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segunda-feira, 23 de setembro de 2019

Guiné 61/74 - P20170: Notas de leitura (1220): “Antologia de textos lusófonos sobre o Senegal”, seleção de textos de António Montenegro, José Horta e Mallé Kassé, sem indicação de editor; Dakar, 2015 (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 24 de Janeiro de 2017:

Queridos amigos,
Esta publicação que tem tanto de maravilhoso e de singular foi-me gentilmente oferecida pelo professor José Silva Horta, historiador da Guiné. Quem elaborou a antologia primou pelo desvelo, pelo rigor histórico e ficamos assim com um documento que permite discernir as mentalidades e os conhecimentos de quem chegou àquela Guiné em primeiro lugar. Onde faltava cartografia a imaginação era luxuriante: tínhamos chegado à Etiópia Menor, o rio Nilo andaria por ali perto, e coisas assim. Trata-se de um documentário com pormenores relevantes sobre os povos, os sistemas de poder, os credos religiosos, os alimentos, as aves, os animais de caça. Ali começava a Guiné, no rio Senegal e a Senegâmbia ou os rios da Guiné de Cabo Verde estendiam-se até à Serra Leoa. E assim foi durante séculos, com tal incerteza que precisámos do século XIX para saber o que era a Guiné Portuguesa, deitando por terra todos os outros topónimos.

Um abraço do
Mário


O Senegal, a Guiné em textos lusófonos

Mário Beja Santos

A obra intitula-se “Antologia de textos lusófonos sobre o Senegal”, é bilingue, seleção de textos de António Montenegro, José Horta e Mallé Kassé, sem indicação de editor, Dakar, 2015. Na apresentação, António Montenegro diz explicitamente que “Os portugueses foram quem primeiro cartografou o território do Senegal e primeiro escreveu sobre as suas populações. Os cronistas portugueses do século XV, que escreveram sobre as navegações ao longo da costa Ocidental de África, e os cartógrafos que pormenorizaram o recorte do continente africano, mencionaram longa e detalhadamente, o que é hoje o Senegal. Deram à península onde se situa Dakar o nome que ainda hoje conserva, o Cabo Verde e, dentro deste, o Cap Manuel, do rei D. Manuel I, e a Pointe des Almadies, de um tipo de barco português”.

Os organizadores maravilham-nos com o acervo dos autores antologizados, logo com Honório Barreto, a que se seguirá um vasto reportório de autores como Fernanda de Castro, Benjamim Pinto Bull, Nize Isabel de Morais, António Pinto da França, Gilberto Gil, Gonçalo Cadilhe, José Luís Peixoto, Ondjaki e Léopoldo Sédar Senghor. A antologia abre com o capítulo XXXI da “Crónica do descobrimento e conquista da Guiné”, e que tem a designação “Como Dinis Dias foi à terra dos negros e dos cativos que trouxe".

Este Dinis Dias pediu ao Infante D. Henrique para armar caravela, “porque era homem desejoso de ver coisas novas”. O Infante agradeceu-lhe, Dinis Dias armou uma caravela, “passou a terra dos Mouros e chegou à terra dos negros que são chamados Guinéus. E ainda que nós já nomeássemos algumas vezes em esta história por Guiné a outra terá em que os primeiros foram, escrevendo-lho assim em comum, mas não porque a terra seja toda uma; pois grande diferença têm umas terras das outras, e muito afastadas estão”. Filharam quatro nativos, “os quais foram os primeiros negros que em sua própria terra foram filhados por cristãos”. Dinis Dias prosseguiu viagem até que chegou a um grande cabo, ao qual puseram o nome Cabo Verde. “E dali fizeram volta para este reino, e conquanto presa não fosse tamanha como as outras que antes vieram, o infante a teve por mui grande, por ser daquela terra. E assim fez por isso a Dinis Dias e a seus companheiros grandes mercês”.

Convém contextualizar o espaço e o tempo destas viagens: a cartografia era então elementar, desconhecia por inteiro o recorte desta África Ocidental, razão pela qual surgiram efabulações à volta da Etiópia, do rio Nilo, na natureza dos povos justapostos entre berberes, mauritanos que habitavam até às proximidades do rio Senegal e os negros, por vezes islamizados, e os outros, puramente animistas, todos eles com sistemas de poder bem diferentes. Só assim se pode entender a leitura de Esmeraldo de Situ Orbis de Duarte Pacheco Pereira, que fala do rio Senegal, que ali era o princípio dos etíopes e homens negros, que havia li duas Etiópias, a inferior, que corre e se estende pela costa do rio Senegal até ao cabo da Boa Esperança, e que a este rio também se chama Guiné. A outra Etiópia, superior, começa no rio Indo, além do grande reino da Pérsia…

No canto V de Os Lusíadas, Camões também aborda a novidade destas terras descobertas, revela o nível de conhecimentos disponíveis na época:

“Deixámos de Massília a estéril costa,
Onde seu gado os Azenegues pastam,
Gente que as frescas águas nunca gosta,
Nem as ervas do campo bem lhe abastam;
A terra a nenhum fruto, enfim, disposta,
Onde as aves no vento o ferro gastam,
Padecendo de tudo inópia,
Que aparta a Barbaria da Etiópia.”

“Passámos o limite a onde chega
O Sol, que pera o Norte os carros guia;
Onde jazem os povos a quem nega
O filho de Climene a cor do dia.
Aqui gentes estranhas lava e rega
Do Negro Sanagá a corrente fria,
Onde o Cabo Arsinário o nome perde,
Chamando-se dos nossos Cabo Verde.”

“Por aqui, rodeando a larga parte
De África, que ficava ao Oriente,
A província Jalofo, que reparte
Por diversas nações a negra gente;
A mui grande mandinga, por cuja arte
Logramos o metal rico e luzente,
Que do curvo Gambeia as águas bebe,
As quais o largo Atlântico recebe.”

Importante testemunho é o do missionário Baltazar Barreira (1538-1612), que visitou a Guiné e a Serra Leoa. Na sua carta ao padre João Álvares ele refere que o rio Senegal é o princípio da Guiné, dizendo mais ou menos isto: “Esta parte de África que os portugueses propriamente chamam Guiné começa no rio Cenaga (fórmula com que ao tempo se falava do rio Senegal), e corre pela costa até à Serra Leoa, obra de 180 léguas de Norte a Sul, é tão caudaloso este rio Cenega que sobem por ele os navios 150 léguas”. Fala dos Fulos que habitam este rio, seus usos e costumes e refere depois os Jalofos que habitam a parte Sul do rio Senegal. Mais adiante, dá-se a palavra a André Álvares de Almada, logo no primeiro capítulo do seu incontornável Tratado Breve dos Rios da Guiné do Cabo Verde fala dos negros Jalofos, dos seus costumes e trajes, são páginas extraordinárias tal como o capítulo VIII, dedicado ao reino do Casamansa.

Esta antologia é uma obra de devoção e de rigor científico, aqui podemos perceber a nebulosidade do conceito territorial da Guiné, como a sua fronteira imaginária começava no Senegal, os textos registados, primorosamente selecionados a partir de Zurara e consagrando nomes como André Donelha, Francisco Lemos Coelho e até Honório Pereira Barreto, devia ser acessível ao leitor português, nesta área da África Ocidental escrevemos páginas brilhantes de uma literatura que permanece praticamente ignorada, é um dano cultural reparável e necessário para portugueses e guineenses, está aqui a nossa proximidade, o nosso abraço lusófono, também.
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Nota do editor

Último poste da série de 20 de setembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20161: Notas de leitura (1219): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (24) (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 29 de abril de 2019

Guiné 61/74 - P19728: Notas de leitura (1173): Um luso-cabo-verdiano que amou desmedidamente a Guiné (3) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 6 de Dezembro de 2016:

Queridos amigos,
Aqui se põe termo à análise da tese de doutoramento de Benjamim Pinto Bull sobre Fausto Duarte, um escritor e divulgador injustamente esquecido. Romancista, publicista e afanoso vasculhador de documentação que inseriu nos dos projetos a que deu toda a sua dedicação, o Boletim Cultural da Guiné Portuguesa.
Não se pode falar da literatura colonial na Guiné sem o pôr no pódio; não se pode falar na investigação e divulgação histórica sem o considerar como esforçado pioneiro na revelação da presença portuguesa naquela Guiné das praças e presídios. As entidades representativas da cultura de Portugal e da Guiné-Bissau só tinham a ganhar em mostrar Fausto Duarte tal como ele foi: um luso-cabo-verdiano emaranhado por grande paixão às terras da Guiné.

Um abraço do
Mário


Um luso-cabo-verdiano que amou desmedidamente a Guiné (3)

Beja Santos

Fausto Duarte pertence à vasta lista de escritores, divulgadores e investigadores injustamente esquecidos. Homem de uma cultura medularmente europeia, orgulhava-se das suas origens cabo-verdianas e vai revelar-se como o nome mais sonante da literatura colonial guineense e o investigador e divulgador de mérito das coisas guineenses. Continuamos a abordar a tese de doutoramento de Benjamim Pinto Bull sobre a obra de Fausto Duarte, apresentada na universidade de Paris Sorbonne, no ano universitário de 1975-1976.

Fausto Duarte foi um importante investigador da história da Guiné. O seu propósito fundamental como Chefe da Secção História do Boletim Cultural da Guiné Portuguesa era o de “inserir nas páginas do boletim material de grande importância histórica constituído por manuscritos, tais como avisos, contas, cartas patentes, consultas, registos, pareceres, etc e outros documentos que poderão interessar a quem se disponha a estudar as origens da formação da província e o seu progressivo desenvolvimento a partir da época em que a nossa ação estava circunscrita às pequenas Praças e Feitorias nascidas da exploração das fontes de riqueza dos Rios da Guiné… Por eles se conhecerá melhor o meio, e o homem, ou seja, a terra, o colono e o nativo, as suas paixões e as suas lutas”. Os artigos que ele publicou no Boletim denotam uma grande preocupação pelo rigor e o seu acrisolado amor por Portugal e pela Guiné: artigos em que abordava a mudança desde a época da permanente hostilidade ao branco até ao momento em que é o branco que passa a decidir tudo; Alexandre Herculano tribuno e a sua importante peça de oratória sobre a Guiné Portuguesa; uma chamada de atenção sobre o presídio de Bissau e o Ilhéu do Rei. Revela-se uma investigação para explicar uma estratégia de ocupação estrangeira frente a Bissau. Veja-se com mais pormenor.

O investigador pretende provar que três séculos após a sua descoberta a Guiné continuava a preocupar duplamente os portugueses pela sua insegurança, estamos em meados do século XVIII. De uma parte, as sublevações constantes dos autóctones e, por outro lado a presença indesejável no país de estrangeiros. Não era Bissau que atraía os franceses, era o Ilhéu do Rei, porque pertencia ao rei de Bissau, interessava cativá-lo para reduzir a influência portuguesa. Benjamim Pinto Bull encontra outra razão para este tipo de trabalhos de Fausto Duarte. Em 1950, a Guiné começava politicamente a mexer. Tudo se passava na clandestinidade mais absoluta. Era com interesse que os guineenses devoraram todos os artigos de história. O ilhéu, esclarece o autor, tinha uma excelente água potável e um clima mais agradável que Bissau. Era muito difícil a um simples turista, ou mesmo a um guineense não informado, de ter em conta a importância do ilhéu, dois séculos antes. Todo o comércio de escravos, de marfim e de cera passava pelo ilhéu do rei. Em meados do século XVIII, os franceses controlavam todo o comércio entre as ilhas Bijagós, Rio Grande e Serra Leoa, porque “ficava o dito ilhéu a menos de um tiro da peça da dita ilha de Bissau e que se os franceses se apossassem do ilhéu logo eram senhores da dita ilha e de todo o negócio daquela costa, com um grave prejuízo da Coroa”.

Todos os temas de história o interessavam: Aires Tinoco, que trouxe de volta a caravela de Nuno Tristão, em 1447; a rivalidade entre “Capitania” e “Igreja”, é próprio Fausto Duarte que explica o significado da rivalidade. A Capitania representava a Coroa e tinha como missão a supervisão absoluta da terra enquanto a presença da Igreja era de um caráter puramente espiritual, eram estes os dois grandes pilhares da conquista e da sua harmonia dependia a paz nas praças e presídios.

Fausto Duarte compulsou cartas de capitães-mores, feitores, bispos, visitadores e assistentes das praças e presídios da Guiné: feliz incitativa de nos pôr ocorrente de todos os problemas da Guiné-Bissau ao longo do século XVIII, publicando-as sem comentários. Dedicou igualmente atenção ao período em que a Guiné se desvinculou de Cabo Verde. É o caso do artigo sobre a Guiné ou Senegâmbia Portuguesa no tempo do Governador Pedro Inácio de Gouveia, publica o relatório de 10 de Outubro de 1982 deste segundo governador da Guiné, onde não se escondem as realidades e as numerosas contradições que cerceavam a ação do governador. O relatório tem o mérito de apresentar desapaixonadamente os aspetos políticos, económicos e sociais. A Guiné não tinha ainda as suas fronteiras bem definidas, já não havia tráfico de escravos, entrara-se com bastante entusiasmo no investimento agrícola, no conhecimento das potencialidades da terra. Isto num tempo em que a concorrência francesa era quase sufocante. Por carta assinada pelo rei D. Luís, em 18 de Março de 1879, dava-se a separação definitiva entre Cabo Verde e a Guiné, ficando claro que a Guiné Portuguesa seria uma província independente com governo sediado em Bolama. E Fausto Duarte não esconde as suas opções: “Terminava assim uma dependência de que apenas o arquipélago beneficiava”.

Benjamim Pinto Bull é muito parcimonioso na descrição que faz quanto ao trabalho de Fausto Duarte nos Anuários da Guiné Portuguesa de 1946 e 1948. O que é inexplicável e mesmo injustificável, é um dos trabalhos mais aturados e relevantes de Fausto Duarte, são levantamentos hoje incontornáveis para estudar a Guiné e mormente o que estava a acontecer graças à governação de Sarmento Rodrigues. Pinto Bull analisa detalhadamente o manuscrito da última obra de ficção de Fausto Duarte cuja publicação foi objetada pela censura, tal a crueza com que se fala de fomes e secas, miséria e emigração, é o texto em que excecionalmente Fausto Duarte regressa às suas origens cabo-verdianas. Curiosas são as análises de Pinto Bull sobre os contextos romanescos de Fausto Duarte e as suas principais ideias-força: as relações ilícitas, o conceito de “vencido” e os verbos vencer e lutar; a religião e a superstição. Em termos de conclusão, o doutorando mostra Fausto Duarte como um escritor que revela um grande desprezo pela hipocrisia, a ambição, as rivalidades e a inveja e a maledicência, erigido em defesa do povo guinéu e a insurgir-se permanentemente contra as expressões da violência colonial, caso das palmatórias. Define-o como um arauto da civilização portuguesa, um escritor que exalta o soldado, o missionário e o comerciante, em permanente orgulho pela gesta da civilização portuguesa naquele ponto de África.

Imagem que consta do Anuário da Guiné Portuguesa de 1946, organizado por Fausto Duarte, e já reproduzida no blogue
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Notas do editor

Postes anteriores de:

15 de abril de 2019 > Guiné 61/74 - P19682: Notas de leitura (1169): Um luso-cabo-verdiano que amou desmedidamente a Guiné (1) (Mário Beja Santos)
e
22 de abril de 2019 > Guiné 61/74 - P19706: Notas de leitura (1171): Um luso-cabo-verdiano que amou desmedidamente a Guiné (2) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de26 de abril de 2019 > Guiné 61/74 - P19719: Notas de leitura (1172): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (3) (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 22 de abril de 2019

Guiné 61/74 - P19706: Notas de leitura (1171): Um luso-cabo-verdiano que amou desmedidamente a Guiné (2) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 22 de Novembro de 2016:

Queridos amigos,

Prossegue a análise da tese de doutoramento de Benjamim Pinto Bull sobre a obra de Fausto Duarte.

Como se recordam, Benjamim Pinto Bull foi o único dirigente nacionalista recebido por Salazar, Pinto Bull era o líder da FLING, organização que aceitou fazer parte de um governo de transição, em 1963. Como escreveu o embaixador Luís Gonzaga Ferreira, cônsul em Dakar, montou-se a Operação Camaleão, Silva Cunha e Pinto Bull, entre outros, estavam em Bissau, a aguardar uma declaração pública de Salazar sobre política ultramarina. Para surpresa de todos, Salazar definiu uma linha de intransigência onde não sabia uma governação com a FLING.
São coisas da história.

Pinto Bull veio a morrer em Lisboa de acidente rodoviário.

Um abraço do
Mário


Um luso-cabo-verdiano que amou desmedidamente a Guiné (2)

Beja Santos

Fausto Duarte pertence à vasta lista de escritores, divulgadores e investigadores injustamente esquecidos. Homem de uma cultura medularmente europeia, orgulhava-se das suas origens cabo-verdianas e vai revelar-se como o nome mais sonante da literatura colonial guineense e o investigador e divulgador de mérito das coisas guineenses. Continuamos a abordar a tese de doutoramento de Benjamim Pinto Bull sobre a obra de Fausto Duarte.

Torna-se conhecido em Portugal quando o seu romance "Auá" ganha o primeiro prémio da literatura colonial, em 1934. Como se disse em texto anterior, o tema do romance é um conflito permanente entre duas civilizações, conflito que é protagonizado por Malan, um jovem Fula que trabalha em Bissau como criado, e Abdulai que permanece enraizado nas suas tradições e convicções. Malan é um admirador de tudo quanto fazem os brancos e orgulha-se de oferecer a Auá novas lembranças compradas nas lojas frequentadas pelos brancos, em Bissau, como sejam lenços e pulseiras, e não se esquece de juntar folhas de tabaco e cola para conquistar a simpatia da família da Auá. A vestimenta de Malan é também esclarecedora: “Tinha na sua bagagem um belo par de sapatos que o administrador lhe oferecera. Sobre a sua camisa, pendia um amuleto em prata, contendo um versículo do Alcorão”. Em Fausto Duarte pareciam convergir estas suas forças, a Europa e África, trata-se de uma tensão que perpassa toda a sua obra literária.

Voltando a Auá, todos os Fulas da tabanca criticam Ançatu que, desprezando a lei muçulmana, aceitou não somente viver com um funcionário de alfândega, um português branco, e de ter dele um filho. Auá também vive dividida, sente o choque das duas civilizações. Dividida entre Abdulai, jovem Fula que ficou na aldeia e que lhe oferece presentes genuinamente africanos; e Malan, seu noivo, que lhe envia lembranças fabricadas pelos brancos. E Fausto Duarte escreve: “Sentia uma invencível inclinação por Abdulai, um moço Fula que habitava ali próximo, em Saré-Boilela, e que lhe trazia mel de abelhas bravas e leite coalhado em boas cabaças… Era, senão com desdém, pelo menos com indiferença que, de vez em quando, recebia de Bissau alguns presentes enviados por Malan, que se mesclara no convívio permanente dos brancos do governo”. Malan irá novamente trabalhar em Bissau, quando regressa à sua aldeia para se casar é já em desenraizado, um abismo separa os seus valores dos da aldeia, então decide emigrar para Dakar. Aqui sente o aguilhão da nostalgia.

Aquilino Ribeiro, no seu prefácio, exalta o romance Auá, é fulminante: “Está dito, o primeiro que viu a Guiné foi Nuno Tristão, o segundo o autor de Auá”. Na introdução, muito didaticamente, Fausto Duarte contextualiza a cultura dos Fulas à luz dos conhecimentos da época e trata o seu livro como um documentário etnográfico, um novo capítulo de psicologia indígena. Mas o contraste vem na escrita, Fausto Duarte é um homem de cultura europeia com uma testa da sua prosa inequívoca:

“Era meio-dia quando a camioneta chegou a Nhacra. As águas tranquilas do Impernal acariciando o debrum da paisagem dormente, anquilosada pelo sol adusto, áscua viva que se reflectia na opacidade plúmbea dos céus, espreguiçavam em torcicolos ocultando-se entre o tufo emaranhado dos mangais. A vazante tinha posto a descoberto a orla mádida e lamacenta do rio, e uma variedade abjecta de moluscos deslocava-se sobre a terra lodosa, aquecendo-se ao calor estuante de Novembro”.

Prosa mais naturalista não pode haver. A crítica literária do tempo embandeirou em arco com o romance Auá: “O primeiro grande romance português inspirado em motivos coloniais”; “A arquitectura da obra é um sólido equilíbrio e a cena do conselho dos anciãos coroa-se como cúpula magnífica”; “O escritor que entre nós melhor sabe traduzir o profundo mistério da alma negra”.

O romance conheceu três edições e hoje praticamente ninguém fala dele.

Passemos agora para a conferência proferida por Fausto Duarte no Porto, no âmbito da primeira exposição colonial, em 1934. Começa por referir a atitude dos escritores da sua época face a África e prossegue com comentários sobre a música dos negros, centrando-se na morna, dança tipicamente cabo-verdiana e aqui procura retratar o cabo-verdiano:

“Como poeta e músico, o cabo-verdiano é um eterno apaixonado. O amor, ponto de convergência desses dois estados de alma é tema que não cansa e antes rejuvenesce em cada morna, vai de aldeia em aldeia, surpreende epidermes virgens, sobe à cumeeira dos montes, transpõe o mar e abraça as ilhas no desejo insatisfeito de unir corações enamorados. E para fugir a uma vida de resignação e renúncia, o cabo-verdiano, poeta e místico, artista de provocação, baila e canta”.

A novela “Um crime” foge ao contexto africano. Versa o regresso de um prisioneiro da I Guerra Mundial, Hans Weiss, regressado do exílio da Sibéria. Perdeu toda a sua família. É num grande estado de revolta que comete um crime.

“O negro sem alma”, datado de 1935, publicado na Livraria Clássica Editora, é o regresso ao conflito entre duas civilizações. Bubacar Djaló recusa as pretensões de Songá à mão da sua filha Aminienta, porque Songá não é Mandinga. No final, vamos ser confrontados com a vitória dos princípios africanos sob os princípios ocidentais.

“O negro sem alma” também aborda o exílio e a separação. Momo deixa a sua aldeia no Tombali, atravessa a fronteira e entra na Guiné Francesa para vender dois sacos de arroz. Vive-se em plena I Guerra Mundial e todos os indígenas são apanhados para marchar em direção às trincheiras ocidentais. Momo, na confusão, é mobilizado à força, temos aqui um novo exílio forçado. Vemo-lo num campo de concentração com o uniforme soldado francês, irá combater nas trincheiras, será condecorado. No regresso, assistimos a novo choque de valores. Momo regressou com modos afetados, maneirosos, afrancesados. Atrai a curiosidade dos seus compatriotas, mas é nítido que há desenraizamento.

Antes de regressar à Guiné, Fausto Duarte escreve em 1936 novo romance, "Rumo ao degredo", publicado pela Guimarães Editora. Põe a seguinte dedicatória: “À minha mulher e ao meu filho”. Manuel da Gaita, inocente, é condenado ao exílio. Regressa 15 anos depois à sua aldeia, no Ribatejo. João Gaspar Simões, então sumidade da crítica literária, não foi meigo com Fausto Duarte, diz que "Rumo ao degredo" é um romance que ficou a meio o que devia ser. “Onde seria necessário pôr à prova o talento do romancista, Fausto Duarte sucumbiu”.

Veremos no próximo texto referências as seus últimos trabalhos literários e à sua atividade no Boletim Cultural da Guiné Portuguesa.

(Continua)


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Notas do editor:

Poste anterior de 15 de abril de 2019 > Guiné 61/74 - P19682: Notas de leitura (1169): Um luso-cabo-verdiano que amou desmedidamente a Guiné (1) (Mário Beja Santos)

Último poste da série  de 19 de abril de 2019 > Guiné 61/74 - P19697: Notas de leitura (1170): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (2) (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 15 de abril de 2019

Guiné 61/74 - P19682: Notas de leitura (1169): Um luso-cabo-verdiano que amou desmedidamente a Guiné (1) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 18 de Novembro de 2016:

Queridos amigos,
É tempo de tirar do limbo uma figura altamente representativa da cultura luso-guineense, Fausto Duarte, escritor singular, divulgador emérito e um desbravador de documentos históricos guardados na poeira dos arquivos. Tinha formação superior e revelou ao longo da sua curta vida uma enorme paixão pela cultura guineense. Impôs a temática logo em "Auá", romance premiado em 1934.
Deixou o seu nome ligado a projetos incontornáveis, os anuários da Guiné de 1946 e 1948 e o Boletim Cultural da Guiné Portuguesa.
Merecia ser melhor estudado por portugueses e guineenses.

Um abraço do
Mário


Um luso-cabo-verdiano que amou desmedidamente a Guiné (1)

Beja Santos

Entrei na Biblioteca da Gulbenkian para consultar uma obra sobre património africano, acabei nos reservados a ler uma tese de doutoramento de Benjamim Pinto Bull sobre o escritor Fausto Duarte, documento de leitura aliciante. Fausto Duarte não merecia o injusto silêncio que rodeia hoje o seu nome, foi grande escritor e investigador e deixou uma obra assinalável na Guiné.

A tese de Pinto Bull começa por contextualizar os ambientes de Cabo Verde e Guiné. Fausto Castilho Duarte nasceu na Praia, ilha de Santiago ou em 1902 ou 1903, não se sabe exatamente, era filho de padre. Passou a infância na Praia, foi enviado, concluída a instrução primária, para Lisboa, percorreu vários liceus, o Pedro Nunes, o Passos Manuel, o Camões, o Gil Vicente. Vivia no Colégio Universal, na Calçada de Santana n.º 180. Findo o liceu, inscreveu-se no Instituto Superior de Agronomia onde estudou principalmente Geodesia e Topografia. Em 1928, fez exame final do curso de Topografia e Elementos de Geodesia. Nesse ano viaja para a Guiné e trabalha para um empresário alemão, Frederick Karsten, como agrimensor. Entre 1929 e 1930 trabalha na delimitação das fronteiras da Guiné sob a direção do Tenente-Coronel Soares Zilhão, mais tarde o Governador da Guiné.
Ao percorrer a colónia, entusiasma-se com a natureza luxuriante e caprichosa, deixará as observações das suas descobertas na sua obra, caso dos morros de bagabaga que descreve no livro “Negro sem Alma”:
“A termiteira lembra uma pirâmide egípcia em miniatura. Um é habitação de vivos, outras jazida de mortos, mas ambas são fantasias de arquitectura ciclópica, ambas objectivam encarcerar a sombra e fazer dela o manto de um rei cujo corpo mumificado zomba dos cegos, ou de uma rainha-insecto extravagante – que governa com despotismo, porque perpetua a espécie, porque seu abdómen é um constante viveiro; ambas são ogivas de pedras trabalhadas por gerações inteiras. Numa falta a unidade interior, na outra há a fronteira religiosa. Desfeita a pirâmide, que resta da termiteira? Simples torrões, habitados por insectos que se refugiam instintivamente na treva, porque elas lhes extinguiu para sempre a luz dos olhos”.

Regressa a Lisboa em 1931, casa com Ilda Massano Sereno e volta à Guiné. No ano seguinte, temo-lo novamente em Lisboa onde vem frequentar o Curso Superior Colonial, que termina com brilho quatro anos mais tarde. Em 1934, publica "Auá", que obtém o primeiro prémio de literatura colonial desse ano. Tem 32 anos. Já deram pelos seus dotes Aquilino Ribeiro, Vitorino Nemésio, faz amizades, uma delas com um distinto médico, o professor Fernando da Fonseca, encontraram-se em Berlim. Nesse mesmo ano de 1934, na Exposição Colonial do Porto faz uma conferência sobre o tema “Da literatura colonial e da morna”.

Segue-se a novela “Um crime” e depois “O Negro sem Alma” e “Rumo ao Degredo”. Em 1936, regressa à Guiné, fora nomeado Secretário-Geral da Câmara Municipal de Bolama. Em 1942, publica “A Revolta”, que obtém o segundo prémio do concurso de literatura colonial. Em 1945, aparecem em Lisboa os contos “Foram estes os vencidos”. De 1946 a Janeiro de 1953, Fausto Duarte participa ativamente na redação do Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, tem a seu cargo a secção “História da Guiné”. Em 1950, depois de uma longa estadia na Guiné, é colocado no Gabinete de Urbanismo do Ministério do Ultramar. Em 1952, descobre-se que tem um cancro no estômago. Escreve sem parar, nessa época a censura exige-lhe a supressão de parágrafos no seu livro mais recente “Mãe Joaninha”. É operado duas vezes e morre em 1953, com 51 anos.

Inegavelmente que foi o romance "Auá" que lhe deu notoriedade como escritor, a Guiné encontrara um narrador de altíssima qualidade. O tema do romance é o conflito permanente entre duas civilizações, a europeia e a africana, mais precisamente a civilização ocidental e a civilização arábico-islâmica. Quem personifica esse conflito? Entre Malam, jovem Fula, que vem trabalhar para a cidade de Bissau como criado de um casal alemão, e que se vai imbuindo de preconceitos e valores ocidentais, e outro jovem Fula, Abdulai, que permanece enraizado nas suas tradições e convicções. Malam volta à sua terra para casar com Auá que 10 meses depois dá luz um bebé “branco”. Malam rejeita a criança enquanto na povoação todos afirmam que “o filho pertence a Malam porque foi gerado no ventre da mulher que ele escolheu. É uma recompensa de Deus”.

Para o leitor ocidental, esta trama tem o poderoso ingrediente de uma escrita cuidada, que detalha perfis e situações. Mais adiante, dar-se-ão exemplos da cultura europeia deste escritor embevecido com as culturas guineenses onde se mostra com solidez os seus conhecimentos de etnografia e religião islâmica. Benjamim Pinto Bull aventa a hipótese de que este mestiço que tinha orgulho em ser cabo-verdiano e que tinha uma forte atração pelas linhas dominantes da cultura europeia sentia-se vexado pelos preconceitos raciais que experimentou, tendo sido a experiência mais dolorosa a sua visita à Alemanha, num período já de ascensão nazi, que nunca mais esqueceu. A sua resposta foi o desenvolvimento de um processo cultural singular, onde predominava uma linguagem cultíssima, quase de pesquisa laboratorial, e o apego à temática colonial, em diferentes situações. Revelou-se um estudioso de gabarito, qualidades que lhe foram reconhecidas por outros estudiosos, como Teixeira da Mota. O topógrafo transforma-se em homem de secretária e dedica-se a projetos de fôlego, caso de dois trabalhos de indiscutível qualidade como foram os anuários de 1946 e 1948, hoje obras de consulta obrigatória dado o acervo de informações que ele coligiu, apensando imagens elucidativas, muitas delas aproveitadas das edições do Boletim Cultural da Guiné Portuguesa.

Vejamos agora como "Auá" é um monumento literário referencial da Guiné colonial. Para o leitor mais interessado, recomenda-se o que sobre "Auá" já se escreveu no blogue:

Guiné 63/74 - P3716: A literatura colonial (2): Auá, novela negra, de Fausto Duarte, uma obra-prima (Beja Santos)

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 12 de abril de 2019 > Guiné 61/74 - P19673: Notas de leitura (1168): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (1) (Mário Beja Santos)

quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Guiné 63/74 - P15495: Historiografia da presença portuguesa em África (66): James Pinto Bull, deputado guineense (1913-1970), da União Nacional, comenta na Assembleia Nacional,em 10/2/1968, a visita oficial do presidente da República à Guiné (que teve início em 2/2/1968, e cujo roteiro incluiu Bissau, Bafatá, Gabu, Bolama, Bubaque e Safim)



Guiné > Bissau > Cemitério local > Fevereiro de 1968 > Visita presidencial à província > O presidente alm Américo Tomás (1894-1987) e comitiva em visita às campas do talhão dos combatentes portugueses. 

Foto da autoria de Firmino Marques da Costa, fotógrafo da comitiva presidencial, e que faz parte do fundo da Agência Geral do Ultramar.  Pode ser visualizada aqui, no Arquivo Histórico Ultramarino (AHU). Reproduzida com a devida vénia.

O ACTD - Arquivo Científico Tropical Digital "pretende ser um sistema de informação inovador, que actua como uma plataforma de partilha e divulgação do saber tropical, potenciando e optimizando simultaneamente a realização de investigação e a aproximação da comunidade científica e da sociedade civil às temáticas tropicais e ao seu património científico, aumentando assim o conhecimento da cultura e da história dos países de língua oficial portuguesa (CPLP)."

O acervo do AHU - Arquivo Histórico Ultramarino "integra actualmente cerca de 16 km de documentos provenientes na quase totalidade de arquivos de organismos da administração ultramarina portuguesa que funcionaram entre meados do séc. XVII e 1974-1975".



Guiné > Bissau > Fevereiro de 1968 > Exposição, na fortaleza da Amura,  de armamento apreendido ao PAIGC, por ocasião da visita do Presidente da República, alm Américo Tomás > Metralhadoras pesadas Degtyarev, de origem soviética (*). Foto do álbum do nosso saudoso camarada Vitor Condeço (1943-2010).


Foto: © Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2007). Todos os direitos reservados


1. Intervenção, antes da ordem do dia, do deputado, pelo círculo da Guiné, James Pinto Bull (Bolama, 1913- Rio Mansoa, 1970), em 10 de fevereiro de 1968, na Assembleia Nacional (**):








Intervenção do deputado, pelo círculo da Guiné, James Pinto Bull (Bolama, 1913 - Rio Mansoa, 1970),  Debates Parlamentares > Diário das Sessões, nº 134, 10 de fevereiro de 1968, pp. 2417-2148 (Reproduzido com a devida vénia...)




Intervenções nas duas últimas legislaturas (a IX e X, que não completou por falecimento)


Fonte: Portugal | Estado Novo | Assembleia Nacional | James Pinto Bull (1913-1970) | VIII, IX e X legislaturas |

Nascido em Bolama, licenciadso pelo ISCUP em ciências sociais e políticas ultramarinas, James Pinto Bull fez a sua carreira profissional no funcionalismo ultramarino, tendo sido deputado pelo círculo da Guiné de 1961 a 1970, ano em que morreu, a 26 (ou 25 ?) de julho (***),  num acidente de helicóptero em que perderam a vida mais 3 deputados (J. P. Pinto Leite, o chefe da "ala liberal" de que James Pinto Bulll também fazia parte, Leonardo Coimbra, e José Vicente Abreu), além de 2 militares (o alf pilav Francisco Lopes Manso e o cap cav Carvalho de Andrade).

O seu irmão mais novo, Benjamim Pinto Bull (1916-2005),  liderou  a coligação União dos Naturais da Guiné-Portuguesa (UNGP), um movimento que, com o apoio do Senegal de Leopoldo Senghor, era contra a luta armada e a favor de uma independência da Guiné-Bissau, progressiva, através do diálogo.

Fonte: Parlamento Português >  Publicações On Line >  Deputados da Assembleia Nacional 1935-1974 (Com a devida vénia...)

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 13 de maio de 2007 >  Guiné 63/74 - P1756: Exposição de armamento apreendido ao PAIGC, aquando da visita de Américo Tomás (Bissau, 1968) (Victor Condeço)

(**) Último poste da série > 31 de outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15309: Historiografia da presença portuguesa em África (59): Cem pesos era "manga de patacão" para o camponês guineense, produtor de mancarra... Era por quanto venderia um saco de 100kg ao comerciante intermediário... Em finais de 1965 o governo de Lisboa garante a compra pela metrópole da totalidade da produção exportável da mancarra guineense e fixa o preço por quilo em 3$60 FOB (Free On Board)

(***) Vd. poste de 26 de outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5162: Controvérsias (39): Nunca se fez um inquérito ao acidente que vitimou o meu avô James e seus companheiros (Sofia Pinto Bull)

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Guiné 63/74 - P5162: Controvérsias (39): Nunca se fez um inquérito ao acidente que vitimou o meu avô James e seus companheiros (Sofia Pinto Bull)

Guiné > Região do Oio > Mansoa > Distância, em quilómetros, de Mansoa a algumas das principais povoações, a leste (Bafatá, Bamabadinca, Enxalé), a sul (Porto Gole) e a leste (Bissau, Nhacra, Encheia)... Na foto, o ex-Alf Mil Paulo Raposo, CCAÇ 2405/BCAÇ 2852 (1968/70).

Foto: Paulo Raposo (2006)

Guiné > Região do Oio > Mansoa > Rio Mansoa > Pescadores > "Mansôa é uma linda vila, à qual o rio Mansôa empresta também os seus encantos, dando-lhe um verde imenso, e florido... A história da Guiné, passa por Mansôa, não só por ser um importante centro de comércio, mas também por ser um centro militar de grande importância estratégica, pois era aqui que existia a única ponte que permitia o acesso a Bissau... Inserida na conflituosa região do Óio, e a poucos quilómetros da mítica mata do Morés, Mansôa foi sempre um palco importante na história da Guiné... A partir de 15/12/2003 a jangada que atravessava o rio rio Mansôa, em Joladim, foi substituída por uma excelente ponte, passando a existir um segundo acesso a Bissau" (Fonte: Guiné - História > BCAÇ 2885, por Carlos Fortunato)
Foto: Cortesia de César Dias, ex-Fur Mil Sapador, CCS/BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71), membro da nossa Tabanca Grande.


1. Comentário, de hoje, de Sofia Pinto Bull ao poste 10 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3292: Controvérsias (3): O acidente de helicóptero que vitimou Pinto Leite (J. Martins / J. Félix / C. Vinhal / C. Dias) (*)

Luís, ao fazer umas pesquisas sobre a Guiné-Bissau, deparei-me com o vosso blog e como não podia deixar de ser procurei info sobre o acidente de 25 de Julho de 1970, o qual vitimou o meu Avô James (Pinto Bull) (**) que, infelizmente, eu nunca viria a conhecer.

E não posso deixar de esclarecer e garantir-lhe (e aos demais participantes/intervenientes do blog) que o acidente ocorreu exactamente na data que mencionei - 25 DE JULHO DE 1970. O meu Pai, inclusivamente, prestava serviço militar na altura na Guiné-Bissau, tendo ele próprio participado nas buscas do aparelho e dos corpos (também o do seu próprio Pai).

Documentos disponibilizados pela COLOREDO (Comissão Eventual para Localização e Recolha de Dcumentação da Marinha sobre a sua Acção nas Operações Militares em África e Timor - 1967/75) com base em documentos nela existentes e no Arquivo Geral da Marinha e em depoimentos prestados por alguns dos intervenientes na operação também o confirmam.

Transcrevo um excerto do livro «O Sonho Desfeito - Quanto Vale a Vida de um Homem?», de Vasco Pinto Leite, irmão do Dr. Pinto Leite, falecido também no acidente:

"(...) Dia 25 de Julho de 1970

"Cerca das 15.00 horas ocorreu a queda de l helicóptero da FAP quando voava de Teixeira Pinto psra Bissau e foi atingido por um forte tornado. (...) pilotado pelo alferes miliciano Pil Av da FAP Francisco Lopes Manso e fazia parte duma formação de 3 helicópteros comandada pelo Cap Pil Av Cubas, que pilotava um dos helicópteros, sendo o terceiro pilotado pelo alferes miliciano Pil Av Coelho.

"O helicóptero sinistrado transportava como passageiros:
- 4 deputados à então Assembleia Nacional (Dr James Pinto Bull, Dr José Pedro Pinto Leite, Dr Leonardo Coimbra e José Vicente de Abreu).
- Capitão de cavalaria Carvalho de Andrade, oficial de ligação do Comando Chefe das Forças Armandas da Província da Guiné.

"Posteriormente viria a verificar-se que o helicóptero tinha caído nas águas do Rio Mansoa, em 20 metros de fundo, a Este da Ilha de Lisboa, ou seja, entre esta e a Ilha de Bissau."


Buscas ocorreram nos dias seguintes (segundo cópias de documentos constantes no livro), terão sido resgatados das águas lodosas dois corpos identificados como sendo do Dr Leonardo Coimbra e do Cap Carvalho de Andrade, e os detroços do aparelho, estes últimos entregues à FAP a 30 de Julho.

Uma das lanchas envolvidas nas buscas, "a LPG Cassiopeia manteve-se na área até ao dia 2 de Agosto, fazendo buscas sistemáticas das águas do Mansoa entre as ilhas de Lisboa e de Bissai mas nada mais viria a encontrar. (...) botes voltaram por vezes às zonas das buscas, em observação, mas nada mais encontraram."

Mas, de facto, e com muita pena minha e concerteza de todos os familiares das vítimas deste desastre, nunca houve nenhum INQUÉRITO. No livro, Vasco Pinto Leite afirma ainda:

"(...) Três dias depois da tragédia, em 28 de Julho de 1970, morre Salazar, e as atenções da Comunicação Social passam para 2º plano o impacto com o desastre da Guiné. Daí para a frente, os brandos costumes portugueses fizeram o resto", inclusivamente "o inquérito que não foi feito", sublinha o autor! (****).

Espero ter elucidado e respondido a algumas dúvidas.

Na imaginação desenho ainda hoje o meu retrato do meu Avô que quis o destino (ou não) que eu nunca tivesse conhecido, e na memória ficam, para além da enorme tragédia, histórias e relatos maravilhosos da minha Avó principalmente, mas também de outras pessoas que tiveram a felicidade de se cruzarem na vida com o meu Avô e com quem também eu me tenho vindo a cruzar!

Sofia Pinto Bull

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Notas de L.G.:

(*) Vd. também postes de:

11 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3296: Controvérsias (4): O acidente aéreo de 26 de Julho de 1970 (Jorge Picado)

20 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3335: Controvérsias (6): O acidente aéreo de 25 de Julho de 1970 (Carlos Ayala Botto)

10 de Outubro de 2008 (Guiné 63/74 - P3291: (Ex)citações (4): Pinto Leite, em Bambadinca, dois dias antes de morrer em desastre de helicóptero: Não há solução militar)

10 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3866: FAP (7): Troca de lugar no ALL III salvou-me a vida, em 25 de Julho de 1970 (Jorge Caiano, mecânico do Alf Pilav Manso)

(**) Último poste da série > 24 de Outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5153: Controvérsias (31): Afinal quem saiu derrotado na guerra da Guiné? (José da Câmara)


Não confundir o James Pinto Bull com o seu irmão, Benjamim Pinto Bull, de quem se apresenta aqui uma resenha biográfica, adaptada (Cortesia de Wikipédia > Benjamim Pinto Bull)

(i) Benjamim foi o líder da União dos Naturais da Guiné-Portuguesa (UNGP), um movimento que defendia uma evolução, negociada e pacífica, para a Guiné-Bissau.

(ii) Cita o Diário de Notícias, aquando da sua morte recente, que Benjamim Pinto Bull “era daqueles homens como já há poucos, um lutador”.

(iii) Durante a sua vida foi um defensor de uma independência progressiva da Guiné-Bissau, em oposição com a linha (revolucionária) de Amílcar Cabral e do seu PAIGC. Chegou, ao que parece, a tentar negociar nos bastidores do poder de Salazar.

(iv) Nasceu na Guiné-Bissau, no seio de uma das suas mais ilustres famílias.

(v) O seu irmão, James Pinto Bull, foi o histórico deputado da Ala Liberal, que morreu, no acidente de helicóptero, com José Pedro Pinto Leite e outros, em 25 de Junho de 1970, no Rio Mansoa.

(vi) Aos sete anos de idade, Benjamim Pinto Bull foi enviado para França, onde ingressou num seminário. Concluiu o ensino secundário e voltou para Portugal, para um seminário em Viana do Castelo. Nesta cidade estudou grego e latim. Mas não seguiu a vida eclesiástica.

(vii) Já em idade adulta, regressou à sua terra, para trabalhar nas alfândegas. Nesta altura, a Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PIDE) seguiu-o e perseguiu-o até à Guiné-Bissau.

(viii) Segue-se o seu o exílio, no Senegal, onde foi acolhido por Léopold Sédar Senghor.

(ix) No Senegal, continuou a luta pela independência do seu país. Léopold Sédar Senghor foi, além de dirigente político e nacionalista, um poeta e um intelectual de grande craveira. Senghor e Pinto Bull tornaram-se grandes amigos.

(x) Abraçando uma nova etapa da sua vida no Senegal, Benjamim promoveu a língua portuguesa, a nível do ensino secundário e do ensino superior. Tornou-se rapidamente no tradutor oficial de Senghor (que, de resto, e ao que parece, na sua árvore genealógica, teria ascendentes portugueses).

(xi) Continuou os seus estudos, formando-se em Filologia Românica em Paris, para depois regressar a Dakar para dar aulas. A sua tese de doutoramento versa sobre o trabalho de Senghor: "Leopold Sédar Senghor e a Negritude".

(xii) Regressa a Portugal em 1984. Foi cônsul do Senegal em Lisboa e leccionou Latim Jurídico e Literatura Africana de Expansão Portuguesa em várias universidades privadas, como a Moderna, a Internacional ou a Lusófona.

(xiii) Em 1989, publicou "Filosofia e sabedoria, O crioulo da Guiné-Bissau". Publicou ainda uma autobiografia – "Memórias de um Luso-Guineense" – com introdução a cargo de Adriano Moreira.

(xiv) Em 1992, num autocarro, a caminho de Loures, Benjamim Pinto Bull defendeu um rapaz de apenas 12 anos que estava a ser insultado. Foi agredido e um soldado da GNR acabou por ser acusado de racismo e violência contra o professor. Um triste, miserável episódio que mereceu a atenção da comunicaçã social, na época, e que levou o então Presidente da República, Mário Soares, a pedir-lhe publicamente desculpas em nome de Portugal.

(xv) Benjamim Pinto Bull faleceu em Lisboa, no dia 25 de Janeiro de 2005.


Do James Pinto Bull, encontrei as seguintes referências bibliográficas, no Portal Memórias de África e do Oriente, Fundação Portugal-África, desenvolvido pela Universidade de Aveiro e pelo CESO :

[13098] Bull, James Pinto
Subsídios para o estudo da circuncisão entre os balantas / James Pinto Bull. In: Boletim cultural da Guiné portuguesa. - Vol. VI, nº24 (1951), p. 947-954
Descritores: Guiné-Bissau Antropologia social e cultural Circuncisão


[13108] Bull, James Pinto
Amor e trabalho / James Pinto Bull. In: Boletim cultural da Guiné Portuguesa. - Vol. VII, nº25 (1952), p.181-187
Descritores: Guiné-Bissau Antropologia social e cultural Contos

[64277] Bull, James Pinto
Amor e trabalho / James Pinto Bull. In: Boletim cultural da Guiné Portuguesa.- vol. 7, nº 25 (Jan. 1952), p. 181- 187
Descritores: Guiné Bissau Trabalho

[80712] Bull, James Pinto
Visita presidencial á Província da Guiné Portuguesa / James Pinto Bull. In: Cartaz. - ano 4, nº 16 (1968), p. 15.
Descritores: Guiné Bissau Chefe de Estado Visita oficial População autóctone

[186325] Bull, James Pinto
Subsídios para o estudo da circuncisão entre os balantas / James Pinto Bull. In: Boletim Cultural da Guiné Portuguesa. - Vol. VI, nº 24 (1951), p. 947-954
Descritores: Guiné-Bissau Mutilação sexual População autóctone

[201234] Bull, James Pinto
A doença do sono / James Pinto Bull. - Contém bibliografia. In: Anuário da Escola Superior Colonial. - (1944-1945), p. 223-233
Descritores: África Doença tropicalTEXTO :


(****) Vd. Decreto-Lei n.º 400/70:

Considerando que no decorrer de uma viagem à Guiné, organizada para informação da Assembleia Nacional, morreram num desastre de helicóptero os Deputados James Pinto Bull, José Pedro Maria Anjos Pinto Leite, José Vicente Abreu e Leonardo Augusto Coimbra;

Atendendo a que a missão que lhes foi confiada se revestia de grande importância para o País;

Usando da faculdade conferida pela 1.ª parte do n.º 2.º do artigo 109.º da Constituição, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:

Artigo único. - 1. Aos familiares que estavam a cargo de cada um dos Deputados James Pinto Bull, José Pedro Maria Anjos Pinto Leite, José Vicente Abreu e Leonardo Augusto Coimbra, e que a requeiram, será atribuída uma pensão do Tesouro do quantitativo correspondente ao subsidio mensal fixado para os Deputados, compreendendo a parte fixa e trinta dias de senhas de presença, a abonar mensalmente, com inicio no dia imediato ao do acidente.

2. O direito e a fruição destas pensões regulam-se pelos princípios estabelecidos no Decreto-Lei n.º 47084 , de 9 de Julho de 1960, não estando, contudo, os seus quantitativos sujeitos a quaisquer deduções, com excepção do selo de recibo.

Visto e aprovado em Conselho de Ministros. - Marcello Caetano - João Augusto Dias Rosas.

Promulgado em 12 de Agosto de 1970.
Publique-se.

Presidência da República, 21 de Agosto de 1970. - AMÉRICO DEUS RODRIGUES THOMAZ.

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Guiné 63/74 - P3238: Antropologia (12): O Crioulo da Guiné. Mário Beja Santos.

O Crioulo da Guiné-Bissau (IV)

Património do Crioulo Guineense

Provérbios, adivinhas, contos
Beja Santos

O crioulo guineense é uma singularidade cultural que ainda não está bem estudada: língua veicular entre as populações nativas, foi sobranceiramente tratada pelo colonizador como uma algaraviada que a língua portuguesa se encarregaria de deitar para o caixote do lixo da História.

Em “O Crioulo da Guiné-Bissau, Filosofia e Sabedoria”, publicado em 1989, Benjamim Pinto Bull lançou luz sobre a imensidão da riqueza linguística desse crioulo que se adaptou ao longo dos séculos e que faz comunicar os guineenses no Cantanhez ou no Monte Abraão, tal o seu vigor da sua originalidade.

Os provérbios guineenses que Pinto Bull conseguiu inventariar abarcam um universo onde cabem o divino e a providência, a casa e a família, a constelação das relações humanas, os múltiplos elementos naturais que envolvem o agricultor ou o pescador, mas também o cosmopolita e também as viagens e as deslocações. Da análise a este rico inventário, Benjamim Pinto Bull reflecte sobre o seu enraizamento na vida quotidiana do guineense, são provérbios que falam de recados, mensagens de prudência ou avisos morais, é uma ordem das coisas não introduzindo clivagens brutais entre os islamismo e o animismo mas não escondendo contradições aparentes no seu discurso proverbial, designadamente entre a religião e as superstições.

No tocante ao divino, há sempre a aceitação do juízo de Deus e seu inefável poder e misericórdia do tipo: sabe Deus o que faz; quem nada tem, Deus o mantém; quem cospe para o céu, na cara lhe cai.

Digamos que esta sabedoria não sai de qualquer classificação do que é o respeito pelo divino ou o convite ao seu acatamento. O que denuncia a profunda riqueza do provérbio em crioulo tem a ver com a vida doméstica e familiar: Recomenda-se prudência e fala-se no baga-baga (“Bu sinta riba di baga-baga, bu na rui cõ”, ou seja, estás sentado em cima de uma baga-baga e estás a dizer mal do solo, por outras palavras conversas com uma pessoas e dizes mal de alguém que até pode ser familiar ou amigo do criticado, recomendo-te toda a prudência).

Mas há mensagens de valor universal, do tipo “filho de peixe sabe nadar”, “de pequenino se torce o pepino”, “quem feio ama, bonito lhe parece”.
Os valores familiares, como sabemos, são quase místicos para quase todos os africanos, como nos lembra este provérbio: “Kasamentu ta kaba, ma kuñadadia ka ta kaba” ou seja pode haver separação, divórcio ou morte mas a cunhadia não acaba.
A moralidade africana fala da hospitalidade, da amizade inseparável (“Sila ku Prera dus kurpu nu korsõ”, Sila e Pereira, dois corpos num só coração), o auxílio mútuo, a compreensão, a tolerância e a verdade (“Bardadi e suma malgeta, e ta iardi” ou seja a verdade é como o piri-piri, arde).

Encontramos provérbios que nos referem a desavença, a vingança, a astúcia, a curiosidade, mas também a confiança, a solidariedade, a injustiça, a longa experiência e os aspectos práticos da vida.
Os provérbios crioulos envolvem animais como as fábulas de La Fontaine: a pintada (galiña di mato), a tartaruga, o mangusto e o abutre. Um outro aspecto colateral ao valor dos provérbios tem a ver com a fé no divino, a saúde e o sofrimento, o uso de fórmulas invocativas e esconjuratórias do crioulo, que acabam por pesar nas sentenças, sobretudo as que têm a ver com as superstições e o sincretismo religioso.

Igualmente as tradições e os costumes carecem de análise, pois vão ser usados recorrentemente na abordagem dos grandes valores da cultura guineense: o respeito pelos velhos, o culto dos mortos e as respectivas cerimónias, por exemplo.
O espaço ocupado pelas adivinhas não é fácil de mapear. Como observa Pinto Bull, na mesma adivinha há muitas vezes duas ou três palavras que nos podem levar a integrá-la em categorias diferentes; como nos provérbios, certas letras maiúsculas precedem a adivinha crioula e no final há um comentário sucinto. Obviamente que a fórmula é sempre a mesma: Qual é a coisa? Qual é ela? As adivinhas constituem um rico manancial da narrativa oral.
Os anciãos, sobretudo à noite, à volta da fogueira, empolgam as crianças com estes jogos de adivinhas que falam de mistérios, trabalhos agrícolas e das relações morais que vinculam as comunidades.

Como escreve Pinto Bull, a maior parte das adivinhas da Guiné tem as suas raízes profundas nas aldeias, na vida quotidiana do trabalhador guineense, por isso falam de abóboras, arroz, mandioca, porco ou rio. A adivinha é um exame, instiga à conversação e o diálogo, toda a pergunta tem solução.

Todo este entrelaçado da filosofia e da sabedoria tem o seu ponto alto nos contos ou stória: Deus e os animais, os homens e os animais, os animais entre si, um único, dois ou três animais como personagens principais. A lebre pode pedir a Deus para que lhe dê mais esperteza. Deus pode chamar a lebre e mandá-la pela floresta à procura da pele de jibóia para fazer sandálias; um caçador vai à caça encontra um crocodilo, este suplica-lhe para ele não lhe tirar a vida, começa aqui a moralidade; a lebre pode conversar com o hortelão? O jambatutu, o rei dos pássaros, terá de aparecer nestes contos, terá a sua imagem maltratada, o falcão pode conversar com o abutre, a lebre com a perdiz ou com a hiena, esta com a coruja, o camaleão com o elefante, ou então a lebre, o elefante e o hipopótamo, mas também o cão, a cabra e a vaca.
A estrutura do conto tem grande plasticidade o importante são a motivação e as ligações, pode recorrer a antagonistas, uma vítima e um caçador, é indispensável que o processo narrativo consagre o diálogo, alguém que peça clemência, há um momento de tensão ou maldade, segue-se a reparação e a moral da história.
Segundo Pinto Bull é em torno destas stória que o crioulo brilha mais alto. É uma língua engenhosa, exalta o direito à diferença, a protecção do mais fraco, o saber vencer e derrubar todos os obstáculos. É neste estrutura narrativa que o contador educa e alerta o auditório para os valores da justiça, da solidariedade, da hospitalidade, do respeito pelas tradições, os exemplos de coragem.

Com mensagem à guisa de conclusão, Pinto Bull insiste que o português continuará a ser a língua de expressão oficial mas o crioulo a língua que corporiza a unidade dos povos da Guiné, é e será a língua da nação que cimenta uma comunicação entre tão díspares línguas maternas.

Para Pinto Bull, a lusofonia é exactamente isto: complementaridade, uma unidade dentro da diversidade, um convívio linguístico sincero e fraterno. E o autor despede-se dos seus leitores com mais de dois mil vocábulos crioulos de um glossário comparando-os com o português e francês já que estas duas línguas são indispensáveis para estudar mais profundamente o que é a essência do crioulo da Guiné-Bissau.
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Notas de vb:

(1) Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), autor de "Diário da Guiné": 1968-1969: Na terra dos Soncó. Lisboa: Temas & Debates. 2008. Uma obra de que o nosso blogue se orgulha de apoiar e de ter visto nascer. Começou por ser uma série, publicada semanalmente no nosso blogue, ao longo do ano de 2007. Está prevista a saída do 2º volume, em Novembro próximo com o título provisório: Diário da Guiné: 1969-1970: Tigre Vadio. Disponível também no Círculo de Leitores. (Luís Graça)

(2) artigos relacionados em 14 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3206: Antropologia (11): O Crioulo da Guiné. Mário Beja Santos.

domingo, 14 de setembro de 2008

Guiné 63/74 - P3206: Antropologia (11): O Crioulo da Guiné. Mário Beja Santos.

O Crioulo da Guiné-Bissau (III)

As singularidades do Kriol da Guiné-Bissau

Beja Santos (1)

O crioulo da Guiné-Bissau suscita o maior interesse nos meios linguísticos, em África e no mundo. É a língua veicular de um povo, a língua franca num território onde se falam 22 idiomas étnicos, território esse que não excede a superfície do nosso Alentejo. É uma língua independente, em crescimento e complexificação, assimilando a toda a hora os termos necessários da nossa contemporaneidade. O ideólogo máximo do PAIGC, Amílcar Cabral, não só falava um português primoroso como deixou toda a sua produção científica e política redigida num português de elevada cultura, o que veio marcar a formação da Guiné como país dividido entre uma liga de comunicação comum, o crioulo, e o português, entendido como a língua da identidade nacional face ao universo francófono envolvente.



Para entender as raízes dessa língua espantosa, aprofundar o seu saber original, é importante ler o que de melhor se escreveu sobre este crioulo, o mesmo é dizer é indispensável ler “O crioulo da Guiné-Bissau, Filosofia e Sabedoria”, por Benjamim Pinto Bull, Instituto de Cultura e Língua Portuguesa, 1989. No primeiro texto que dedicámos ao estudo que Pinto Bull dedicou ao crioulo do seu país, deu-se uma panorâmica dos diferentes falares crioulos, da intersecção entre o português e as línguas nativas, primeiro na Senegâmbia e depois na actual Guiné-Bissau, aflorou-se a colonização da Guiné para se revelar como se organizou e difundiu o crioulo nas praças e presídios, no tráfego de escravos e no comércio dos tangomaus ou lançados, na cultura dos grumetes ou assimilados. A grande singularidade é que a Guiné-Bissau é o único país de expressão oficial portuguesa onde coexistem sem sobressaltos as línguas africanas, o crioulo e o português. O surpreendente é que o crioulo é uma língua antiga e sempre renovada, recebe interferências linguísticas do francês, das línguas senegalesas, é riquíssima em provérbios, contos e adivinhas, o colonizador julgou mesmo no século XX que iria ser desvanecida a sua importância com o português, tal não aconteceu, o crioulo está reabilitado, autónomo, de boa saúde. Pinto Bull procura justificar como tudo aconteceu.

Primeiro, é impressionante o número de palavras crioulas nas relações e descrições dos viajantes e religiosos do século XVI ao século XX, o seu livro inclui o seu estudo pormenorizado no glossário. Logo no século XVII se observava o exótico multicolor da língua do país, referindo-se expressamente a palavra crioula. As descrições da fauna ou da flora, expressão nomes em crioulo, certamente por quem perguntava era esclarecido por negros e mulatos que dominavam fluentemente o crioulo. Os poucos períodos de sucesso missionário ocorreram quando os religiosos perceberam que a sua comunicação não podia prescindir centralmente do crioulo. Dos diferentes testemunhos evocados por Pinto Bull registo um do rei de Bissau, Incinhate, que se dirige ao governador Gomes Mena assim em 16 de Janeiro de 1697: “Sr. Governador, faço a V. Ex.ª esta carta para lhe falar mantenha”.

Segundo, coube aos grumetes a resistência cultural do crioulo. Em 1842, surgiu, um conflito entre o governador de Bissau e os grumetes da cidade. Dois anos depois, dá-se nova revolta, e os grumetes tomam a iniciativa de negociar a paz. A cerimónia decorre debaixo dos poilões, onde se resolvem os litígios – palavra, em crioulo. Poderá ser excessivo querer encontrar nas manifestações de revolta dos grumetes qualquer sinal de independência. O que os relatos deixaram claro é que houve resistência dessa gente que se expressava em crioulo e que queria ver a sua língua respeitada, a sua língua e a sua identidade.
Uma das maiores figuras do século XIX da vida política da Guiné foi Honório Pereira Barreto, um natural da Guiné que procurou defender a integridade do território sobretudo dos franceses e dos ingleses. Cabe a este homem que foi governador de Bissau uma expressiva definição do crioulo: “A língua do país é um dialecto da portuguesa, mas tão desfigurada que os Reinícolas não a entendem; além disso é recheada de muitas palavras derivadas do gentio”.
O primeiro cientista a estudar o crioulo foi o padre Marcelino Marques de Barros, natural de Bissau. Veio para Portugal com 12 anos, depois de ordenado padre em Cernache do Bonjardim, foi nomeado pároco em Bissau, percorreu a Guiné durante onze anos, veio a Portugal por motivos de saúde e regressou à Guiné onde permaneceu por mais oito anos. Deixou a sua obra espalhada por diferentes publicações como por exemplo o “Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa”. Correspondeu-se com linguistas de renome e escreveu obras ainda hoje de leitura obrigatória, tais como “Literatura dos Negros: contos, cantigas, parábolas” ou “Guiné Portuguesa ou Breve Notícia Sobre os Usos, Costumes e Línguas da Guiné”. É, historicamente, o primeiro estudioso do crioulo guineense, tendo mesmo organizado um vocabulário português/guineense, repertoriando 5420 palavras, deixando claro à comunidade científica que havia duas línguas aparentadas mas distintas: labra (cultivar), kume (comer), rema (remar), verbos que dão substantivos (labur, kumida e remu). No início do século XX, a alta sociedade do Cacheu fala informalmente em crioulo, cantado em crioulo, escrevia histórias em crioulo.

Terceiro, o colonialismo não compreendeu o crioulo e procurou discriminá-lo. Pinto Bull refere a Carta Orgânica da Província da Guiné (1917), o Acto Colonial (1930), o Acordo Missionário (1940), o Diploma legislativo n.º 1356 (1946), que constituíram tentativas de banimento de uma língua tida como uma algaraviada de gente inferior que para chegar à civilização deviam obrigatoriamente fazer um uso exclusivo do português.
Em 1954, Avelino Teixeira da Mota dá o sinal de alarme: “A difusão actual do crioulo – ainda que pese aos puristas e racistas – é um triunfo do português. Porque o crioulo, aqui, está em evolução, e cada vez se enche de palavras portuguesas”. Durante a luta de libertação, o PAIGC usou o crioulo como arma ideológica: nas escolas, na propaganda e mesmo na música (Musika k’ no na kanta luta de libertasõ, a música que cantamos é a nossa luta de libertação; Tempu di labur, tempu di kalur, tempo de trabalho, tempo de suor). Com a independência, o crioulo ganhou reconhecimento em toda a sociedade, tornou-se num instrumento de trabalho, apareceram poemas, obras didácticas, storia, adivinhas, banda desenhada.

Quarto, a prova indesmentível da sabedoria crioula é comprovado pelos seus provérbios, transmitidos em história e fábulas, em canções para ninar, e Pinto Bull recolheu-as graças a alguns contadores que o ajudaram no levantamento. São provérbios que falam da religião, da casa, da família, das relações humanas, do desentendimento, da vingança, das proezas, das viagens, das injustiças e da solidariedade. Vale a pena no próximo texto passar em revista alguns desses provérbios, fórmulas evocativas e até adivinhas. Eles constituem a prova provada de uma cultura admirável de grandes bibliotecas da narrativa oral onde se espraia o génio africano.
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Nota do editor

(1) Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70).

(2) artigos relacionados em

5 Setembro 2008 > Guiné 63/74 - P3175: Antropologia (10): O Crioulo da Guiné. Mário Beja Santos

29 Agosto 2008 > Guiné 63/74 - P3154: Antropologia (9): O Crioulo da Guiné. Mário Beja Santos

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Guiné 63/74 - P3175: Antropologia (10): O Crioulo da Guiné (Mário Beja Santos)

O Crioulo da Guiné-Bissau (II)



O livro de Benjamin Pinto Bull encheu-me de orgulho pela sua importância quanto ao estudo da nossa língua e como ela influenciou e influencia o crioulo da nossa Guiné-Bissau. É um livro deslumbrante que merece um tratamento de divulgação. Farei um conjunto de referências e começarei a enviar mais na próxima semana.
"O Crioulo da Guiné-Bissau", de Benjamim Pinto Bull é uma edição de 1989, patrocinado pelo Ministério de Educação de Portugal, é uma edição conjunta do Instituto de Cultura e Língua Portuguesa (Portugal) e do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa (Guiné-Bissau). A capa é de Maria Fernanda de Carvalho e os desenhos de Cathie Peyredieu Pinto Bull, prefácio de Léopold Sédar Senghor

A Sabedoria do Crioulo Guineense

Beja Santos

Uma grande figura da cultura luso-guineense

Benjamim Pinto Bull (1916-2005) foi um lutador pela independência da Guiné-Bissau e um grande intelectual africano do século XX, aparecendo o seu nome ligado à promoção da língua portuguesa e ao estudo do crioulo guineense. Licenciou-se em Filologia Românica pela Sorbonne, doutorou-se em Rennes (também em França) com uma dissertação sobre O Crioulo da Guiné-Bissau: Filosofia e Sabedoria (Instituto de Cultura e Língua Portuguesa e Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa, 1989). No prefácio do resumo do seu doutoramento, Léopold Sédar Senghor, antigo presidente do Senegal e membro da Academia Francesa exaltou a originalidade do seu trabalho como uma simbiose das culturas guineense, senegalesa e francesa. Pinto Bull apareceu na Universidade de Dakar em 1962 como responsável pela cadeira de Português. No final da década de 80 havia já no Senegal mais de mil alunos que aprendiam nos liceus do país a língua de Camões. O seu glossário de crioulo guineense é um trabalho magistral de valor incalculável, só precedido pelo trabalho pioneiro de outro guineense de grande estatura que foi o padre e investigador Marcelino Marques de Barros (1844-1928).

Senghor refere os aspectos capitais do trabalho de doutoramento de Pinto Bull e que são: o estudo das sobrevivências linguísticas portuguesas (toponímia, patronímica e vocabulário) na Guiné-Bissau, Gâmbia e Senegal; a abordagem do crioulo em geral e síntese dos diferentes falares crioulos; generalidades do crioulo da Guiné e referência a palavras crioulas nas relações e descrições dos viajantes e religiosos; o apogeu do crioulo ao tempo de Marcelino Marques de Barros e como é que ele entrou em declínio em meados dos anos quarenta; como se processou a reabilitação do crioulo, inclusive durante a luta da libertação. Começa aqui, talvez, a parte mais interessante do trabalho de Pinto Bull reservado ao património cultural crioulo. Ele analisa exaustivamente a filosofia e sabedoria do crioulo: provérbios, alcunhas, esconjuratórias, tradições e costumes, contos. E a nossos olhos abre-se uma realidade, uma bela narrativa oral que são as storia contadas pelos garandi contadas aos mais jovens onde se podem avaliar a alta qualidade das estruturas do conto crioulo com o seu estilo vivo cheio de ritmo e harmonia, manipulando com imenso talento os pleonasmos, as elipses, os eufemismos e até a ironia.

A dissertação de Pinto Bull é tão mais importante quando se sabe que o crioulo e o português vão coexistir ou coabitar por muito mais tempo. Se o português é a língua oficial da Guiné-Bissau, a língua que abre o país ao mundo exterior, fazendo-o escapar do isolamento cultural, o crioulo é língua viva e permanente da nação. Neste primeiro texto dedicado ao maior investigador de crioulo guineense do século XX e que faleceu no hospital Amadora-Sintra em 25 de Janeiro de 2005, precede-se à síntese dos capítulos referentes às sobrevivências linguísticas do português na Senegâmbia e uma abordagem do crioulo em geral.

Garandi k’ jungutu ta ma oja lunju di ke mininu k’ sikidu: Um ancião de cócoras vê mais longe do que uma criança de pé

Os portugueses baptizavam as terras que descobriam recorrendo hagiologia, os nomes dos santos e das santas eram frequentemente homenageados. Mas também as cores: Cabo Branco, Cabo Roxo, Cabo Verde. Inspiraram-se em animais, no ouro, na malagueta, etc. Restam sobrevivências linguísticas em diferentes regiões. No Senegal, os cristãos de Rufisque (talvez Rio Fresco) usavam nomes e apelidos portugueses, afrancesados. Gummes, Gonçalve, Rodrigue, Dies, Barrette, Baptiste. Os senegaleses, descendentes de imigrantes das ilhas de Cabo-Verde, são os Mendez, Gomez, Lopez que, em Ziguinchor se transformam em Mendy, Gomis e Lopy.

Na Gâmbia, Pte Barra é simplesmente a tradução do topónimo português Ponte da Barra e Ilha de Santa Maria deu origem ao topónimo inglês Sta. Maria Isle. Refere Pinto Bull que as autoridades coloniais da Gâmbia, dado o grande número de imigrantes vindos da Guiné Portuguesa que não falavam inglês, inscreviam o crioulo no registo civil sob a patronímica Carayol com o fim preciso de identificar esses emigrantes. Passando para a Guiné-Bissau, em que a palavra Guiné é de origem africana, aparecendo com várias grafias ao longo dos séculos, o topónimo Bissau é provavelmente papel, uma das etnias do país.

O actual Canal de Geba era designado nos mapas antigos sob o topónimo de Rio Grande ou rio Francasso, de origem mandinga. Os topónimos da região de Bafatá são de origem mandinga, os do Biombo são de origem papel, os de Bolama estão nitidamente associados ao crioulo e o mesmo se dirá de topónimos da região de Cacheu. Quanto à região de Gabu, prevalecem os topónimos de origem mandinga enquanto no Oio há topónimos claramente africanos que o crioulo respeitou.
Concluindo esta matéria, o investigador refere que a Guiné-Bissau tem diferentes topónimos de origem portuguesa que foram acrioulizados, há igualmente topónimos acrioulizados e há topónimos crioulos, caso de Gã Gregório, Ponta Augusto Barros e Ponta Consolação (gã em crioulo significa quarteirão de casa ou pequena aldeia e ponta propriedade rural). Pinto Bull refere o importante papel desempenhado pelos intérpretes na preservação das culturas guineenses e do crioulo em particular.

Os falares crioulos

Para os diferentes investigadores, a palavra crioulo designa um sistema linguístico autónomo de origem mista, que decorre do contacto de uma língua europeia com línguas indígenas ou importadas e que se tornou ou numa língua materna ou em língua principal de uma dada comunidade. Há crioulos com base lexical francesa, nas Américas (caso do Haiti, Martinica e Guadalupe, mas também na Guiana), no oceano Índico (caso da Reunião e Seychelles), crioulos com base lexical espanhola (o papiamento nas ilhas Curaçau, Aruba e Bonaire, por exemplo), crioulos com base lexical inglesa (Jamaica, crioulo da Guiana, o krio da Serra Leoa), crioulos com base lexical holandesa, crioulos com base lexical portuguesa (São Tomé e Príncipe, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Malaca, Macau, Sri Lanka e Índia, mas também diferentes crioulos no Brasil). Depois, Pinto Bull anuncia que se vai centrar no crioulo da Guiné, fala da sua história, na Guiné de Cabo-Verde e na Guiné autonomizada de Março de 1879, refere o tráfego de escravos, a importância dos lançados, os recursos económicos, os aspectos étnicos e humanos. Começaremos o próximo texto falando das generalidades do crioulo da Guiné.
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Notas de vb:

(1) Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70)

(2) artigos relacionados em

29 Agosto 2008 Guiné 63/74 - P3154: Antropologia (9): O Crioulo da Guiné. Mário Beja Santos
11 de Agosto de 2008 Guiné 63/74 - P3128: Antropologia (8): Exposição Bijagós no Museu Afro Brasil, São Paulo