domingo, 16 de junho de 2013

Guiné 63/74 - P11716: Os melhores 40 meses da minha vida (Veríssimo Ferreira) (38): 39.º episódio: Memórias avulsas (20): Tavira - O antes da guerra

Ponte em Tavira


1. O nosso camarada Veríssimo Ferreira (ex-Fur Mil, CCAÇ 1422 / BCAÇ 1858, Farim, Mansabá, K3, 1965/67), em mensagem do dia 1 de Junho de 2013, enviou-nos mais uma história ocorrida durante "Os melhores 40 meses da sua vida", na bela algarvia Tavira.


OS MELHORES 40 MESES DA MINHA VIDA

GUINÉ 65-67 - MEMÓRIAS AVULSAS

20 - O ANTES DA GUERRA - TAVIRA

Contrariado parti, primeiro no comboio de Mora para Évora e daí em diante nem sei como, mas que cheguei... cheguei.

A janela gradeada por fora, onde estava a cama que me destinaram, ainda lá está, que há pouco a voltei a acariciar, em visita de saudade serôdia, que bastas vezes faço, bem como a "porta do cavalo" (assim chamada provavelmente porque era por ali que me desenfiava) e onde hoje ainda, costumo estacionar o meu bólide enquanto vou aos comes.

Por aí saía, pela manhã e para a ginástica matinal a praticar logo ali atrás do quartel e também para as visitas bi-semanais, às salinas que ainda ali estão, só que agora sem recrutas e onde (nesse tempo, Julho-Agosto de 1964), de botas engraxadas, fato lavado e passado a ferro, tive de afocinhar voluntariamente obrigado, naquelas empestadas águas, cheias de enguias.

A suite para 150, era razoável, melhor que a de Mafra, a comida... comia-se... o vinho Lagoa era bestial com os seus 14 graus.

Tavira não era grande, os Algarvios... avarentos de verdade e de tal maneira, que eu e habituado como era, por educação, mesmo saudando-os de borla, quer com os bons-dias quer com os olás nem sequer troco alguma vez recebi.

Uma vez por semana a visita guiada era para a carreira de tiro e isso significava descanso à sombra das alfarrobeiras, pois que só alternadamente íamos disparando lá para baixo onde estavam os alvos.

O melhor de tudo era a hora de almoço, ali mesmo confeccionado nas cozinhas de campanha com tampas abertas a fim de permitir a entrada do pó, que bom sabor a barro dava.

As noites eram porreiras, pois que me permitiram, após a primeira semana, que dormisse no exterior, em casa alugada e com mais dois amigos, além do outro lado do rio. Tal significava que jantava bem e regava melhor. A coisa nem dispendiosa ficava, papando ali nas variagadas tascas à beira do Gilão.
Lembro-me que bebendo um tinto ofereciam três carapaus fritos presos pela cabeça, com um palito.

Outras vezes e dando um salto à praia, trazíamos (éramos três) quilos de conquilhas, mas das grandes, e que depois mandávamos cozinhar e faziam-no de tomatada. Depois era só migar, qual açorda, pão lá p'ra dentro da molhança.

Graças à preciosa indicação do Senhor Aspirante Comandante do Pelotão, que me apresentou ao pai, pescador com barco, este protegeu-me e apresentou-me aos comerciantes de vinhos e seus derivados ali do burgo e tal contribuiu muito para que a minha popularidade enóloga, fosse apreciada e passei a ser convidado para acontecimentos inerentes a provas.

Também colaborei por duas vezes na pesca do atum e só vos digo, que foi das experiências mais valiosas e de que ainda guardo imagens maravilhosas.

E quando se tem sorte, tem-se e mai'nada... até os fins de semana ia passar com a família, pois que um dos camarigos do pelotão, sendo de Évora trazia-me até aí e também juntos, daí regressávamos.

Vínhamos no seu Mini, demoravam-se horas, mas habitualmente às 10 da noite estávamos lá. Depois faltando-me ainda 70 Km até casa recorria a boleias mas o mais tardar ao sábado de madrugada chegava cansado mas feliz.

O trajecto inverso começava ao Domingo depois das migas e levava já comigo a roupa lavada e encerada, um os dois "xóriços", um bocado de paio... ou de morcela da grossa, alguma fruta, alguns escuditos no bolso.

Assim se passaram dois meses após o que regressei com as divisas no local próprio.

O tempo passara rápido e vinha muito, mas muito mais culto qu'até já sabia "trabalhar" c'as Dreyse... FBP... Uzi... Walter... Parabellum e melhor ainda... a medida dos supositórios que usavam, ou seja 7,92 e 9mm.

(continua)
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Nota do editor:

Último poste da série de 3 DE JUNHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11669: Os melhores 40 meses da minha vida (Veríssimo Ferreira) (37): 38.º episódio: Memórias avulsas (19): Mafra, Junho de 1964

6 comentários:

José Augusto Miranda Ribeiro disse...

Gostei de ler esta narrativa que me fez lembrar, dois anos antes, aquela linda cidade de Tavira, que não me deixou saudades.Parabéns por esta intervenção. JRibeiro. José Augusto Miranda Ribeiro

Tony Borie disse...

Olá Veríssimo.
Estas lembranças são qualquer coisa, eu não sei explicar bem, mas falam de quando éramos jovens, mesmo muito jovens, e depois tudo era bom, por exemplo aquela frase que diz "lembro-me que bebendo um copo de tinto, ofereciam três carapaus fritos, presos pela cabeça com um palito"!.
Eu acabo de chegar do sul, ainda mais do sul de onde me encontro, pois fui visitar uns amigos a Key West, que fica lá no fim da Florida, de onde dizem que com o tempo claro se vê a ilha de Cuba, eu fartei-me de ver, ainda com a ajuda de uns potentes binóculos, e não vi nada, esses amigos tinham comida da mais variada, com peixe fresco, tudo pescado umas horas antes, mas apesar da boa vontade e da simpatia com que nos receberam, creio que esses carapaus fritos, que tu explicas, regados com o tal copo de tinto, deveriam ser muito mais saborosos!.
Um abraço, Tony Borie.

Tony Borie disse...

Olá Veríssimo.
Estas lembranças são qualquer coisa, eu não sei explicar bem, mas falam de quando éramos jovens, mesmo muito jovens, e depois tudo era bom, por exemplo aquela frase que diz "lembro-me que bebendo um copo de tinto, ofereciam três carapaus fritos, presos pela cabeça com um palito"!.
Eu acabo de chegar do sul, ainda mais do sul de onde me encontro, pois fui visitar uns amigos a Key West, que fica lá no fim da Florida, de onde dizem que com o tempo claro se vê a ilha de Cuba, eu fartei-me de ver, ainda com a ajuda de uns potentes binóculos, e não vi nada, esses amigos tinham comida da mais variada, com peixe fresco, tudo pescado umas horas antes, mas apesar da boa vontade e da simpatia com que nos receberam, creio que esses carapaus fritos, que tu explicas, regados com o tal copo de tinto, deveriam ser muito mais saborosos!.
Um abraço, Tony Borie.

Alfredo Miranda disse...

Amigo Veríssimo gostei de ler mas o amigo Furriel quanto as armas nao falou aí numa que nos soldados demos uma arma pequenita chamada (Manelica)sera que se esqueceu ou não deu porque em Maio de &8 na Gaca3 demos todas essas armas quanto aos carapaus não me ademira pois só penssas em comer e nesse tempo era uma fominha do caraças era fritos ou cosidos com palitos ou sem palitos morria tudo como se diz aqui no Poorto um grande abraço para o meu amigo Veríssimo e contiua assim porque é bom ferte com essa inteligençia e saúde fica bem abraços

armando pires disse...

Ó Camarada Veríssimo.
Então tu também estiveste em Tavira?
Ou melhor, que a antiguidade continua a ser um posto, eu também estive em Tavira.
Mas só lá estive duas semanas.
Depois, em privado, hei-de contar-te como e porque me pirei de lá.
armando pires

Bispo1419 disse...

Obrigado, Veríssimo, por estas tuas memórias de Tavira. Tanta coisa em comum na nossa vivência em tal sítio!
Interessante, trocámos os turnos. Enquanto estiveste em Mafra, estava eu em Tavira e vice-versa. Cruzámo-nos pelo caminho,no final de Junho de 1964, eu em direção a Mafra e tu a Tavira.
Para o meu gosto, tive mais sorte do que tu porque gosto do Algarve no inverno e na primavera, muito mais do que no verão. Então a luz de Maio "esmaga-me"!
Aguçaste-me o apetite, talvez venha a escrever aqui no blogue alguma coisa sobre os meus cinco meses de recruta no CISMI.
Um grande abraço
Manuel Joaquim