foto nº 1-A


Guiné > Região de Tombali > Gadamael > Junho de 1973 > Foto nº 1-B


Guiné > Região de Tombali > Gadamael > Junho de 1973 > Foto nº 2


Guiné > Região de Tombali > Gadamael > Junho de 1973 > Foto nº 2-A


Guiné > Região de Tombali > Gadamael > Junho de 1973 > Foto nº 3


Guiné > Região de Tombali > Gadamael > Junho de 1973 > Foto nº 3-A

Guiné > Região de Tombali > Gadamael > Junho de 1973 > Fotos do álbum do  Rodrigues Delgadinho, na altura fur mil pára, da CCP 123/BCP 12, força de elite que conseguiu travar a ofensiva do PAIGC contra aquele aquartelamento de fronteira. Gadamael faz parte dos três famosos G - Guidaje, Guileje, Gadamael...

Fotos: ©  Delgadinho Rodrigues / Manuel Peredo (2013). Todos os direitos reservados [Editadas por L.G.]


1. Mensagem, com data de 4 do corrente, enviada pelo nosso camarada Manuel Peredo (ex-Fur Mil Paraquedista (CCP 122 / BCP 12, Brá, Bissalanca, 1972/74) [, foto à esquerda: é o primeiro lado direito, armado de RPG-2, seguido do sagento Carmo Vicente e do Fernandes, caboverdiano, fur mil, todos do 4º Gr Comb da CCP 122]

Caro Luis Graça, aqui vão três fotos de Gadamael que me foram oferecidas pelo Delgadinho Rodrigues, capitão pára na reforma e furriel em Junho de 73. Sei que há elementos do blogue que já não suportam ouvir falar em Gadamael, mas esses certamente não estavam lá naqueles dias difíceis. (*)

Um abraço, Manuel Peredo [, foto atual à direita]

2. Comentário de L.G.:

Meu caro Manel, sê bem aparecido. Julgo que ainda estás por França, não ? E,  se sim, tencionas voltar ? Espero bem que sim, afinal esta é a Pátria pela qual já verteste sangue, suor e lágrimas.

Obrigado, antes de mais pelas fotos, de Gadamael.  A preto e branco, e em dia de céu carregado, e com vestígios,  bem evidentes, dos ataques do PAIGC(que começaram em finais de maio de 1973), elas conseguem transmitir-nos  o dramatismo desses dias que lá vivestes, com os teus valorosos camaradas da CCP 122 e da CCP 123, até ao dia 10 de junho, em que foste ferido.

Agradece, por todos nós, ao Joaquim Manuel Delgadinho Rodrigues, o ter-te facultado estas fotos e, através de ti, tê-las feito chegar ao nosso blogue (que está aberto a todos os camaradas da Guiné, como sabes). Diz-lhe (, no caso de ele não ler esta mensagem, ) que a sua presença, na nossa Tabanca Grande, nos honraria muito, a todos, e seria também uma forma de homenagear os mortos e os feridos da batalha de Gadamael. Ele só precisa de nos mandar as duas fotos da praxe, e escrever meia dúzia de linhas sobre as férias que ele passou nesse paraíso tropical chamado Guiné... Podes (e queres) ser o padrinho dele ?

 Quanto a Gadamael, nunca será demais falar... E continuaremos a falar, de Gadamael,  "ad nauseam"... Temos já cerca de 200 referências a esse lugar, que ficará na história desta guerra e deste país pelo patriotismo, coragem, abnegação e camaradagem de homens como tu, o Carmo Vicente (CCP 122),  o Manuel Rebocho (CCP 123), o Victor Tavares (CCP 121), o J. Casimiro Carvalho (CCAV 8350) e tantos outros. Desejo-te boa saúde e longa vida. Vai aparecendo.

Parafraseando o Virgínio Briote, no seu poste sobre o livro do Carmo Vicente ("Gadamael"), "foi a Guerra que vivemos (é sempre assim em todas, em poucos minutos, horas ou dias, somos capazes do melhor e do pior")... Em 26 de junho de 1975, o nosso grã-tabanqueiro J. Casimiro  Carvalho podia escrever â mãe, com os dizeres , em caixa alta, "Now we have peace" [, Finalmente temos paz].




Foto: © José Casimiro Carvalho (2007) / BlogueLuís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados.

Excerto de uma das cartas enviadas de Gadamael. Na resenha biográfica do J. Casimiro Carvalho, não há grande precisão nas datas,   no que diz respeito ao período em que esteve em Gadamael. O BCP nº 12, a duas companhias (CCP 122 e CCP 123) é enviado para Gadamael a 2 de Junho, seguindo-se a 13 a CCP 121, do Victor Tavares. Regressa a Bissau a 7 de Julho (as CCP 122 e 123) e a 17 de Julho (a CCP 121). Os páras conseguirão travar a ofensiva do PAIGC a partir do momento em que se instalam em Gadamael. 

______________


(...) Já agora vou descrever um pouco por alto aquilo que ainda está gravado na minha memória. Quando nos disseram em Bissau que íamos para Gadamael, informaram-nos que a situação era muito grave e que não valia a pena irmos carregados, só o necessário para três ou quatro dias. Quando nos aproximávamos de Gadamael, recordo-me muito bem de ver muita tropa à beira do rio, com uma expressão de terror na cara.

Alguns dizem que desembarcámos em botes, mas eu quase afirmava que foi de LDM e era capaz de jurar que só a minha companhia, a [CCP] 122, é que desembarcou nesse dia e não me lembro de estarem lá duas companhias de páras ao mesmo tempo. Penso que a 123 nos foi render para a 122 poder descansar uns dias em Cacine.

Mal chegámos a Gadamael, dois pelotões foram logo para a mata, onde passaram a noite. Em Gadamael apenas se encontravam lá uns quinze ou vinte homens, o resto tinha fugido. Recordo-me que veio logo uma Berliet conduzida por um açoriano muito destemido para evacuar os mortos e feridos. Soube pelo blogue que o José Casimiro Carvalho também fazia parte dos que não fugiram. 

O meu pelotão, o quarto, fazia parte do bigrupo que passou a primeira noite no mato e, quando estávamos a regressar ao quartel, este foi fortemente bombardeado, originando a morte de alguns soldados do exército que tentaram fazer fogo com o obus 140, salvo erro. Estivemos à espera que os rebentamentos acabassem para poder entrar no quartel.

Um dia ou dois mais tarde morreram mais três soldados e um alferes miliciano, vítimas duma emboscada, muito próximo do quartel. Alguém devia ter um grande peso na consciência por ter mandado para o mato um grupo de apenas duas dezenas de militares, se tanto. Este ataque já foi contado pelo José Casimiro e pelo [Carmo] Vicente.

Aqui o Vicente deve estar enganado. Quem foi primeiro recuperar os corpos foi outro pelotão, o nosso pelotão foi enviado em reforço porque tínhamos acabado de chegar do mato. Encontrámo-nos a meio caminho e demos uma ajuda a transportar os corpos que estavam muito mal tratados : tinham o corpo queimado e ferimentos causados pelas balas. O alferes tinha um grande buraco na cara derivado a uma rajada e um soldado nem calças trazia vendo-se bem o efeito das chamas.

Quando chegámos ao quartel, os colegas dos militares mortos estavam no cais à espera e houve um pormenor que me deixou surpreendido e até chocado. Nenhum deles teve a coragem de nos ajudar a carregar os mortos para a Berliet. Os corpos eram postos no chão e o pessoal ia para as valas. Eu próprio os carreguei com a ajuda de colegas. 

Quando estávamos com este trabalho, o IN lançou novo ataque e eu só tive tempo de saltar do paredão do cais para me proteger. Foi a minha salvação pois uma granada caiu no local que tinha deixado. Escapei à uma morte certa por décimos de segundo.

Outro pormenor que me surpreendeu : quando íamos resgatar os corpos, um dos soldados que tinha fugido da emboscada dirigiu-se a mim, suplicando-me por,  tudo quanto me era sagrado, que tentasse recuperar uma medalha ou um fio que a mãe lhe tinha dado. Essa medalha ou fio devia estar no casaco que ele largou durante a fuga. Os ataques iam-se sucedendo e talvez mais espaçados e a tropa que tinha fugido ia regressando ao quartel talvez por se sentirem mais seguros com a nossa presença.

No dia dez de Junho (ninguém no mundo me convencerá que não foi neste dia ) sofremos então uma emboscada que deixou a 122 muito debilitada. Pela manhã fomos montar uma emboscada um pouco distante do quartel. Nada se passou de anormal a não ser uma tentativa do IN em abater um Fiat que voava bem lá no alto:  distinguia-se perfeitamente o fumo do míssil que tinha rebentado.

A meio da tarde, iniciámos o regresso ao quartel. Estava previsto o meu pelotão e mais um pernoitarem na mata, já muito próximo do quartel e estávamos já nesses preparativos, quando se deu a emboscada. Os dois pelotões que lá deviam pernoitar encontravam-se já na mata e os outros dois seguiam pelo caminho que dava acesso ao quartel. Os dois bigrupos encontravam-se em posição paralela,  o que podia ter custado muito caro. 

Claro que foi um erro de quem dirigiu a manobra. Os dois pelotões que iam para o quartel é que deviam ir na frente. Eu por acaso apercebi-me do erro e disse aos meus homens para não dar fogo. Aquilo nunca mais acabava. Quando os caças Fiat vieram em nosso auxílio ainda o combate não tinha acabado. Não havia árvores de grande porte para nos protegermos. O meu colega do lado esquerdo tentava proteger-se atrás dum arbusto que foi ceifado por uma granada logo por cima da cabeça. O que estava do meu lado direito foi levantado pelo sopro duma granada.  possivelmemte dum RPG 7. 

Acreditem que foi verdade,  pois vi com os meus próprios olhos. Há minutos na vida que duram uma eternidade. Resultado da brincadeira :17 feridos, todos causados por estilhaços,  fazendo eu parte desse grupo com um ferimento na cabeça.

Por absurdo que pareça eu fiquei bem disposto e até brinquei com os meus colegas. Quando estes me viram a sangrar da cabeça disseram-me : "Ó meu furriel já pode estar descansado, já acabou a comissão". Mal eles imaginavam que passados oito ou dez dias estava de novo junto deles. Claro que o ferimento não era grave e, derivado ao medo que os médicos tinham do comandante, eu próprio pedi para voltar à minha companhia. 

Quando voltei, já a 122 estava a descansar em Cacine e mal cheguei lá fui presenteado com um ataque de paludismo. Veio logo o capitão Terras Marques dizer-me que tinha que recuperar depressa pois precisava de mim para irmos fazer uma operação à fronteira da República da Guiné.

Voltando um pouco atrás. Fomos então evacuados para Cacine em dois botes que iam superlotados e de Cacine seguimos de helicóptero para Bissau. Quando eu estava no hospital a aguardar transporte para Bissalanca, chegou o homem do monóculo [, o gen Spínola,]  para ver como estavam os feridos. O médico que o acompanhava apontou para mim e disse-lhe que eu era um dos feridos. Dirigiu-se a mim e perguntou-me como se tinha passado. Quando lhe disse que foi no regresso, logo me perguntou se vínhamos pelo mesmo caminho. Pensei logo que estava ali uma armadilha e lá lhe enfiei o barrete. (...)

quarta-feira, 4 de outubro de 2006

Guiné 63/74 - P1150: Carta a Pedro Lauret: A actuação da LFG Orion na evacuação das NT e da população de Guileje, no Rio Cacine, em Junho de 1973 (Manuel Rebocho, ex-Srgt Pára, CCP 123, 1972/74)

Photobucket - Video and Image Hosting


Guiné > Região de Tombali > Cacine > Rio Cumbijã > Junho de 1973 > "A LFG Orion, com populares a serem evacuados (...). A população de Guileje, não sendo aceite pela população de Gadamael, por serem chãos diferentes (no sentido de etnias), embarca num navio Patrulha que a levaria para Bissau, onde desembarcou".


Photobucket - Video and Image Hosting

Guiné > Região de Tombali > Cacine > Junho de 1973 > Uma LDM [Lancha de Desembarque Média] com militares e populares e a costa do rio onde nunca o Orion conseguiria chegar".

Legendas de Manuel Rebocho. Fotos de Delgadinho Rodrigues (2006), gentilmente cedidas por Manuel Rebocho (2006). Todos os direitos reservados.

Fotos alojada no álbum de Luís Graça > Guinea-Bissau: Colonial War. Copyright © 2003-2006 Photobucket Inc. All rights reserved.





Foto: © Manuel Rebocho (2006)


Texto enviado pelo Manuel Rebocho, ex-sargento paraquedista da CCP 123 (Maio de 1972/Julho de 1974), hoje Sargento-Mor Pára-quedista, na Reserva, e doutorado pela Universidade de Évora em Sociologia da Paz e dos Conflitos (tese de doutoramento: "A formação das elites militares portuguesas entre 1900 e 1975").

Carta a Pedro Lauret (1)

Não pretendo fazer polémica mas também a não recuso. Assumo a frontalidade e a responsabilidade do fiz e vi fazer.

A actuação da LFG [Lancha de Fiscalização Grande] Orion, na evacuação das populações de Guileje, que tinham sido forçadas a acompanhar as tropas portuguesas que se retiraram para Gadamael Porto, na manhã do dia 22 de Maio de 1973, teve o seu mérito (2), mas não exageremos.

Nas duas fotografias, que junto, a primeira é da LFG Orion, onde se vêem os populares a serem evacuados. Contudo, a segunda mostra uma LDM [Lancha de Desembarque Média] com militares e populares e a costa do rio onde nunca o Orion conseguiria chegar.


Temos assim que só chegaram ao Orion as pessoas que foram transportadas pala LDM, que era comandada por um Sargento. Acresce, que esta LDM estava aportada em Cacine e foi o então Major Manuel Monge, que desempenhava as funções de Segundo Comandante do COP 4, quem lhe ordenou aquela missão. Tendo o Sargento procurado esquivar-se ao cumprimento da ordem, a mesma foi-lhe imposta pela força já que o então Capitão Pára-Quedista Norberto Crisante de Sousa Bernardes que, como eu próprio, assistiu à ordem, determinou a uma força, que ele próprio integrou, que acompanhasse o Sargento e assegurasse a defesa da dita LDM.

Todos sabemos que Manuel Monge era um dos Oficiais mais íntimos de Spínola, cujo comportamento não pretendo justificar, mas antes, ser cientificamente sério. Neste sentido, Monge determinou a evacuação só depois de ter o beneplácito de Spínola.

Neste caso, não recuso méritos ao Orion, que os teve, mas não exageremos, quanto às motivações e iniciativas. O Orion cumpriu uma missão que lhe foi ordenada. E só. Lembro que o Orion estava no local, porque havia ido buscar a CCP [Companhia de Caçadores Pára-quedistas] 123, que integrei como operacional durante 26 meses, a Cadique (Cantanhez) no rio Cumbijã, precisamente para auxiliar Gadamael Porto, como fez. O Orion desembarcou a CCP 123 em Cacine, tendo a companhia seguido depois para Gadamael,  de LDM, mas, mesmo assim, desembarcou na zona onde estava a população, seguindo depois a pé até Gadamael, dado que o porto estava a ser constantemente bombardeado.

O Orion esteve sempre muito distante do alcance das granadas que o PAICG estava lançando sobre Gadamael. A população estava dispersa na margem, mas também muito distante de Gadamael.

A presente carta é da responsabilidade do tertuliano Manuel Rebocho, mas não só, também o é do Sargento-Mor Pára-Quedista Manuel Rebocho, que esteve nos actos que refere, e também do Doutor Manuel Rebocho que investigou estas operações durante mais de cinco anos.


Aceite o tertuliano, o camarada e V. Excia. os protestos dos meus mais elevados cumprimentos pessoais.

PS - O Delgadinho Rodrigues era na altura dos factos, tal como eu, Segundo Sargento Pára-Quedista e éramos da mesma companhia [CCP 123]. O facto de ele ter tirado as fotografias prova que estava lá. Como estava.

[ Revisão / fixação de texto / título: L.G.]Guiné 63/74 - P1137: Do NRP Orion ao MFA: uma curta autobiografia (Pedro Lauret, capitão-de-mar-e-guerra)


_________

Notas de L.G.:

(1) Vd post de 1 de Outubro de 2006 >

(2) Vd. posts de 15 de Junho de 2006 :

Guiné 63/74 - P878: Antologia (42): Os heróis desconhecidos de Gadamael (Parte I)

Guiné 63/74 - P879: Antologia (43): Os heróis desconhecidos de Gadamael (II Parte)