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terça-feira, 16 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25076: Memórias cruzadas: o que o PAIGC sabia sobre Bubaque, em 1969... "O antigo governador Schulz ia lá de vez em quando, com outros militares e algumas mulheres. O atual governador nunca lá esteve morado. Foi só visitar."...


Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque > 1978  >  O "Palácio do Estado" (hoje, 2024, em completa ruína)... Edifício da época colonial, de arquitetura alemã,conhecido também como "Palácio do Governador"... Do lado esquerdo,  uma outra casa que terá sido construida, para efeito de lazer,  para os oficiais superiores portugueses...  ("Foto tirada pelo médico cirurgião Dr. Luís Tierno Bagulho em 1978, como cooperante, já falecido"). Cortesia de Patrício Ribeiro (*)


Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque > Dezembro de 2023 > O "Palácio do Estado" "ou "Palácio do Governador", hoje uma total ruina...


Foto (e legenda): © Patrício Ribeiro (2024). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


ORGANIZAÇÃO, FORNAÇÃO POLÍTICA E IDEOLÓGICA
2-12-69
Audição de camaradas vindos de Bijagós
(A láspis,no alto da folha,está escrito: "Informações recolhidas pelo camarada Vasco Cabral")


(...) BUBAQUE não tem quartel. Tem lá padres italianos (2) e co-
merciantes cabo-verdianos, que são 4. Um deles, sabe-se de certeza
que é contra o Partido e está como empregado encarregado da
Casa Gouveia em Bubaque. A loja da Gouveia vende tecido, compra
coconote, compra óleo de palma. Vende também arroz.
 

Há 3 tugas que trabalham na fábrica de extração de óleo de 
palma. Esta fábrica pertenceu em tempos aos alemães. Esses
tugas estão armados com armas de defesa pessoal - pistolas.
Estão em Bubaque uns 10 cipaios que se enontram armados 
de carabinas Mauser, mas só usasm as armas em momentos
de serviço. O serviço de vigilância é montado poe 2 cipaios : um que circula 
na ilha eoutro que monta a guarda à Administração. Drante o
dia não usam armas no seu serviço. De noite usam as armas.
Por volta das 10h da noite o cipaio da guarda à Administração
custuma ir dormir. Mss o cipaio que vigia a iha faz  ua roda
até de manhã.

De uma maneira eral as pessoas da ilha são favoráveis ao Partido.







ORGANIZAÇÃO, FORNAÇÃO POLÍTICA E IDEOLÓGICA
3-12-69
Audição de camaradas vindos de Bijagós

(...) 2. BUBAQUE - Está contra o Partido um comerciante cabo-verdiano de     
[nome 
Juca Ferraz que pertence à Pide. Também pertence  à
à Pide um outro empregado cabo-verdiano de nome Alberto
dos Santos.

Cada cipaio trabalha 24 h seguidas: das 7h da manhã de um 
dia às 7h da manhã do dia seguinte.

As tabancas grandes têm um nº de pessoas que oscila



entre 600 e 1 000.

Há um outro elemento favorável ao Partido e que ouvia frequente-
mete as nossas emissões. Trata-se de Luís de Barros, empregado da Casa
Espinheiro [? ] .

Há carreiras turística de avião e de barco que vêm de Bissau para
gente visitar as praias ao fim de semana. Em geral, trata-se de oficiais do Exér-
cito português que aí vão com as suas famílias. Às vezes, alguns, aproveitando
o tempo de férias ou gozando um certo tempo de licença, permanecem 15 dias e
até um mês. Existe em construção ainda uma casa destinada a albergar esses
oficiais. Trata-se de um edifício em  3 blocos, cada um com uns 4 quartos,
o que perfaz um total de 12 quartos. Situa-se à beira-mar.

Há também cerca deste edifício a casa do Governador da Guiné que já
está pronta. Trata-se de uma casa grande com 4 grandes quartos, também


está na praia. O antigo governador Schultz  [sic, Schulz ]   ia lá 
de vez  em quando,
com outros militares e algumas mulheres. O atual governador nunca lá
esteve morado. Foi só visitar. (*)

Uns aspirantes [cadetes ] da Marinha, um grupo vindo 
de  Portugal,  comeram  lá perto por altu- 
ras do mês de março e abril. Comeram numa pensão à beira-mar que é des-
tinada aos turistas e que foi construída pelos alemães. Esta casa pertence
ao Estado, mas é explorada comercialmente por um tal Teodoro Romano Pe-
reira.  Há ainda mais 2 casas semelhantes a esta, que pertencem ao
Estado e onde moram os empregados portugueses da Fábrica de Extração de
Óleo de Palma, em nº de 3, havendo um outro ainda de nome Lourenço de Pina.

  [ Seleção, edição,  transcrição, revsão / fxação de texto, parênteses retos: LG ]

Citação:
(1969), "Informações sobre o Arquipélago dos Bijagós. Organização, formação política e ideológica dos Bijagós", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_41391 (2024-1-16) (Com a devida vénia...)

Fonte: Casa Comum | Instituição: Fundação Mário Soares
Pasta: 07073.128.006 | 
Título: Informações sobre o Arquipélago dos Bijagós. Organização, formação política e ideológica dos Bijagós. | Assunto: Informações de carácter militar, extraídas da audição com os "camaradas" vindos dos Bijagós, sobre Soga, Bubaque, Formosa, Uno, Caravela, Orango, Orangozinho, Canhabaque, Galinhas e Uracane. Organização e formação política e ideológica dos Bijagós, manuscritos por Vasco Cabral. | Data: Terça, 2 de Dezembro de 1969 | Observações: Doc. incluído no dossier intitulado Relatórios 1965-1969. | Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral | Tipo Documental: Documentos.

____________

Nota do editor:

(*) Vd. poste de 15 de janeiro de  2024 > Guiné 61/74 - P25073: Bom dia desde Bissau (Patrício Ribeiro) (32): Os encantos e os mistérios da ilha deBubaque (incluindo o "Palácio do Governador", hoje em total ruína, onde o PAIGC quis matar Spínola)

segunda-feira, 15 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25073: Bom dia desde Bissau (Patrício Ribeiro) (32): Os encantos e os mistérios da ilha de Bubaque (incluindo o "Palácio do Governador", hoje em total ruína, onde o PAIGC quis matar Spínola)

 

Foto nº 1 > Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque > Dezembro de 2023 > Canoa de transporte junto à ilha de Rubane


Foto nº 2A > Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque > Dezembro de 2023 >  A canoa (tipo nhominca) a chegar ao porto

Foto nº 2 > Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque > Dezembro de 2023 > 

Foto nº 3 > Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque > Dezembro de 2023 > Ponte-cais de Bubaque


Foto nº 4 > Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque > Dezembro de 2023 > Canal de Bubaque, de águas profundas


Foto nº 5 > Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque > Dezembro de 2023 > Hotel na zona do palácio ("Hotel Cajou Lodge",  passe a publicidade... ,  acrescenta o editor LG que nunca foi a Bubaque).


Foto nº 6 > Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque > Dezembro de 2023 > Hotel Kasa Afrikana, ao fundo a ilha de Rubane


Foto nº 7 > Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque > Dezembro de 2023 > Vivendas com vista para o mar

Foto nº 8 > Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque > 178 >  O "Palácio do Estado": Foto tirada pelo médico cirurgião Dr. Luís Bagulho em 1978, como cooperante (já falecido). (*)


Foto nº 8A > Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque > 1978  >  O "Palácio do Estado"... Edifício da época colonial, conhecido também como "Palácio do Governador"... Do lado esquerdo, não pode ser a antiga casa de Luís Cabral, construída depois da independência pelos jugoslavos, em estilo pós-moderno...  e que em 2013já estava em ruínas (ver aqui foto do nosso camarada José Martins Rodrigues)


Foto nº 9B > Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque >  1978 >  Muito provavelmente uma "casa de função", para oficiais superiores do exército português, que estava em construção em 1969...

Foto nº 9A > Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque > Dezembro de 2023 > O "Palácio do Estado" "ou "Palácio do Governador", hoje uma ruina...


Foto nº 9 > Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque > Dezembro de 2023 > O "Palácio do Estado" ou "Palácio do Governador"... Ao que parece, o PAIGC chegou a pensar assassinar aqui o Spínola, quando em férias...  


Foto nº 10 > Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque > Dezembro de 2023 > O "Palácio do Estado", frente ao canal, hoje em ruina...


Foto nº 10A > Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque > Dezembro de 2023 > O "Palácio do Estado", hoje uma ruina...

Fotos (e legendas): © Patrício Ribeiro (2024). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Mensagem (e fotos) que nos foi enviada pelo  Patrício Ribeiro (nosso correspondente em Bissau, colaborador permanente da Tabanca Grande para as questões do ambiente, economia e geografia da Guiné-Bissau, onde vive desde 1984, e onde é empresário, fundador e diretor técnico da Impar Lda; tem mais de 130 referências no blogue; autor da série, entre outras, "Bom dia desde Bssau"):



Data - domingo, 14/01/0204, 23:15   | Assunto- Bom dia desde Bissau                                                                                                                                                                              Luís, junto uma fotos... São fotos de dezembro de 2023, durante os meus passeios pela Guiné. Aconselha-se uns passeios pelas águas quentes dos Bijagós, para fugir à chuva e ao frio na Europa.

Em dezembro do ano passado (há umas semanas atrás),  voltei a dar uma volta pela ilha de Bubaque. (**)

Para lá ir, há diversos transportes, de ida e volta, principalmente ao fim de semana, a partir de Bissau, para esta ilha e dali é possível apanhar transportes para as restantes ilhas, onde há alguns hotéis, espalhados por algumas das ilhas dos Bijagós.

Na ilha de Bubaque, há alguns hotéis novos, outros já os conheço há dezenas de anos.

Os principais clientes são franceses (da minha idade) que vêm diversas vezes ao ano, à pesca. Já o fazem há muitos anos.

Logo de manhã, entram nos botes e vão para a pesca todo o dia, nos canais entre ilhas, também há os que compram ou constroem hotéis, ou casas.

Hotéis de famílias portuguesas, já não há.

Tenho pena, do que está a acontecer aos Palácios do Estado em Bubaque (ver fotos). O que era do Spínola (era o nome que me informaram, das primeiras vezes que lá fui). Era ali que PAIGC o ia tentar assassinar, “como dizem”.

Também cheguei a dormir lá.

Assim como o outro Palácio, ou antiga "casa do Luís Cabral", na falésia, construído após a independência, com arquitectura tipo “Jugoslávia”, que não foi possível tirar foto, porque é só mato. (O Rosinha, que informe que arquitetura é esta, ainda existem alguns edifícios, com estas linhas arquitectónicas. )

PS - A foto antiga do Palácio foi tirada pelo médico cirurgião Dr. Luís Bagulho em 1978, como cooperante (já falecido).(*)

Abraço

Patricio Ribeiro
impar_bissau@hotmail.com
__________

Notas doo editor:

(*) Luís Tierno Bagulho: esteve em 1972 Teixeira Pinto, como alf mil médico,  com o nosso camarada António Graça de Abreu (que era do CAOP1). Outros médicos desse tempo: Pio de Abreu (psiquiatra, Coimbra) e Mário Bravo (ortopedista, Porto). 

 Vd. postes:

27 de fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1552: Lançamento do livro 'Diário da Guiné, sangue, lama e água pura' (António Graça de Abreu)



(**) Último poste da série > 20 de novembro de 2023 > Guiné 61/74 - P24867: Bom dia desde Bissau (Patrício Ribeiro) (31): Já estava com saudades de Farim e das canoas de transporte público...

Vd. também poste de:

9 de junho de 2022 > Guiné 61/74 - P23339: Recortes de imprensa (123): Bubaque: alterações climáticas e educação ambiental (Excertos de reportagem de Carla Tomás, Expresso, 18 de abril de 2019, com a devida vénia...)

8 de junho de 2022 > Guiné 61/74 - P23336: Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-Furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) - Parte XXVII: O "meu" regresso à Guiné (3): Os Bijagós que muitos de nós nunca vimos - II (e última) Parte

7 de junho de 2022 > Guiné 61/74 - P23334: Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-Furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) - Parte XXVI: O "meu" regresso à Guiné (2): Os Bijagós que muitos de nós nunca vimos - Parte I

13 de maio de 2014 > Guiné 63/74 - P13136: Memória dos lugares (265): Bubaque, cada vez mais bonita... (Patrício Ribeiro)

12 de maio de 2014 > Guiné 63/74 - P13132: Notas de leitura (590): Bubaque foi uma colónia alemã... antes da I Guerra Mundial (Luís Vaz)

4 de abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8043: Notas fotocaligráficas de uma viagem de férias à Guiné-Bissau (João Graça, jovem médico e músico) (7): Os encantos e as armadilhas das ilhas de Bubaque e Rubane (Bijagós), 11/13 de Dezembro de 2009 (Parte III, o regresso a Bissau)


12 de Março de 2011 > Guiné 63/74 - P7931: Notas fotocaligráficas de uma viagem de férias à Guiné-Bissau (João Graça, jovem médico e músico) (5): Os encantos e as armadilhas das ilhas de Bubaque e Rubane (Bijagós), 11/13 de Dezembro de 2009 (Parte I)

terça-feira, 16 de maio de 2023

Guiné 61/74 - P24319: Homenagem a dois 'guineenses' de adoção e paixão, o algarvio António Camilo e o nortenho Xico Allen (1950-2022): "Diário da Viagem até à Guiné-Bissau por terra e por ela", em 20 dias (Herculano Prado). II (e última) Parte: de 26 de setembro a 6 de outubro de 2017; 11 dias : Bambadinca, Xime, Ponta do Inglès, Ponta Varela, Bafatá, Saltinho, Cussilinta, Quebo, Mampatá, Bafatá, Gabu, Bijagós, Bissau... Lisboa

Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Saltinho > Rio Corubal > Rápidos do Saltinho > 3 de Março de 2008 > Lavadeiras do Saltinho.

Foto (e legenda): © Luís Graça (2008). Todos os direitos reservados. [Edição:  Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Guiné > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque > c. 1973/74

Foto (e legenda): © Rui Vieira Coelho (2014). Todos os direitos reservado. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > O Rio Geba... o estreito (do Xime para montante) e o largo (do Xime para jusante)... c. 1970, no tempo seco... O rio era navegável de Bissau até Bafatá!... Mas normalmente, as embarcações (civis) iam até Bambadinca... As LDG ficavam pelo Xime, mas chegavam a Bambadinca, pelo menos até a 1968... Dois pontos vulneráveis do percurso eram a Ponta Varela (na margem esquerda do Rio, entre a Foz do Corubal/Ponta do Inglês e o Xime), e o Mato Cão (entre o Xime e Bambadinca, no troço serpenteante do Geba Estreito). Foto do álbum do Humberto Reis, ex-fur mil op esp (CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71)

Foto (e legenda): © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados.  [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Guiné-Bissau >  Região de Bafatá > Saltinho > Abril de 2006 > Um olhar de esperança no futuro ?... É, pelo menos, o que gostaríamos de adivinhar neste olhar inocente de uma criança às costas de sua mãe...

Foto: © Hugo Costa (2006). Todos os sireitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Xime > Novembro de 2000 > Da margem esquerda (Xime) à margem direita (Enxalé): a canoa ainda continua a ser um meio fundamental de "cambança"

Fotograma do vídeo A Outra Guiné /The Other Guinea, de Hugo Costa, legendado em inglês. Vídeo (9' 27''). Ficha técnica: produção: Universidade do Porto, 2012; realização: Hugo Costa e Tiago Costa: diretor de fotografia: Hugo Costa; som: Hugo Costa... Duração: 9' 27''. (Deixou de estar disponível "on line", inclusive na página do Facebook do Hugo Costa, possivelmente pela reprodução de músicas sujeitas a direitos de autor.)

Cortesia de Albano Costa e Hugo Costa (2013). Edição e legendagem da imagen: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné

 
Guiné-Bissau > Região de Gabu > Gabu > 16 de dezembro de 2009 > A rua comercial da nova Gabu, onde então já havia banco (agência do BAO - Banco da África Ocidental) e multibanco... Em 2009, a velha "rainha do Gabu" havia já destronado a "princesa do Geba", do nosso tempo, Bafatá, a cidade "colonial" mais encantadora da Guiné... Mudam-se os tempos, mudam-se os lugares: aqui falava-se mais francês do que português, e corriam muitos CFA, escreveu o João Graça, médico e músico, que viajou por estas paragens...  

Foto (e legenda): © João Graça (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné-Bissau > Região de Bafatá   > Bafatá > Abril de 2020 >  Hospital
 
Foto (e legenda): © Patrício Ribeiro (2020) Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Segunda (e última) parte da publicação do diário da viagem à Guiné-Bissau, feita "por terra e por ela" (sic), em 20 dias, de 18 de setembro a 6 de outubro de 2017, por 4 portugueses, em dois jipes, o António Camilo, o Xico Allen, o Herculano Prado e a esposa, Luzinha, prima do António Camilo (que foi fur mil da CCAÇ 1565, Bissau, Jumbembém, Canjambari, Bissau, 1966/68).

O diário, da autoria de Herculano Prado, chegou-me, reencaminhado em 2018, quatro 
 anos antes de morrer, pelo Xico Allen (1952-2022).  

O Herculano Prado, hoje advogado, foi fur mil, CCAÇ 3550 / BCAÇ 3885 (Zambué, Tete, Moçambique, 1972/74). Não é membro da nossa Tabanca Grande, mas já foi convidado para a integrar, não só por esta viagem e a publicação deste texto (em duas partes), como pela ligação (profissional e afetiva) à Guiné (desde pelo menos 2010), e a amizade que criou e manteve com dois dos nossos tabanqueiros, o António Camilo e o Xico Allen (1952-2023).

Depois da morte do Xico, julgámos que seria oportuna a publicação deste "diário" no nosso blogue, partindo do pressuposto que era vontade dele que o texto fosse publicado no nosso blogue, com a anuência (pelo menos tácita) do Herculano Prado. 

Por outro lado, já aqui o dissemos, esta é a viagem que alguns de nós já fizeram, e que a maioria gostaria de ter feito em vida, e que por uma razão ou outra (a começar pelos problemas de saúde e segurança) nunca fez nem já chegará a fazer.

O texto, infelizmente, não veio acompanhado das fotos da expedição. Por esta ou aquela razão, as fotos nunca chegaram. Tivemos de recorrer por isso ao arquivo do nosso blogue. Mais uma vez deixamos aqui a manifestação da nossa gratidão ao Herculano Prado. E damos-lhe os parabéns pela excelència do texto, que ganha em vivacidade, fluência e objetividade (e que por isso seria uma pena ficar na "gaveta"...). 

Enviamos, entretanto, um alfabravo fratermo ao Camilo (de quem não temos tido notícias) desejando-lhe saúde e longa vida para poder continuar a fazer as suas expedições à Guiné-Bissau onde tem casa (em 2017, ao que parece, era a sua 22ª viagem). 

Em comentário do poste P24311 (*), o Carlos Silva, outro conheced0r da Guiné-Bissau,  comentou: "O Camilo, foi à Guiné depois da comissão, antes de 1998. Creio que em 1992 (?). E vários camaradas já lá tinham ido antes do Xico Allen e do Camilo. O Herculano, meu colega, está equivocado neste aspecto".

Por fim, fica aqui uma saudação especial à Inês Allen, que também já fez esta viagem por terra (um pouco mais longa, porque partiu do Porto). A nossa recém-tabanqueira (nº 875) é uma dugna sucedora do espírito aventureiro e solidário do seu pai.

DIÁRIO DA VIAGEM À GUINÉ BISSAU 

POR TERRA E POR ELA

  © Herculano Prado (2017)

8º dia, segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Após uma viagem tão desgastante e sempre a levantarmo-nos cedo, aproveitamos para dormir até mais tarde.

A primeira coisa que fiz foi tomar um antibiótico, porque se acentuou a dor que tinha no ouvido esquerdo, deduzindo que a tontura que tive em Saint Louis era devida a esta infeção.

Depois procurei o telemóvel, que já não via desde que tínhamos partido de Marraquexe, para lhe colocar um cartão local. Tinha-o desligado porque, em fevereiro, quando fizemos um cruzeiro nas Caraíbas, apesar de não ter feito chamadas, quando regressámos a Portugal tinha uma despesa de sessenta euros, gerada pela própria rede. Não o encontrei, nem até agora, concluindo que deve ter ficado em Marraquexe. Não fiquei muito preocupado, porque quando o desliguei retirei-lhe o cartão, para que não fosse ludibriado pelo sistema, colocando-o na pequena carteira que uso, há muitos anos, no bolso das calças. A preocupação, contudo, reapareceu quando constatei que o cartão não estava na carteira, tendo-o perdido ou ficado no bolso dos calções que utilizei durante a viagem. Quando procurei os calções informaram-me que tinham sido levados juntamente com a outra roupa para lavar… O meu azar acabou por se transformar em sorte, porque ainda fui a tempo de recuperar os calções e encontrar o cartão que estava dentro de um dos bolsos.

Depois do almoço, o Camilo levou-nos a visitar a região, tendo passado por muitos locais que marcaram muita da juventude portuguesa dos anos sessenta a 1974. Estivemos na Foz do Corubal com o rio Geba, em Xime, Ponta do Inglês e Ponta Varela. Passamos na Ponte do Rio Udunduma, vendo-se ao lado a do tempo colonial, já em ruinas, por onde passaram milhares de soldados e onde as nossas tropas sofreram muitas baixas. 

Eu, que também fiz a guerra, ainda que em outras paragens, em Moçambique, comovi-me ao visitar sítios que me foram referidos pelo Camilo e pelo Francisco, que cá estiveram na Guerra, pois imaginava o que sentiram e viveram os camaradas de armas que por cá passaram.

A minha mobilização foi para Moçambique, onde estive de Maio de 1972 a Agosto de 1974, integrado na Companhia 3550, pertencente ao Batalhão 3885, sediado no Fingoé. 

A companhia 3550 tinha a sede no Zambué e um destacamento no Zumbo, que distava cem quilómetros da sede. No mapa de Moçambique é fácil localizar o Zumbo, por ser a primeira terra moçambicana a ser banhada pelo rio Zambeze, junto à antiga Vila da Feira, atual Luangwa (15º 37`S, 30º 23` E), na Zâmbia, na foz da margem direita do Rio Aruangua, que divide os dois países.


9º dia, terça-feira, 26 de setembro de 2017

Este dia foi destinado a continuar a visitar os locais mais emblemáticos desta zona, começando por Saltinho e conhecer a casa que o Camilo tem no Clube de Caça, que fica junto à ponte Craveiro Lopes, sobre o rio Corubal, que foi visitada durante a construção pelo General Francisco Higino Craveiro Lopes, Presidente da República, em 1955.

Do Clube de Caça, localizado no antigo quartel da tropa, tem-se uma boa vista sobre a ponte e sobre o rio, que vai com um grande caudal. Do Outro lado do rio tem uma povoação grande ,onde visitei o régulo Suleiman, que foi soldado do meu primo Fernando, alferes Mota, quando cá cumpriu serviço militar. 

No bar do Clube, antigo bar dos oficiais ainda lá encontrámos um quadro de fotos da época feito pelo nosso companheiro de viagem, o Xico Allen, quando por cá passou em 1998. Depois passámos por Aldeia Formosa, atual Quebo, descendo a Buba, aonde almoçamos “ração de combate”, no Hotel da Dona Gabi, que se encontrava ausente para Bissau, utilizando uma das mesas que nos foi cedida, tendo sido recebidos pelo marido. 

De seguida regressámos a casa do Camilo, em Bambadinca, continuando a passar, agora sem riscos, por locais de tão triste memória, para aqueles que aqui fizeram a guerra.


10º dia, quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Mais uma vez nos levantámos cedo para, desta vez, irmos visitar Bissau e para o Camilo e o Francisco tratarem de vários assuntos. O Francisco trouxe duas ofertas de 50,00 e umas canadianas para serem entregues a dois antigos faxineiros, enviadas por dois antigos combatentes. Um deles, numa viagem que fez à Guiné, encontrou um desses faxineiros - em Moçambique chamávamos-lhes “mainatos” -, deficiente motor, que se locomovia encostado a um pau, do qual se condoeu, tendo prometido que lhe enviaria umas canadianas, promessa que foi cumprida, através do Xico Allen.

Durante a estadia, porque o Camilo conhecia o Tenente Coronel Sado e o Engº Agrónomo Constantino, que me tinham sido referidos pelo meu primo Fernando, o ex-Alferes Mota, para lhes apresentar cumprimentos e para lhes pedir ajuda, no caso de necessidade, encontrámo-nos com eles na Pastelaria Império. Foi um encontro agradável, que serviu para troca de cumprimentos e para o Engº Constantino, falar da sua boa experiencia vivida na minha cidade, Vila Real, quando lá frequentou o curso de agronomia. Fiz entrega a cada um de uma garrafa de vinho Cancellus Premium, que trouxe de Bambadinca a contar com um possível encontro, na convicção de que esta oferta seria do agrado do meu primo.

Porque, desde que saímos de Saint Louis, não tive oportunidade de aceder à internet, procurei encontrar um estabelecimento onde fosse possível, o que não consegui na Império, nem na Pensão Coimbra, onde pretendíamos almoçar, tendo, por isso, ido almoçar ao Hotel Ancar (antiga Solmar) aonde, para além de simpático almoço de buffet, consegui aceder ao Citius para consultar os processos que ainda tenho. Tinha uma notificação de um saneador.

Depois do almoço eu e o Francisco mantivemo-nos no bar do hotel, aproveitando a capacidade do Hi-Fi, cuja qualidade era inferior à que tínhamos encontrado no Diamarek de Saint Louis.

O Camilo e a Luzinha chegaram quando estava a começar uma grande ventania, que levantava poeira, mais parecendo que estávamos no deserto. Já tinham tratado da estadia nos Bijagós e comprado a viagem de barco para quatro pessoas. Também já tinham ido buscar o peixe que tínhamos comprado no porto e que tinha ficado para arranjar e para colocar na arca que levámos para esse efeito.

Porque eu pretendia ver o Basileia – Benfica para taça dos campeões, que começava às 18,45 horas locais, e entre Bissau e Bambadinca são 105 quilómetros, tivemos que regressar.

Quando chegámos a Bambadinca procurámos um sitio onde fosse possível ver o jogo, até que encontrámos um barracão onde supostamente daria o jogo, conjuntamente com outros, tendo pago a quantia de 150 francos CFA (um euro vale 650 CFA ), mas não conseguimos passar da entrada tal era a quantidade de pessoas que ali estavam para ver. Dos cinco écrãs que estavam ligados, um era o Sporting – Barcelona e num quinto procuravam um jogo que, provavelmente, seria o do Benfica. Em face destas condições e porque o Camilo só nos iria buscar depois do jogo terminar, eu e o Xico Allen fomos a pé para a casa do Camilo, que distava dois quilómetros.

Antes do jogo terminar, o Camilo disse-me que faltavam dez minutos para terminar o jogo e que o Benfica estava a perder 2 -0. No dia seguinte, quando nos levantámos disse-me que o Benfica perdeu 5-0. Custou-me a creditar…


11º dia, quinta-feira, 28 de setembro de 2017

Saímos por volta das horas 10 horas para visitarmos Bafatá, cidade natal de Amílcar Cabral. Na parte colonial, alguns dos edifícios da época estão a ser utilizados por serviços públicos e outros estão em degradação. O que resta da cidade dá par ver que era uma muito bonita e que foi importante na histõria da Guiné. O Camilo vai-nos fazendo a historia de cada uma das grandes casas, pois ele conheceu a cidade no seu apogeu.

No regresso passámos por Gabu para a Luzinha comprar panos africanos. O mercando nativo é vasto e tem de tudo o que é expetável existir num sitio com muitas limitações.

Infelizmente, comprou muitos tecidos e alguns vestidos nativos…

É uma pena ver que tantos anos após a independência, nada tenha evoluído. A Guiné continua a ser um pais adiado, não se vislumbrando grandes saídas. Mesmos a fonte da sua economia - o caju - pode vir a ser abalada quando as enormes plantações que têm sido feitas no Vietname começarem a inundar o mercado

Não tendo pela Guiné a afetividade que tem aqueles que cá passaram parte da sua vida, tenho pena que a independência, que era inevitável em face das pressões internacionais e do desgaste que a guerra estava a fazer na sociedade portuguesa da época, não tenha trazido vantagens para as populações.

Começo a ter saudades dos meus cinco amigos de quatro patas: a Sacha, uma labradora de 10 anos; o Handy, um Waimaraner de sete anos; a Estrela, uma Serra da Estrela de seis anos; o Aires, um Serra D`Aires de cinco anos e, por fim, o Lobo, um pastor Alemão de nove meses.

Pela primeira vez tive tempo para ler, começando um romance histórico, Vela Sagrada, escrito por um escritor árabe Abdelaziz Al-Mahmoud, situando-se na época em que os portugueses chegaram à India e destabilizaram, não só o comércio de especiarias, que mudaram de rotas, mas também o poder político e militar da região, dominado pelos árabes.

Durante a tarde levantou-se uma ventania a que não estamos habituados, seguida de chuva intensa, que quem viveu na Guiné tao bem conhece.

Antes de nos deitarmos, fizemos a mala para partir no dia seguinte para a ilha de Bubaque, onde ficaremos quatro noites.


12º dia, sexta-feira, 29 de setembro de 2017


Saímos por volta das sete horas para fazermos os 105 quilómetros que nos separam de Bissau onde tínhamos a viagem marcada para Bubaque, às 15 horas.

Antes de partirmos, depois de chegarmos a Bissau o Camilo tratou do que era preciso para fazer uma pintura num dos jeeps. Fomos almoçar à pastelaria e, enquanto fazíamos tempo para a partida para Bubaque, fui tomar café ao Ancar para tentar aceder à Internet, não o tendo conseguido.

Porque pretendíamos marcar o nosso regresso a Lisboa, fomos à TAP, saber dos preços, que ficavam por quantia superior a € 400,00 por pessoa. Como eram muito caros, achamos por bem consultar as duas companhias que cá operam. Uma marroquina, que faz preços mais em conta, mas como teríamos que perder algumas horas em Casablanca acabámos por comprar na Euro Atlantic Airways, por cerca de € 300,00, por bilhete, para o dia 20 o Camilo comprou por cerca de € 150,00.

Depois, porque a Luzinha pretendia comprar uns panos pintados, que fazem quadros de parede, andámos à procura nas ruas perpendiculares à Av. Heróis da Pátria, que começa na Praça do Império e desce atá ao porto. O comercio foi deslocalizado para um parque distante do centro o que veio dar àquelas ruas um abandono ainda maior. Algumas estavam piores do que em 2010, apesar de algumas já estarem alcatroadas.

O palácio do quartel general, situado na Praça do Império, que, quando lá estive, em 2010, estava esburacado de balas, desde a altura em que assassinaram o General Nino Vieira, já está reparado, dando um ar mais digno àquela Praça.

Os bilhetes, que pagámos como residentes, ficaram em 40 000 CFAS, o que equivale a € 62,00.

O barco partiu às 15 horas e chegou às 19 horas, sem sobressaltos, porque o mar estava calmo.

O Xico Allen ficou em Bissau, para tratar de assuntos pessoais.

Depois de atracarmos transportámos a nossa bagagem para a Casa da Dona Dora. O que encontramos era um pouco diferente do que imaginava pelos relatos da Luzinha, feitos através de informações que recolheu do Facebook.

A luzinha, o Camilo e uma helvética que veio connosco no barco e que, também, ficou na Casa da Dona Dora,  foram beber um gim à Kasa Africana, enquanto eu fiquei a tentar pôr o diário em dia.

Deitamo-nos cedo e, contra o que era habitual, dormi razoavelmente.


13º dia, sábado, 30 de setembro de 2017

Por volta das oito horas fomos avisados pelo Camilo para nos despacharmos porque tinha encontrado um amigo, chamado Quintim, que é o diretor do Parque Nacional Marinho de João Vieira e Poilão, que ia em trabalho para uma outra ilha, e que estava à nossa espera para nos levar. Tomámos o pequeno almoço à pressa, nem me deixaram acabar o galão, pois uma oportunidade destas não era para desperdiçar.

No barco fomos várias pessoas, tendo duas ou três ficado numa primeira paragem do barco e nós ficámos numa praia, na Ilha de Canhabaque ou Ilha da Rocha, enquanto os técnicos iam fazer o seu serviço, recuperando-nos no regresso, por volta da hora de almoço.

Quando descemos do barco ficámos encantados com a temperatura da água, ao nível da melhor que já encontrámos, comparando-a com a das Filipinas, Indonésia, Cabo Verde, Caraíbas, Cuba, S. Tomé, por serem as mais quentes aonde já estivemos. Se em Saona, nas Caraíbas, existe a que é considerada a maior piscina natural do mundo, esta praia e a piscina que a rodeia, na ilha de Canhabaque, não lhe fica atrás e a água é incomparavelmente mais quente. Estivemos horas dentro de água e poderíamos continuar indefinidamente pois não chegaríamos a ter nenhuma sensação de desconforto. Uma maravilha! Avançámos pelo mar dentro, sempre com água pela cintura.

O barco recolheu-nos por volta da 13 horas, e quando estávamos na viagem de regresso, receberam um telefonema de um dos técnicos, que iriamos recolher, informando que estava atrasado, tendo-nos sido posta a hipótese de nos virem trazer a Bubaque e depois regressarem , com o que nós não concordámos pelos incómodos que lhes causaríamos e porque, para nós, a espera era a possibilidade de ficarmos mais algum tempo naquelas águas maravilhosas.

Enquanto esperávamos pelo recomeço da viagem, voltámos para a água, que continuava a ter altura da minha cintura, com a variante de os nossos pés pisarem lodo em vez de areia. Aquilo que, inicialmente, parecia um transtorno, porque nos enterrávamos, passou a ser um privilégio quando nos apercebemos de que estávamos a pisar, aquilo a que Luzinha chamou “ uma mina” de ameijoas, combé. Começámos a apanhá-las por distração e, passado pouco tempo, com a colaboração do condutor do barco, apanhámos uma grande quantidade, que acabámos por colocar num saco de supermercado, dos resistentes. 

Num calculo, por baixo, deveríamos ter apanhado mais de dez quilos, que transportámos para a Casa da dona Dora, para comermos no dia seguinte, porque, para o jantar desse dia, já tínhamos encomendado três robalos grandes, grelados, a uma nativa que tinha um grelhador à porta.

Nos primeiros dias de Guiné não teria comido em tal local – uma mesa colocada na rua de terra batida - mas agora, depois de me aperceber de que as pessoas são limpas, apesar da falta de qualidade das habitações, deixei-me dessas esquisitices ou então continuaria a comer “ ração de combate”, na gíria de combatente.

O peixe que foi servido com batatas fritas, salada e pão acompanhado de cerveja, estava bom e foi em quantidade suficiente que deu para quatro pessoas e para uma dúzia de amigos de quatro patas, que interesseiramente nos fizeram companhia. As festinhas que lhes fiz deu para mitigar as saudades, que cada vez são maiores, dos cinco amigos, que ansiosamente nos esperam em Vale da Laranja / Rio Maior.

Quando regressámos à “nossa casa”, a Glória, uma filha da Dona Dora, que está atualmente à frente do negócio, porque a mãe e irmã estão há um ano em Lisboa, conseguiu disponibilizar-me o sinal Hi-Fi, permitindo-me, assim, aceder ao Citius. Tinha duas notificações, das quais só tive acesso a uma. Espera-me trabalho, quando na próxima sexta-feira chegar a Lisboa. É por estas limitações e preocupações que deixei de aceitar a quase totalidade dos clientes que me procuram.

Não consegui receber nenhum dos setenta e-mails, que ficaram retidos.

Combinámos uma viagem ao outro extremo da ilha, para as 9,30 horas, com o dono de um transporte, que veio ter connosco ao hotel.


15º dia, domingo, 1 de outubro de 2017

Tomámos o pequeno almoço e ficámos a aguardar que nos viessem buscar, o que aconteceu por volta das 9,30, para nos transportarem a Bruce. Fomos recolhidos por um triciclo de caixa aberta com dois bancos de cada lado, que nos transportou a Bruce, no outro lado da Ilha de Bubaque e que dista 24 quilómetros do nosso “ aquartelamento” – a casa Dora. 

Foram quarenta e oito quilómetros por estrada, ida e vinda, na gíria chamamos-lhe picada, que deu para apreciar a paisagem verdejante, com algumas plantações de arroz, de milho e de outros produtos, Após muitos solavancos chegámos e encontrámos uma praia maravilhosa, a perder de vista, de águas tépidas e calmas. Passámos horas na água, tal como temos feito sempre que há oportunidade. Deu para explorar as redondezas, encontrando um pequeno curso de água, que faz uma piscina natural, antes de correr, devagarinho, para a praia, que deve secar no tempo seco. Continuámos a encontrar rochas vulcânicas, o que não me deixa qualquer dúvida quanto à origem destas ilhas, apesar de haver quem conteste esta evidência.

Aqui, em Bruce, um jovem local construiu um edifício de oito apartamentos, suites, espaçosos e modernos, dignos de qualquer bom lugar, que têm apoio de restaurante e bar. Com aquele mar em frente é um local a ter em conta para quem queira passar umas férias calmas e com conforto. O único contra são as viagens: quatro horas de barco, com saída de Bissau e os 24 quilómetros de “picada”. Também estão a ser construídos outros apartamentos, ainda que mais modestos, mesmo ao lado, que poderão, a preços mais módicos, prestar os serviços essenciais.

Quando chegámos, cruzamo-nos com duas portuguesas que cá estão a prestar cooperação, no seu período de férias e que tinham ficado num dos apartamento. Falámos-lhes da nossa viagem, o que as deixou desejosas de um dia também a poderem fazer.

Parte do regresso foi feito por outro caminho, incluindo a pista aérea, que também serve de campo de pastagem às muitas cabras que as populações próximas possuem.

À noite, comemos parte das ameijoas, que aqui se chama combé, arranjadas pela Glória, a dona do Aparthotel Canoa, mais conhecido por Casa da Dona Dora. Estavam ótimas.

Depois do jantar fui ver o jogo do Marítimo 1 – Benfica 1, que acabou por me dar mais uma desilusão. Quando não estamos habituados custa mais…


16º dia, segunda-feira, 2 de outubro de 2017

Por volta das dez horas, aproveitando mais uma visita ao Parque Nacional Marinho de João Vieira e Poilão, fomos com a equipa do Diretor, Quintim, visitar as quatro ilhas mais no interior do Atlântico: João Vieira, Cavalos, Méio e Poilão, em trabalho de dinamização e sensibilização.

Fizemos uma paragem em Cavalos, para deixar o Diretor, que iria lá ficar até sábado e continuámos até Méio, onde parámos e aproveitámos para nos banharmos nestas águas maravilhosas. 

Continuámos para a Ilhéu de Poilão, que é a ilha mais ocidental do Arquipélago de Bijagós, sendo talvez por isso que é um santuário para as tartarugas marinhas, que aí vêm desovar. Estivemos com os técnicos que lá prestam serviço na monotorização das tartarugas e a prestar-lhes apoio no seu regresso ao mar, quando ficam presas nas rochas ou quando estão cansadas, depois do esforço de porem uma média de cento e vinte ovos, em cada postura. 

O chefe da equipa, biólogo, que esteve recentemente em Bragança a frequentar um curso, desta área, fez-nos uma exposição sobre o Instituto da Biodiversidade das Áreas Protegidas, no qual se insere o Parque Nacional Marinho de João Vieira e Poilão.

Quando nos preparávamos para piquenicar, coincidindo com o almoço dos nossos anfitriões, fomos obsequiados com a oferta de um prato de arroz com peixe, que estava muito bom. 

De seguida visitámos os locais de desova das tartarugas, sendo bem visíveis os enormes buracos dos últimos nascimentos. Indicaram-nos os locais, que se encontram identificados por datas, para onde transferiram os ovos, que se encontravam em locais ao alcance das ondas.

No regresso passámos pela Ilha de João Vieira, onde se encontra a sede do Instituto. Estivemos duas horas a banhos. Antes de regressarmos, por volta das 17 horas, ainda vimos o Museu do Parque, uma pequena sala, que contém elementos da fauna existente no Parque. Foi um viagem de regresso que demorou cerca de duas horas.

Durante o regresso vimos grande quantidade de golfinhos, que vinham saltar ao lado do barco, quando batíamos na chapa. Foi um momento muito gratificante.

Depois de jantarmos as sobras do almoço, pagámos os bilhetes da viagem de regresso, que tiveram a amabilidade de nos levar ao Aparthotel. Antes nos irmos deitar, pagámos a estadia, porque, no dia seguinte, deixaríamos os quartos por volta das sete horas, para apanharmos o barco às oito horas. Como aquela hora ainda não haveria pequeno almoço, a Glória, não vou chamar-lhe dona, porque é uma jovem de trinta anos, arranjou-nos uns bolos feitos por ela.


17º dia, terça-feira, 3 de outubro de 2017

Levantámo-nos pouco antes das sete para irmos apanhar o barco que nos traria de regresso a Bissau, puxando, no meu caso, uma mala de porão que tinha as minhas coisas e as da Luzinha.

Um dos jovens, que nos acompanhou nas visitas ao Parque, veio-se despedir de nós, tal como prometera na véspera. A contar com essa despedia, deixei-lhe ficar dois polos e uns calções safari, dos que tenho utilizado e demos-lhe uma pequena gratificação, para lá da que já havíamos feito coletivamente.

Fomos transportados num dos barcos que faz a ligação Bubaque a Bissau, sem comodidades, dado só ter meia dúzia de cadeiras, sendo a maioria dos assentos bancos sem encosto. Para atenuar este incómodo passei para a parte superior do barco, aonde descobri uma cadeira sem pernas, que coloquei em cima de um pneu, que partilhei com o Camilo, diminuindo o incómodo que foi a viagem, de mais de quatro horas e meia, aproveitando para continuar a leitura do livro Vela Sagrada. Foi a uma das piores partes da viagem!

Quando chegámos ao cais, tínhamos o Xico Allen à nossa espera com o jeep, que o Camilo conduziu de imediato, confirmando o que já sabíamos: o Camilo só cede o volante quando já não consegue resistir ao cansaço. Mas desta vez a condução foi curta, porque o Camilo ficou no Banco para levantar dinheiro e o Xico transportou-nos até ao Restaurante Ancar, para esperarmos por ele, pois este era o local que nos permitiria aceder ao Hi-Fi. Deu para fazer algumas consultas, mas continuo sem receber e-mails.

Como não gostámos do bufete do restaurante, fomos almoçar à Pastelaria do Trovão, onde comi uma bifana com batatas fritas e ovo, antecedido de umas moelas, que a Luzinha e o Xico condimentaram com piripiri. Como tinham gostado muito da primeira vez que lá comemos, o Xico, enquanto estivemos nas ilhas, comprou gindungo (piripiri) em verde, que deixou na pastelaria para uma empregada da casa preparar. Depois dividirá com a Luzinha, na sexta-feira, quando partirmos para Lisboa. Passado muito tempo de espera o Camilo lá chegou do Banco. Vinha esfomeado. A fome ainda poderia ser maior se, durante a viagem, não lhe tivesse dado um ovo cozido, que trazia para quando eu tivesse fome.

Depois do almoço regressámos a Bambadinca, tendo-nos cruzado com o Sr. Jorge que ia para Gabu aonde está a construir um armazém e outras instalações. Na viagem, várias vezes ultrapassámos o Sr. Jorge e fomos ultrapassados por ele, devido às paragens que fomos obrigados a fazer, talvez por culpa do piripiri que a Luzinha comeu.

A Luzinha, para o jantar, fez uma ótima sopa de abóbora, batata doce, cebola e de outros vegetais, acompanhado com umas rodelas de chouriço, que trouxemos de Portugal.

Antes de dormir, estive a escrever o diário.


18º dia, quarta-feira, 4 de outubro de 2017


Depois de tantos dias a levantar cedo, levantámo-nos calmamente. A Luzinha preparou o almoço: arroz de tomate com peixe frito. A refeição foi acompanhado com o vinho RedVelvete, de 2015, produzido pela Adega Alonso, de Alijó, propriedade da família do meu amigo Tozé Alonso, que era uma “boa pomada”, seguido de café, de moscatel de Alijó da mesma Casa e de Wiskey Teachers, uma garrafa antiga que trouxe da minha garrafeira.

Depois de bem bebido e quando se preparava para uma sesta merecida, e eu me encontrava a ler a Vela Sagrada, no alpendre, duas nativas vieram pedir ajuda ao Camilo, para levar ao médico a menina que as acompanhava e que aparentava ter seis anos, que está com a barriga inchada. A barriga da menina tinha duas grandes cicatrizes devido à operação que lhe foi feita em 2014. Perante esta situação, acabou o descanso do Camilo e do Xico, que foram levar a menina ao médico a Bafatá, sem a certeza de que lhe possa ser prestada ajuda. Se o Camilo não o fizesse, a menina ficaria sem assistência, porque aqui não existe Serviço Nacional de Saúde, nem ambulâncias acessíveis, nem postos de saúde adequados. O Camilo e o Chico saíram às 15 horas e passadas mais de duas horas ainda não regressaram. A menina poderá precisar de cuidados mais especializados que só existem em Bissau, que dista daqui 105 quilómetros por más estradas. Por muito boa vontade que o Camilo tenha, não pode estar a substitui uma função do estado guineense. São seis horas e o Camilo e o Xico acabaram de chegar. 

Estamos desolados! O médico que atendeu a menina, um espanhol dos Médicos Sem Fronteiras, que já anteriormente a tinha visto, referiu-lhe que não havia nada a fazer, que o problema é do fígado e que a menina está condenada… Ao olharmos para aquela menina, de olhos tristes, não podemos deixar de sentir um grande mal estar, por nos sentirmos impotentes perante esta crueza da vida!


19º dia, quinta-feira, 5 de outubro de 2017


Como tínhamos programada uma vista ao Saltinho, para lá almoçarmos, levantámo-nos mais tarde, sem as correrias que foram habituais ao longo destes dezanove dias. Só em Saint Louis, onde fizemos uma paragem reparadora e ontem, que ficámos em Bambadinca, ainda que com os incómodos que o Camilo e Xico tiveram, não fizemos visitas ou não estivemos ocupados com programas.

Chegámos a Saltinho por volta da 11,30 horas. Trouxemos almoço, para almoçarmos no Clube de Caça, que já foi referido na primeira visita, porque o Clube só abre para clientes, quando são feitas reservas. Contamos que depois das três horas nos tragam as famosas ostras, que até o meu primo Fernando me disse que são imperdíveis.

Como gostei deste local, trouxe o portátil para, na explanada em frente ao bar, ouvindo o barulho que as águas do Corubal fazem ao passar pelos rápidos do Saltinho, pouco antes de passarem pela Ponte Craveiro Lopes, procurar a inspiração que me falta, para escrever um texto mais digno de quem o possa ler.

A Luzinha acabou de chegar com um nativo do tempo da guerra, o Mamadu, ex-fuzileiro da nossa tropa, segundo diz, que reconheceu o alferes Mota de entre o grupo de fotos que tenho no portátil, tirados na festa dos meus sessenta anos.

Depois do almoço e enquanto esperámos pelas ostras, depois de tirar mais umas fotos, fomos tirar uma sesta nos quartos do Clube.

O Camilo veio dar-nos a notícia de que devido à altura das marés não puderam apanhar as ostras, o que para nós foi uma frustração e para a Luzinha um alívio, por não gostar de ostras.

No regresso a Bambadinca, o Camilo levou-nos a passar pelo interior da Tabanca de Mampata e, posteriormente, levou-nos aos rápidos de Cussilinta.

Antes de nos deitarmos deixámos as malas feitas, para irmos cedo para Bissau, porque apesar da partida estar marcada para as 15 horas, é necessário fazer o chec-in com seis horas de antecedência e porque para fazer a viagem até Bissau são necessárias mais de duas horas


20º dia, sexta-feira, 6 de oubro de 2017


Acordámos cedo, porque o calor húmido, apesar da ventoinha ficar ligada durante toda a noite, faz-nos sentir como se estivesse-mos numa sauna. Mesmo depois de tomarmos banho, com água fria, a transpiração regressa e só quando iniciámos a viagem para Bissau, com as portas do jeep abertas, para sentirmos os odores da mata, o calor abranda, tornando a viagem menos incomoda.

Durante a viagem aproveitámos para comprar amêndoa de caju, em quantidade que dará para satisfazer alguns amigos e a gulodice que eu e Luzinha temos por este produto.

Antes de chegarmos à cidade, ao passarmos ao lado do aeroporto, fizemos o check-in, ficando sem esta preocupação, o que nos permitiu fazer as últimas compras calmamente.

A Luzinha comprou  mancarra (amendoim) e duas papaias grandes. Enquanto o Camilo foi pagar o bilhete de avião para regressar no dia vinte, fomos mais uma vez ao Ancar para aproveitar o ar condicionado e para aceder ao Hi-Fi. Deu para aceder, mas, mais uma vez, não pude consultar os meus e-mails. Acabámos para ir almoçar à pastelaria do Trovão, antes do Camilo nos trazer ao aeroporto. O gindungo que o Xico deixou para preparar estava pronto, tendo-o divido com a Luzinha.

Ao passarmos pela máquina de controlo, a funcionária pediu-me um sumo e, como não lhe dei nada, mandou-me para uma mesa aonde estavam sentados dois funcionários, que me pediram para mostrar o que levava, ao mesmo tempo que me pediam dinheiro.

São três horas da tarde, estamos no aeroporto, à espera do embarque, com uma sauna ainda pior da que sentíamos em casa do Camilo, porque ali, à noite, tínhamos as ventoinhas ligadas, que atenuavam o calor.

Finalmente, entrámos no avião da Euro Atlantic, um boeing 767 – 300ER, com boas condições. Já são 4,20 e o avião nunca mais parte…. Partiu às 4,30 horas e chegámos a Lisboa por volta das 9,15 horas. Tendo em atenção a diferença de hora, mais uma em Portugal, demorámos quatro horas e pouco.

O serviço da Euro Atlantic é bom e a Luzinha comeu a refeição, coisa que poucas vezes acontece nos aviões.

Porque as bagagens só nos foram disponibilizadas por volta das 22,30 horas, o Xico Allen já não tinha transporte para o Porto, ficando em nossa casa.

Enquanto a Luzinha preparava o quarto para o Xico e uma refeição ligeira, acedi à Internet para consultar o Citius, constatando que tinha duas notificações: uma cujo prazo para apresentar testemunhas terminaria daí a uma hora, por sorte já as tinha apresentado, e a outra a terminar na segunda, para apresentar originais de documentos, no tribunal de Portimão, porque o juiz deve ter problemas de visão e não consegue ler as cópias que enviei. Isto vai alterar tudo o que tinha programado, porque teremos que ir no domingo pernoitar na Praia da Rocha, para, no dia seguinte, me deslocar ao escritório do cliente, em Albufeira, a fim de recolher os originais e entregá-los. Só pensávamos ir buscar o meu carro mais tarde, depois de matarmos saudades, ficando com disponibilidade emocional, para repousarmos mais uns dias no Algarve.

O Xico deixou-nos às sete, para apanhar o Alfa das oito, depois de chamarmos um táxi, porque não tínhamos o comando para abrir a porta da garagem, que se encontrava no meu carro, em Lagoa, aonde o tínhamos deixado.

O Xico Allen, que não conhecíamos, durante estes vinte dias de viagem , ganhou o direito de fazer parte do nosso grupo de amigos.


PS: No sábado, dia 7, fomos para Vale da Laranja aonde nos esperavam os nossos cinco amigos. Ficámos lá essa noite e no dia seguinte fomos para o Algarve, para dar cumprimento à notificação. Enquanto me encontrava no escritório do cliente, aproveitei para contactar a Virtual, firma informática de uma sociedade do Zé Miguel, meu cunhado, que, com a qualidade que lhe é reconhecida, à distância, resolveu o problema existente com a minha conta de e-mail, que se mantinha desde os primeiros dias da viagem.

Aproveitámos a nossa ida ao Algarve para levarmos o Lobo, o pastor alemão, a fim de o socializar, tendo excedido as nossas expectativas. Na praia do Alvor, o Lobo, depois das hesitações iniciais, tomou o seu primeiro banho de mar e conseguiu enfrentar as ondas.

Regressámos na terça, a tempo de ver o Portugal – Suíça, porque, apesar da água do mar estar como poucas vezes a encontrámos no Algarve, achámos por bem regressar, até porque, para além de já termos saudades das nossas rotinas em Lisboa e em Vale da Laranja, a mãe da Luzinha tinha uma consulta para hoje, na qual lhe foi marcada a operação, para transplante da córnea.


APRECIAÇOES FINAIS

Antes das apreciações gerais não posso deixar de agradecer ao Camilo tudo o que nos proporcionou. Sem ele, esta viagem nunca teria existido e nunca teria sido tao variada e completa, para além de nos acolher na sua casa em Bambadinca e por nos ter mostrado e explicado os locais que são referidos neste diário. Obrigado Camilo!

Também queremos agradecer ao Xico Allen, pela sua amizade e por todo o apoio que nos prestou, nomeadamente por ter feito a maior parte da condução, especialmente nos troços mais difíceis.

Esta foi a viagem da nossa vida: pela duração, pela diversidade de situações vividas, pelas muitas emoções sentidas. Não foi uma viagem muito difícil, porque íamos acompanhados por dois veteranos, conhecedores de todos os locais por onde passámos.

Durante a viagem, passámos por países e regiões muito dispares, bem percetíveis pelo que nos era dado apreciar nos contactos que fomos tendo com as suas gentes, nos locais em que parámos e que visitámos.

Marrocos foi uma agradável surpresa, começando por Tânger, aonde já tinha estado em 1980 e pelo que conheci de Casablanca quando lá estivemos em 2015. Casablanca e Tanger, tal como as grandes cidades de Marrocos, são cidades tipicamente ocidentais, com exceção das partes tradicionais do mundo muçulmano, como a Medina, o Kasbah e as mesquitas no lugar das igrejas.

Marrocos é um pais muçulmano, situado em Africa mas que se considera mais europeu do que africano, com o que concordamos, pois é diferente dos outros do mesmo continente e que tem a sorte de ser governado por uma monarquia esclarecida. O atual rei, Mohammed VI, filho de Hassan II, tem seguido uma politica de desenvolvimento, bem patente na rede viária e na construção civil, procurando eliminar os bairros da lata, como foi visível ao longo do percurso. Dentro de dois anos já terão o TGV, segundo nos disseram e acreditámos, tendo em atenção o estado avançado dos trabalhos. Devido ao seu poderio, a anexação dos territórios do Sara Ocidental poderão ser irreversíveis.

Mauritânia é um pais desértico e porque não tem petróleo é pobre, bem patente na aparência das suas gentes e dos pedidos que nos faziam, quando parávamos para meter combustível. A sua capital, Nouakchot, é cheia de contrastes. Tem partes agradáveis e limpas e outras com o lixo espalhado pelos passeios. O Hotel onde ficámos é de grande qualidade e quando lá pernoitámos estava praticamente vazio.

Senegal, por já fazer parte da região subsariana, não é tão pobre como a Mauritânia – tem mais condições naturais para se viver -, mas a pobreza é bem visível.

Em Saint Louis, cidade costeira, que, no tempo da colonização francesa chegou a ser a capital do Senegal, ficámos impressionados com a pobreza e sujidade que encontrávamos. As pessoas coabitavam com o lixo, as cabras, os burros, galinhas e outros animais. Também foi aqui que passámos um dos melhores dias da viagem, no Hotel Diamarek, bem juntinho à praia.

A Guiné, apesar de ser um país pobre, não é um país miserável, como me pareceu ser a Mauritânia e o Senegal que conhecemos, mas continua a ser um país adiado. As suas gentes são simpáticas, mas indolentes, por natureza, o que, associado ao clima quente e húmido e à impreparação das pessoas, contribui para esse atraso. 

Para além destes fatores endógenos, muito contribui a corrupção e a frequente instabilidade política. Por outro lado, também lhe faltam fontes de energia, porque, sendo um país plano, não tem centrais elétricas, tendo que recorrer a geradores e a painéis fotovoltaicos, que são dispendiosos e por isso leva a que a energia elétrica seja distribuída de forma intermitente. Em Bambadinca, a luz é produzida por painéis fotovoltaicos e é distribuída só à noite e com pouca capacidade.

Estive em Bissau em 2010, no âmbito de um protocolo antigo celebrado com o Governo da Guiné e os Jogos Santa Casa, para darmos apoio ao desenvolvimento dos Jogos Sociais na Guiné. Apesar dos apoios que íamos dando, inicialmente em material e dinheiro, sentíamos que nada estava a ser feito, mas os pedidos de apoio em dinheiro continuavam, o que me fez duvidar que tais verbas se destinassem para o desenvolvimento dos Jogos Sociais. Por isso, propus ao Administrador daquela área que o melhor seria ir à Guiné para, in loco, aferir dos apoios necessários e, a partir daí, começar a dinamização que fosse necessária. Quando lá cheguei fiquei na Pensão Coimbra e no dia seguinte vieram levar-me, num carro posto à disposição pelo Secretário de Estado da Juventude e Desportos, com quem reuni mais tarde no seu gabinete, com a presença do seu Assessor e do meu anfitrião, o futuro diretor. 

Enquanto estava a decorrer a reunião, ocorreu um facto, que nos deixou estupefactos: entraram pelo gabinete dois chineses para prestarem assistência ao ar condicionado, sem pedirem licença nem cumprimentarem ninguém, o que me levou a comentar, talvez de forma inapropriada, que estávamos na presença dos novos colonizadores.

Antes desta reunião fomos visitar as instalações onde funcionaram as Apostas Mútuas ( Totobola) do tempo colonial, aonde ainda se conseguia vislumbrar a antiga designação. O edifício, apesar de em tempos ter sido enviado dinheiro para a sua reparação, estava um autêntico pardieiro, esburacado, sem forro no telhado, sem cofres para guardar o que fosse necessário, sem as bolas para fazerem os sorteios. Em suma, eram um barracão onde nada existia que pudessem dar credibilidade à existência de um jogo oficial, apesar de serem vendidos alguns bilhetes na rua, por engraxadores, apondo um carimbo nos bilhetes antigos, que lhes tínhamos fornecido. Numa sala, em que nem cadeiras existiam para as pessoas se sentarem, foram-me apresentadas umas quatro, que eram as que supostamente lá trabalhavam e para as quais precisavam de dinheiro para lhes pagar.

Na reunião com o Secretário de Estado referi-lhe toda a disponibilidade da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, através do seu Departamento de Jogos, mas para isso o governo da Guiné teria que mostrar interesse, começando por criar legislação própria e arranjar umas instalações, com alguma dignidade porque aquelas, já eram impróprias. 

Apesar das promessas, saí da Guiné convicto de que nunca mais lá voltaria, porque não acreditei que a minha colaboração viesse a ser necessária. Apesar dessa convicção, ainda elaborei um projeto de decreto-lei e uns estatutos, que poderiam servir de apoio para a criação da legislação necessária. A instabilidade politica inviabilizou a possível boa vontade do Secretário de Estado.

A Guiné continua a ser delapidada pelas potencias mundiais naquilo que lhes interessa. A China, nos últimos anos, veio buscar muitos milhões de metros cúbicos de madeira, a coberto de protocolos, que pouco contribuíram para o seu desenvolvimento. Só pararam devido às pressões da Greenpeace, acabando por deixar muita madeira cortada pela mata, como nos tem sido dado observar.

Os pedidos de dinheiro, que nos foram feitos em alguns controlos policiais e no aeroporto, dão uma ideia da fragilidade institucional e social da Guiné Bissau.

Arquipélago dos Bijagós, com as suas muitas ilhas, mais de oitenta, e as suas águas maravilhosas, tem condições excecionais para o turismo, que poderá vir a ser uma das fontes de maior rendimento do pais.

A Luzinha pretende voltar aos Bijagós, mas é minha intenção, apesar de ter adorado os Bijagós, visitar novas paragens, quando tiver oportunidade. Com tanto para ver, não gosto de repetir destinos.

[Seleção / Revisão e fixação de texto / Negritos: LG]
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Nota do editor: