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quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Guiné 63/74 - P7678: Casos de azar e sorte (1): Camarada ferido pelo impacto de granada que não explodiu (José Corceiro)

1. Mensagem de José Corceiro (ex-1.º Cabo TRMS, CCaç 5 - Gatos Pretos , Canjadude, 1969/71), com data de 24 de Janeiro de 2011:

Caros amigos, Luís Graça, Carlos Vinhal, E. Magalhães.
Envio este texto onde relato um episódio passado na Guiné que na altura me apiedou, que publicarão caso entendam que tem algum interesse para o blogue.
Quanto à foto que eu na época tirei, onde são visíveis os ferimentos provocados na pessoa, a mim não me choca, mas pode ferir sugestibilidades mais sensíveis de alguns. Sendo assim, publicar a foto pode não ser a opção mais curial, deixo à vossa sensibilidade a decisão de fazer o que acharem mais adequado.

Um abraço
José Corceiro


Foto 1 - Corceiro, no Hospital de Bissau, à volta com as suas escritas.


CASOS DE AZAR E SORTE (1)

Camarada ferido pelo impacto de uma granada que não explodiu

Creio não estar a errar, se afirmar que já todos nós, ao longo das nossas vidas, nos confrontámos e fomos surpreendidos por acontecimentos que se nos perspectivaram estarem a tanger e ameaçar entrar na fronteira do incrível, deixando-nos a meditar com alguma perplexidade, porque à luz duma interpretação racional tivemos dificuldade em os ajuizar numa explicação lógica que nos tranquilizasse o ego, ou que serenasse a crença de outros, para os quais essas circunstâncias poderão ter a grandeza de mistério!

Eu ao longo da minha existência tenho sido bafejado por muitos e variados casos, a raiar o limite do fenomenal, algumas vezes como espectador, outras como sujeito interveniente. O meu carácter é de compleição reservada, pois não sou pessoa de manifestar exaltação exacerbada e irreflectida, perante os acontecimentos extraordinários que tenho testemunhado e vivido, durante o percurso da minha vida. Direi que é raro expandir-me em manifestações efusivas ou admiração de entusiasmo desmedido, de forma a empolgar exageradamente os acontecimentos menos explicáveis, mas com potencial espectável que ocorram e nos quais eu possa estar envolvido, pois aceito pacificamente a “lei da probabilidade” que diz:

- Tudo aquilo que é susceptível de acontecer mais cedo ou mais tarde acontece!

Posto isto, perante os casos que se me afiguram como enigmáticos, mas com o mínimo de virtualidade provável para que sucedam, mantenho uma postura de euforia contida dominada pelo racional, visto reconhecer que há por vezes coincidências resultantes de acontecimentos concomitantes que conduzem a estes “fenómenos” menos vulgares que ocorrem, e eu admito-os como casos passíveis de acontecer!

Redigi este intróito com a finalidade de enquadrar a narração de alguns episódios que vivi na Guerra da Guiné, durante o período que lá permaneci e que a seguir vou tentar descrever. São meia dúzia de casos que teimam em permanecer mais lúcidos e vivos no meu consciente e que vou partilhar convosco, dividindo o envio em partes.

Foto 2 - Corceiro, sentado de frente lado esquerdo. Refeitório do Hospital de Bissau, Não recordo os nomes dos outros camaradas.


1.º CASO - O dia nove de Dezembro de 2010, foi editado o P7409 cujo título é: - A Granada de Morteiro que Veio Jantar. O Autor é o nosso estimado camarada, Alberto Branquinho.

Nesse poste eu deixei o seguinte comentário:

- “Não tenho a certeza que seja o mesmo caso, que o Torcato refere sobre o acidente da granada de morteiro que se alojou na coxa dum ser humano sem explodir!

Eu, durante um internamento que tive no Hospital de Bissau, foi-me permitido, por pessoa conhecida, atendendo ao inédito acontecimento, tirar umas fotos que guardo da coxa dum adulto, com os ferimentos provocados por uma granada que não deflagrou. Segundo me disseram na altura, a pessoa em questão estava na sua tabanca deitada, quando foi surpreendida com a granada que se alojou na coxa.”


Foto 3 - Tirada por mim no Hospital de Bissau. Os ferimentos da foto foram causados por uma granada que não explodiu.
(Clicar para ampliar a imagem)

Porque creio que haverá desfasamento temporal entre o acontecimento que o Torcato referiu no comentário ao P7409 e isto que eu vi e que fotografei a parte da pessoa, com ferimentos provocados por uma granada disparada que ao cair atingiu a coxa dum ser humano e não rebentou, como na altura me foi dito, afigurasse-me provável que não sejam o mesmo caso, pois entendo não haver similaridade entre os dois.

Julgo que os traumatismos visíveis na foto são de etimologia perfurocontundentes, ou seja, que poderão ser as contusões provocadas pelo impacto da granada, que ao atingir a coxa rasgou os tecidos musculares e destruiu algumas partes ósseas. As lesões parecem-me ser muito extensas para a contundência causada pelo objecto em análise, ainda que a profundidade seja a espectável que provocaria o projéctil. Pois temos que levar em linha de conta, que a contusão dependerá sempre de N factores, como seja a direcção da força que provocou os danos, outros obstáculos já ultrapassados pelo engenho, a aceleração ou desaceleração da velocidade do objecto e a posição do corpo atingido, ou seja o alvo!

Disseram-me na altura e a foto confirma-o, que não tinha sido afectado nenhum órgão vital, mas é bem visível que ficou muito lesada a complexidade dos ligamentos iliofemorais, assim como o conjunto dos diversos músculos existentes na zona do ferimento, que são muitos, tais como os glúteos, os gémeos, os adutores, o periforme, o obturador etc. Ficaram dilacerados vasos e nervos da região afectada. Foram destruídos o colo e a cabeça do fémur, assim como a cápsula coxofemoral, até a crista ilíaca foi atingida.

Mas, que foi uma coincidência de azar e sorte, lá isso foi; atendendo a similitude dos efeitos provocados por esta causa, em relações a outras que aconteceram com perigosidade idêntica noutras ocasiões.

O ter-se ficado com vida por a granada não ter rebentado, foi um factor de sorte; o estar a descansar em casa e ser atingido pelo projéctil, que causou ferimentos que provavelmente desencadearão um processo que levará à amputação da perna, isto foi um factor de azar!

Não soube como evoluiu clinicamente o caso.

Junto envio foto que na época eu tirei, no Hospital de Bissau.

Foto 4 - Granada que caiu sem explodir, dentro do Aquartelamento de Canjadude, durante uma flagelação desencadeada pelo inimigo.

Foto 5 - Míssil disparado pelo inimigo que não explodiu ao cair. Espetou-se junto ao bloco do edifício, caserna, secretaria, refeitório, armazém e cozinha, de Canjadude. Se tivesse rebentado, estas estruturas iam todas pelos ares. São visíveis estragos na cobertura da cozinha, devido a outro rebentamento!

Foto 6 - Baioa, em Canjadude, junto do míssil que não explodiu ao cair.

Um abraço
José Corceiro
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(*) Vd. poste de 19 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7471: O Mural do Pai Natal da Tabanca Grande (2010) (9): Como vejo o Natal (José Corceiro)