sábado, 14 de fevereiro de 2015

Guiné 63/74 - P14258: Manuscrito(s) (Luís Graça) (46): Quando o absurdo da morte bate à porta dos amigos...Para o Zé Belo, em memória de Britt-Marie














Poemombro ou o ombro amigo


Para o Zé Belo, 
nestes dias 
em que o absurdo lhe bateu à morte; 
em memória de Britt-Marie (*)


Às vezes a gente pensa
que o mundo vai desabar.
Às vezes a gente teme
que o céu vá cair
em cima das nossas cabeças.
Às vezes a gente deixa de ver,
e de sentir.
E até de pensar.
Às vezes a gente vê que não há luz,
que estamos num túnel, escuro,
que não há luz ao fundo do túnel,
que há alguém que te diz,
perentório, seguro:
– É o fim! Acabou-se!
Ou então:
– É bom que esqueças,
desiste, parte para outra!

Às vezes a gente tem dúvidas.
E pergunta se vale a pena.
Se valeu a pena,
a vida, em retrospetiva.
Às vezes a gente até duvida do amor e da amizade
dos que nos amam e gostam de nós.
Às vezes a coisa parece que está feia,
às vezes parece que tudo é feio.
Que a coisa está preta e feia,
a vida, o país, o mundo à nossa volta,
os outros,
o marido ou a mulher.
os filhos,
os amigos,
os colegas de trabalho,
os vizinhos,
os concidadãos,
os homens e as mulheres do teu país,
a humanidade, por fim globalizada.

Às vezes dá-te uma enorme vontade de chorar.
E de parar no caminho.
E de chorar numa pedra do caminho.
Às vezes a gente quer desistir de caminhar.
A gente sente que lhe faltam as forças,
e que já que foi longe de mais.
Que não nascemos para caminhantes,
que já fizemos a nossa parte,
que já cumprimos o nosso papel,
que as pernas estão cansadas.
As pernas.
O corpo.
A alma.
Os músculos.
Os neurónios.
Os ossos.
Que andamos a caminhar há muito tempo,
que já demos a volta ao mundo não sei quantas vezes.

Às vezes a gente apercebe-se
que tem uma enorme vontade de chorar.
Mas que não tem lágrimas para o fazer,
não tem sequer forças para o fazer.
E é então que nos dá uma raiva danada,
telúrica, fulminante, brutal,
uma raiva de vulcão.
E descobrimos, então,
o terrível vulcão que há em nós.
E a gente, de repente,
dá de novo à chave de ignição.
... E retoma o caminho.

Querido amigo:
eu sei que não podemos competir com os vulcões,
que só explodem de mil em mil anos,
ou de cem mil em cem mil, tanto faz.
E que são uma força bruta da natureza.
Brutal.
Fulminante.
Telúrica.
Mas temos o direito de explodir,
de dizer o que nos vai na alma.
Temos o direito ao nosso vulcão,
tu tens direito ao teu vulcão,
tens direito mesmo ao teu vulcãozinho.
O direito de mostrar o que te dói no corpo e na alma.
De explodir.
De chorar.
De chorar de raiva.
Ou mesmo baixinho.
A única diferença, além da escala de tempo,
é que os vulcões não têm uma ombro amigo.
Para chorar.
Para encostar a cabeça e chorar.
Hoje ou amanhã,
em qualquer dia do ano ou da semana
Sempre que te apetecer,
sempre que te der raiva de chorar.

Se os amigos têm algum préstimo
é justamente para saber ouvir.
Ouvir, escutar, entender.
Mais do que falar,
analisar,
explicar
ou compreender.
Para estar contigo.
Simplesmente para estar ao pé de ti.
Ou para te segredar ao ouvido
qualquer coisa que te faça sorrir.
Mesmo que seja um sorriso amargo.
Ao ouvido, baixinho.
E sobretudo para te oferecer o ombro amigo:
pode até ter pouco préstimo,
mas sempre é mais macio e quente
do que a pedra do caminho.

Luís Graça (**)



(...) Comentário de L.G.:

Meu querido Zé Belo:

Ainda há dias falavas da tua casa na Lapónia com candura, ternura e uma estranha ponta de saudade, premonitória…
Falavas dessa casa, no passado… ”Para a minha família, esta casa mais não é que um refúgio de paz. Para a manter com os níveis de conforto, modernidade e funcionalidade neste isolamento extremo, é claro que se torna necessário um custo económico considerável e, não menos, um planeamento contínuo e sempre bem antecipado. As profissões, tanto da minha mulher como a minha, permitiram, felizmente, os largos períodos em que aqui nos refugiámos. “…

Alguns dias depois do teu escrito, largamente comentado, em tom descontraído, ligeiro e bem-humorado, morre a tua companheira de uma vida, e a mãe dos teus filhos!...

Acabo de ler a brutal notícia no nosso blogue, num dia em que, ao mesmo tempo, celebramos com alegria os 100 anos de uma mulher grande, a decana da nossa Tabanca Grande, que há um ano perdeu o seu filho mais novo, o nosso saudoso Pepito.

Zé, ficamos aparvalhados, desarmados, despidos, indefesos, perante uma notícia tão devastadora como é a perda do amor da nossa vida. Sei que não somos deuses, não somos imortais, mas nunca estamos (nem estaremos) preparados para receber, assim, de chofre a notícia da morte de quem amamos…

Zé, apesar da distância física, apesar do sofrimento por que estás a passar, tu e os teus filhos, fica com a certeza de que, na tua pátria, por muita madrasta que ela tenha sido contigo, tens bons amigos e camaradas que estão contigo, nesta hora de provação. São muitos os ombros amigos com que podes contar na nossa Tabanca Grande, e onde podes reclinar a cabeça e chorar, porque só os homens  choram, de dor, de raivo e de impotência, quando o absurdo lhes bate à porta …

O absurdo tocou-te à porta, meu bom amigo.

Saibamos honrar a memória da tua Britt-Marie que , para além de te ter dado um lugar no seu coração, dei-te também uma segunda pátria, um doce lar e uma família maravilhosa.

Zé, acabei de chegar ao Porto, vindo do meu refúgio em Candoz, e fiquei destroçado ao saber esta notícia. Recebe um xicoração apertado, meu, do João e do resto da minha família, a Alice e a Joana. (...)


(**) Último poste da série > 12 de fevereiro de  2015 > Guiné 63/74 - P14242: Manuscrito(s) (Luís Graça) (45): A arte lusitana de bem comunicar em toda a parte...

Guiné 63/74 - P14257: In Memoriam (217): Britt-Marie, esposa do nosso camarada José Belo, faleceu no passado dia 12 de Fevereiro

1. Mensagem dirigida ao nosso camarada José Belo, publicada hoje no sítio da Tabanca do Centro, a propósito do falecimento de sua esposa e companheira Britt-Marie: 
  
É sempre muito difícil escrever para dar notícias terrivelmente tristes.

Mais difícil se torna quando envolvem um amigo a quem não podemos abraçar fortemente nos nossos braços, por se encontrar milhares de quilómetros longe.

Não há modos mais suaves ou melhores de dar estas notícias.

Em escassos três meses, depois de diagnosticada uma doença do foro oncológico, faleceu a Britt-Marie, mulher do nosso camarigo José Belo, que vive longe na Suécia.

Como Português que é, a distância do seu Portugal, da sua língua materna, não ajuda nada a viver estes momentos dolorosos, que eu nem calculo o que sejam.

Podia escrever aqui um “tratado” de palavras doces, de conforto, de solidariedade, mas tenho, por experiência própria, que nestes momentos as palavras são escusadas e que o melhor é o beijo na face, o abraço forte, apertado, de tal modo que ele sinta que os nossos corações batem no mesmo compasso do dele.

E é isso que aqui te queremos dar, José Belo, querido camarigo, um abraço que envolve todos nós, mas um abraço de tal modo que sintas que estamos contigo agora e sempre.

Joaquim Mexia Alves
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2. Em nome da Tertúlia da Tabanca Grande, aqui deixamos ao camarada José Belo, a seus filhos e demais familiares, o nosso abraço solidário e o profundo pesar pelo falecimento de sua esposa e mãe.

Caro amigo Zé Belo, que vos sirva de consolo saber acabou o sofrimento da vossa ente querida e que apesar de vos ter deixado fisicamente, ficará para sempre no vosso coração.

A Tertúlia
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Nota do editor

Último poste da série de 31 de dezembro de 2014 > Guiné 63/74 - P14100: In Memoriam (216): Rui Romero (1934-1966), cap mil inf, 1º cmdt da CCAÇ 1565 (1966/68)... Finalmente... a Verdade (Ana Romero)

Guiné 63/74 - P14256: Homenagem da Tabanca Grande à nossa decana: a "mindjer grande" faz hoje 100 anos... Clara Schwarz da Silva, mãe do Pepito (8): Mensagens da Tertúlia

 
MENSAGENS DE FELICITAÇÕES DA TERTÚLIA A PROPÓSITO DO CENTENÁRIO DA NOSSA GRÃ-TABANQUEIRA E MULHER GRANDE DO NOSSO BLOGUE SENHORA DONA CLARA SCHWARZ


1. Mensagem do nosso camarada Domingos Gonçalves, (ex-Alf Mil da CCAÇ 1546/BCAÇ 1887, Nova Lamego, Fá Mandinga e Binta, 1966/68):

Cem anos, - que linda Idade!
Tantas histórias para contar!
À grande tabanqueira,
Tão querida,
Só posso desejar
Outros cem anos de vida.

Domingos Gonçalves

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2. Mensagem do nosso camarada Francisco Baptista, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2616/BCAÇ 2892 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72):

Senhora D. Clara:
Pelo grande respeito e admiração que aprendi a ter por si, através de testemunhos deste blogue, neste dia em que faz cem anos, sendo a "Mulher Grande" desta Tabanca eu sinto-me tão pequeno que me apetece pedir-lhe a bênção como pedia à minha mãe, quando era jovem.

Desejo-lhe muita saúde e felicidade junto das pessoas que lhe são queridas, filhos, netos e amigos.

Sei que já sofreu muito, tantos familiares mortos sem justiça, numa guerra selvagem, só por serem diferentes na religião ou nos costumes. Além desses outros familiares próximos partiram sendo o último o seu filho Carlos, esse homem bom, que tanto fez pelo bem das gentes da Guiné-Bissau que tanta falta lhe sentirão.

É duro, é cruel, para uma mãe ver partir um filho mas D. Clara deve pensar na grande obra que ele realizou e na admiração, respeito e amizade que conquistou, o Carlos continua a viver, nessa obra, nas boas recordações que deixou e sobretudo no coração dos guineenses.

O Carlos continua vivo também nas semelhanças de carácter, de modos, no sorriso franco, nos gestos dos seus filhos e dos seus netos.

D. Clara, neste dia em que faz cem anos, que todos os seus amigos da Tabanca Grande festejam, assim como os seus familiares e amigos mais próximos, deixe que lhe chame mãe e que lhe envie com muito carinho os mesmos beijos que gostaria de dar à minha mãe, que já não me pode ler ou ouvir, porque já partiu.

PARABÉNS! MUITOS BEIJOS MÃE!

Francisco Baptista

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3. Mensagem do nosso camarada Fernando de Jesus Sousa (ex-1.º Cabo da CCAÇ 6, Bedanda, 1970/71):

Uma saudação muito especial, com estima e consideração para esta grande Senhora.

Desejo-lhe um feliz aniversário repleto de amizade e carinho.

Parabéns e muitas felicidades.
Fernando Sousa


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4. Mensagem do nosso camarada Manuel Luís Nogueira de Sousa (ex-Fur Mil Art da 1.ª CART do BART 6520/73, Bolama, Cadique e Jemberém - 1974):

Muitos parabéns á estimada e lutadora "centenária", meta alcançada por poucos.
Que acrescente muitos mais e com qualidade de vida.

MSousa



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5. Mensagem do nosso camarada José Casimiro Carvalho (ex-Fur Mil Op Esp da CCAV 8350 e da CCAÇ 11) - Gadamael, Guileje, Nhacra e Paúnca, 1972/74):

De forma indelével, o "Pepito" está ligado umbilicalmente a mim. Por isso e por ter sido gerado por essa menina, quero desejar, como ex-combatente ("tuga") e como apaixonado por esse POVO um bom aniversário e que ainda viva assista ao fim das atrocidades , entre elas a excisão feminina.

Parabéns BAJUDA.
José Carvalho,
ex-militar de Guiledje (Guileje)

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6. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70):

Luís,
A Sr.ª D.ª Clara Schwarz da Silva, Primeira Dama desta confraria, é nome memorável diferentes títulos: pelas sementes que deixou naquele ponto dos trópicos; por pertencer a uma estirpe familiar que deu a um grande escritor, seu marido, um grande artista e um desenvolvimentista humanitário, seus dois filhos já falecidos; e por dispor de um património de memória de que a Guiné não devia abdicar, pela fertilidade e pela luminosidade do seu exemplo.

Escrevo-lhe com o pedido especial de que não se esqueça de que não há futuro sem aprofundar o conhecimento do passado, é deste que despontam valores, princípios, matrizes da identidade de um país que vive finalmente um tempo de esperança e de pacificação.
E mando-lhe um beijinho, as mulheres grandes são por inerência caudais de sabedoria, archotes da experiência e expoentes de bravura.
E como tu observas, é mesmo inspiradora de todos nós, sei o que é perder um filho.

Que Deus a conserve e nos guie com o seu exemplo, a rasgada admiração do
Beja Santos

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7. Mensagem do nosso camarada José Lima da Silva (ex-Soldado da CCAÇ 1496/BCAÇ 1876, BissumPirada e Bula, 1966/67):

Os meus parabéns para a Senhora Dona Clara Schwarz, e se a saúde deixar, que vais mais alguns anos.

Um beijo para ela
José Lima da Silva


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Nota do editor

Último poste da série de 14 de Fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14255: Homenagem da Tabanca Grande à nossa decana: a "mindjer grande" faz hoje 100 anos... Clara Schwarz da Silva, mãe do Pepito (7): José Eduardo Reis Oliveira (Tabanca de São Martinho do Porto)

Guiné 63/74 - P14255: Homenagem da Tabanca Grande à nossa decana: a "mindjer grande" faz hoje 100 anos... Clara Schwarz da Silva, mãe do Pepito (7): José Eduardo Reis Oliveira (Tabanca de São Martinho do Porto)

1. Mensagem do nosso camarada José Eduardo Oliveira (JERO) (ex-Fur Mil da CCAÇ 675, Quinhamel, Binta e Farim, 1964/66), com data de 11 de Fevereiro de 2014:


Feliz aniversário Dona Clara Schwarz

No dia em que completa 100 anos é uma emoção especial estar por perto para a ajudar a sorrir e a chorar. Com tantas memórias, tantas recordações terá motivos sem fim para sorrir. E outros para chorar. Porque a vida é cheia de vivências, de amor.
Neste dia tão especial que Deus lhe conceda tempo para chorar pelos que já partiram. Mas também que tenha disposição para os recordar com imensa saudade mas com um sorriso.
Que possa partilhar com os familiares e amigos que estarão perto de si.
Parabéns. E que possa continuar a olhar a vida como uma dádiva de Deus.

Com particular estima e apreço,
José Eduardo Oliveira (JERO)

PS- Se me permite uma humilde "prenda", que tem a ver com a tarde do dia em que fez 95 anos!!!


Regresso ao passado em São Martinho do Porto…

Absolutamente por acaso estive em passado recente - 21 de Agosto - na Casa de férias da família Schwarz da Silva.
A meio da tarde desse dia 21 o Luís Graça, a quem me une uma amizade muito especial por termos sido ex-combatentes da Guiné, telefonou-me por se ter lembrado que eu poderia estar de férias em São Martinho. Acertou e passado poucos minutos foi-me possível juntar-me à aniversariante.

…Do lado dos donos da casa estava a matriarca, Clara Schwarz, a nossa 'tabanqueira' com a bonita idade de 95 anos, o seu filho Carlos (Pepito), a esposa, Isabel Levy Ribeiro, e a mãe desta... A Isabel ofereceu-nos uma deliciosa cachupa...


Recordar é viver e não mais esqueci a surpreendente troca de impressões que tive nessa tarde…
Para meu espanto a D. Clara e o seu marido, o advogado Artur Augusto Silva, tinham residido em Alcobaça na década de 1940, antes do casal partir para a Guiné em 1949. Mais exactamente entre 1945 e 1949. A D. Clara Schwarz tentou explicar-me onde então moravam em Alcobaça mas não deu para entender.
Mas lembrava-se de muita coisa desses velhos tempos ...


Tinham sido amigos pessoais e visitas de casa do Pintor Luciano Santos.

Depois saltámos… para advogados do tempo do seu marido Artur Augusto Silva.
Recordava-se do Dr. Pinna Cabral e de uma paixão complicada de uma sua familiar próxima, que muito agitou a sociedade do seu tempo na então pacata vila de Alcobaça…

Mas voltando um bocadinho atrás e ao início da nossa conversa em que recordámos acontecimentos da década de 40, referiu-me os jovens refugiados austríacos que Alcobaça (e o resto de Portugal) então receberam .

Mal a dona da “Casa do Cruzeiro” referiu os miúdos austríacos lembrei-me (com emoção) do Hans e do Helmutt com quem tinha brincado numa casa da família Raposo Magalhães. ”Vi” à distância no tempo dois miúdos altos, que usavam calções compridos.

Clara Schwarz, que fala alemão descreveu-me ainda uma menina confiada a uma família dos arredores de Alcobaça (Vestiaria???) , que vivia com muitas dificuldades devido aos fracos recursos da sua família de acolhimento. Essa menina - de quem eu não me recordo - veio mais tarde a ser confiada à família de um médico de Alcobaça - Dr. Nascimento e Sousa…

E hoje posso surpreendê-la com uma fotografia que entretanto encontrei e que aqui reproduzo onde estão duas meninas austríacas desse tempo. A fotografia não tem muita qualidade mas as meninas em causa estão em destaque (com cor mais escura) em relação aos outros meninos.


Fotografia das refugiadas austríacas... Na fila de trás o 3º. miúdo a contar da esquerda sou eu. Teria então uns 10 ou 11 anos de idade (1950-51).


Estão passados cerca de setenta anos…

Para não alongar mais esta” memória” salientamos a extraordinária lucidez, cultura e sensibilidade de Dona Clara Schwarz... Uma vida, uma memória espantosa... - que o Luís Graça quer homenagear (e muito bem) quando completa hoje em 14 de Fevereiro de 2015 os seus 100 anos!


Até sempre…
Recordo com muita saúde e gratidão pela inesquecível tarde de 21 de Agosto de 2010, um dos melhores momentos que vivi nas férias de Agosto desse ano.
JERO
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Nota do editor

Último poste da série de 14 de Fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14254: Homenagem da Tabanca Grande à nossa decana: a "mindjer grande" faz hoje 100 anos... Clara Schwarz da Silva, mãe do Pepito (6): António Estácio, seu aluno de Francês no Liceu Honório Barreto, em Bissau

Guiné 63/74 - P14254: Homenagem da Tabanca Grande à nossa decana: a "mindjer grande" faz hoje 100 anos... Clara Schwarz da Silva, mãe do Pepito (6): António Estácio, seu aluno de Francês no Liceu Honório Barreto, em Bissau


A centenária Senhora Dr.ª Clara Schwarz da Silva

Foto: © Luís Graça


1. Mensagem do nosso Amigo Grã-Tabanqueiro António Estácio, natural da Guiné-Bissau, com data de 13 de Fevereiro de 2015:


HOJE FAZ ANOS!

Hoje faz anos a minha antiga professora do Liceu de Bissau, a Dr.ª Clara Schwar da Silva, a quem devo muito do francês, que, deliciosamente, nos foi ensinando, assim como da postura firme e determinada que sempre assumiu.

Para ela uma grande salva, por tudo quanto nos deu. O meu Obrigado.

Recordo-me, como se fosse hoje, a minha primeira tentativa para falar, enunciando o presente do indicativo do verbo “Savoir”, que eu já sabia, mas que ela estava a ensinar-nos, de forma pausada e firme. Apercebeu-se que eu já tinha umas bases e reconheceu-o logo de entrada, acabando por me dizer:
- Mas tu já sabes. Quem foi que te ensinou?

No ano seguinte, fui considerado um aluno muito bem-educado, etc. e tal, o que me permitiu transitar nesse ano para a turma das raparigas. Eramos 7 - a que se juntou um 8.º aluno - sendo o gozo da turma, em que nas aulas tudo corria bem, enquanto noutras, era o que Deus quisesse, e, nunca por nunca, conseguiam, nas aulas, saber o que se estava a comer de fruta...

Dali para diante, foi um rápido crescimento, tendo tido a sorte de chegar ao 5.º ano, com um crescimento hesitante até que, no 4.º ano, em que eramos 28, só passaram 14, tendo eu sido contemplado com um estrondoso chumbo.

Enfim lá se juntaram os alunos que vieram do 3.º ano e em que abundavam referências boas, de que entre eles o Toni Delgado, o Armandinho Salvaterra, o João Cardoso, e quantos mais, se não o filho querido da senhora, o nosso "Pepito", sempre pronto a gozar, fosse com quem fosse.

Disse a mim mesmo: "Isto assim não pode ser. Tenho que mostrar o que valho". E de facto foi uma mudança do dia para a noite, tendo completado esse 4.º e o 5.º para seguir para Coimbra, onde viria a estudar na Escola Agrícola.

Seguiram-se anos que nunca nos vimos, mas eu nunca me esqueci da sua boa imagem, da mulher justa, das aulas com disciplina, de nunca por nunca a ter visto fazer ou dela, houvesse a notícia de ter assumido um raciocínio errado, ou, no mínimo, ainda que pequeno, tivesse qualquer crítica.

Acabada a tropa, voei para Macau, onde, ao fim de 26 anos, regressei. Muitos se afastaram, outros houve que se foram agregando e outros houve que, sabendo eu os seus nomes, nunca se juntaram.
De permeio, numa das vindas a Portugal, se juntaram para, numa festa organizada pelo Vasco Rodrigues, se encontrou um grupo de antigos professores e colegas da Guiné.

 Mas, dizia eu, que hoje, 14 de Fevereiro, era o dia de aniversário da nossa querida professora.
Assim seja, se me for permitido, daqui ouso levantar a minha taça para a felicitar pelos seus 100 anos de saber estar, com dignidade e afecto, em que, apesar das duras experiências da vida, sido uma Professora com o conhecimento, a inteligência e todo o saber da Dr.ª Clara Schwar da Silva.

António Júlio Estácio
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Nota do editor

Último poste da série de 14 de Fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14253: Homenagem da Tabanca Grande à nossa decana: a "mindjer grande" faz hoje 100 anos... Clara Schwarz da Silva, mãe do Pepito (5): João Martins (Tabanca de São Martinho do Porto)

Guiné 63/74 - P14253: Homenagem da Tabanca Grande à nossa decana: a "mindjer grande" faz hoje 100 anos... Clara Schwarz da Silva, mãe do Pepito (5): João Martins (Tabanca de São Martinho do Porto)


Alcobaça > São Martinho do Porto > Casa do Cruzeiro > Foto de LG




1. Mensagem do nosso camarada João José Alves Martins, ex-Alf Mil Art.ª do BAC 1 (Bissum, Piche, Bedanda e Guileje, 1967/70), com data de 8 de Fevereiro de 2015:

Assunto:  14/2/2015: A "mindjer grande" faz 100 anos... Clara Schwarz da Silva, mãe do Pepito, decana da Tabanca Grande


Clara Schwarz

É com um misto de saudade, de admiração e de agradecimento que escrevo estas singelas palavras.

Saudade, porque tive o privilégio de vos conhecer numa tarde quente de verão em S. Martinho do Porto, desfrutando na vossa acolhedora casa, de um ambiente de confraternização, em que os sentimentos de amizade e de partilha eram predominantes.

Recordo que foi nesse almoço que conheci o Pepito que nos deixa muitas saudades pois era um homem preocupado com o bem estar e a felicidade dos outros, lutando, na medida das suas forças, por uma Guiné mais próspera com a possibilidade de contribuir para melhores condições de vida.

Admiração, porque a Clara, durante toda a sua vida, assumindo o papel de mãe e de professora, transmitiu educação e valores, dando um verdadeiro exemplo de cidadania e contribuindo para um Mundo melhor.

Agradecimento, porque todos nós, só podemos agradecer todo esse esforço, sacrifício e, até, sofrimento, porque a vida dedicada ao bem comum também tem, como contrapartida, os seus contratempos e as suas dificuldades.

Bem haja Clara, e que Deus lhe conceda muita saúde, muitos anos de vida e muitas felicidades.
João Martins
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Nota do editor

Último poste da série de 14 de Fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14252: Homenagem da Tabanca Grande à nossa decana: a "mindjer grande" faz hoje 100 anos... Clara Schwarz da Silva, mãe do Pepito (4): José Teixeira (Tabanca Pequena, Matosinhos)

Guiné 63/74 - P14252: Homenagem da Tabanca Grande à nossa decana: a "mindjer grande" faz hoje 100 anos... Clara Schwarz da Silva, mãe do Pepito (4): José Teixeira (Tabanca Pequena, Matosinhos)


Alcobaça > Martinho do Porto > 21 de Agosto de 2010 > Casa do Cruzeiro > A Clara Schwarz, uma cidadão do mundo, uma mulher de grande coragem e cultura, que ajudou a fundar o Liceu Honório Barreto, em Bissau, onde foi professora de francês... É licenciada pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.


Foto: © Luís Graça (2010). Todos os direitos reservados




Alcobaça > Martinho do Porto > 13 de Agosto de 2011 > Casa do Cruzeiro > A Clara Schwarz, uma cidadão do mundo, uma mulher de grande coragem e cultura, com um experiência de 25 anos de Guiné (onde foi professora de francês no Liceu Honório Barreto, em Bissau). É licenciada pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa... .Aqui, aos 96 ano, no convívio da Tabanca de São Martinho do Porto  com o Zé Teixeira e os filhos Tiafo e Joana...


Fotos (e legenda): © Luís Graça (2010). Todos os direitos reservados


1. Mensagem do José Teixeira, um dos régulos da Tabanca de Matosinhos:

Cem anos bem vividos. É que se pode dizer da D. Clara.

Uma mulher voltada para o mundo, muito atenta aos acontecimento, sobretudo com uma vida muito ativa e sempre aberta à comunidade. Ainda hoje continua a cativar amizades, pela simpatia que irradia.

Tive o grato prazer de a conhecer há uns anos atrás na sua casa de S. Martinho do Porto, na tertúlia que o saudoso amigo Pepito, seu filho, organizava todos os anos, quando vinha passar um mesito com a mãe.  Dizia ele que tinha de vir à fonte e na verdade, a D. Clara é uma fonte de afetos e uma fonte de sabedoria. Conversar com ela e viajar com ela ao seu passado de luta, é gratificante, pelo que se aprende com seu exemplo e dedicação a causas que considerava fundamentais, como o ensino do povo da Guiné, como forma de desenvolvimento.

Num desses encontros, levei os meus filhos. Juntamo-nos, um grupo de amigos, com um denominador comum, a Guiné, centrados no Pepito e os seus sonhos de promoção humana das gentes daquele país. Mesmo ao lado uma simpática velhinha cativava a atenção de dois jovens, pela sua jovialidade e visão atual do mundo. Era a D. Clara que lhes falava da Guiné, do tempo que por lá andou e como conseguiu dar vida aos seus projetos. Escutavam-na atentamente com uns olhitos a brilhar, de espanto talvez, ou, de bem-estar pela forma como a D. Clara expunha apaixonadamente as suas ideias.

Muito obrigado D. Clara pelos 100 anos de vida ativa. Quero expressar-lhe o meu apreço e a minha gratidão, pelo que aprendi consigo nas vezes que nos encontramos em sua casa.

Cá de longe, quero enviar-lhe um profundo abraço de parabéns e desejar-lhe muita saúde.

José Teixeira
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Nota do editor:

Último poste da série de 14 de Fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14251: Homenagem da Tabanca Grande à nossa decana: a "mindjer grande" faz hoje 100 anos... Clara Schwarz da Silva, mãe do Pepito (3): Patrício Ribeiro (Bissau)

Guiné 63/74 - P14251: Homenagem da Tabanca Grande à nossa decana: a "mindjer grande" faz hoje 100 anos... Clara Schwarz da Silva, mãe do Pepito (3): Patrício Ribeiro (Bissau)


Alcobaça > São Martinho do Porto > Casa do Cruzeiro > 7 de agosto de 2008 > O Pepito e a mãe... Foi a 1º encontro da Tabanca de São Martinho do Porto. Foi nessa altura que conheci pessoalmente a mãe do Pepito. Escrevi a respeito deste convívio:  "Foi um privilégio, para mim, para o João e para a Alice, usufruir da hospitalidade dos Schwarz e conhecer, pessoalmente, a matriarca da família, senhora que atravessou um século e tem uma memória, uma cultura e uma vitalidade prodigiosas"...

Foto (e legenda): © Luís Graça (2008). Todos os direitos reservados.


1. Mensagem do Patrício Ribeiro, o "patriarca" dos portugueses na Guiné-Bissau (já há quase 3 décadas) [, foto  à esquerda: em Farim, dezembro de 2014]:


De: IMPAR Lda energia <impar_bissau@hotmail.com>

Data: 10 de fevereiro de 2015 às 17:26

Assunto: 14/2/2015: A "mindjer grande" faz 100 anos... Clara Schwarz da Silva, mãe do Pepito, decana da Tabanca Grande


Olá Luís,
Aqui vai.

Doutora Clara Schwarz! Sempre assim a tratei, embora ela me deixasse sempre à vontade, quando lá ia a casa.

Não a vejo há um tempo, mas sei do sofrimento por que está a passar e sei também que dia 14, será um dia ainda mais triste para ela. Não havia aniversário dela, em que o meu querido e saudoso amigo Pepito, não fizesse questão de estar presente!

Agora restam-lhe as saudades e saber que o filho é e será sempre lembrado pelos amigos que fez por
vários continentes, especialmente pelos mais próximos e que deixou uma marca na sua amada terra, a Guiné Bissau! E onde tanta falta faz!


Que dizer mais de uma Senhora que completa 100 anos com a vivacidade que lhe conhecemos? Resta-me o consolo de saber que estará rodeada da familia, principalment dos seus netos e bisnetos.

À Doutora Clara, desejo um dia senão feliz, pelo menos um dia na companhia dos seus familiares e com a certeza de que muitos amigos estarão a pensar nela e a desejar que o passe em Paz!

Um abraço apertado do
Patricio

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Patricio Ribeiro
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Guiné 63/74 - P14250: Homenagem da Tabanca Grande à nossa decana: a "mindjer grande" faz hoje 100 anos... Clara Schwarz da Silva, mãe do Pepito (2): tive o privilégio de a ter como professora de francês no Liceu Honório Barreto (Manuel Amante da Rosa, embaixador de Cabo Verde em Roma)


Portugal > Alcobaça > São Martinho do Porto > Casa do Cruzeiro > 15 de Agosto de 2009 > A "jovem de 94 anos", na altura, Clara Schwarz, em férias...


Portugal > Alcobaça > São Martinho do Porto > Casa do Cruzeiro > 15 de Agosto de 2009 > O nosso querido amigo Pepito,  Ao fundo, um "pano africano...."Nesse dia, almoçámos uma deliciosa cachupa, confeccionada pela Isabel, que é de nacionalidade portuguesa, bem com os filhos, Cristina, Ivan, Catarina... O Pepito fez sempre questão de conservar a sau nacionaliddae guineense"...

Fotos (e legendas) : © Luís Graça (2009). Todos os direitos reservados


1. Mensagem do Manuel Amante da Rosa [,  ex-fur mil, QG/CTIG, Bissau, 1973/74; atual embaixador de Cabo Verde em Roma]


Meu Caro Luís,


Reflectindo sobre o teu pedido sobre a minha inestimável Professora Clara Silva, veio-me à memória a minha Mãe, há uns anos, desabafando, desconsolada e incrédula, de que era contra natura os filhos morrerem primeiro que as mães. O meu irmão tinha acabado de falecer. Mágoas que ela diz nunca chegam a sarar a não ser com o desaparecimento da própria genitora.

Recordei das primeiras vezes que vi o Pepito, sentado no Império, no campo de futebol de Salão, no Estádio Sarmento Rodrigues, nas escadarias do Liceu Honório Barreto ou sentado na varanda da sua casa contígua à Floresta Negra. Uma referência para nós, que contávamos o tempo que demorava a passar para entrarmos para o Liceu como alunos. 

Destacava-se o Pepito no grupo da sua geração pela exuberância da sua simpatia, de se dar com todos, mesmo com os mais novos, pelas sonoras gargalhadas e ser bom aluno. Para além de ser filho, obviamente, da Dra. Clara que todos respeitavam havia muitos anos, como excelente pedagoga. Tinha uma auréola de respeitoso silêncio que a acompanhava pelos corredores, indo para as salas de aula ou voltando para a sala de professores. Todos baixávamos a voz ou interrompíamos os jogos ou correrias à sua passagem.

Cincoenta anos passados e ainda me lembro de como entrou pela primeira vez, altiva e austera, no nosso 1º ano B, com o bonjour da ordem, pasta em cima da mesa, livro de ponto aberto e caderneta nova, com as nossas fotos, ainda por preencher nos recantos das notas e chamadas orais. Iniciar ela própria a chamada da praxe para nos ir identificando pelo primeiro nome, um sorriso e olhar maternal ocasional para os mais amedrontados dissiparem o respeito que nos incutia.

Não me lembro nunca de ter visto algum aluno a ser expulso das suas aulas ou levar falta de material. Ela teria o dom da disciplina sem ter que castigar. Uma admoestação verbal dela caía fundo porque era dada de frente para o aluno, olhando-lhe bem nos olhos. Muito preocupada sempre com aqueles que sabia serem os mais carenciados e carentes de locais para estudo. Poucos olhares se mantinham fixos nela quando por detrás das lentes procurava um de nós para as chamadas orais. 

Durante quatro anos tive o privilégio de a ter como minha Professora de Francês e ao mesmo tempo educadora. Como eram os Professores antigamente. Fui expulso algumas vezes de outras aulas. Éramos irrequietos, jovens e sempre à procura de algo diferente mas nas classes da Clara Silva e mais um ou outro Professor imperava a atenção e a disciplina. 

 Este o testemunho e a imagem carinhosa, respeitosa e de saudades que tenho da minha Professora Clara Silva que dentro de dias festejará o seu 100º Aniversário.

Abraços, Luís.
Manuel
_________________

Nota do editor:

Vd. poste anterior de 14 de Fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14249: Homenagem da Tabanca Grande à nossa decana: a "mindjer grande" faz hoje 100 anos... Clara Schwarz da Silva, mãe do Pepito (1): 100 anos não é apenas uma vida, são muitas vidas, que atravessam dois séculos e muitos lugares do mundo (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P14249: Homenagem da Tabanca Grande à nossa decana: a "mindjer grande" faz hoje 100 anos... Clara Schwarz da Silva, mãe do Pepito (1): 100 anos não é apenas uma vida, são muitas vidas, que atravessam dois séculos e muitos lugares do mundo (Luís Graça)







Guiné &gt; s/d &gt; "Durante a  estadia na Guiné [, 1948-1966], Artur [Augusto Silva] viveu feliz tanto em Bissau onde trabalhava como em Varela onde ia em geral passar as férias do Natal. Aqui vão  fotografias desses tempos".

[As fotos são da página do filho do casal, João Schwarz da Silva, que vive em Paris: Des Gens Interessants. Temos a sua amável autorização para utilizar a documentação inserida na sua página sobre pessoas que tiveram vidas "interessantes", basicamente amigos e família, a começar pelos seus pais, Artur Augusto Silva e Clara Schwarz da Silva, nascidos respetivamente em 1912 e 1915]

Fotos (e legendas):  © João Schwarz da Silva  (2015). Todos os direitos reservados [Edição: LG, com a devida vénia]



Portugal &gt; Alcobaça &gt; São Martinho do Porto &gt; Estrada do Facho &gt; Casa do Cruzeiro  &gt; c. 1957 &gt; O pai, Artur Augusto Silva (1912-1983), com os filhos, da esquerda para a direita, João, Iko [Henrique] e Carlos (1949-2014).

Cortesia de João Schwarz da Silva, que nos diz que a data deve ser "provavelmente 1957"... Teria então o Pepito (, nascido em Bissau, em 1949) os seus oito anitos... Que matulão, para a idade!  Nessa altura, a família vivia em Bissau e vinha passar férias à metrópole, mais concretamente na "Casa do Cruzeiro"...

Foto (e legenda): © João Schwarz da Silva  (2015). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: LG, com a devida vénia]



Da esquerda para a direita, Clara Schwarz, Maria Helena  e Amílcar Cabral, na estrada de regresso de Dakar para Bissau em 1954.

Foto do arquivo pessoal de Clara Schwarz. O seu marido, o escritor e jurista Artur Augusto Silva, é que conviveu mais com Amílcar  Cabral. Clara, que foi professora no Liceu de Bissau, traduziu textos (técnicos, não políticos) de Cabral para francês.  Pepito, o filho mais novo, nasceu em Bissau, em 1949.

 Foi o nosso saudoso amigo Pepito (Bissau, 1949-Lisboa, 2014) quem nos cedeu esta foto, na altura em que aqui publicámos um notável texto seu sobre "Amílca Cabral, um agrónomo antes do seu tempo"...

Amílcar Cabral, casado com Maria Helena, regressou a Bissau, em setembro de 1952, tinha então 28 anos. Em entrevista dada, em Bissau, ao Diário de Lisboa, em 27/5/1980, três anos antes de morrer, Artur confidenciou que "privou bastante" com  Amílcar Cabral.  Ambos eram membros do Centro de Estudos da Guiné. A última vez que o viu,  foi em setembro de 1956, dias antes de fundar o PAI [mais tarde, PAIGC]. Uns meses antes, tinham-se encontrado em Angola e combinado um jantar em Bissau. Amílcar passou à clandestinidade, e o jantar nunca mais se realizou.

Foto; © Carlos Schwarz (2013). Todos os direitos reservados. [Edição: LG, com a devida vénia].


 Guiné > Bissau > 1953 > Vista aérea da cidade, tirada na direcção sul-norte. Ao centro, a avenida principal, a Av República (hoje Av Amílcar Cabral) onde já se erguia, à direita, a sé catedral (arquiteto João Simões / Gabinete de Urbanização Colonial, 1945).  Ao fundo da avenida, do lado esquerdo já se erguia o cinema UDIB, o melhor edifício da cidade (arquiteto Jorge Chaves, 1949-52), de iniciativa privada. Em Bissau, com cerca de 5 mil habitantes, era lá que se reunia a elite local...

Ao fundo, à direita, o bairro de Santa Luzia  (1948), com uma estrutura reticulada: foi a primeira experiência de alojamento para populações nativas. Em primeiro plano o cais do Pidjiguiti, e parte da zona portuária ainda em obras...

Quando Artur e Clara chegaram a Bissau, no final dos anos 40, a cidade estava em plena fase de densolvimento, graças ao dinamismo e *a visão do governador Sarmento Rodrigues. Vários edifícios públicos estavam a construir-se,  havia ruas por asfaltar, espaços para ajardinar e alindar...


Foto (e legenda): © João Schwarz da Silva  (2015). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: LG, com a devida vénia]


1. Mensagem do nosso editor LG:

Camaradas, amigos/as: hoje, sábado, 14, a nossa amiga Clara Schwarz faz 100 anos. Nasceu em Lisboa em 1915. De origem judia (pai polaco e mãe russa), casou com o escritor e advogado Artur Augusto Silva (, nascido na Ilha da Brava, Cabo Verde, em 1912).  Teve 3 filhos, o mais novo dos quais o nosso saudoso Pepito (1949-2014). Clara viveu na Guiné em dois períodos: 1949-1966 e depois da independência, até ao ano da morte do marido, em 1983.

Licenciou-se em letras pela Universidade de Lisboa e frequentou o Conservatório Nacional de Música (onde tirou o curso de violino). Foi professora no liceu Honório Barreto, em Bissau. Tem gente, no nosso blogue, que foram seus alunos: estou-me a lembrar do António Estácio, do Manuel Amante da Rosa... (Ambos escreveram um pequeno depoimento para esta ocasião, que publicaremos a seguir.) Foi amiga ou pelo menos privou com o casal Cabral, Helena e Amílcar. No início dos anos 50, fez inclusive traduções, para francês, de trabalhos técnicos do engº agrº Amílcar Cabral.

O  pai de Artur Augusto Silva  havia falecido 1925 em Lisboa,  onde se encontrava para tratamentos. Deixava a esposa de 50 anos de idade e dois filhos ainda menores, João e Artur, que foram viver para casa da irmã Cristina, em Lisboa. Esta irmã mais velha (n. 1904)  tinha casado com o médico Augusto Pereira Brandão que na altura trabalhava em Farim, na Guiné.



S/d &gt; S/d/ &gt; "Da esquerda para a direita,  Cristina (nasceu em 1904), Artur (nasceu em 1912), Henrique e Margarida (os pais) e João (nasceu em 1910)."

Foto (e legenda):  © João Schwarz da Silva  (2015). Todos os direitos reservados [Edição: LG, com a devida vénia]

Por sua vez, já aqui falámos do seu irmão, e tio do Pepito, o João Augusto Silva. Sobre ele escreveu Mário Beja  Santos:

(...) João Augusto Silva (1910-1990) foi funcionário da Administração Colonial na Guiné, em Angola e Moçambique. Desenhador, naturalista, decorador e escritor, foi galardoado em 1936 com o Prémio de Literatura Colonial da Agência Geral das Colónias. Foi também caçador, tendo abandonado a espingarda em troca da máquina fotográfica, com a qual se dedicou a capturar imagens de uma
das suas paixões: os animais. Nasceu em Cabo Verde, passou parte da infância na Guiné, terra a que regressará entre 1928 e 1936. As suas obras maiores são: “África: Da Vida e Amor da Selva” e “Animais Selvagens: Contribuição para o Estudo da Fauna de Moçambique”. Administrador do Parque da Gorongosa, será mais tarde Curador do Jardim Zoológico de Lisboa. Sobre a Gorongosa deixou um livro da maior importância “Gorongosa: Experiências de um Caçador de Imagens”. Foi recentemente homenageado pela Sociedade de Geografia de Lisboa. Foi irmão de Artur Augusto Silva, um investigador e poeta luso-guineense, aqui já várias vezes auferido, e tio do nosso confrade Pepito." (...)




Belíssima xilogravura de João Augusto Silva, publicada na revista "Momento", de fevereiro de 1936.


Foto (e legenda):  © João Schwarz da Silva  (2015). Todos os direitos reservados [Edição: LG, com a devida vénia]


Desiludido com a vida do pós-guerra em Portugal, Artur decide partir, em finais de 1948, para a Guiné. Chega ao território em 6/11/1948. A família (Clara, João e Henrique) ir-se-á juntar-lhe no ano seguinte. Carlos ("Pepito") nasce em 1949.

Artur, até 1966, exerce naquele território a sua profissão de advogado, mas também fez de notário e até substituto do Delegado do Procurador da República. [Sobre Artur Augusto Silva temos duas dezenas e meia e meia de referências no blogue]

Escreve o seu filho João: "Em 1948, partiu para a Guiné (Bissau) para ali continuar a advocacia, com um sentimento pesado de frustração pela derrota politica, deixando para trás o Movimento de Unidade Democrática [MUD,] , desfeito, Leiria e Alcobaça, a mulher e dois filhos que em 1949 se juntaram a ele". (...). Depois da guerra, em 1945, o dr. Artur Augusto, como era conhecido, tinham esperanças na mudança democrática e pacífica do regime de Salazar.  Em 1947, o MUD foi ilegalizado e o o seu nome continuou debaixo do olho da política política... até ao 25 de abril.

Na Guiné, "foi um dos fundadores do Colégio Liceu de Bissau (Liceu Honório Barreto) que no inicio a partir de 1949 ocupava umas salas do Museu da Guiné que tinha sido criado em 1947 num edifício junto do Palácio do Governador". Em julho de 1952 era  governador Raimundo Serrão... "De 1949 a 1956, o liceu ocupou algumas salas do Museu. Só a partir do inicio do ano lectivo 1956 é que o Instituto Liceal Honório Barreto passou a poder contar com instalações próprias." 

Foi também membro do Centro de Estudos da Guiné. Licenciado em Direito, Artur havia estado, de 1939 a 1941, em Angola, como secretário particular do Governador Geral, dr. Manuel Marques Mano; de regresso a Portugal exerceu advocacia em Lisboa, Alcobaça e Porto de Mós. O casal viveu em Alcobaça e tinha casa de praia em São Martinho do Porto. Diz o filho João: "Depois de se casar, Artur Augusto exerceu a advocacia em Lisboa, mas a convite de Luciano Santos, um amigo pintor, decidiu mudar-se para Alcobaça onde havia falta de advogados".


Lisboa &gt; s/d &gt; c. 1930/40 &gt; Artur Augusto Silva, numa festa,  com a Clara (à direita) e uma amiga.



Lisboa &gt; 1935  &gt; "Foi como director da revista Momento que Artur Augusto acompanhou o funeral de Fernando Pessoa em 1935, Possivelmente a única fotografia tirada nessa altura, mostra Artur à direita da fotografia ligeiramente encoberto por outro participante"

Fotos (e legendas):  © João Schwarz da Silva  (2015). Todos os direitos reservados [Edição: LG, com a devida vénia]

Ainda como estudante (, passou pelo Liceu Camões, foi colega de faculdade de Álvaro Cunhal), e depois como recém-licencidado, Artur  Augusto participou intensamente da vida cultural e literária de Lisboa dos anos 30. Foi director da revista "Momento" e, nessa qualidade, acompanhou o funeral de Fernando Pessoa,  em 1935.

"Publicou vários livros, fez reportagens, dirigiu saraus literários, organizou exposições de arte moderna, promoveu conferências culturais na Casa da Imprensa, na Sociedade Nacional de Belas Artes e em vários outros locais de Portugal nomeadamente no Grémio Alentejano e no Porto", escreve o seu filho João Schwarz da Silva, que vive em Paris, numa sentida e bela homenagem que faz ao seu pai, na sua página "Des Gens Intéressants" [, Pessoas Interessantews].

Em 1953, morre o pai de Clara, Samuel Schwarz (, nascido em Zgierz, Polónia, Rússia, em 1880). Havia-se formado, em 1904, aos 24 anos, como engenheiro civil de minas, na École National Supérieure de Mines de Paris.




Bilhete de identidade de cidadão português de Samuel Schwarz, emitido em 25 de janeiro de 1941.



Autorização de residência, emitida em 19/2/11927, para a mãe de Clara, Agata Schwarz


Fotos (e legendas):  © João Schwarz da Silva  (2015). Todos os direitos reservados [Edição: LG, com a devida vénia]


Samuel trabalhou em diversos países na indústria petrolífera (Baku, Cáucaso Russo) e na indústria mineira (Polónia, Inglaterra, Espanha, Itália e, por fim, Portugal). Em 1914, casa em Odessa com  Agatha Barbash,  filha de um banqueiro. (Nascida em 1884, em Tulczyn, Ucrânia, virá a morrer em 1950, em Lisboa)

Na altura em que eclodiu a I Guerra Mundial, em  1914, com 34 anos de idade, Samuel estava em viagem de núpcias em Portugal. Decidiu cá ficar. Começa a trabalhar em 1915 numa mina de volfrâmio, em Vilar Formoso, e noutra de estanho, em Belomonte, Na época vivia em Lisboa. Em 14 de fevereiro de 1915 nasce a sua filha, Clara.

Os cristãos-novos em Portugal no século XX
Autor: Samuel Schwarz
Editora: Livros Cotovia
Local: Lisboa
Colecção: Judaica
Ano de Edição: 2010
N.º de Páginas: 200
ISBN: 978-972-795-309-7

Sobre a vida fascinante deste homem Samuel Schwarz (1880-1953), vd. aqui o artigo escrito pelo seu neto João Schwarz da Silva:  judeu asquenaze,  era fluente em nove línguas,incluindo o hebreu. Foi um conceituado estudioso do judaísmo em Portugal, arqueólogo, historiador, autor da descoberta e da revelação pública, em 1925, da comunidade cripto-judaica de Belmonte, e .  bem como da antiga sinagoga de Tomar que comprou e efereceu ao Estado Português. Em 2010,  os Livros Cotiva reeditaram, em livro, o seu trabalho, de 1925, sobre os cristãos-.novos da Beira Baixa e, em especial,  de Belmonte, os rituais do Babatm do Kiopur e da Páscoa, orações ditas em português arcaico misturadas com palavras hebraicas, e que foram transmidas, sempre pelas mulheres, ao longo de quatro séculos e meio, pro sucessivas gerações.

Fotografia e assinatura no passporte do marido, emitido em
23 de agosto de 1946. Cortesia de João Schwarz da Silva 
Clara Schwarz da Silva é  nossa grã-tabanqueira desde 2010... Entrou para a Tabanca Grande, mais precisamente,  em, 14 de fevereiro de 2010, aos 95 anos.  Passou então a ser a Mulher Grande da nossa Tabanca Grande, com o nº de entrada 397. Hoje temos mais de 675 membros. É a nossa decana, e também a "mulher grande" da Tabanca de São Martinho do Porto (que se reuniu todos os todos os anos em agosto, quando o Pepito vinha de férias, de 2008 a 2012). Alguns de nós têm o privilégio de a conhecer e de ter privado com ela e a sua família, na famosa "casa do Cruzeiro", em São Martinho do Porto.

Foi sempre um mulher independente e cosmopolita. Até há bem pouco tempo era muito autónoma, usando com desenvoltura o telefone, o skype, o mail, a internet, e visitando o nosso  blogue… Ainda ontem telefonou à Maria Alice Carneiro, mamtendo com ela uma conversa perfeitamente normnal... Conduziu até tarde, com mais de 90 anos. Tem uma memória prodigiosa, é culta, é poliglota, e tem um grande  orgulho de seu pai, engenheiro de minas, de origem polaca,

Se outras não fossem válidas, bastaria invocar aqui o seu papel como co-fundadora, juntamenete com o marido e outros,  do Liceu Honório Barreto, hoje Liceu Nacional Kwame N' Krumah. Mais: foi professora de francês (e creio que também de português) de inúmeros guineenses, incluindo  dirigentes do PAIGC... (É capaz ainda de os citar de cor, e avaliar um a um!)...

Fala, sempre e ainda hoje, com muita ternura do seu marido, Artur, como um homem que "conhecia e amava a África" como poucos... Recordo-me de ela ter.me oferecido com dedicatória um pequena brochura dele, "Pequena Viagem Através de África"... Foi uma conferência que ele pronunciou na Associação Comercial da Guiné, em 1963, no 46.º aniversário da sua fundação. É uma admirável lição de sapiência e de sabedoria.

Três anos depois, em 1966, a PIDE prendia-o no aeroporto de Lisboa. O seu único crime era o de ser defensor de presos políticos... Libertado graças à intervenção pessoal, ao que se soube,  de Marcelo Caetano, seu professor de direito, após quatro ou cinco meses de Caxias, sem culpa formada, seria impedido de voltar à sua querida Guiné, agora a ferro e fogo... Sabe-se que o governador Schulz considerou-o "persona non grata" no território.




"Foi preso no aeroporto de Lisboa à chegada de Bissau [, em 26 de agosto de 1966,]  já em plena luta de libertação da Guiné, e foi detido na prisão de Caxias durante 4 meses sem julgamento. Foi libertado a 23 de Dezembro de 1966, por influência de alguns amigos que lhe conheciam e admiravam o carácter, mas foi-lhe fixada residência na capital . Escassos dias antes da libertação de Artur da prisão de Caxias, o Governador da Guiné (Arnaldo Schulz) mostra-se preocupado com a sua eventual libertação. [Sua Excelência o Governador é de opinião que aquele senhor não deve voltar à Guiné, pelo menos enquanto se mantiver o terrorismo".]

Foto (e legenda):  © João Schwarz da Silva  (2015). Todos os direitos reservados [Edição: LG, com a devida vénia]


Clara falou-me uma vez deste episódio triste e do cinismo do governador, Schulz, que era visita da casa dos Silva, em Bissau, e que inclusive acompanhou o Artur, até ao aeroporto, nessa triste viagem sem regresso... Só depois da independência é que Artur (e a Clara) voltaria, a convite de Luís Cabral, para desempenhar o lugar de juiz do Supremo Tribunal de Justiça... E lá morreria, em Bissau, em 1983. Era especialista em direito consuetudinário. Publicou livros sobre os usos e costumes jurídicos dos felupes, mandingas e fulas.

É também com a mesma frontalidade e coragem que a Clara vem protestar, em 2005, junto do Presidente da Câmara de Belmonte pela imperdoável omissão do nome do seu pai, Samuel, no recém-inaugurado Museu Judaico de Belmonte. Embora tarde, a injustiça foi reparada em 2007.

(...) "S. Schwarz está na origem da descoberta dos cristãos novos de Belmonte. Graças à sua enorme sabedoria ele revelou os ritos e costumes destes cristãos novos, em numerosos livros dos quais o principal, publicado em 1925, 'Os cristãos novos em Portugal no Século XX' , livros esses que são uma referência incontestável tanto para historiadores portugueses como estrangeiros." (...)

Hoje, sábado, 14 de fevereiro de 2015, os filhos, netos e bisnetos vão fazer-lhe uma festinha íntima. Ela fez questão de dizer "não queria nada", porque ainda não ultrapassou a profunda dor causada pela morte, inesperada, do seu querido Carlos... E não era seguramente esta a festa dos 100 anos que a gente tinha imaginado para ela...

À distância (, ela mora em Paço de Arcos, Oeiras), e respeitando a sua intimidade, queremos apenas levar-lhe uma palavra de afeto, apreço, conforto, amizade e homenagem... 100 anos não é apenas uma vida, são muitas vidas, que atravessam dois séculos e muitos lugares do mundo... Mais de metade da sua família, da Europa de leste, desapareceu com a II Guerra Mundial. E ela conheceu uma boa parte dela quando visitou a Polónia em 1938 (*)...

Clara Schwarz é uma mãe coragem. E um exemplo de vida, inspirador, para todos nós. Alguns/algumas de nós fizeram questão de  escrever duas linhas sobre esta mulher e nossa amiga, que sempre manifestou um grande interesse e carinho pelo nosso blogue. São esses testemunhos que publicamos a seguir, a par deste pequena resenha biográfica, que só possível graças à amável e afetuosa cumplicidade do João (que veio ontem de Paris se juntar à festa de família). Também sei que, pelo menos os filhos do Pepito, Ivan e Catarina, vai estar hoje a cantar os parabéns à avó, a "mindjer grande" que nos orgulha a todos/as. (**)

O editor Luís Graça (em nome pessoal e da Tabanca Grande)
____________________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 26 de agosto de 2009 &gt; Guiné 63/74 - P4863: Agenda cultural (24): A História de Cristina, por Mikael Levin, no CCB, de 31/8 a 8/11 (Carlos Schwarz, 'Pepito' / Luís Graça)

(**) Vd. poste anterior de 14 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14248: Parabéns a você (860): Senhora Dona Clara Schwarz, Amiga Centenária, Grã-Tabanqueira

Guiné 63/74 - P14248: Parabéns a você (860): Senhora Dona Clara Schwarz, Amiga Centenária, Grã-Tabanqueira

A Centenária Senhora Dona Clara Schwarz
Foto: © Luís Graça


____________

Nota do editor

Último poste da série > 10 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14237: Parabéns a você (859): José Brás, ex-Fur Mil TRMS da CCAÇ 1622 (Guiné, 1966/68)

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Guiné 63/74 - P14247: Blogpoesia (401): Me fere o tirar a vida (Mário Vitorino Gaspar, ex-Fur Mil Art MA da CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Vitorino Gaspar (ex-Fur Mil At Art e Minas e Armadilhas da CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68), com data de 11 de Fevereiro de 2015:

Comando a NT. Ao me preparar para uma patrulha; segurança ou emboscada, os sentidos multiplicam-se. Atento ao mínimo pormenor. A distância diminui. Os olhos ampliam as imagens. A pica beija o chão, meigamente bate. Se somos agressivos, rebenta. O coração cadenciado como o melhor relógio do mundo. De pressa, não! A pica presa, como a vara do pastor.

Surge o inimigo, inicia-se o fogo, o meu coração surge como um sino manejado por um sacristão aprendiz.
Num ápice, fico anestesiado, a mente o obriga. Controlo o medo que por milésimos de segundos invadiram o meu ser. Tem calma! Vislumbro, e logo de seguida, sábio de tal modo que antecipo-me ao tempo. Com nitidez, o mundo na mão. E a sabedoria encontra resposta imediata para tudo.

Quantos mortos? Feridos? Evacuações, o radiotelegrafista tem de informar:
- Nenhum morto! Sete a evacuar!

Mas qual a memória, que matemática e fotografia? Os olhos munidos de lentes e de maquinetas fotográficas dão a resposta certa.
A razão de colocar aquela orquestra é a pausa, a liberdade que regressa e mora dentro de mim. Transformo-me em ave que voa na pauta. Música nascida na pureza de notas libertas.

Interessa-me mais a poesia, gostava de saber, mas necessito de uma ajuda, de um empurrão. Uma opinião basta. Os meus dedos tocam o teclado, por acaso não com a delicadeza que se trata uma mona ou um diamante em bruto. A poesia tem de ser facetada, e eu só trabalho o tosco. Falta-lhe, talvez o nome mais apropriado: ALMA.

Como me sinto muito em baixo, nunca vivi um período tão mau, desde o dia 26 de Setembro. Se paro morro…
Mário Gaspar


Me Fere o Tirar a Vida!

Mário Vitorino Gaspar

“Uma guerra ganha-se com a razão da força.
E o vencedor conta-a depois com a força da razão.”
Vergílio Ferreira

- Amanhã ao despertar do sol, Corredor da Morte!
Quebra o silêncio a voz do capitão,
cheira-me a sangue em tal reunião.
As sílabas me sugam o rosto, será que choro?
quererei beber as lágrimas de quem adoro?
Riso de malmequer a olhar a lua, o furriel miliciano:
- Deus, deixa-me viver só falta um ano!
Naquele cemitério de trevas vamos ter sorte!

O sol a me sorrir fontes de madrugada
somos pastores beliscando a terra com carinho,
ao ombro como um cajado, a G3 meu amorzinho.
Fiéis camaradas com precisão alinhados,
alguém grita comigo: - Piquem, meus adorados!
seja fornilho, armadilha ou mina
mascarada, nariz de riso de palhaço pequenina.
Piquem com amor e não haverá nada!

Árvores rainhas erguem-se em prece: Guileje à vista!
De verde salpicados, soldados nos seus postos
sementeiras de suores nos seus rostos.
Risonho a meu lado, do tão jovem que foi
rompeu um veterano, eterno herói.
Lares distantes, destas terras solitárias...
Na guerra existe ódio e campas tumultuárias.
Raízes fortes de Portugal. Há quem resista!

Chega a hora para comer e descansar
vou beber uma cerveja e mais nada
ainda há gente rindo, feliz e acordada.
Sonhar com as namoradas… dormir!
nem sequer o camuflado vou despir.
Beijar a vida, beijar o beijo, sem dor
sonhar sementes de paz cobertas de amor.
Sono descansado, salta o coração a palpitar!

Partida, noite escura, beijar rosas mas a picar
G3, bazucas, MG’s, morteiros, todos carregados
rompemos a mata e o tempo, e chegamos.
Esperar a ameaça chegar, tarefa dura
o tempo custa o silêncio adormece, é altura!
Há quem desespere a espera e não a suporte
Cheiram-se aromas do Corredor da Morte.
Vai andar a roda, o sorteio está no ar.

Mulheres quais peixeiras surgem à frente
coroadas de caixotes, pressa no andamento,
não é fruta nem peixe, é armamento.
O pão de liberdade para o inimigo
é amor forte de libertação, antigo.
Digo a ciciar: - deixá-los avançar!
Sinal silencioso, dou ordens para atirar
Matar para não ser morto, é hora de o ter presente.

Tiroteio vira inferno, inunda o belo de ais
há vómitos de morte, das morteiradas
pavor de barrigas sangrando esburacadas.
Semeiam-se palmos de terra para sepultura...
recolhem feridos e mortos e sem cura.
Mortos presos nas covas e onde a glória?
Nós vivos saboreamos a vida na memória,
chegados ao lar o que contar aos pais?

PAIGC grita responde sem parar,
debaixo de tiros e rebentamentos
mais mortos caem, outros com ferimentos.
Vagueamos num cemitério, floresce-nos a sorte
nem um beliscão um ferido uma morte.
Um dos meus heróis: - Escapámos desta!
Em Guileje, em Gadamael depois, será festa.
Beliscaremos umas cervejas para alegrar!

Atravessamos a bolanha comprida,
à altura da cabeça está o capim
ainda há que andar para chegar ao fim.
Pecarás! – tinha ouvido na igreja mas é guerra
longe da família do amor e da nossa terra!
Lembro de novo o padre: - Não matarás
se fores um malfeitor és igual a Satanás!
Coisa não estranha… me fere o tirar a vida!

Temos de orar, pedir perdão a Deus?
Choro sem lágrimas sei que Ele existe.
Sou um girassol sem sol, quedo e muito triste.
Matámos e ferimos gentes pequei e pecamos
Deus manda amar e não amamos …
Dar paz ao inimigo e um abraço?!
O poeta pinta entre os povos o enlaço
verso pincel ou cinzel com fundo de céus!

Senti tudo o que amava, num singelo olhar:
alma e coração do meu golfinho,
lezíria, fragatas, bateiras, o beijinho
do Pai, minha Mãe heroína sem fala.
Pincéis de poemas, letras, e não cala
a silvestre e brava amoreira de amor.
No coração estagna-me uma linda flor
revejo a fuga do Sol ao infinito rumar!

A morte é… a morte não gera amor,
ter de matar para não morrer?
A morte padece e faz padecer
é a solidão da multidão no cais a partida,
não é ser é nada ser nesta vida.
Ver-se culpado pelo sangue que se derrama
do corpo do seu inimigo, é drama!
Ó meu Deus por tal te imploro, Senhor.

Passada a bolanha cresce a floresta
perdem-se versos cresce a morteirada
retarda-se o tempo na retirada.
Irmãos de Guileje, destino a atingir!
Saboreamos o sumo do suor, a fugir
tocando nos secos lábios e bebemos
sonhos sonhados, mundo melhor não vemos
e este é reles e na verdade não presta!

Amor e rezas além dos mares, flor sorri…
Ainda longa é a viagem até à chegada.
Incólumes das mordidelas da emboscada,
sãos e soltos de vida, às portas das mortes
passaram. Regressa o riso aos soldados fortes
prontos a cumprir, a cuspir vómitos da guerra
pedindo a Deus o regresso à sua terra.
Toco no meu corpo, corre a vida, não morri!…

Amo a vida, a paz e com fervor
corro entre pedras, seguro a vida.
O coração ri à pincelada quente e florida
espreitando as cores da ave vistosa
que me voa no pensamento. Que formosa!
Rompo dentro de mim em crescimento,
amo a vida o amor a cada momento.
Beijo o vácuo o espaço até ao amor.

Sonho. Aves livres desenham cada nota musical
dirige a orquestra o maestro e a sonhar
usa a batuta como ave leve a voar.
As notas riem na pauta a libertar
sons melancólicos sobre o tema amar:
sons de bandolim banjo cavaquinho trombone
trompa concertina cravo pratos saxofone,
música única que é língua universal.

Pífaro, cítara, xilofone, gaita, fagote,
violino triste, poesia leve rima sobrenatural!
E o toque da harpa ou da lira, brisa breve e musical?
Chora a guitarra, notas breves da noite do fado,
violoncelo e rabeca riem para mim soldado.
Ferrinhos e pandeireta em música tão distinta,
piano e viola quadro de amor do pintor que pinta
alegria nos fardados. Risos há quem os adopte.

Saímos de Guileje carimbando o solo com a pica.
Ecoam cristalinas as notas da pauta.
Armado, pétalas floridas se soltam da flauta
e nasce a tristeza nas teclas do acordeão.
Esqueço a guerra, pinto um poema uma oração
o bigode do meu pai, a minha mãe de tranças…
os meus sobrinhos riem felizes crianças.
No clarinete e no tambor a nostalgia fica.

O compositor criou mel, que façanha esta?
Chegámos folhas caídas e velhas, mas risonhos
a mata recorda os amigos mortos, plantados os sonhos
eis que se escuta o hino em grito triste do trompete...
que a alegria dos soldados não compromete.
Beber umas cervejas, tomar banho, jantar e escrever
cartas amorosas para ninguém conhecer
que na guerra se mata e se morre, não é uma festa.

Sonhava. A vida é vida se for vivida com amor
se nascer na fonte dos beijos que beberes
saboreando o grão dos trigos que comeres.
A vida só é vida se entre pântanos nascer a flor,
a vida só é vida quando não vejas mais dor
se saíres vencedor sem muito sofreres
e amares na humanidade todos os seres!
A vida só é vida se for vivida, sim senhor.

Gritos aflitivos na chegada, chamadas e risos felizes.
Voam saltitos de flor em flor, danças de gente louca.
E o pobre sem amor, liberdade e pão para a boca?!
No fim a vida semente há-de romper com carinho
dar liberdade às flores e aos pássaros um ninho...
Haja humanismo, solidárias acções
Em prol deste mundo que sonhava de paixões.
A Guiné me espremeu os sonhos, de crescidas raízes!

Mário Gaspar
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Nota do editor

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