quarta-feira, 12 de abril de 2017

Guiné 61/74 - P17239: Os nossos seres, saberes e lazeres (207): Tavira fenícia, árabe, portuguesa; a cidade e a água (1) (Mário Beja Santos)

Tavira - Rio Gilão


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 12 de Janeiro de 2017:

Queridos amigos,
Por razões profissionais, passo intermitentemente por Tavira desde 1975, passagens de raspão, daquelas que permitem absorver fragmentos de um todo, uma ponte, uma vista do rio, parar mais tempo perante uma fachada, saborear uma caminhada até à Ria Formosa.
Desta vez, aqui aterrei para juntar peças, fazer o puzzle cronológico, sentir o pulsar de uma cidades mais lindas de Portugal, bordejada pela água, um contraste espantoso com a Serra do Caldeirão, Tavira é história, tem uma imprescindível história militar, como adiante se verá, e guardarei impressivamente na memória os passeios ao fim da tarde, avistando pauis e salinas, o ribombar das ondas a entrar na Ria Formosa, um local de fascínio para contemplar um pôr do sol, haja céu azul ou nublado.

Um abraço do
Mário


Tavira fenícia, árabe, portuguesa; a cidade e a água (1)

Beja Santos

Tavira é sede de um concelho em que 80% da sua área é constituída por serra e barrocal. Daqui dá-se a imagem do rio Gilão que liga com o rio Séqua, esta ponte terá origem árabe com todas as modificações do costume. O litoral tem uma frente de mar de 18 quilómetros, são praias situadas em pleno Parque Natural da Ria Formosa, uma jóia ambiental. Cidade cheia de história, temos aqui indícios da presença fenícia, a escassos quilómetros está situada Balsa, há arqueólogos que dizem que era maior que Conímbriga, a ocupação muçulmana deixou imensas marcas no urbanismo da cidade. Tavira era no século XVI o principal porto comercial e centro populacional do Algarve. Regressados da conquista de Ceuta, D. João I armou aqui os seus filhos cavaleiros.


Estamos agora no núcleo islâmico do Museu Municipal de Tavira, aberto ao público em 2012, este espaço foi construído no local onde em 1996 se encontrou o famoso vaso de Tavira e um troço da muralha islâmica.



O vaso de Tavira data do século XI, tem uma exuberante decoração com a representação anatómica da figura humana e de animais. Vemos uma figura feminina com a cara descoberta, hábito que é atribuído às mulheres do Al-Andalus, vemos igualmente um peão manejando uma besta; o bordo é vazado, assim como a “torre” ou funil e algumas figuras zoomórficas. Em Valência são conhecidos vasos aparentados mas sem a decoração naturalista que carateriza este exemplar. Muitos museus famosos disputariam.


Indício seguro da presença árabe no Algarve, é um simples guardanapo de jardim, ao passar por aqui o viandante, sabe-se lá porquê, lembrou-se de Córdova, mas Tavira está cheia de jardins, dos quais o mais famoso está na colina de Santa Maria, a colina da fundação, bem encravado entre a Tavira fenícia, almóada e medieval, não se vai a Tavira sem cheirar os odores que se espalham entre muralhas.



O viandante procurou munir-se de elementos sobre a Tavira arqueológica, já visitou o núcleo islâmico, segue agora para o Convento da Graça, onde está instalada uma pousada, vai visitar o que resta de um bairro almóada (fins do século XII princípios do século XIII), estes vestígios apareceram durante as obra de adaptação do antigo Convento da Graça, é um encanto visitar este pequeno núcleo de exposição. No Palácio da Galeria, o melhor edifício da arquitetura civil da cidade situa-se o museu municipal e logo à entrada podemos ver os poços rituais fenícios. Há também muralha fenícia. Esta imagem dá-nos uma visão do gótico, da Ordem de Santiago, quando os conquistadores cristãos consolidaram a sua presença civil, militar e religiosa. Tudo vai culminar com a arte manuelina, no auge do esplendor tavirense.





Na deambulação pelo centro histórico de Tavira há vestígios arquitetónicos góticos, portas antigas de arco quebrado, com sucessivas alterações, há reminiscências de mesquitas, caminhos antigos, avista-se a torre albarrã que vem do período almóada e as muralhas islâmicas de Tavira, com é evidente cruzam-se estilos no confronto das épocas, o que torna a viagem ainda mais aliciante: de que época é esta janela, esta porta, esta torre? E a vista deste pormenor de Tavira fala inequivocamente do passado árabe, é uma inconfundível organização do espaço, é uma evidência do legado islâmico.

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 5 de abril de 2017 > Guiné 61/74 - P17210: Os nossos seres, saberes e lazeres (206): Uma biblioteca de pedra na estação do Metro de Entre Campos (Mário Beja Santos)

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