domingo, 22 de setembro de 2013

Guiné 63/74 - P12070: Estórias dos Fidalgos de Jol (Augusto S. Santos) (14): A minha passagem pelo Depósito Geral de Adidos, em Brá

1. Em mensagem do dia 19 de Setembro de 2012, o nosso camarada Augusto Silva Santos (ex-Fur Mil da CCAÇ 3306/BCAÇ 3833, Pelundo, Có e Jolmete, 1971/73), enviou-nos mais uma história dos Fidalgos de Jol.

Olá Camarada e Amigo Carlos Vinhal
Antes de mais, que esteja tudo bem contigo e família, são os meus sinceros votos.
Já há algum tempo (quase um ano) que não te "brindava" com mais uma das minhas estórias, pelo que resolvi, mais uma vez, vasculhar o meu baú e "sacar" algumas memórias da minha passagem por terras da Guiné. Além do mais, importa continuar a "alimentar" o nosso blogue... 
Nesta perspectiva, junto estou a enviar ficheiro que relata a minha passagem pelo Depósito de Adidos em Brá, após ter deixado de pertencer à CCAÇ 3306/BCAÇ 3833, mas que por uma questão cronológica gostaria que continuasses (caso aches oportuno) a incluir nas "Estórias dos Fidalgos do Jol" sob o título "A minha passagem pelo DA".
Deixo ao teu critério.
Junto seguem também ficheiros com algumas fotos que poderás publicar de acordo com as minhas sugestões, ou fazê-lo como melhor entenderes.
Muito obrigado pela tua disponibilidade em continuares ao "serviço" das nossas memórias.

Recebe um Grande e Forte Abraço
Augusto Silva Santos


ESTÓRIAS DOS FIDALGOS DE JOL

14 - A MINHA PASSAGEM PELO DA

Depois da partida do BCAÇ 3833 para a metrópole no navio Uíge, que ocorreu em Dezembro de 1972, fui colocado no Depósito Geral de Adidos em Brá. Naquele Batalhão pertenci à CCAÇ 3306 colocada Jolmete, para onde fui em rendição individual.


Crachá do Depósito de Adidos

No Depósito de Adidos, para além do serviço na Secção de Justiça como escrivão, tinha também periodicamente, para além dos serviços inerentes à Unidade, a missão de fazer Sargento de Dia à Casa de Reclusão Militar.
Lembro-me que no primeiro dia em que isso aconteceu, no Render da Guarda tinham desaparecido 12 reclusos, que entretanto ao longo da semana foram voltando. Na segunda vez desapareceram mais 5, que mais tarde também voltariam a aparecer.
Esta era uma situação comum com outros camaradas que faziam esse mesmo serviço, que igualmente se queixavam e viviam o problema.

Brá / Depósito de Adidos, Fev1973

Nunca ninguém (pelo menos no meu tempo) chegou a saber ao certo por onde os presos fugiam, só sei que eles saíam para ir ao Pilão a Bissau (às “meninas”) e deliciarem-se com alguns petiscos, e que mais tarde voltavam sempre (alguns obviamente eram apanhados pela PM). Tive alguns dissabores (ameaças de levar uma “porrada” se os reclusos não aparecessem), pelo que a partir de determinada altura e, por sugestão de outros camaradas mais antigos (inclusivé de um 1.º Sargento), combinei com um dos reclusos (o mais velho, um Fuzileiro com a alcunha de “Grelhas” e que se dizia havia tido um “confronto directo” com o Cor. Paraquedista Rafael Durão, tendo este como consequência, partido uma mão), para fazer uma “escala de saída”, com a condição de todos estarem presentes ao Render da Guarda.
Remédio santo, ou seja, nunca mais faltou nenhum recluso quando estava de serviço.
A esta distância parece caricato, mas o que é certo é que a “medida” funcionou (para mim e para os reclusos).



Brá / Casa de Reclusão Militar, Mar1973 – Em convívio com alguns reclusos por ocasião de um aniversário. O camarada ao fundo, de óculos e barba, é o Carlos Boto, já aqui referenciado por outros camaradas

O meu relacionamento com a maioria dos reclusos era regra geral muito cordial e sem grandes problemas. Alguns eram considerados como “perigosos” por terem cometido crimes com alguma gravidade no teatro de operações ou no interior das suas unidades, mas sinceramente nunca observei nada que me levasse a acreditar nessa perigosidade ou a ter receio fosse do que fosse.
Relembro que, na sua maioria, eram camaradas nossos, que pelos mais diversos motivos haviam caído nesta situação. De qualquer forma não deixavam de o ser (camaradas), pelo que assim sempre os considerei, embora com as limitações a que a situação obrigava.

Brá / Depósito de Adidos

Quando já me faltavam escassos 3 meses para acabar a comissão, por ter discordado de uma ordem mal dada por um oficial (o que viria a ser confirmado) e chegado a via de factos, fui castigado com 5 dias de detenção. Só não apanhei 5 dias de prisão porque tinha dois louvores e tive vários Furriéis e Sargentos que presenciaram os factos a testemunharem em meu favor.

Foi-me na altura dito pelo então Comandante do Depósito Geral de Adidos, um tal Major Francisco Ferreira, de alcunha “o Galo” por andar sempre todo emproado (usava um boné à Hitler), que eu tinha razão, mas que a democracia ainda não tinha chegado à tropa (sic), e que a ordem de um superior, mesmo mal dada, era para ser sempre cumprida.
Como consequência, fui ainda castigado com o ter de fazer a guarda de honra ao General Spínola, na sua última deslocação a este aquartelamento, o que para mim na altura até foi mesmo uma honra.

Brá Depósito de Adidos – No dia em que fiz a última Guarda de Honra ao General Spínola, antes do seu regresso a Portugal

Lembro-me que, nos finais de 1973, era já grande a tensão entre as NT, principalmente por acontecimentos como os de Guileje e Guidaje (entre outros), factos dos quais íamos tomando conhecimento por relatos dos de camaradas que pelo Depósito de Adidos iam passando.
O facto de o PAIGC possuir os mísseis terra-ar Strela, passou a ser um grande problema para a nossa força aérea. Também me recordo de Bissau começar então a ser cercada de arame farpado e da colocação de minas nalgumas zonas da sua periferia, e de nos ter sido comunicada a possibilidade de podermos vir a sofrer em qualquer altura um ataque por terra ou por ar, por também constar que o IN já possuía os famosos MIGs.

Isto passou-se perto do final de Dezembro de 1973, altura em que terminei a minha comissão e regressei a Portugal.
____________

Nota do editor

Último poste da série de 7 DE OUTUBRO DE 2012 > Guiné 63/74 - P10495: Estórias dos Fidalgos de Jol (Augusto S. Santos) (13): Aventura com final feliz: O Cabo 'Bigodes', o Dandi e a mulher mais velha do Dandi...

4 comentários:

Anónimo disse...

Joaquim L. Fernandes

Camarada Augusto Santos, cordial saudação

Na busca de refazer as minhas memórias da Guiné, após 40 anos de esquecimento voluntário, encontro-te neste poste com um percurso na Guiné,em que me aproximo, embora com um ano de atraso, mas que provavelmente nos interceptou. Também eu, vindo do Chão Manjaco, fui colocado no D.Adidos em Brá, na Secção de Justiça como Oficial de Justiça, em 15 de dezembro de 1973. Tinha dois companheiros; Um creio seres tu, embora não esteja seguro do nome, mas a memória visual leva-me a acreditar que sim. O outro companheiro era um Furriel que tinha sido "castigado" e despromovido para soldado pelo Gen. Spinola. O seu nome creio ser Castanheira.

Por favor confirma-me estes dados, pois poderei estar enganado, já que, pela data que anuncias do teu regresso em Dezembro de 1973, poderá ter sido outro camarada parecido contigo, mas que decerto seria teu conhecido.

Já agora, se souberes e quiseres fazer o favor, diz-me também como se chamava o 1º Sargento enfermeiro, Guineense, que aí prestava serviço e que eu considerava muito, como militar e homem, o que me levou ao longo dos anos a pensar, várias vezes, sobre o sue teria sido o seu destino. Há pouco tempo, neste Blogue, encontrei uma lista de Militares e Milicias fuzilados em 1976 pelo PAICG. A encabeçar a lista estava o nome de um 1º Sargento João Baptista. Seria este o seu nome?

Muito obrigado pela atenção e um abraço fraterno.
(ex. Alf. Mil. Fernandes)
J.L.F.

Anónimo disse...

De: Augusto Silva Santos
Para: Joaquim Luís Fernandes

Camarada e Amigo, é com muita satisfação que te respondo e te dirijo esta mensagem.

Pois, efectivamente o nosso percurso em terras da Guiné foi realmente algo idêntico, embora como tu dizes, com um ano de diferença.

Estando eu colocado durante todo o ano de 1973 na Secção de Justiça do Depósito de Adidos, regressei a Portugal em Dezembro desse ano, mais precisamente no dia 22, pelo que, a estarmos juntos, foi durante uma escassa semana.

Lembro-me que o Chefe da Secção de Justiça era, na minha altura, o Capitão SGE Almeida, sendo o outro Oficial de Justiça o Alf. Mil. Com. Machado (que deves ter ido substituir), sendo eu mais o Fur. Mil. Fernandes, os Escrivães. Deves ter tido muitas oportunidades de ver autos elaborados por mim (tinha uma letra muito certinha) :)

Provavelmente o Fur. Mil. a que te referes, de seu nome Castanheira, de quem me lembro perfeitamente por estar recluso na Casa de Reclusão Militar e com quem eu me dava muito bem, ter-me-à ido substituir.

Com toda a sinceridade te digo que não me lembro de ti, pois como já referi anteriormente, só estivemos juntos uma semana, semana essa que foi para mim muito complicada, pois estava a ver que já não iria regressar nesse ano a Lisboa. Tal só aconteceu por diligências do Cap. Almeida e do 1º Sarg. Saúde que me conseguiram colocar na lista de embarque do último voo desse ano para a metrópole. Mesmo assim estive condicionado até ao último momento, pois poderiam haver evacuações que, logicamente, tinham prioridade de embarque. Felizmente tal não aconteceu e ainda consegui vir passar esse natal a casa.

O 1º Sarg. Enf. de origem guineense, era de facto o João Baptista, de quem me lembro perfeitamente e com quem também tinha um óptimo relacionamento. Infelizmente não tenho muitas dúvidas que tenha sido esse o seu fim.

Foi um prazer trocar estas recordações contigo.
Recebe um grande e forte abraço.

Anónimo disse...

De: Joaquim L. Fernandes
Para: Augusto Silva Santos

Caro Camarada Augusto Santos

Muito obrigado pela tua resposta pronta e esclarecedora. O Camarada que admiti seres tu, era com certeza o Fur. Mil. Fernandes, meu homónimo, que se a memória me não atraiçoa, tinha algumas parecenças fisionómicas contigo: usava bigode, cabelo escuro e liso e era bem encorpado.

Em postes teus publicados anteriormente e que visitei há umas semanas atrás, quando te vi nas fotografias postadas, ocorreu-me se não serias o tal camarada da Secção de Justiça dos Adidos, já que via alguns traços semelhantes. Neste poste,quase confirmavas a minha dúvida, mas não eras tu e está tudo esclarecido. A minha memória é que já não é o que era e requer estas ajudas.

Mais uma vez os meus agradecimentos.

Com um fraterno abraço me despeço até uma próxima.
J.L.F.

Anónimo disse...

AUGUSTO bom dia acabei de ler este teu comentario sobre a casa militar e eu ja contei mais o menos a mesma historia quando fui ferido estive em bissau nos adidos e entao como sabes tinhamos que fazer patrulhamentos em volta da cidade e tinhamos um giro onde um tinha a casa e o cabo apresentava-se ao sargento e tinha que contar os detidos uma das veses o sargento disse podes ir embora que esta tudo certo estava la um amigo que tinha conhecido nos adidos e mais tarde saiu e me contou essa historia eu nao contei ninguem um abraço ANTONIO FANECO 1CABO