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quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Guiné 63/74 - P8896: Recortes de imprensa (51): Hoje como ontem, de África ao Afeganistão, a realidade (oculta) do stresse pós-traumático de guerra...

Reproduzido,  com a devida vénia,  do JN - Jornal de Notícias, de 8 do corrente:

Sociedade > Militares que serviram no Afeganistão têm sintomas de stress pós-traumático



Um estudo da Universidade do Minho aponta que mais de 10% dos militares portugueses em missão no Afeganistão entre 2005 e 2009 apresentam sintomas de perturbação de stress pós-traumático [PSPT], além de queixas físicas e outras doenças.

Em entrevista à Agência Lusa, o investigador da Universidade do Minho (UM) Carlos Osório, que é também militar, explicou que um dos objectivos desta investigação foi "perceber as consequências a nível de saúde" que a presença no Afeganistão teve para os militares portugueses "no imediato e a longo prazo". 

Assim, referiu, "foram feitos inquéritos a 113 militares do Exército português mobilizados no Afeganistão, integrados na International Security Assistance Force [ISAF], uma força que tem por objectivo restabelecer a paz entre forças beligerantes".   

Segundo Carlos Osório, estes inquéritos serviram para "avaliar a exposição a stressores específicos" a que os militares das forças especiais portuguesas estiveram expostos no Afeganistão e a "associação desta exposição com o desenvolvimento de problemas mentais e queixas físicas".  

Os resultados, revelou o investigador, mostram que destes 113 militares, "três por cento preencheram os critérios de PTSD [, acrónimo inglês de Post-Traumatic Stress Disorder] e 10 por cento os critérios de PTSD parcial", isto a nível de "sintomas de perturbação mental".

Quanto a problemas de saúde física, "os resultados mostraram a presença de queixas físicas como dores nas costas, fadiga, dores musculares, dificuldades em dormir, ou inclusivamente dores de cabeça", enumerou o investigador.

Já as doenças "mais comuns" identificadas foram "doença gastro-intestinal, nervosa, respiratória, alérgica e cardiovascular".

Sobre o "teatro" em que se movimentaram estes militares, o estudo mostra que:

(i)  "71% destes militares participaram em operações de combate onde poderiam ter perdido a vida",

enquanto  (ii) "81% observaram inimigos feridos, 

(iii) 23% observaram inimigos mortos,

(iv) 15% feriram inimigos em combate

e (v) 10% chegaram mesmo a matar inimigos".

Segundo Carlos Osório, "apesar de a presença de PTSD e PTSD parcial ser relativamente baixa", os sintomas destas perturbações mentais estão "associados a diversas queixas físicas e à presença de doenças". 

Com base neste estudo, o investigador concluiu ser "essencial a criação de programas que avaliem e monitorizem todos os militares portugueses regressados do Afeganistão" para lhes "providenciar sempre que necessário o acompanhamento psicológico e psiquiátrico".

Carlos Osório alertou ainda para a necessidade de "todos os militares que apresentem várias queixas físicas serem avaliados para PTSD" e que "aqueles diagnosticados com PTSD devem também ser avaliados para a presença de sintomas físicos".

[ Revisão / fixação de texto / links / título: L.G.]

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Nota do editor:

Último poste da série > 3 de Outubro de 2011 >Guiné 63/74 - P8852 Recortes de imprensa (50): Medalha de mérito militar chega 43 anos depois... A história do 2º Srgt Mil Libério Candeias Lopes, de Penamacor (CCAÇ 526, Bambadinca e Xime, 1963/65)

segunda-feira, 21 de novembro de 2005

Guiné 63/74 - P281: Morreu um soldado português no Afeganistão...

Vários tertulianos - para já, o A. Marques Lopes, o Afonso Sousa e o João Tunes - manifestaram-se a propósito da notícia da morte de um dos nossos soldados, no Afeganistão (1). Aqui ficam os seus comentários. O texto e o contexto justificam a sua inserção no nosso blogue.

1. Texto do A. Marques Lopes (de 18 de Novembro de 2005, que circulou por e-mail, pela tertúlia)

Morreu um soldado português no Afeganistão (foi um sargento) e dois ficaram feridos (um em estado grave, já sabemos o que isso quer dizer...). Foi com uma mina. Onde é que já ouvimos... e vimos isto, nós os veteranos de guerra?...

Primeira questão:

- No Iraque não morreu nenhum GNR, mas no Afeganistão morreu já um soldado portugês; missões diferentes? cuidados diferentes? Uma coisa é certa: a condição do militar é poder ser morto no desempenho da sua missão. Mas há quem continue a não perceber (ou não querer perceber) esta particularidade, merecedora de mais respeito e atenção, e contrapartidas adequadas.

Segunda questão:

- Todos nós estivemos nesta condição na Guiné, voluntária ou involuntariamente, consciente ou inconscientemente; estivemos para defender o que os governantes da altura chamaram os interesses de Portugal, também voluntária ou involuntariamente, também conscientes ou sem nenhuma consciência disso. Teve que ser, que remédio, já passou, e vamos falando disso. A maior parte lamenta-se, e bem, porque não lhes estão a reconhecer essa condição(imposta, na altura).

Terceira questão:

- Os interesses eram claros para nós (embora contestados) em Angola, Guiné e Moçambique. Mas quais são os interesses em jogo no Afeganistão (país charneira naquela região da Ásia, estrada dos pipe-lines que ligam às repúblicas asiáticas da ex-URSS, e produtoras de petróleo) ou no Iraque (fonte quase inesgotável de petróleo)? Neste aspecto, não é claro que sejam interesses de Portugal, e há outros com todo o interesse.

Quarta questão:

- Estamos em alianças com estes e temos que cumprir as nossas obrigações de aliados. Morremos a cumpri-las. E eles? A nossa frota pesqueira, a nossa agricultura e a nossa indústria são destruídas para podermos comprar os seus produtoa nos hiper e supermercados de Portugal; o nosso desemprego sobe exponencialmente, porque os nossos aliados deslocam a s empresas para onde há mão-de-obra mais barata (mas o nosso governo está a trabalhar para corrigir esse problema, é verdade...)...
Vou dar de beber à dor, adeus.

A. Marques Lopes


2. Comentário do Afonso M. Ferreira Sousa (também com a data de 18 de Novembro; circulou apenas por alguns e-mails de nós):

Tudo claro como a água, mais não pode ser !

Mas os contestatários de outrora (e bem)...foram, muitos deles, os governantes ou timoneiros neste caminhar de 31 anos !...

Afinal como é ?!

A mesma detracção que tentaram (*) lançar-nos, continua infelizmente a gerar, para o futuro, companheiros no "demérito injusto e vergonhoso".

(*)...e fico só com esta: TENTARAM (salvo mais avalizada opinião)

Um abraço
Afonso Sousa


3. Texto do João Tunes (de 21 de Novembro de 2005; não circulou, por e-mail, pela tertúlia)(2):
Leio isto e percebo isto:

"Estive na guerra, vi morrer amigos meus e quando morre um soldado ou um militar português, seja onde for, evidentemente que isso deixa de luto todo o país e nos deixa de luto a todos nós" (Manuel Alegre, sobre a morte em combate do Sargento Comando João Paulo Roma, no Afeganistão).

Eu que também estive na guerra, contra a guerra, fazendo a guerra, a mando de um ditador parado no tempo, sob o comando de um actor feio como a noite mas maníaco de poses prussianas e disfarçado de general com um vidro redondo empoleirado teatralmente num olho, vergado sob o peso dos colonos - mais que os dali, da Guiné, os de Moçambique e de Angola (as jóias da coroa) - que cada um de nós trazia às cavalitas para afastarem com chicote e para longe, um chicote afiado pelos pides, a pretalhada na sua terra, eu entendo-o bem.

Naquelas circunstâncias, ali parados para matar e morrer, sair vivo da merda, dos cus de judas, um camarada é camarada, é muito mais que patrício ou mesmo irmão, até que o mais amigo, o melhor amigo.

Um camarada de armas na guerra é alguém que perdemos, ou podemos perder, nos braços, na força da juventude, sabendo que foi a pura sorte que evitou o inverso - sermos, nós, tripas ao léu, a dizermos-lhe "estou fodido, eu sei que estou fodido, foderam-me, estou mais que fodido, foda-se, diz por mim à Luísa que, agora que estou fodido, estou a pensar nela, só penso nela!". Um camarada de armas, na guerra, é um pedaço de nós, alguém que morre no nosso lugar ou a quem nos pode calhar morrermos no lugar dele.

Este sentido, que a paneleiragem pacifista-folclórica não entende, não pode entender, perdura perante um qualquer nosso morto em combate, ontem, hoje e amanhã. Ficamos sempre com a sensação que ele lerpou no nosso lugar. Eu não sei quantos entenderam as palavras de Manuel Alegre. Porque se entendessem, se calhar não entendem e preferirão - talvez - o "amigo da Unita" ou o "cara de pau", o candidato que apoio - o Presidente de Palavra e das Palavras - ganhava logo à primeira volta. Limpinho, porque um gajo teso e de alma límpida, que mantém, assim, esta camaradagem do tempo de guerra é o homem de sentimentos e sensibilidade que merece ser saudado em Belém, batendo-lhe a pala para o gozar e nos gozarmos. Em cumplicidade de camarada. Numa camaradagem que vai além da política, é, apenas e sobretudo, coisa de alma. Sei que pouquíssimo decido, eu só tenho um voto, como manda a democracia e assim está bem. Mas o meu voto será especial - é de um camarada.

João Tunes
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Notas de L.G.

(1) Segundo o Diário de Notícias, de 19 de Novembro de 2005, "a guerra contra o terrorismo fez ontem, nos arredores de Cabul, a primeira vítima mortal entre os militares portugueses". O sargento João Paulo Roma Pereira, de 33 aqnos, natural de Alhos Verdos, foi "o décimo soldado luso a morrer desde que, em finais de 1995, Portugal começou a participar em missões internacionais de paz". Facto não menos significativo, "é também o primeiro militar comando a falecer desde o fim da Guerra Colonial". Houve ainda três feridos. A viatura blindada em que os quatro militares seguiam, numa patrulha de rotina, nos arredores de Cabul, accionou um "engenho explosivo".

(2) Está publicado no blogue do autor > Água Lisa (4) > 21 de Novembro de 2005 > Camarada Presidente