sábado, 13 de fevereiro de 2016

Guiné 63/74 - P15741: Efemérides (214): Dia 8 de Novembro de 1967, data do falecimento do primeiro militar da CART 1742, numa acção de reconhecimento na Tabanca de Ganguiró (Abel Santos, ex-Soldado At Art)

 

1. Em mensagem do dia 28 de Janeiro de 2016, o nosso camarada Abel Santos (ex-Soldado Atirador da CART 1742 - "Os Panteras" - Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69) fala-nos do dia 8 de Novembro de 1967, data do falecimento do primeiro militar da sua Companhia numa acção de reconhecimento na Tabanca de Ganguiró.
 


A Tabanca de Ganguiró

Aquele dia 8 de Novembro de 1967 foi fatídico para a malta da CART 1742, porque foi abatido pelo IN o primeiro camarada, numas das muitas incursões que a malta já tinha realizado no sector Leste, o chamado L 4, cujo centro operacional se situava em Nova Lamego (Gabu), abrangendo uma vasta área geográfica, como a imagem mostra a cinzento, que vai desde o Boé até Pirada, e do Sonaco a Buruntuma, toda esta zona patrulhada pela 1742, que dava ainda apoio às populações, assim como às colunas de reabastecimentos que se faziam periodicamente a Madina do Boé e Beli, assim como a Bambadinca, para o nosso próprio consumo.


Chegámos a Canjadude ao fim do dia anterior daquele fatídico 8 de Novembro, onde pernoitámos. De manhã cedo lá abalamos em direcção a Ganguiró, objectivo que alcançámos pelas 16 horas. A ordem que nos foi transmitida era para inspecionar o local e ver o que tinha acontecido à população. O que encontrámos foi a tabanca incendiada, sem população, que tinha abalado dali, tendo os seus parcos haveres sido transformados em cinza. Um espectáculo aterrador que nos foi apresentado, mas o pior estava para vir.

Posição relativa da Tabanca de Ganguiró ao quartel de Canjadude
Vd. Carta de Cabuca 1:50.000

Enquanto o grupo de combate se foi instalando para fazer a segurança próxima ao local, para passar a noite, sem que nada o fizesse prever, deu-se uma explosão fortíssima junto a uma árvore, local onde uma secção se ia instalar. Tinha sido provocada pelo acionamento de uma mina antipessoal pelo camarada Neto, decepando-lhe a perna direita e provocando ferimentos a outros militares. Passados alguns segundos reagimos à inércia momentânea, começámos a prestar os primeiros socorros a quem deles precisava, improvisando macas com canas de bambu para o transporte dos feridos para Canjadude, estando já o camarada Neto em agonia, que acabamos por perder perto do aquartelamento.

Na Tabanca de Ganguiró

Este episódio, que recordo com muita mágoa, ainda hoje me provoca interrogações inexplicáveis. O meu camarada não deveria estar ali, ele era o carpinteiro da Companhia, e por ironia do destino, era a primeira vez que nos acompanhava, perdendo a vida daquela maneira.

Recordo que em Canjadude havia um cartaz colado na parede (julgo que na caserna), simbolizando a união entre os Portugueses e os Guineenses, que mostrava a imagem de um aperto de mão entre um branco e um preto, com a frase: Juntos venceremos.
Puro engano, tamanha mentira que ainda hoje perdura.

Sem mais, recebam um Alfa Bravo, e até já.
Abel Santos
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Nota do editor

Último poste da série de 8 de fevereiro de 2016 Guiné 63/74 - P15723: Efemérides (213): 1969, um ano trágico para as NT, em matéria de desastres em transportes fluviais: não foi apenas o desastre do Cheche, no rio Corubal, em 6 de fevereiro, mas também em 21 de junho o desastre de Mopeia, no Rio Zambeze, Moçambique, com uma centena de vítimas militares

2 comentários:

Luís Graça disse...

Abel, mais um nome de guerra, mais um topónimo, mais uma estação do nosso calvário por onde passámos e penámos: Ganguiró, a sudeste de Canjadude, a nordeste de Beli...

Só havia até uma referência a essa tabanca onde o teu camarada Neto perdeu a vida.

Vd, aqui poste do José Corceiro:

29 DE NOVEMBRO DE 2010
Guiné 63/74 - P7358: José Corceiro na CCAÇ 5 (19): Pára-quedistas contra Gatos Pretos


http://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2010/11/guine-6374-p7358-jose-corceiro-na-ccac.html

Vítíma de "fogo amigo" morreu um soldado da CCAÇ 5, MAMADU DJALÓ... Apanhados numa emboscada do IN morreram dois páras, da CCP 123/BCP 12 em 15 de abril de 1971

AVELINO JOAQUIM GOMES TAVARES e CARLOS ALBERTO FERREIRA MARTINS.

Este último era da minha terra, Lourinhã... Foi recentemente homenageado. Também foi o homem errado no lugar errado... Segundo bem percebi da conversa que tive com o antigo cmdt do CCP 123, hoje maj gen Avelar de Sousa, o Martins estava destacado no bar, em Bissalanca, mas daquela vez apeteceu-lhe vestir o camuflado e pegar na G3...


9 DE SETEMBRO DE 2014
Guiné 63/74 - P13589: Convívios (624): I Encontro de paraquedistas do Oeste... Lourinhã, 6 de setembro de 2014... Parte III: Homenagem ao sod paraquedista Carlos Alberto Ferreira Martins (1950-1971), da CCP 123/BCP12... Vídeo com a alocução do seu antigo comandante, hoje maj gen ref Avelar de Sousa

http://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2014/09/guine-6374-p13589-convivios-624-i.html


18 DE SETEMBRO DE 2014
Guiné 63/74 - P13622: Convívios (630): I Encontro de paraquedistas do Oeste... Lourinhã, 6 de setembro de 2014... Parte VI: Discurso do Jaime Bonifácio Marques da Silva > 2ª Parte: homenagem ao sold paraquedista lourinhanense, natural de Toledo, Vimeiro, Carlos Alberto Ferreira Martins (1950-1971), morto em combate em Ganguirô, Canjadude, região de Gabu, Guiné, em 15/4/1971~

http://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2014/09/guine-6374-p13622-convivios-630-i.html

Luís Graça disse...

Abel, podemos generalizar: o Neto, o Martins, o Tavares, o Djaló, e todos os nossos camaradas que morreram ou foram feridos na Guiné, eram "homens errados no sítio errado"... Penso que era essa a "imagem" que querias transmitir, evocando a história, triste, sem glória, do teu/nosso camarada Neto.

Obrigado pela partilha. LG