quarta-feira, 23 de abril de 2014

Guiné 63/74 - P13022: Em busca de... (241): Fotos e histórias do cinema ao ar livre e do empresário Manuel Joaquim dos Prazeres, que deambulou pelo território entre 1943 e 1972 (Lucinda Aranha, filha e escritora)

Foto n.º 2

Foto n.º 3

Foto n.º 4

Fotos: © Lucinda Aranha (2014). Todos os direitos reservados.

1. Mensagens de 2 e 8 do corrente, de Lucinda Aranha, membro mais recente da nossa Tabanca Grande,  nº 654 (*):

(i) Em tempos, encontrei no vosso site umas crónicas escritas pelo Carlos Geraldes, uma das quais se intitula O Dia de S. Cinema.
Entrei então em contacto com o Diamantino Pereira Monteiro que pôs o meu cunhado José Filipe Soares, que fez o serviço militar na Guiné, em contacto com o Geraldes. O caso é que sou filha do Manuel Joaquim, o personagem dessa crónica que tinha um cinema ambulante com o qual percorreu toda a Guiné entre 1943/70.
Era minha intenção escrever uma biografia do meu pai, projecto que então abandonei porque tinha entre mãos um outro livro que entretanto foi editado pela Colibri. Finalmente, a biografia do meu pai está praticamente acabada, mas não consigo resposta do Carlos Geraldes e também não o encontro como vosso seguidor. Faço-lhe, no entanto, referência no livro assim como ao vosso site. Espero não haver problema.
Também gostaria de poder contar com o vosso apoio, quaisquer informações, divulgação.

Muito obrigada,
Lucinda Aranha Antunes

(2) Caro Carlos Vinhal
Junto envio o texto de apelo que gostaria de ver publicado no blogue.
Em anexo seguem as fotografias de meu pai que podem ajudar à sua identificação. (**)
Atenciosamente
Lucinda


"Caros amigos,
Estou a escrever uma biografia ficcionada sobre Manuel Joaquim dos Prazeres, meu pai, que andou, entre 1943/72, pela Guiné com um cinema ambulante, dedicando-se também à caça grossa e dando apoio aos administradores e chefes de posto quando havia problemas com os geradores. Por isso, agradeço todas as informações que eventualmente tenham sobre ele, assim como fotografias, particularmente alguma relacionada com o cinema ao ar livre. "

Lucinda
_____________

Nota do editor:

(*) Vd. poste de 15 de abril de 2014 >Guiné 63/74 - P12991: Tabanca Grande (433): Lucinda Aranha, filha de Manuel Joaquim dos Prazeres que viveu em Cabo Verde e na Guiné entre os anos 30 e 1972, e que era empresário de cinema ambulante

(...) um cinema ambulante com o qual correu desde os anos 40 aos anos 70 do século passado a Guiné e, quando a guerra colonial começou, entreteve civis, militares e guerrilheiros, oficialmente terroristas para o Estado português, convivendo com todos eles, admirando por igual Salazar e Amílcar Cabral com quem chegou a privar e de quem a Julinha se orgulhava de dizer que conhecera ainda rapazinho de calções. 

O próprio Zezinho Araújo, ministro de Luís Cabral e um dos assinantes do Acordo de Argel, foi durante os seus tempos de estudante em Lisboa visita assídua, com a irmã Noémia, de nossa casa. Até uma vez por lá apareceu o Agostinho Neto, quem sabe se levado pelo Manelito, angolano embarcadiço casado com a Maninha, afilhada de casamento do Nequinhas e da Juju, que apadrinharam também o casamento da Cecília e do Fidelis, célebre por ter vivido nos EUA, onde quase dera o nó com uma americana. Só a Nené escapou a esta onda de enlaces que es cusa di relaxo não era com ela, como dizia numa misturangada de português e crioulo da Praia, exemplo acabado de aculturação.

Nestas suas andanças lá ia com a sua velha Ford, gerador, projector, ecrã, filmes os mais inócuos possíveis (capa e espada, cowboys, musicais, comédias, dramas), os seus ajudantes nativos, os seus acompanhantes de quatro patas, os amigos cães que alimentava, afagava, acudia na doença, com quem convivia tu cá tu lá, que era médico e veterinário autodidacta. 

Veja bem, insistia o Nequinhas, que esses amigos são compadres, grandes comerciantes, sírios e libaneses, chefes de posto, administradores, governador, até um deputado e que seria do meu cinema – o cinco pesos e leva cadeira – sem o apoio deles? Era a pergunta com que sempre punha fim ao arrazoado da sua Julinha, farta de aturar gente que só dava trabalho. Já agora não se esqueça daqueles régulos que trouxe cá a casa, em 63, aquando da comemoração do dia da raça, acrescentava minuciosa, lembrando os “homens grandes” que arrebanhavam à força o grosso dos espectadores, que pateavam e ululavam quando o Nequinhas censurava os beijos dos actores tapando-os com a mão. (...)

(**) Último poste da série > 8 de abril de 2014 >Guiné 63/74 - P12949: Em busca de... (240): À procura dos Artilheiros de 1969 em Gadamael (Manuel Vaz)

4 comentários:

Cherno Balde disse...

O Manel Djoquim (Manuel Joaquim), o Homem do cinema ambulante:

“Nestas suas andanças lá ia com a sua velha Ford, gerador, projector, ecrã, filmes os mais inócuos possíveis (capa e espada, cowboys, musicais, comédias, dramas), os seus ajudantes nativos (...) o cinco pesos e leva cadeira...” e conhecido em toda a Guine e em todas as aldeias, naturalmente, pelas pessoas daquele tempo, isto e pessoas com idade igual ou superior a 50 anos.

Eu conheci o Sr. Manuel Joaquim desde os meus 8/9 anos de idade em Fajonquito. Ele vinha a nossa aldeia, pelo menos, uma vez, em cada 2/3 meses, no seu velho camiao carregado da sua maquina de sonhos para nos alegrar, e foi gracas a ele que fomos descobrindo grande parte da cultura ocidental estilizada em gestos ousados, olhares atrevidos, caricias publicas e mil pedacos de um universo que entrava pouco a pouco dentro da nossa forma de ser e estar na vida. Pessoalmente, para o resto da minha vida estaria marcado pela postura e coragem dos actores (Cowboys e Indios indomaveis) que, no fundo, era muito parecido com aquilo que nos tentavam inculcar nas nossas cerimonias iniciaticas designadas de Fanado tradicional.

Dele ainda recordo-me dos seus enormes calcoes, meias esticadas ate os tornozelos e chapeu de abas largas, tipo Chipaio. A certa altura, um dos seus ajudantes era Camoes (zarolho) e por isso acreditavamos que com esta limitacao visual podiamos sempre aproveitar para entrarmos sem que ele nos visse. Normalmente eramos apanhados e soltos de seguida dentro do recinto fechado para a projeccao do filme. Naquela idade nao precisavamos de cadeiras, e quando a projeccao se iniciava, pouco a pouco, enchiamos o recinto, acabando por nos sentarmos mesmo por baixo do pano das imagens, importante mesmo era entrar e assim poder participar, no dia seguinte, de mais um episodio marcante, uma historia de vida que so voltaria a acontecer passados 2 ou 3 meses.

Quem nao ficava contente com a chegada do "Manel Djoquim" eram as nossas pobres maes, pois sabiam que ele vinha, por certo, roubar, atraves dos seus filhos as pequenas economias conseguidas durante semanas ou meses com muito sour e canseira.

Um abraco amigo,

Cherno Balde

Unknown disse...

Caro Cherno Balde, obrigada pelo seu depoimento. Não sabia que lhe chamavam Manel Djoquim mas faz sentido. Gostei também da estória do Camões.Percebo a preocupação das mães das crianças mas várias testemunhas têm-me dito que as crianças até 10 anos não pagavam.
Lucinda Aranha

Anónimo disse...

O Carlos Geraldes já faleceu.

Antº Rosinha disse...

E com gente fomos "colonizando", o que poucos brancos e pretos "civilizados" jamais aceitarão, compreenderão e irão perdoar a colonização "tuga"

Pouca diferença há entre este colonialista/explorador, Serpa Pinto ou Silva Porto.