segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Guiné 63/74 - P13638: Selfies / autorretratos (2): filho único, com pai emigrado no Canadá, podia também ter saído do país, aos 17 anos... Passei pela universidade de Coimbra e lutas académicas, tendo decidido participar na guerra colonial, contrariado e sabendo ao que ia (Manuel Reis, ex-alf mil cav, CCAV 8350, Guileje, 1972/74)

1. Comentário de Manuel Reis ao poste P13623


[, Foto á esquerda: Manuel Augusto Reis, em Guileje, 1973:  foi alf mil cav, CCAV 8350, Guileje, Gadamael, Cumeré, Quinhamel, Cumbijã, Colibuia, 25/10/72 - 27/8/1974]

Amigo e ex-camarada Vasco:

Abriste uma frente de diálogo bastante interessante e que o Luís com o seu saber deu uma ajuda suplementar.

Conheço o Vasco desde os tempos de escola, com um percurso um pouco idêntico, mas trilhando o mesmo caminho: colégio de Anadia e Universidade de Coimbra e,  imagine-se, ....Gadamael. 

Aproveito para lembrar o percurso dos meus familiares no que à guerra diz respeito. Meu avó (materno) foi mobilizado para a 1ª guerra mundial e participou na batalha de La LYs. Consegui ouvir algumas peripécias, dispersas, dos momentos difíceis, que teve de suportar, na sua qualidade de granadeiro. 

No seu regresso era um homem destroçado anímicamente. A minha presença na sala tornava-se incómoda, pelo que me era dada ordem de retirada.

Na casa dos meus avós vivia-se um ambiente republicano, sendo o meu bisavô, Pedro, meu grande amigo, constantemente perseguido. A maior parte das noites eram dormidas em palheiros, afastados da sua residência. Lamento que o diário do meu avó se tenha extraviado, a sua importância, para mim, era bastante significativa.

Seguiu-se o meu pai, que é mobilizado para alinhar na 2º guerra mundial, sendo enviado para Moçambique, durante 3 anos, onde supostamente se previa um desembarque de tropas japoneses. Nada faria supor esta mobilização do meu pai, recém- casado. Não sofreu os traumas da guerra, mas a ausência da família foi dura.

Poucos anos passados, face ás dificuldades económicas, o meu pai emigra para o Canadá onde permanece durante mais de 20 anos. No ano em que eu completava 17 anos e perante o espectro da guerra que pairava sobre a minha cabeça, desloca-se a Portugal e coloca-me a possibilidade de emigrar também. 

O meu pai, homem simples do campo, tem a noção e a preocupação de que a guerra me espera.Possibilita-me que decida .Estar-lhe-ei  eternamente grato. Acabei por recusar, via a guerra ainda muito longe, e com um percurso académico satisfatório, nada o aconselhava. 

A minha entrada na academia, e o meu envolvimento nas lutas académicas, rasgaram-me outros horizontes e quando decidi, contrariado, participar na guerra que já se vivia nas ex-colónias, sabia para o que ia. A decisão era sustentada no plano familiar, pois na qualidade de filho único, não imaginava um afastamento prolongado dos meus pais.

Um grande abraço.

Vasco,  as caçoilas estão prontas!

Manuel Reis

__________________

Nota do editor;

Último poste da série > 22 e setembro de  2014 > Guiné 63/74 - P13634: Selfies / autorretratos (1): por que é que fomos à guerra... (Vasco Pires / Luís Graça / Francisco Baptista / José Manuel Matos Dinis)

10 comentários:

Luís Graça disse...

Manel, um abraço.

Duas notas, ou um pedido e uma nota:

(i) Não tens fotos e/ou documentos do teu avô (que foi à I Guerar Mundial e esteve em La Lys) e do teu pai (, que passoui por Moçambique, na II Guerra Mundial), para um eventual poste para a série "Meu pai, meu velho, meu camarada" ?

Temos camaradas, aqui no blogue, que estão nas tuas condições, com o pai expedicionário nos Açores oiu em Cabo Verde (cvaso do meu), na II Guerra Mundial, e/ou o avÔ, na I Grande Guerra...

(ii) Quando fostes às sortes, um em cada cinco mancebos eram "faltosos", isto é, não compareciam à inspeção militar...

Isto dá uma ideia do que foi a "sangria" deste país, nos anos 60/70...

Luís Graça disse...

Mail envaido esta manhã ao nosso colaborador permanente Zé Martins:

Assunto - Faltosos à inspeção militar, refratários, desertorea: quantos foram ?

22 set 2014
09:58


Zè: Os nºs continuam a ser fantasiosos, imprecios... Há quem fale em 100 mil, 150 mil, 170 mill, 200 mil, metidos todos no mesmo saco, refratários e desertores...

O que é uma coisa e outra, segundo a justiça militar ?

Os desertores (mais cá do que lá...) foram poucos...Algumas centenas ? Alguns milhares ? 3 mil ?...

E o total de combatentes ? 800 mil metropolitanos ? E os africanos ? 200 mil ?

Parece que entre 1969 e 1972, 1 em cada 5 faltava à inspeção (20%)... (segundo o exército)

Tens algum estudo sobre isto ?... Ou conheces alguma fonte com crédito ?

Um abração. Luis

Luís Graça disse...


Luís Graça

22 set 2014 10:46


Zè: Vê aqui no portal "Guerra Colonial", da A25A... Não indicam a fonte:

http://www.guerracolonial.org/specific/guerra_colonial/uploaded/graficos/estatiscas/recrutamento.swf

Mas uam coisa são os faltosos (à inspeção militar), outra os refratários e outra ainda os desertores...

São figuras jurídicas distintas, acho eu...

Podemos fazer uns gráficos...a partir do Excel... Pode ir para o teu "consultório"...

Ab. Luis

Anónimo disse...

josesmmartins@sapo.pt

22 set 2014 12:34 (
Bom dia Luis

Tenho dados fornecidos por fonte oficial.

Há uma referência a "estes" casos no texto que estou a finalizar.

Abraço

Zé Martins

Anónimo disse...

josesmmartins@sapo.pt

22 set 2014 14:39
Luis

A fonte é o 1º Volume da CECA.
O quadro que esta no ukltramar.terraweb é baseado nestes dados. Aliás os únicos disponiveis.



Zé Martins

Anónimo disse...

josesmmartins@sapo.pt

22 set 2014 14:39
Luis

A fonte é o 1º Volume da CECA.
O quadro que esta no ukltramar.terraweb é baseado nestes dados. Aliás os únicos disponiveis.



Zé Martins

Anónimo disse...

josesmmartins@sapo.pt

22 set 2014 14:39
Luis

A fonte é o 1º Volume da CECA.
O quadro que esta no ukltramar.terraweb é baseado nestes dados. Aliás os únicos disponiveis.



Zé Martins

Luís Graça disse...

Luís Graça

22 set 2014
10:21

Assunto - Filme (documentário de longa metragem) do Rui Simões, "Guerra ou Paz" (2014)


Zé: Não sei onde o cineasta Rui Simões foi buscar estes números... Há um óbvio lapso no nº de efetivos mobilizados... Provavelmete ele queria dizer "um milhão!, mas assim o trocadilho não bate certo: "100 mil" teriam saído do país "para não ir à guerra" (o que é uam leitura abusiva...) enquanto outros 100 mil partiam para fazer a guerra...

Ele próprio é refratário, creio eu, tendo saído do país, para Paris. em 1966. Ele nasceu em Lisboa em 1944, devendo ter tendo ido portanto à inspeção em 1964... Não é desertor, é refratário... Só regressou em 1974, tanto quanto sei....

A propósito, ainda não vi o filme. Sei que está disponível em DVD.

Ab. Luís

________________

Sinopse:

"Entre 1961 e 1974, 100.000 jovens portugueses partiram para a guerra nas ex-colónias. No mesmo período, outros 100.000, saíram de Portugal para não fazer essa mesma guerra.

"Em relação aos que fizeram a guerra já muito foi dito, escrito, filmado. Em relação aos outros, não existe nada, é uma espécie de assunto tabu na nossa sociedade.

"Que papel tiveram esses homens que “fugiram à guerra” na construção do país que somos hoje? Que percursos fizeram? De que forma resistiram?

"Esta é a história que GUERRA OU PAZ pretende contar: a dos jovens que se recusaram a participar numa guerra que não sentiam como sua, sem pôr em questão o seu amor à Pátria. Se há a figura do Soldado Desconhecido, este filme pretende retratar esse outro Homem Desconhecido que recusou ser soldado." (Fonte: Real Fição)

http://cargocollective.com/ruisimoes/GUERRA-OU-PAZSINOPSE

Anónimo disse...

Refractário..o que não se apresenta na data da incorporação para cumprir o serviço militar.

Desertor..o que estando a cumprir o serviço militar se "pisga"..julgo que era considerado desertor todo aquele que passados dois dias não justifica-se a sua ausência.

Os números julgo que são completamente exagerados..e no n.º de refractários (100.000) então tenho a certeza por ser estatisticamente quase impossível ..é só fazer contas.
Criaram-se mitos muito convenientes a certas pessoas.

Sou de uma aldeia onde mais de 80% da população emigrou..onde houve mais de 300 incorporados ao longo da guerra..só me lembro de um refractário e não foi por motivos políticos.. quase todos os que emigraram foi depois de cumprirem o serviço militar, tendo alguns já emigrado, voltarem para o cumprir.

Lembro-me que alguns na inspecção militar ficaram livres, não por "cunha" mas por manifestamente não reunirem as condições físicas mínimas ou outras..vinham com a fita branca e muito tristes alguns choravam porque se consideravam menos "machos"..se nem para a tropa serviam ?!!

Convém relembrar que a consciência política da maioria da população era nula ou quase..o "botas" era o salvador deste jardim à beira-mar plantado e a "maralha" ia defender a pátria.

Sem querer ser ofensivo..mas a verdade é que a grande maioria dos ditos refractários o fizeram por pura e simples cobardia.

C.Martins

Anónimo disse...

P.S.

Onde se lê justifica-se deve ler-se justificasse ..

C.Martins