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sábado, 26 de novembro de 2022

Guiné 61/74 - P23818: Efemérides (377): Foi há 52 anos, a carnificina da Op Abencerragem Candente, 26/11/1970, subsector do Xime..."Choro para uma morte anuncidada" (poema de Luís Graça)

Caldas da Rainha > RI 5 > 1968 > O futuro furriel miliciano David Guimarães, de minas e armadilhas [CARt 2716, Xitole, 1970/72], está a tocar viola, rodeado de camaradas que estavam a fazer a recruta no CSM - Curso de Sargentos Milicianos. Lá ao fundo, à direita e em último plano, uma carinha pequenina, é o Joaquim Araújo Cunha (assinalado com um círculo a vermelho).... Era de minhoto, de Barcelos. Viria a morrer em combate, no subsector do Xime, no decurso da Op Abencerragem Candente, em 26 de Novembro de 1970; pertencia à CART 2715, unidade de quadrícula do Xime, que integrava o BART 2917, chegado há poucos meses ao Setor L1 (Bambadinca). 

Foto (e legenda): © David Guimarães (2005). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. Parece que ainda estou a vê-lo... O Cunha, o Joaquim de Araújo Cunha, o pequeno e valoroso Cunha, ainda com o seu ar de criança tímida, era o único dos seis corpos que não estava desfeito pelos rockets. (*)

Tinha apenas um fiozinho de sangue na testa: o primeiro tiro fora, seguramente, para ele que ia à frente da secção, juntamente com o nosso guia e picador Seco Camarà (que veio connosco de Bambadinca). A imagem que retenho dele, era de alguém que caíra, exausto, em cima do capim, na berma do trilho... Quando cheguei à sua beira, ainda lhe dei uma bofetada, sacudindo-o energicamente: "Acorda, meu sacana!"... Em redor a maior carnicifina que vi na minha vida... Trouxemos os restos mortais dos nossos camaradas em trouxas feitas com os ponchos... O Cunha foi o único veio às costas, do Abibo Jau,  o "bom gigante" da CCAÇ 12 (e depois da CCAÇ 21)  que o PAIGC irá fuzilar em 1975, juntamente com o seu comandante, o ten  'comando' graduado Abdulai Jamanca.

Em tempos fomos contactados por uma sobrinha do Cunha, que nos deixou este comentário no poste P9863, de 8 de maio de 2012 (mas, lamentavelmente,  não temos o seu email ou o seu nº de telemóvel):

"Sou Sobrinha do Fur Mil Joaquim de Araújo Cunha. Apesar da mágoa, a minha mãe gostou muito de ler estas palavras e perceber que era acarinhado pelos colegas. Temos, ainda, guardadas todas a fotografias pelo que teremos todo o gosto em as partilhar. Obrigada. Cumprimentos para todos". .11 de março de 2015 às 22:14. 

Não sei como voltar a evocar esta trágica efeméride (**), a não ser republicando uma  versão (ligeiramente modificada) de um  dos poemas que escrevi há uns anos sonre etsa tragédia (***).

Choro para uma morte anunciada!


por Luís Graça


Em memória  
de todas as vítimas 
da Op Abencerragem Candente,
Xime, 26/11/1970,
 em memória do Cunha (1948-1970),
em memória dos demais camaradas da CART 2716, 
caídos em combate, nesse dia e local,
o Ribeiro, o Soares, o Monteiro, o Oliveira,
em memória do nosso guia e picador Seco Camará,
em memória do Amaro dos Santos (1944-2014),
em memória de todos nós, afinal,
que lá morremos todos um pouco...



Esquecer a Guiné, camarada!,
a salada de atum, cebola e tomate,
que vai ser a tua última ração de combate,
e o copo de vinho verde tinto
que tomas de um trago do teu cantil de fel
e o último cigarro
que partilhas connosco,
nharros de 1ª classe, 
tu,  camarada e amigo, ainda "pira",
que não sabes que vais morrer,
à hora marcada, 
às 8h50…

Um, dois,  três, quatro, cinco, seis homens
vão morrer daqui a três ou quatro horas,
às 8h50,
em vinte e seis de novembro de mil novecentos e setenta,
no cacimbo da madrugada,
na antiga picada do Xime-Ponta do Inglês.
Cinco brancos e um preto,
a lotaria da morte, em L,
numa emboscada que é cubana, 
numa roleta que é russa,
com os RPG, amarelos, "made in China"...
na corrocel da morte que é, afinal, universal!

Qualquer um de nós, 
que está aqui à volta da mesa,
pode vir a morrer, camaradas,
na próxima hora!, 
galhofas tu, com um sorriso amarelo,
para exorcizar os teus medos,
os nossos medos todos juntos, de "piras" e "velhinhos"...

Ou nem isso,
um gajo que se preza,
não fala da morte na guerra, 
às 3 horas da madrugada,
no Xime de todas as batalhas,
a caminho do vespeiro da Ponta do Inglês,
indo exatamente pelo mesmo trilho da véspera,
porque não há outro, di o Seco Camará,
e os olhos e os ouvidos e a boca dos irãs do Xime
não estão do teu lado, pobre tuga,
que vais morrer a cinco mil quilómetros da tua terra,
lá no teu verde Minho, 
tu que nunca mais irás de Barcelos a Viana,
em noite de romaria!

Camaradas, 
qualquer um de nós pode lerpar
na próxima saída para o mato,
ou até com os cornos enfiados no abrigo,
porque há sempre uma hora para morrer.
De um tiro no coração,
de um roquetada, 
de uma canhoada,
de uma mina antipessoal, 
do despiste de um Unimog,
de um ataque de abelhas assassinas,
da picadela mortal da cobra verde, 
da explosão de uma granada de morteiro
ou até de paludismo cerebral
ou de simples morte súbita,
fulminado por um raio dos irãs irados,
debaixo do poilão onde dormes com a tua bajuda... 

Esquecer a Guiné, camarada!,
o teu jovem capitão de artilharia, 
vinte e tal anos,
acabado de sair da Academia Militar,
que se recusa a sair com os seus homens
para a Ponta do Inglês…
E o safado do segundo comandante do batalhão
que lhe manda dizer, alto e som,
pelo altifalante da parada:
"O nosso capitão vai e torna a ir,
nem que seja a reboque de uma GMC!"...

Esquecer a Guiné, camarada,
nem que seja por uma noite,
por esta noite 
em que um de nós,  quatro,  
que estão aqui à volta desta mesa tosca, 
vai morrer!

O sabor a sangue e a merda
que a vida aqui tem,
aos vinte e poucos verdes anos,
a merda da Guiné,
a merda verde rubra do Xime,
a merda que te cobre o corpo e a alma,
é muito mais do que a merda toda,
das bolanhas, das lalas e do tarrafo

do Geba e do Corubal!
Podes lavar-te todos os dias,
mesmo que não morras amanhã, 
à hora aprazada,
às 8h50,
que essa merda nunca mais te sai,
nunca mais te sairá, 
nunca mais te sairá do corpo e da alma!
Podes até trocar de camuflado,
de bandeira,
arrancar a pele,
trocar a G3 pela Kalash,
venderes a alma ao diabo,
essa merda que te vai matar,
está te entranhada, 
no corpo e na alma, 
até ao tutano!
Vais levá-la para a eternidade, 
mesmo que sejas cremado a mil e tal graus centígrados.

Quem foi o idiota que  disse 
que descansarás em paz, camarada,
e que a terra da tua pátria te seria leve ?!

Meu pobre camarada, 
meus bravos camaradas,
meu Deus,
que pedaço de inferno foi este
que nos coube em vida,
nesta terra?!

Última versão: 26/11/2022


2. Op Abencerragem Candente: há 52 anos atrás  terá sido a mais sangrenta das operações realizadasa no subsetor do Xime, durante a guerra colonial,  de que na altura tínhamos  registo e memória, no sector L1 (Bambadinca). Dela resultaram pesadas baixas para as NT: 6 mortos e 9 feridos graves:

(i) Da CCS/BART 2917, ao serviço da CCAÇ 12: guia e picador Seco Camará, assalariado, trabalhando sobretudo com a CCAÇ 12; está sepultado em Nova Lamego:

(ii) Da CART 2715 / BART 2917 (Xime, 1970/72):

- Furriel Mil Mec Auto Joaquim  Araújo Cunha, nº mec 14138068; sepultado em Barcelos;

- 1º Cabo Atirador José  Manuel  Ribeiro, nº mec 18849069; sepultado em Lousada.

- Soldado Atirador Fernando Soares,  nº mec 06638369; sepultado em Fafe;

- Soldado Atirador Manuel Silva Monteiro, nº mec 17554169; sepultado em em Condeixa-a-Nova;

- Soldado Atirador Rufino Correia Oliveira, nº mec  17563169; sepultado em Oliveira de Azeméis...

Dos feridos graves (9), helievacuados em Madina Colhido, não temos infelizmente registo dos seus nomes, tirando o sold Sajuma Jaló (apontador de bazuca do 4º Gr Comb/CCAÇ 12, onde eu ia integrado, como comandante de secção). 

A emboscada, em L, possivelmente enquadrada e/iu comandada por cubanos, apanhou na "zona de morte"  os 3 Gr Comb do Agr C [ CART 2715] e 1 Gr Comb (4º) do Agr B [CCAÇ 12]. Estiveram envolvidos nesta operação 3 agrupamentos, 8 grupos de combate, cerca de 250 homens em armas.

"O ataque durou cerca de 20 minutos, sendo a retirada do IN apoiada com tiros de mort 82 e canhão s/r (!) que incidiram sobre a antiga estrada Xime-Ponta do Inglês, e especialmente sobre os 2 últimos Gr Comb (1° e 2º) da CCAÇ 12, assim como rajadas enervantes de pistola-metralhadora, de posições que ainda não se haviam revelado, nomeadamente de cima das árvores." (Fonte: poste P1318).

_____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 27 de novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16765: Manuscrito(s) (Luís Graça) (102): Para ti, camarada, que ainda não sabes que vais morrer, às 8h50 da madrugada do dia 26 de novembro de 1970...

(**) Último poste da série de 17 DE NOVEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23792: Efemérides (376): Inauguração de um Monumento aos Combatentes do Ultramar de Vitorino das Donas (Ponte de Lima), realizada no dia 12 de Novembro (António Mário Leitão, ex-Fur Mil)

(***) Vd. poste de 27 de novembro de  2021 > Guiné 61/74 - P22756: O nosso blogue por descritores (5): duas dezenas de referências à "Op Abencerragem Candente" (subsetor do Xime, 25-26 de novembro de 1970: um banho de sangue, com 6 mortos e 9 feridos grave, do lado das NT )

sexta-feira, 8 de março de 2019

Guiné 61/74 - P19561: XIV Encontro Nacional da Tabanca Grande, Palace Hotel de Monte Real, 25 de Maio de 2019 (2): Duas baixas de vulto, o David Guimarães (ex-fur mil MA, CART 2716, Xitole, 1970 / 72) e a sua esposa Lígia, um casal histórico de grã-tabanqueiros, residente em Espinho, que, pela primeira vez, desde 2006, falha à chamada!... Mas já temos as primeiras 18 inscrições...



Montemor-o-Novo > Ameira > I Encontro Nacional da Tabanca Grande > 14 de outubro de 2006 >  Dois históricos da nossa tertúlia, assinalados a amarelos,o David Guimarães e a esposa Lígia, que vivem em Espinho. (*)

Fotos (e legenda): © Luís Graça (2006) . Todos os direitos reservados. (Edição: Blogue Luís Graça &  Camaradas da Guiné).


Leiria > Monte Real > XIII Encontro Nacional da Tabanca Grande > 5 de maio de 2018 > Os nossos 'totalistas' David e Lígia Guimarães (**)... Eram, até então, o único casal que tinha ido a todos os nossos 13 encontros, a começar pela Ameira, em Montemor-O-Novo (2006)... Por isso, a Lígia passou a  figurar, com todo o mérito, na lista dos membros da Tabanca Grande, com o nº 643 (***)

Foto (e legenda): © Luís Graça (2018). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentário de David Guimarães (ex-fur mil, MA, CART 2716, Xitole, 1970/72), ao poste P 19492 (****):

Azar!!!!...

Dentro dos convívios da querida Tabanca Grande (, para mim é!), nunca faltei a nenhum deles, desde a Ameira [, em 2006,]  e por aí fora. Dei as voltas todas,  fiz todas as ginásticas e lá estive eu, em todos [os 13 encontros nacionais d Tabaanca Grande realizados até a 2018]... Não me achava eu assim tão importante, achava que a causa é que era importantíssima.

Havia no entanto sempre uma data em que me era impossível ir, o último sábado de Maio,  por uma razão bem simples: aqueles que comigo lutaram, da CART 2716 a que pertenci, e alguns por aí a conheceram e bem, combatentes que, como por exemplo os da CCAÇ 12,  nos iam levar os comes & bebes ao Xitole. 

Toda esta companhia, a CART 2716, resolveu junto comigo, há muitos anos, ter sempre o convívio no último sábado de Maio (*****). Que justificação daria eu a quem lutou ao meu lado alinhar noutra companhia ou trocá-los ?!

"Lixei-me e bem lixado", eu que queria nunca faltar, desta vez foi isto que calhou. E fica já marcado como lá consta e pronto, quem quiser vem, quem não puder não vem, o  que é que  se há-de fazer?!...

Tive azar, o primeiro azar dentro dessa magnífica Tabanca!... Afinal o factor presença é importante de facto. Sei que seremos todos iguais, ou não ?!. Fiquei triste, muito triste, e agora?!...

"David,  é para aprenderes mas conscientemente não podes faltar àqueles que combateram contigo, isso nunca...."

Azar, dos 365 dias do ano de 2019,  foram logo acertar no único em que eu não posso ir de todo!...  Enfim como que saio derrotado na minha teimosia em ir a todos, agora não vais, disse-me a consciência, e a razão é... o dia apontado,  vinte e cinco de Maio.

David,  que pela 1ª vez assina a falta e diz porquê! 


2. Nota dos editores:

Lígia e David, estamos desolados.... mas não é nenhum tragédia!... Vocês estão vivos e recomendam-se!... Em contrapartida,  não são deuses, não têm o dom da ubiquidade, não podem estar em dois sítios ao mesmo tempo!...

Há, de facto, um conflito de agenda, todos os anos, e alguns dos nossos grã-tabanqueiros têm que fazer a dolorosa opção: estar em Monte Real ou no local do convívio anual da sua unidade ou subunidade...

De qualquer modo, o vosso recorde é histórico e imbatível, enquanto "casal totalista" dos nossos 13 primeiros encontros... Obrigados pela vossa fidelidade, amizade e camaradagem... Oxalá possamos para o ano voltar a reunir-nos, e desta vez em data compatível com a vossa agenda. Iremos brindar à vossa saúde, no nosso próximo encontro em Monte Real, marcado para o dia 25 de maio de 2019, sábado.

Aproveitamos para publicar a lista das 18 primeiras inscrições. 

Recorde-se que as inscrições no encontro e os pedidos de reserva no Palace Hotel Monte Real devem ser dirigidas ao nosso coeditor e membro da comissão orgnizadora Carlos Vinhal (Leça da Palmeira / Matosinhos):

carlos.vinhal@gmail.com



AS 18 INSCRIÇÕES NO XIV ENCONTRO NACIONAL DA TABANCA GRANDE

António João Sampaio e Maria Clara - Leça da Palmeira / Matosinhos
António José Pereira da Costa e Maria Isabel - Mem Martins / Sintra
António Martins de Matos - Lisboa
Carlos Vinhal e Dina - Leça da Palmeira / Matosinhos
Joaquim Mexia Alves - Monte Real / Leiria
Lucinda Aranha e José António - Torres Vedras
Luís Graça e Maria Alice Carneiro - Lourinhã
Luís Paulino e Maria da Cruz - Lisboa
Manuel José Ribeiro Agostinho e Elisabete - Leça da Palmeira / Matosinhos
Miguel e Giselda Pessoa - Lisboa
_____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 15 de outubro de  2006 > Guiné 63/74 - P1177: Encontro da Ameira, Montemor-o-Novo, em 14/10/2006 : foi bonita a festa, pá!... A próxima será em Pombal (Luís Graça)

(**) Vd. poste de 6 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18610: XIII Encontro Nacional da Tabanca Grande (20): Monte Real, sábado, 5 de maio de 2018: mais caras, "novas" e "velhas"... É uma alegria ver gente desta geração que faz 100, 200, 300, 400, 500 quilómetros ou mais (ida e volta) para se encontrar e "matar saudades"... Outros vêm pela primeira vez à procura dos camaradas da Guiné...

(***) Vd. poste de 23 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14511: X Encontro Nacional da Tabanca Grande, Palace Hotel de Monte Real, 18 de abril de 2015 (17): Distribuição de Certificados aos tertulianos totalistas dos 10 Encontros nacionais e admissão de duas novas tertulianas: Graciela Santos (hnº 682) e Lígia Guimarães (nº 683)

(****) Último poste da série > 12 de fevereiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19492: XIV Encontro Nacional da Tabanca Grande, Palace Hotel de Monte Real, 25 de Maio de 2019 (1): Primeiras informações e abertura das inscrições (A Comissão Organizadora)

(*****) Vd. poste de 5 de jullho de 2007 > Guiné 63/74 - P1924: Convívios (20): CART 2716 (Xitole, 1970/72), em Fátima, no dia 26 de Maio último (David Guimarães)

terça-feira, 21 de março de 2017

Guiné 61/74 - P17166: In memoriam (280): Manuel Fernandes Oliveira, ex-sold aux coz, CART 2716 / BART 2917 (Xitole, 1970/72): o funeral é amanhã,. 22 de março, 16h30,. em Serzedelo, Vila Nova de Famalicão



1. Mensagem de Benjamim Durães, ex-fur mil op esp, CCS/ BART 2917 (Bambadinca, 1970/72), com data de hoje, às 17h24: 

Boas Tardes,

Acabo de receber a triste notícia de mais um nosso camarada, o Manuel Fernandes Oliveira, ex-Soldado Auxiliar de  Cozinheiro, que faleceu ontem,  dia 20 de março, e  vai ser sepultado amanhã,  dia 22, em Serzedelo, Vila Nova de Famalicão. O Oliveira era de 1948.
Paz à sua alma.
Um abraço de pesar para a família e para os ex-camaradas da CART 2716, Xitole, 1970/72, que pertenciam ao meu batalhão, o BART 2917.

Benjamim Durães
___________________

Nota do editor:

segunda-feira, 25 de abril de 2016

Guiné 63/74 - P16014: Agradecimento: David Guimarães, ex-Fur Mil Art MA da CART 2716, a propósito do seu aniversário ocorrido ontem, dia 24 de Abril

A pedido do nosso camarada David Guimarães, (ex-Fur Mil, At Inf, MA da CART 2716, Xitole, 1970/1972), publicamos o seu postal de agradecimento pelas mensagens de parabéns a ele enviadas a propósito do seu aniversário ocorrido ontem, dia 24 de Abril.


sábado, 10 de maio de 2014

Guiné 63/74 - P13126: Convívios (593): XVIII Almoço do pessoal da CART 2716 (Xitole, 1970/72), dia 31 de Maio na cidade do Porto (José Martins Rodrigues)

A pedido do nosso camarada José Martins Rodrigues (ex-1.º Cabo Aux Enf.º da CART 2716/BART 2917, Xitole, 1970/72) em mensagem de hoje, 10 de Maio de 2014, damos notícia do 18.º Almoço/Convívio do pessoal da CART 2716:


CART 2716

18.º ALMOÇO CONVÍVIO – 2014 – PORTO 

ESTIMADO AMIGO E EX-CAMARADA DE ARMAS 

Honrando uma já longa tradição de que muito nos orgulhamos, vamos festejar esta “família” que a nossa estadia Guiné ajudou a nascer. A cada ano, este um é dia único e muito especial porque transforma os nossos rostos em sorrisos abertos de alegria pelo reencontro e os nossos abraços são cúmplices de uma sincera, leal e fraterna Amizade.

Desejamos sinceramente que todos se sintam motivados a alegrar este nosso almoço convívio que se vai realizar no próximo dia 31 de Maio (sábado) na cidade do Porto.

O repasto terá início pelas 13horas no Restaurante “O Assador Típico” na rua D. Manuel II nº 22, junto ao Museu Soares dos Reis, a pouca distância do Palácio de Cristal e próximo das traseiras do Hospital de Santo António.

Cumprindo o nosso tradicional roteiro gastronómico, da ementa constará, como entrada, as inevitáveis Tripas à moda do Porto e o repasto será de churrascos e grelhados de diferentes peixes e carnes e suas guarnições.

O local da concentração será a partir da 10horas na rua D. Manuel II, junto da entrada principal do Palácio de Cristal. O estacionamento terá que ser encontrado nas ruas próximas do restaurante e do local concentração e para quem optar por estacionamento no privado Cristal Parque, defronte do restaurante, este oferece duas horas de estacionamento gratuito.

O nosso muito estimado e respeitado Capitão Espinha de Almeida irá, como é seu habitual desejo, dirigir-nos algumas palavras de estímulo. De seguida, serão distribuídas as lembranças alusivas ao Convívio.

Faz deste dia uma festa e trás a tua família para partilhar connosco as vivências da nossa experiência em terras da Guiné.

Inscreve-te até ao dia 25 de Maio, pelos telefones: 
Santos - 229 812 148 
Rodrigues – 229 517 464
Guimarães – 227 345 236 
Faria - 252 942 314 


RESTAURANTE ASSADOR TÍPICO I

ENTRADAS: 
RISSÓIS, CHOURIÇO, TOSCANA, ROJÕES, MOELAS E TRIPAS A MODA DO PORTO.

PRATO DE PEIXE: 
MISTO DE PEIXES; BACALHAU NA BRASA, LULAS GRELHADAS E SALMÃO NA BRASA. 

PRATO DE CARNE: 
MISTO DE CARNES: POSTINHA DE VITELA, ENTRECOSTO, COSTELINHAS E FRANGO. 

SOBREMESA: 
DOCE DA CASA, FRUTA LAMINADA. 

BEBIDAS: 
VINHO VERDE, VINHO MADURO, ÁGUA, SUMOS E CERVEJA. 

CÁFE E DIGESTIVO.

BOLO COMEMORATIVO E ESPUMANTE. 

Preço por pessoa – 20 euros 
Crianças entre os 5 e os 10 anos – 10 euros 

CONTACTO: 222015149 
RUA D. MANUEL II, 18/26 
4050-342 PORTO

Se tiveres dificuldade em encontrar o local liga para: Rodrigues - 967 409 449

____________

Nota do editor

Último poste da série de 8 DE MAIO DE 2014 > Guiné 63/74 - P13112: Convívios (592): XXIX Almoço anual da CART 3494, comemorativo do 40.º aniversário do regresso, dia 7 de Junho de 2014 em S. Pedro de Moel

sexta-feira, 25 de abril de 2014

Guiné 63/74 - P13037: Convívios (586): VIII Encontro/Convívio do pessoal da CCS do BART 2917, dia 24 de Maio de 2014 em Torreira (Benjamim Durães)


1. O nosso Camarada Benjamim Durães, que foi Fur Mil Op Esp/RANGER do Pel Rec Inf, CCS/BART 2917 – Bambadinca -, 1970/72, solicitou-nos a publicação do seguinte convite para a festa do convívio anual do BART 2917 e unidades adstritas:

8º ENCONTRO-CONVÍVIO DA CCS / BART 2917
DIA 24 DE MAIO DE 2014
JARDINS DA RIA
QUINTA DO COCHEL – MURANZEL – TORREIRA  


O 8º Encontro-convívio da CCS do BART 2917 é extensivo a todas as unidades que operaram sob o comando do BART [Cart 2714, 2715 e 2716, CCaç 12; Pel Caç Nat 52, 53 e 63, Pel Rec Daimler 2206 e 3085, Pel Mort 2106 e 2268, Pel Intend A/D 2189 e 3050, 20º Pel Art/GAC 7 e Pel Eng do BENG 447 de Bambadinca], seus familiares e amigos, e será no dia 24 de Maio de 2014, no EMPREENDIMENTO JARDINS DA RIA – QUINTA DO COCHEL, MURANZEL, TORREIRA, situado na estrada nº 327, a cerca de 7,5 kms da Praia e cidade turistica da Torreira, na direcção Torreira/S. Jacinto (coordenadas GPS - N 40.7180671º -  W 8.7077497º), com a concentração a partir das 09h00. 

EMENTA
BUFFET DE ENTRADAS
Rissóis de Camarão, pataniscas, pastéis de bacalhau, Lulinhas estufadas, peixinhos fritos com molho criativo, bola de carne, azeitonas temperadas, orelheira de coentrada, pezinhos de porco, croquetes, carapauzinho frito, pão d'alho, pizza.
BUFFET DE SALADAS E FRIOS
Camarão ao natural, paté de sapateira, sapateira, alface, primavera, tomate.
BUFFET DE QUENTES
Sopa, camarão à africana, massada de marisco, amêijoa à Bolhão Pato, amêijoa à espanhola).
BUFFET DE PRINCIPAIS
Arroz de marisco, feijoada de marisco, grelhada de peixes variados, misto de carnes na brasa.
BUFFET DE SOBREMESAS
Fruta laminada, doces de colher, bolos diversos.
LANCHE
Idêntico às entradas, caldo verde, bifanas.
Bolo comemorativo e espumante.
BEBIDAS
Águas, refrigerantes, vinhos da casa, cerveja e café. 

RESPOSTA, O MAIS TARDAR, ATÉ DIA 10 DE MAIO

Nota:
Saindo nas Portagens em Estarreja, segue em direcção à Murtosa e depois em direcção à Torreira e em última instância segue em direcção a S. Jacinto sempre pela N327 junto à Ria. Passa a Torreira em direcção a S. Jacinto e vai encontrar mais ou menos 4 kilometros depois a Pousada da Ria do seu lado esquerdo. Mais ou menos 200 metros à frente encontra uma Rua à direita e vira segue em frente e está no complexo Jardins da Ria que se situa na Rua B, Quinta do Cochel 3870-301 Murtosa. Vindo da A29, sai em Ovar Norte e segue em direcção à Torreira/ S. Jacinto e o processo repete-se. 

Os aperitivos terão início às 10h45, com o almoço às 13.00 horas, conforme ementa. O lanche-ajantarado terá início pelas 17h30. O custo do Encontro-Convívio é de 30,00 Euros para adultos e 15,00 euros para crianças dos 04 aos 09 anos. 

Gratuito até aos 3 anos. Para quem quiser pernoitar neste Hotel, o custo é de 55 euros por quarto de casal (preço especial). 

A reserva terá de ser efectuada directamente pelos interessados para aquela unidade, o mais cedo possível.  

Se necessário, contactar com os organizadores. 

Solicita-se a confirmação das presenças no convívio, o mais tardar, até dia 10 de maio:
JOSÉ A. ALMEIDA – Telemóvel 969 872 211 ou email: jotarmando@gmail.com
PAIS DA SILVA – Telemóvel 968 635 665 ou email: antoniodamas1948@gmail.com BENJAMIM DURÃES – Telemóveis 939 393 315 e 93 93 93 939 ou email: duraes.setubal@hotmail.com

A Organização agradece desde já a todos os camaradas a melhor colaboração no cumprimento dos prazos.
Um abraço,
___________
Nota de M.R.: 

Vd. último poste desta série em:

24 DE ABRIL DE 2014 > Guiné 63/74 - P13033: Convívios (585): XXXI Almoço do pessoal da CCCAÇ 2317 / BCAÇ 2835, dia 7 de Junho de 2014 em Penafiel (Joaquim Gomes Soares)

domingo, 5 de janeiro de 2014

Guiné 63/74 - P12544: Estórias do Xitole (David Guimarães, ex-fur mil, CART 2716, 1970/72) (6): Armadilhe-se tudo à volta!... Ou as malditas granadas vermelhas que mataram turras, tugas e macacos-cães...



Guiné > Zona Leste > Setor L1 (Bambadinca) > Xitole > CART 2716 (1970/72) > O Fado da Guerra ou... das Minas e Armadilhas ? Os Fur Mil Guimarães (tocando viola) e Quaresma, ambos sapadores...



Guiné > Zona Leste > Setor L1 (Bambadinca) > Xitole > CART 2716 (1970/72) >  Mina antipessoal PDM-6 reforçada com uma carga de trotil de 9 kg (as barras do lado direito). Detectada e levantada na estrada Bambadinca-Xitole pelo furriel de minas e armadilhas Guiimarães da CART 2716 ("Bem, lá ia uma GMC ao ar, isso sim!!!".)

Fotos: © David J. Guimarães (2005). Todos os direitos reservados.




Guiné > Região do Oio > Mansoa > BCAÇ 4612/72  > Sistema de defesa de um destacamento


Foto: © Carlos Fraga (2011). Todos os direitos reservados.



1. Texto do David Guimarães, residente em Espinho (ex-fur mul, at inf, minas e armadilhas, da CART 2716, Xitole, 1970/1972), um dos primeiros camaradas a aparecer, a dar cara, a escrever no nosso blogue, nos idos anos de 2005. O primeiro poste que temos dele é de 17 de maio de 2005, e era o nº 20 (Foi você que pediu uma Kalash ?). Este que reproduzimos a seguir foi o  75, de 23 de junho de 2005 (*).

É mais uma das suas estórias do Xitole, escritas no seu português castiço, e que retratam bem o quotidiano de um operacional de uma unidade de quadrícula, mais sendo ele um dos especialistas em minas e armadilhas:


2. Estórias do Xitole (6) > Armadilhe-se tudo à volta!... Ou as malditas granadas vermelhas que mataram turras, tugas e macacos-cães...

por David Guimarães

Quando ocupámos o Xitole, em substituição da CART 2413  que lá se encontrava [, no período de1968/70], procedemos de imediato ao armadilhamento da zona limítrofe do quartel. Foram colocadas muitas minas antipessoais, de fabrico português, com espoletas de pressão, reforçadas com mais cargas explosivas ou não, conforme a maior ou menor importância do local. O objetivo era impedir a aproximação e a infiltração do IN, criando um zona de segurança à volta do quartel...

Também era frequente serem pendurados, no arame farpado, objetos diversos desde latas de coca-cola até garrafas de cerveja, que ao menor movimento tocariam umas nas outras, dando sinal pelo som de que o arame estava a ser mexido... Isto era importante especialmente de noite...

Este processo de alarme e prevenção efetivamente só ajudou a, de início, apanhar-se alguns sustos, pois que não funcionava na prática, como devia de ser. Enfim era a fé de cada um… Um sistema de segurança altamente falível, pois que todos os dias tínhamos barulhinhos esquisitos, o que era natural....

Quanto às minas e armadilhas, essas, sabíamos que estavam muito bem colocadas e, essas sim, davam uma certa segurança... Apesar de tudo eventualmente fazíamos armadilhamentos temporários, a mais longa distância, usando para isso a granada armadilha instantânea que qualquer combatente da Guiné conhecia.

Todas as granadas eram formadas por cápsula fulminante, 3 cm de cordão lento e um detonador que fazia explodir a carga base... Todos nós nos lembramos da mina defensiva, de composição B, e do seu uso, bem como das ofensivas, cilíndricas, de carga de trotil (TNT).

A que estou a referir era exactamente cilíndrica, como a ofensiva, só que enquanto as outras tinham a cor verde azeitona, esta era vermelha e mais de metade era envolta com espiral de metal. A maior diferença, e por isso se chamava instantânea, era não ter os três cm de cordão lento. O percutor, acionado, logo fazia explodir o detonador e a carga base. Esta mina era altamente mortífera devido ao seu poder de fragmentação, provocado pelas espiras em aço.

Bem, mas isto não é uma aula sobre minas e armadilhas. Serve apenas para contar uma estória, do início também da nossa comissão.... Uma estória de guerra ou uma contrariedade.

Um camarada nosso, o [fur mil minas e armadilhas] Quaresma, lá foi para o mato com um pelotão para colocar uma dessas granadas instantâneas num trilho. Tudo feito como devia ser, a mina colocada estrategicamente na base de uma árvore de copa frondosa e arame de tropeçar a atravessar o trilho. Era a assim que mandavam as regras aprendidas, teoricamente, em Tancos...

Bem, pelas 4 da manhã (e na Guiné, a essa hora, ouvia-se tudo), há um grande rebentamento para aqueles lados da armadilha... Não há dúvida, a guerra fez-nos ser tipo animais:
─ Alto, alguém caiu, alto, alto!!!... ─ Já todos nos mordíamos para ir ver o sucedido.

Pela manhã, bem cedo, aí vai o pelotão de reconhecimento. Aproximação cautelosa ao local, sangue no chão...
─ Boa, que isto funcionou!

Mais sangue ali e acolá e eis que surge a vítima.... Um grande macaco, já morto... E não tinha camuflado!...
─ Ora, foda-se!

A guerra tinha disto...

David J. Guimarães


Em tempo: ironia do destino, o nosso camarada Quaresma acabou por morrer pela acção de uma granada dessas, a instantânea.. [Como já aqui foi contado, na estória do Xitole nº 1]

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Nota do editor:

Postes anteriores da série > 

26 de agosto de 2013 > Guiné 63/74 - P11982: Estórias do Xitole (David Guimarães, ex-fur mil, CART 2716, 1970/72) (5): Uma noite em Tangali com ataque ao Xitole, o quico do furriel Fevereiro e o meu baptismo de... voo em 1971

(...) Era costume nós irmos fazer protecção nocturna à tabancas. Era também uma forma de acção psico... Um dia lá fui eu e o [furriel] Fevereiro a comandar uma secção do 3º grupo de combate. Tangali era o nome da tabanca, a última que estava à guarda do Xitole. Ficava na estrada Xitole-Saltinho (os da CCAÇ 12 muitas vezes passaram por ela). (...)



(...) Um dia, novinhos ainda, piras, com as fardinhas novinhas em folha, aí vamos nós. Sai o 1º Grupo de Combate. Patrulha em volta do aquartelamento para os lados de Seco Braima, o que era normal: acampamento IN. (...)

12 de maio de 2013 > Guiné 63/74 - P11556: Estórias do Xitole (David Guimarães, ex-fur mil, CART 2716, 1970/72) (3): Era do caraças o paludismo

(...) Nós sabemos o que era uma coluna logística, uma operação de reabastecimento, mas outros nem calculam o que seja... O vai haver coluna já era uma grande chatice... Andar até ao Jagarajá, à Ponte do Rio Jagarajá, a pé e a picar, não era pera doce... E depois? Se acaso acontecia mais algo a seguir? (...)

24 de abril de 2013 > Guiné 63/74 - P11456: Estórias do Xitole (David Guimarães, ex-fur mil, CART 2716, 1970/72) (2): Nem santos nem pecadores

(...) Até que enfim!... Acho que sim — não poderá haver tabus e ainda bem que o Zé Neto, o Zé Teixeira, o Jorge Cabral e o Luís são, afinal, os responsáveis por quebrarem o tabu... Falaram de algo que também é guerra... Foi e marcou a nossa guerra: a lavadeira, o cabaço, etc, etc... Ai, ai, ai, que começo a falar demais, ou talvez não... Creio que nunca houve grandes abusos nesse sentido, nunca foi preciso apontar a G3 a nenhuma bajuda, já uns pesos, enfim ... Que mal fazia, se era dinheiro de guerra?!...(...)

(...) Sempre me preocupei, durante a guerra, em contar cá para a Metrópole (era assim que então se dizia) não propriamente as peripécias da nossa vida militar mas as coisas mais belas que encontrava na Guiné: os mangueiros carregados de mangas, os milhares de morcegos que povoavam o céu ao escurecer e ao amanhecer e que dormiam nas árvores, os macacos, as galinhas de mato, etc. Eu achava que deveria poupar a minha família e que esta não teria que ouvir e até viver a guerra em directo: bastava para isso o sofrimento de saber que eu andava por lá (...).

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Guiné 63/74 - P12392: Crónicas das minhas viagens à Guiné-Bissau (José Martins Rodrigues) (8): Último dia nos Bijagós, em Bissau e na Guiné. Até um dia destes

1. Oitavo e último episódio da série do nosso camarada José Martins Rodrigues (ex-1.º Cabo Aux Enf.º da CART 2716/BART 2917, Xitole, 1970/72), dedicada às suas viagens de saudade à Guiné-Bissau, a primeira efectuada em 1998.




CRÓNICAS DAS MINHAS VIAGENS À GUINÉ-BISSAU

A PRIMEIRA VIAGEM - 1998

8 – Último dia nos Bijagós, em Bissau e na Guiné... até um dia destes

Eram as últimas horas em Bubaque e o retorno a Bissau, com a amarga sensação de que estes dias memoráveis na Guiné estavam a chegar ao fim. Como o voo para Bissau seria logo após o almoço, levantámo-nos bem cedo para desfrutarmos de mais umas horas na pequena, mas acolhedora piscina de água salgada. Foi uma manhã muito agradável, na companhia do jovem casal de noivos, e esticada até ao limite do possível antes do apronto final das bagagens e do último almoço nesta ilha.

Enquanto nos deliciávamos com uns mergulhos, apercebemo-nos da chegada do avião que nos levaria de regresso a Bissau. Acabado o almoço, na companhia de todos os hóspedes, ficamos aguardar ainda algum tempo que nos transportassem até à “pista” porque a tripulação da aeronave teria ido almoçar a outro lugar.

Durante a espera dei comigo a pensar que, exceptuando-se as semelhanças da natureza no interior da ilha, esta sociedade animista, fortemente baseada na influência das mulheres, não tinha qualquer registo nas minhas memórias. Esta estadia em Bubaque mostrou-me também uma outra realidade. Conheci uma Guiné que não se sente prisioneira de memórias da guerra, tal como é latente em qualquer pequeno rincão e nos habitantes do seu espaço continental.

Pensamentos! E por falar em pensamentos, é inevitável que nos assaltem alguns receios quanto ao voo para Bissau, já que não é fácil esquecer o atribulado episódio da aterragem que até aqui nos trouxera. Mas, como não havia alternativa, só nos restava confiar nos homens e na máquina.

De novo no jipe lá seguimos a caminho da “gare”, uma pequena construção de tijolos e chapa de zinco, uma torradeira aquela hora do dia para quem se atrevesse a ficar lá dentro. Aqui chegados, fomos surpreendidos pela presença de dois aviões estacionados. Um, era naturalmente o nosso já conhecido velhinho biplano, e o outro era um pequeno mas moderno, elegante e colorido aparelho em que predominava o azul e branco.
Perante a nossa admiração, o condutor do jipe informou-nos de que o aparelho pertenceria ao casal homossexual, que eram também hóspedes do hotel.

Chegara a hora da partida. Para além de nós e da tripulação, embarcaram também dois outros europeus que não conhecíamos, sendo um deles bastante “robusto” e que nos disse depois que era o proprietário do aparelho. Motores em marcha para o aquecimento e feitas as verificações finais o aparelho começa a mover-se lentamente, quando se gera algum burburinho a bordo. Alguém se terá apercebido de que uma nova passageira, que em marcha acelerada se dirigia para o aparelho, fazia sinais para que esperassem por ela. Imobilizado o aparelho, a senhora guineense bastante cansada e ofegante lá subiu e se acomodou num dos lugares ainda vagos. Este episódio fez-me lembrar situações semelhantes que acontecem na minha cidade com os transportes públicos. Tudo resolvido e o avião faz-se à pista. A descolagem decorreu normalmente e o avião deixa Bubaque, sobrevoando a praia que frequentamos e a ilha de Rubane.

Calados, expectantes e ansiosos, rogamos aos céus para que tudo corresse bem. Os últimos minutos da aproximação a Bissalanca foram de alguma turbulência mas, apesar disso, o aparelho tocou a pista com suavidade. Respiramos fundo. Com a recordação sempre presente da aterragem em Bubaque, exclamamos: desta já nos safamos.

Seriam cerca das 15 horas e aqui o calor apertava. Na gare, para além dos ocupantes do aparelho, não se via uma só pessoa. De malas nas mãos dirigimo-nos para a praça defronte da gare para se arranjar um táxi que nos levasse até ao Hotti Bissau. Também aqui era o vazio. Percebi que havia falhado ao imaginar que esse elementar serviço num qualquer aeroporto estaria sempre disponível. Estávamos a conhecer a realidade guineense e a “saborearmos” mais um dos encantos da África. O proprietário do aparelho, atento e percebendo o desconforto da situação em que nos encontrávamos, apressou-se a oferecer-nos boleia na sua viatura que estaria a chegar.

Deixou-nos depois no hotel, desta feita por poucas horas. Aqui instalados, fizemo-nos à magnífica piscina para um resto de tarde de relaxe e da contemplação do bonito enquadramento em que estava integrada. Outros europeus, sobretudo cooperantes, eram a nossa companhia neste hotel que era um pequeno paraíso neste pobre, mas único país. Programamos para marcar o fim da nossa estadia, um jantar no restaurante do hotel e convidamos o Candé a partilhá-lo connosco, aquele a quem passamos a considerar como Amigo e que muito contribuiu para o sucesso desta viagem.
Depois do prolongado jantar era a hora do transporte para o aeroporto, com uma paragem no Lusófono para uma última bebida antes do regresso a casa.

O avião partiu com o meu coração muito apertadinho por tantas emoções, mas de uma coisa eu tinha a certeza; voltarei um dia. Senti que uma semana é sempre muito pouco tempo para um primeiro retorno à terra em que vivemos uma parcela da nossa juventude, aquela fase da vida em que escolhemos e confirmamos as nossas opções para o futuro. Mas apesar disso, e como escreveu um dia a esposa de um amigo, nesta terra é possível num só dia lançar a semente à terra, ver crescer a planta e colher as suas flores. É assim nesta terra, os dias parecem imensos e vive-se docemente sem o stress da vida agitada da nossa sociedade. Aqui, são tantas e tão intensas as emoções que nos envolvem e tão grande o choque com as realidades sociais e humanas, que acabamos por crescer e a aceitar o mundo com as suas diferenças e aprendemos a ser mais tolerantes e solidários. Por isso, quando se vem à Guiné é indispensável trazer na bagagem uma atitude mental de disponibilidade para se aceitar as realidades que vamos encontrar. Não devemos comparar nada. Não comparem os preços nem as condições de higiene, não comparem a qualidade dos transportes nem a qualidade de vida. Não comparem nada, mesmo nada. E sobretudo, aceitem e respeitem os diferentes usos e costumes das diferentes etnias. Não se vem à Guiné para se provar nada. O que aqui me trouxe foi a procura das minhas memórias, dos lugares, das imagens e dos interlocutores das vivências do meu passado. Vim ao encontro da minha juventude. Em troca, recebi afectos que julgava perdidos e as mais efusivas demonstrações de amizade, de respeito e até de gratidão. Vá-se lá encontrar a explicação para esses sentimentos. Talvez até nem seja difícil.

Como algo fica sempre por fazer ou por ver, como a não concretização do ansiado encontro com Galé Djaló, voltarei um dia de coração ainda mais aberto, para rever esta terra e as suas gentes. Para os que me acompanharam nesta viagem, em especial a minha esposa que da Guiné só guardava os aerogramas do nosso tempo de namorados, todos ficaram maravilhados com o povo Guineense.
Abençoada viagem.

Neste momento, em que alinhavo os últimos retoques para dar por finda esta série (8) “CRÓNICAS DAS MINHAS VIAGENS À GUINÉ - A MINHA PRIMEIRA VIAGEM – 1998”, preparo-me para iniciar os contactos para voltar à Guiné em 2012, na minha quarta viagem. A seu tempo, para não correr o risco de ser repetitivo, vos darei um resumo dos momentos mais interessantes do conjunto das posteriores visitas e, por considerar que é no relato da primeira viagem que reside o maior encanto e a magia do reencontro com um passado, que é património da personalidade de cada um de nós.

Zé Rodrigues

Hotti Bissau, acesso à piscina

Deliciosos momentos

Restaurante Asa Branca, último almoço em Bissau

Regresso a Lisboa, paragem no Lusófono com o Candé

A minha primeira viagem à Guiné - 1998 (6) - Vôo para Bissau, estadia e regresso a Lisboa
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Nota do editor

Postes da série de:

17 DE OUTUBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12162: Crónicas das minhas viagens à Guiné-Bissau (José Martins Rodrigues) (1): A asfixiante e inadiável ideia de voltar

24 DE OUTUBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12195: Crónicas das minhas viagens à Guiné-Bissau (José Martins Rodrigues) (2): A minha primeira viagem em 1998

31 DE OUTUBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12226: Crónicas das minhas viagens à Guiné-Bissau (José Martins Rodrigues) (3): A minha primeira viagem em 1998 - A descoberta da nova realidade

7 DE NOVEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12260: Crónicas das minhas viagens à Guiné-Bissau (José Martins Rodrigues) (4): A caminho do Xitole, 26 anos depois

14 DE NOVEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12290: Crónicas das minhas viagens à Guiné-Bissau (José Martins Rodrigues) (5): O dia seguinte no Xitole com as pessoas

21 DE NOVEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12322: Crónicas das minhas viagens à Guiné-Bissau (José Martins Rodrigues) (6): Bubaque, a outra Guiné com sabor a férias
e
28 DE NOVEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12356: Crónicas das minhas viagens à Guiné-Bissau (José Martins Rodrigues) (7): Segundo dia em Bubaque, na descoberta do povo Bijagó

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Guiné 63/74 - P12356: Crónicas das minhas viagens à Guiné-Bissau (José Martins Rodrigues) (7): Segundo dia em Bubaque, na descoberta do povo Bijagó

1. Sétimo episódio da série do nosso camarada José Martins Rodrigues (ex-1.º Cabo Aux Enf.º da CART 2716/BART 2917, Xitole, 1970/72), dedicada às suas viagens de saudade à Guiné-Bissau, a primeira efectuada em 1998.




CRÓNICAS DAS MINHAS VIAGENS À GUINÉ-BISSAU 

A PRIMEIRA VIAGEM - 1998

7 - O SEGUNDO DIA EM BUBAQUE, NA DESCOBERTA DO POVO BIJAGÓ

Após uma noite bem dormida e um pequeno-almoço frugal (os franceses são uns unhas de fome) a pressa era dar uma saltada até à praia, não longe dali. Toalhas ao ombro e chinelos nos pés, fizemo-nos ao caminho aproveitando para apreciarmos a especial beleza de algumas espécies de flores que fomos encontrando.

Continuando, deparamo-nos com uma construção de aspecto bizarro e de gosto duvidoso, ali virada ao canal que nos separa da Ilha de Rubane. Imagine-se uma casa a quem os alicerces cederam e toda a estrutura ficou tombada, como se as janelas ficassem viradas para o “céu”. Estranhamos o aspecto da vivenda, mas logo percebemos que havia sido construída assim mesmo. Quer a casa, quer os jardins estavam no mais completo abandono. Ao que nos disseram depois, teria sido a casa de férias do primeiro Presidente da Guiné, Luís Cabral. O poder e as suas excentricidades, neste pobre país.

Terá sido casa de férias de Luís Cabral

Continuamos o nosso percurso e chegamos a um conjunto de construções com todo o aspecto de ser uma unidade hoteleira. Tratava-se do Hotel Bijagós, com um grande bungalow central que seria a sala das refeições com cozinha anexa e ainda vários pavilhões de construção térrea, implantados nas proximidades. Esta unidade já existiria na era colonial com a finalidade de ser uma “colónia de férias” para Sargentos e Oficiais das nossas Forças Armadas. À época, devia ser um paraíso, hoje um lugar muito tranquilo e quase deserto.

Um pouco mais à frente, acedemos à praia através de um “trilho” em declive e logo deparamos com um grupo de jovens frequentadores locais. O nosso olhar deliciou-se com a imagem de uma praia magnífica. Estendidas as toalhas na areia finíssima e depois de uns mergulhos nas águas cálidas e com ondulação praticamente inexistente, logo percebemos que éramos os únicos brancos por aquelas bandas.

Alguns coqueiros e outras árvores eram o nosso guarda-sol. A pouca profundidade das águas permitiu-nos um passeio ao longo da praia para apreciarmos a paisagem que nos envolvia. Alguns jovens Bijagós acercaram-se de nós, talvez na expectativa de uma qualquer oferta. Uma grande canoa a motor, de pesca, aportou à praia e era esperada por um adulto que entretanto chegara.
Da canoa, foram arremessados vários peixes para o areal que prontamente foram recolhidos. Das palavras trocadas entre um dos tripulantes da canoa com o adulto que recolhera os peixes, pareceu-nos ter ouvido a expressão “brancos na praia”.
Uma saudação, um comentário ou uma exclamação de espanto pela raridade da presença de europeus por aquelas bandas?

Enquanto a canoa de pesca se ia afastando da praia, os nossos olhares distinguiam no horizonte os contornos de outras ilhas.

Regressamos ao hotel para o almoço e percebemos que um jovem casal nos fazia agora companhia. À conversa com esse casal, durante o almoço, a jovem informou-nos ser filha do proprietário do Anura Clube, um outro empreendimento turístico na região de Bula, e que ali estariam em lua de mel. Após o almoço era tempo do planeado passeio, a pé, pela povoação e tabancas próximas, na procura dos sinais da cultura e das tradições daquele povo.

A caminho da povoação e acompanhados de alguns jovens, fomos visitar um local em que estavam “expostas” uma quantidade apreciável de máscaras, estatuetas e outras obras de arte, executadas em diferentes materiais, e que eram certamente muito antigas. Estávamos perante uma das mais conhecidas expressões de arte deste povo animista e, como em anteriores crónicas já citei, com referências em muitos trabalhos de estudiosos sobre as diversas expressões de arte Africanas.
Quase como quem receia tocar em algo sagrado, perguntamos ao respeitável ancião, guardião daquele espólio, quanto poderia custar uma pequena máscara que nos captou a atenção. Delicioso no trato e com um português perceptível, disparou um valor incomportável para nossas exauridas carteiras em fim de “férias”.

Na impossibilidade do negócio, continuamos até à principal “avenida” da povoação, sulcada de canais em resultado de muitas chuvadas e ausência de reparações, que nos conduziria até ao cais de Bubaque. Este era o principal ponto de ligação do arquipélago dos Bijagós com a parte continental da Guiné. As construções próximas do cais eram precárias, pequenos estabelecimentos comerciais e muito pouco movimento naquela hora.
Inflectimos para outra zona da ilha e fomos ao encontro de uma missão católica dedicada ao apoio a crianças, e não só, dirigida por um religioso italiano. Pelo caminho, conhecemos uma jovem, filha de Portugueses emigrados na Bélgica e que, estando na missão em serviço de voluntariado e a preparar uma tese, nos acompanhou até lá.

A missão estava integrada num conjunto urbano com traço colonial e militar e várias das construções estavam a ser utilizadas, nomeadamente pelos serviços telefónicos. Prosseguimos mais para o interior da ilha ao encontro de uma tabanca. Caminhando, fomos abordados por dois jovens, membros de uma cooperativa de artesanato local e que nos propuseram a compra de algumas das esculturas que exibiam. Deixamo-nos seduzir quer pela beleza, quer pelo preço, regateado, e trouxemos para casa algumas peças, de que destaco a escultura de um Irã que representa o espírito dos animistas nas cerimónias e rituais de ligação à natureza.

Levamos depois as peças à presença de uma autoridade tradicional, que através de um carimbo, certificou cada uma delas como sendo autêntico artesanato dos Bijagós. Satisfeitos com as peças e com o preço pago por elas, continuamos o nosso caminho até uma tabanca próxima. Era ainda a época seca e as hortas estavam por cultivar.

O tempo era já escasso e só permitiu observar visualmente alguns pormenores da vida dos Bijagós. Gente hospitaleira, amiga de conversar e que se desloca para a região de Bissau na procura do trabalho que garanta o sustento da família. Imigrantes na sua própria terra, como em tantos outros lugares do Mundo.

Já na saída da tabanca deparamo-nos com um peixe de grande tamanho secando ao sol, espetado numa esteira que servia de vedação a um terreno de cultivo. Até aqui nada de anormal, não fora o cheiro nauseabundo e a quantidade de moscas que o peixe nos “oferecia”.

Cansados, decidimos regressar ao hotel e, aqui chegados, saímos disparados para um refrescante banho. Reunidos depois na esplanada para uma “loira” fresquinha, a tempo de assistirmos à chegada de mais hóspedes. Eram dois cavalheiros de meia-idade. Um deles, exprimindo-se em francês e substancialmente mais alto que o outro, exibia uns trejeitos efeminados. Não tardamos a concluir que se tratava de um casal de homossexuais.
Este pedaço de terra, perdido na costa ocidental africana, era o local ideal para se fugir a olhares indiscretos.

A hora do jantar confirmou, mais uma vez, que o peixe era a base de quase todas as refeições que degustamos, sendo a barracuda o principal sacrificado.

O sol escondia-se já no horizonte por detrás de uma qualquer daquelas ilhas, anunciando a hora do recolher.
Foi um dia cansativo mas enriquecedor, no contacto com o povo Bijagó.

( Continua)

Na esplanada do hotel em Bubaque

Praia em Bubaque

À descoberta de Bubaque

A minha primeira viagem à Guiné-Bissau - 1998 (5) - Estadia em Bubaque, na descoberta do povo Bijagó
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Nota do editor

Último poste da série de 21 DE NOVEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12322: Crónicas das minhas viagens à Guiné-Bissau (José Martins Rodrigues) (6): Bubaque, a outra Guiné com sabor a férias

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Guiné 63/74 - P12322: Crónicas das minhas viagens à Guiné-Bissau (José Martins Rodrigues) (6): Bubaque, a outra Guiné com sabor a férias

1. Sexto episódio da série do nosso camarada José Martins Rodrigues (ex-1.º Cabo Aux Enf.º da CART 2716/BART 2917, Xitole, 1970/72), dedicada às suas viagens de saudade à Guiné-Bissau, a primeira efectuada em 1998.




CRÓNICAS DAS MINHAS VIAGENS À GUINÉ-BISSAU 

A PRIMEIRA VIAGEM - 1998

6 - BUBAQUE (BIJAGÓS), A OUTRA GUINÉ... COM SABOR A FÉRIAS

Depois do pequeno-almoço no Capé (Bafatá), partimos para Bissau a tempo do almoço no Restaurante Asa Branca, propriedade de um alentejano, bem no centro da cidade. Partilhamos o repasto na companhia do nosso amigo Candé, que nos iria acompanhar depois até ao aeroporto para um voo com destino a Bubaque.
Esta parte final da nossa presença na Guiné, com um cheirinho a férias, foi o preço que tive que pagar para as senhoras me acompanharam nesta viagem. Mas, convenhamos que, depois de uns dias tórridos na zona centro/leste do país, impunha-se um pequeno período de relaxe, de usufruto da natureza e do convívio com alguns dos aspectos da cultura deste povo animista, muito conhecido pelas suas esculturas, quase sempre referidas na literatura especializada no estudo das origens desta antiga arte Africana.

Alguns episódios, completamente inesperados e que rodearam esta viagem até Bubaque, iriam transformar-se nos momentos mais agitados de toda a nossa estadia na Guiné. Desde momentos bizarros e rocambolescos, até ao receio pela nossa segurança, de tudo um pouco aconteceu.

Depois das elementares formalidades de embarque, dirigimo-nos para a placa do aeroporto e, de imediato, procuramos visualizar o nosso meio de transporte. Lá ao fundo, um pouco à esquerda, encontravam-se dois helicópteros e um pequeno avião. Saquei da minha Sony e apressei-me a registar imagens das aeronaves. De repente, um agente da autoridade puxa-me por um braço e informa-me que tenho que lhe entregar a cassete vídeo, porque estava a filmar em local proibido. (Para nos situarmos, registe-se que nesta data vigorava em Bissau o regime de partido único).

Tentei, com calma, explicar-lhe que desconhecia a proibição, que não via qualquer risco para a segurança do país, etc. etc. etc.
Não tendo conseguido demover o agente da autoridade, recusei veementemente a entrega da cassete, porque tal significaria perder imagens únicas e irrepetíveis desta viagem à Guiné. Perante a minha recusa e a estupefacção dos meus acompanhantes, o agente levou-me para a esquadra do Aeroporto.

Era a Guiné e a África destes tempos. Fiquei rodeado de alguns agentes da autoridade num espaço exíguo e, fizeram-me sentar numa cadeira. Exigiram-me o passaporte e ameaçavam retirar-me a máquina de filmar. Voltei aos mesmos argumentos, tentando de forma firme, mas respeitadora, explicar-lhes o que significava perder as imagens de uma viagem há tantos anos sonhada. Continuaram irredutíveis. Já não sabia o que mais fazer. Num relâmpago, ocorreu-me a ideia do suborno. Depressa desisti, porque poderia ser pior a emenda que o soneto.

Enquanto isso, lá fora, os meus familiares procuraram, e encontraram, o nosso amigo Candé a quem contaram o sucedido. Apercebo-me da entrada de mais uma pessoa. Era Candé. Coloca-me a mão no ombro e diz-me para estar calmo. Sinto-me agora mais confiante. Até aí, sentia-me perdido e prestes a desistir. Candé, dirige-se aos mais graduados e troca com eles algumas palavras em crioulo. Inesperadamente, diz-me para me levantar e para sair para junto dos meus.

Quando saí daquele abafado espaço, respirei bem fundo, devido ao ar sufocante e ao alívio da situação. Os meus familiares, meio incrédulos, viveram momentos de ansiedade. Candé voltou para junto de nós e, devolvendo-me o passaporte, disse-nos que estava tudo resolvido. Enquanto isso, o avião para Bubaque esperou por nós mais de uma hora.

Informados os pilotos de que estávamos prontos, recebemos indicações para nos deslocarmos para o aparelho. Os inevitáveis abraços ao Candé e lá nos dirigimos ao aparelho. Tratava-se de um mono-motor muito antigo, de dupla asa, pertencente à “ASTRÁVIA” e com capacidade para dez passageiros. Acomodamo-nos.

Tínhamos por companhia dois pilotos na cabine e uma simpática hospedeira, todos eles guineenses. Estávamos a meio da tarde e um calor asfixiante dentro do aparelho. O avião começou a movimentar-se na pista, preparando-se para a descolagem. A cabine de pilotagem não teria porta, o que permitia que os passageiros assistissem aos procedimentos do voo. Do tecto da cabine pendia um qualquer instrumento de medição que os pilotos consultavam. Tudo a postos e o avião descolou normalmente. Poucos minutos depois já estávamos sobre a água e, para além dos bancos de areia, começaram a ver-se os contornos de algumas ilhas. No aparelho, os tirantes que uniam as asas vibravam, mas o voo, de cerca de meia hora, decorria sem grandes oscilações. Os pilotos iam consultando o aparelho suspenso na cabine e tudo parecia bem. Um deles calçava um sapato rasgado na costura do calcanhar e as peúgas eram diferentes.

Viam-se agora com nitidez várias ilhas e sentimos que o aparelho iniciara a descida, apontando na direcção de uma delas. De relance vêem-se várias construções e uma linda praia bordejada de arvoredo, que sobrevoamos em direcção à pista de terra batida. Estávamos longe de imaginar o que nos esperava na aterragem. O avião faz-se à “pista”, desce normalmente e toca suavemente no solo e, de repente, sobe bruscamente aí uns dez metros. A pista começa a ficar curta e ao fundo, termina com árvores de elevado porte. Perante esta inesperada situação, os pilotos “atiram” o avião para o solo com tal força, que todos nós, sacudidos nas cadeiras, soltamos um assustado grito com a violência pancada.

Apesar do grande susto, lá conseguiram imobilizar o avião próximo do fim da pista. O trem de aterragem fixo, era dos rijos. Desde o episódio com a polícia no aeroporto de Bissau, até esta aterragem na ilha de Bubaque, estas “férias” nos Bijagós prometiam.

Num jipe sem cobertura e com os cabelos soltos ao vento, fomos conduzidos até ao “Maiana Village”. Esta unidade hoteleira, propriedade de um casal francês, ficava sobranceira a uma pequena falésia, bem junto ao canal que nos separa da Ilha de Rubane. Estava equipada com vários bungalows individuais, um salão restaurante, uma agradável esplanada e, de uma pequena piscina. No jardim, bastante arborizado, pontuavam muitos lagartos que se deliciavam com as sempre presentes formigas.

Resolvidas as formalidades da chegada, fomos deliciar-nos com um banho na piscina. Na esplanada e enquanto aguardávamos o jantar, comentamos as peripécias deste dia inusitado. Éramos os únicos hóspedes do hotel.

Ao jantar foi-nos servido um prato de massa com “estilhaços” de carne que, como habitual nos franceses, enchia mais os olhos que o estômago. A temperatura por aqui, neste delta com 88 ilhas e ilhéus, é bem mais amena que na parte continental da Guiné. Caiu a noite e, antes de nos recolhermos, decidimos que o dia seguinte seria de descoberta da ilha, das suas gentes e das suas praias.

(Continua)

Pequeno-almoço, despedida do Capé


Avião que nos levará a Bubaque, nos Bijagós

Canal e Ilha de Rubane

Na piscina em Bubaque

A minha primeira viagem à Guiné - 1998 (4) - Despedida do Capé, Bissau e voo para Bubaque (Bijagós)
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Nota do editor

Último poste da série de 14 DE NOVEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12290: Crónicas das minhas viagens à Guiné-Bissau (José Martins Rodrigues) (5): O dia seguinte no Xitole com as pessoas