quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

Guiné 61/74 - P18172: Memória dos lugares (369): Fajonquito (1961) ou... Gam Sancó (1940, 1914, 1906, 1889)? (Armando Tavares da Silva)


Capa do Atlas Colonial Português, 1914


Capa do Atlas Colonial Português, 1914  > Mapa da Guiné > Posição relativa de Gam Sancó, entre Cambaju e Bafatá.



Guiné > Atlas de João Soares (c. 1940) > Posição relativa de Gam Sancó (a azul)... Escala: 1/2 milhões


Guiné > Mapa geral da províncía (1961) > Escala 1 / 500 mil > Posição relativa de Fajonquito, a noroeste de Contuboel.

Infogravuras: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2018)


1. Mensagem do nosso amigo e grã-tabanqueiro Armando Tavares da Silva, com data de hoje:

Caro Luís Graça,

O Post P18170,  do Grã-Tabanqueiro Cherno Baldé (*), fiz-me apressar o envio da carta da “Província da Guiné” inserta no Atlas Colonial Português da Comissão de Cartografia do Ministério das Colónias, de 1914. Esta carta, que tem 100 anos, ajuda a conhecer as mudanças que sofreu a toponímica da Guiné.(**)

Para além da imagem de toda a carta (ocupa 2 páginas e tem a dimensão de 43 x 32 cm), envio ainda a mesma carta mas dividida em quatro partes para melhor identificação das povoações.

Uma das povoações que nela figura é Gam Sancó, povoação que não figura nas cartas mais recentes. Esta povoação figurava também nas cartas da Comissão de Cartografia de 1889 e 1906, e ainda no atlas de João Soares, que teve várias edições nos anos 1940, e era utilizado no ensino liceal. Para melhor identificação da povoação segue ainda uma parte ampliada daquela mesma carta, com a região a norte de Bafatá.

Eu penso que esta povoação [, Gam Sancó,], que era a terra de origem do ex-soldado comando Cissé Candé (**), se por acaso não desapareceu, pela sua localização, é a actual Fajonquito, e gostava que me confirmassem, ou não, esta hipótese.

O Cherno Baldé, natural de Fajonquito,  talvez possa dar alguma informação relevante.

Abraço do
Armando Tavares da Silva

PS: As imagens seguem por WeTransfer


2. Mensagem do nosso editor acabada de enviar ao Cherno Baldé:

Amigo e mano Cherno:

Além dos votos de bom ano (, a nível pessoal, familiar e profissional), mando-te aqui uma pequena prenda (coletiva)... do nosso grã-tabanqueiro Armando Tavares da Silva: o atlas da Guiné de 1914... Segue um outro mail com o link para poderes transferir as imagens até ao dia 11 deste mês... São pesadas: mais de 24 MB... Vou também publicar no blogue [neste e noutros postes]... Mas gostaríamos de ter o teu douto comentário sobre a toponímia dessa época, em especial a da tua região natalícia: será que Fajonquito poderá ter-se chamado no passado "Gam Sancó" ou "Gã Sancó"?  [Gã Sancó  não consta da Portaria nº 71, de 7 de julho de 1948, do Governo da Colónia da Guiné: Primeira relação de nomes geográficos da Guiné Portuguesa, escritos segundo a ortografia oficial]

Já em 7/10/2017. tu perguntavas o seguinte (**):

"Caro Luís,

A tal aldeia de "Pejungunto" na região de Farim, bem poderia ser uma grafia alternativa a de 'Fajonquito',  isto antes da normalização com o Governador  Sarmento Rodrigues."


E o prof Armando Tavares da Silva comentava:

" E a aldeia de "Gam Sancó" que aparece no Atlas de João Soares (Sá da Costa, 1949) e que desapareceu na relação de nomes geográficos de 1948, e ausente nas cartas de 1/50 000, o que será? Poderá ser a actual 'Fajonquito'? E 'Gam Sancó',  o que foi/é?"

Mantenhas!...
Luís (***)
__________________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de  3 de janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18170: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (53): três balas de kalash para uma missão suicida: o trágico fim do ex-soldado 'comando', Cissé Candé, em abril de 1978

10 comentários:

Antº Rosinha disse...

Aquele mapa de 1914, provavelmente feito alguns anos antes, quando os oficiais e sargentos da Marinha se lançaram de bússolas e podómetros, paludismos e anti-ofídicos talvez ainda Casamance fosse portuguesa, e ao ver a precisão da localização das tabancas e na correta configuração dos rios, dá para perguntar, "Valeu a pena" tanto esforço?

Vê-se que na altura havia apenas caminhos de pé posto (riscos picotados)e quem ia daqui, não falava crioulo, quanto mais outra vintena de idiomas.

Serpa Pinto ainda escreveu a sua odisseia de Angola à Contra Costa, brutal aventura, mas e tantos anónimos, como quem fez estes levantamentos da Guiné?

Mas já está, deixa ficar!

Cherno Balde disse...

Boa noite amigos Luis Graca e Armando Tavares,

Ja alguma vez ouviram falar de perguntas ou questoes que sao mais "velhas" que o questionado? Certamente eh o caso desta questao que o Sr. Armando coloca. Atlas de 1901??? Meu Deus, nessa data a minha avo materna acabava de dar os seus primeiros passos na vida!
Nao obstante o tema eh muito interessante e espero que as pistas que posso dar possam ser uteis ao Sr. Armando Tavares.

1-Actualmente o toponimo "Gam-Sonco" (Nos pronunciamos Cansonco) como tal nao existe, trata-se da designacao de um antigo Regulado, provavelmente extinto e incorporado no Regulado de Sancorla (na origem Sancorla podia ser Soncoia "Sonco+ia" quer dizer terra dos Sonco, principes mandingas que regiam esta zona na epoca do dominio do imperio de Gaabu ou Kaabu. Gam-Sanco ou Can-Sonco tinha a sua antiga capital na localidade de Berecolom, situado a 3/4 kms a norte de Fajonquito. Esta fortaleza mandinga foi destruida pelos Almames de Futa-Djalon em 1852, no inicio da guerra que culminaria com a derrota dos primeiros na batalha de Cansala em meados 1864, segundo alguns historiadores.

Perto de Berecolom existe uma aldeia antiga, de nome Farimbali, local onde eu mesmo nasci e que visito regularmente. Provavelmente, aqui seria uma das residencias dapoderosa familia dos Sonco ou Sanco. Farim queria dizer um chefado, diriamos hoje, Governador ou Chefe de uma regiao lingua mandinga de entao.

Resumindo, Cansonco seria uma regiao autonoma da Provincia de Biracu/Biraco/Braco ou entao uma parcela territorial dentro da regiao de Sancorla ou Soncoia. Os Regulados seus vizinhos na actualidade sao o Corla (planalto do norte) e o Caresse a oeste/noroeste, Mansonna e Oio a sul/sudoeste.

Eh bem possivel que Fajonquito (grafia aportuguesada dificil de interpretar) tenha surgido mais tarde, o certo eh que ate 1950, data do primeiro recenseamento, Farimbali era a localidade mais importante do ponto de vista populacional. Nos anos 30/40, com o aparecimento dos primeiros comerciantes lusos e Caboverdianos, Fajonquito foi escolhida para Centro do comercio pelos Regulos Fulas de Sancorla, e desta forma ganhar a primazia em detrimento de Cansonco que hoje representa a faixa mais a poente de Sancorla na fronteira com o Corla, hoje, administrativamente situada na regiao de Oio com capital em Farim.

Cherno AB9 disse...

Cont.

Sempre disse ao Mario BS que os "Sonco" do Regulado de Cuor, area de Bambadinca, podem ser os descendentes dos "Soncoia" ou Soncos de Sancorla de onde sao originarios. De notar que existe no Cuor o toponimo ou Tabanca com o nome de Sancorla, nao seria por mero ocaso, penso eu. Com o fim infeliz na guerra com os Fulas, os antigos senhores de Gaabu dispersaram-se aos quatro cantos da regiao de Senegambia.

Um grande abraco aos dois e ao transmontano Francisco Baptista

Cherno Balde disse...

Caro Luis Graca,

Quando o Armando perguntou-me sobre a aldeia de "Gam-Sanco" no Poste de 07/10/2017, confesso que fiquei intrigado sem perceber a minha relacao com o assunto.

Agora a situacao comecou a ficar mais clara para mim. De facto, das duas uma:
1. Gam-Sanco seria a actual aldeia de Fajonquito nos primeiros mapas (Atlas de 1914 e de Joao Soares) ou;
2. Gam-Sanco ou Cansonco seria a designacao generica da area onde se localizava a aldeia de Fajonquito e que os portugueses, devido as dificuldades de traducao e interpretacao, confundiram com a propria aldeia. Estou mais inclinado por esta segunda hipotese.

Caro Armando, olhando detalhadamente os tres mapas em presenca, constata-se que os dois primeiros eram ainda "rudimentares" e pouco precisos. Fajonquito (Gam-Sanco) e Sare Dico (S. Dico) estao quase juntos quando na realidade estao separados por mais de 20 Kms. Bangigara tambem esta muito perto quando a distancia real eh perto de 40 Kms.

Com um abraco amigo,

Cherno AB


Carlos Vinhal disse...

Como pode um país tão pequeno ter tanta história. E o nosso irmãozinho Cherno sabe da matéria que se farta.
Já pensaste Cherno, um dia, quando fores mais velhote, logo com mais tempo disponível, em transpor para livro os teus conhecimentos sobre a Guiné-Bissau?
Abraço e votos de bom 2018
Carlos Vinhal

Anónimo disse...

Obrigado Carlos Vinhal, Homem grande de Mansaba,

Talvez um dia, quem sabe.

Na verdade, na Guine-Bissau, ha ainda muita gente, diante dos quais eu ainda sou um simples aprendiz e nao teria coragem de escrever o que quer que seja.

Mas, como costumam dizer na Guine: Se a diferenca de idades nunca se pode superar, ja a diferenca nos conhecimentos eh superavel. Talvez um dia.

Com um abraco,

Cherno Balde

Anónimo disse...

Caro Cherno,

Considero a ideia/sugestão (proposta!?) do camarada Carlos Vinhal de relevante pertinência.

E é relevante, no meu modesto entendimento, porque o amigo (irmãozinho) Cherno, ao longo dos últimos anos, se tem disponibilizado para partilhar connosco valiosos e preciosos conhecimentos de História do Povo guineense (antes e depois de "Abril"). É por via desta partilha e do seu significado que hoje compreendemos melhor o porquê de continuarmos ligados a essa terra vermelha e a essas gentes que, tal como nós, também sofreram... e continuam a lutar por melhores condições de vida.

Obrigado Cherno por seres como és: um grande intelectual e um BOM AMIGO.

Um abraço e votos de Bom Ano.

Jorge Araújo.

Anónimo disse...

Obrigado Cherno por tão valiosas informações.
No meu comentário de 7 de Outubro de 2017 ao post 17856 de 5 de Outubro, eu perguntava o que é/foi Gansoamó. Esta povoação aparece referida (com esta grafia) em documentos relativos aos acontecimentos de Geba de Outubro de 1891, onde era régulo In'hacota Di, "aliado do governo". Será também Gam Sancó?
Abraço do
Armando Tavares da Silva

Anónimo disse...

Obrigado Jorge Araujo,

Quem esta orgulhoso e grato por esta partilha sou eu, pois tenho aprendido muito sobre o que aconteceu comigo e com o meu pais durante aquela guerra onde voces eram protagonistas directos. Praticamente eu nasci e cresci com a guerra e mem imaginam o efeito daquilo na cabeca de uma crianca.

Continua a trazer-nos o outro lado da guerra, com a tua isencao habitual.

Um abraco amigo,

PS: Um antigo guerrilheiro disse-me que o significado de Fiofioli na lingua Balanta eh "Cu fedorento", tal era o perigo e as dificuldades q esperavam os elementos afectos aquele triangulo de Bambadinca-Xime-Xitole. Concordas?

Anónimo disse...

Caro Cherno,

Fico-te grato e sensibilizado com a tua resposta ao meu comentário.

Quanto à concordância ou não sobre a utilização da expressão semântica "Cu fedorento", como figura de linguagem dos guerrilheiros balantas do PAIGC, em substituição de [mata do] Fiofioli, creio que ela procura estabelecer alguma analogia com o contexto/ambiente que aí se vivia/viveu durante o período da guerra.
Ela, enquanto expressão metafórica, surge, certamente, como consequência dos muitos sustos e sobressaltos porque passaram aqueles que aí residiam ou circulavam, dando lugar a muitas dores de barriga acompanhadas dos naturais distúrbios digestivos, com gastroenterites e diarreias, com exalação para o exterior (atmosfera) de mau cheiro (fedor).

"Cu fedorento" seria então o "cu" (ânus) que exala fedor (mau cheiro).

No meu caso, durante a minha actividade operacional, felizmente que nunca me aconteceu ter alterações ou distúrbios digestivos, ainda que tenha vivido, também, alguns sustos e sobressaltos naquela região. O que acontecia, às vezes, era a necessidade de fazer uma mijinha, acto que fazia parado, quando era possível, ou em andamento, quando não havia outra alternativa.

Recordo, a este propósito, o que nos disse o médico cubano Amado Alfonso Delgado quando por aí andou entre Janeiro e Setembro de 1969: "vivi muitos sobressaltos, com muitas corridas em ziguezague, rastejanços e dores de barriga, com diarreias...".

Com um forte abraço,

Jorge Araújo.