quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10988: Diário de Iemberém (Anabela Pires, voluntária, projeto do Ecoturismo, Cantanhez, jan-mar 2012) (2): A adaptação

1. Continuação da publicação do Diário de Iemberém, da nossa grã-tabanqueira Anabela Pires, técnica superior de serviço social no Ministério da Agricultura, nascida em Moçambique, reformada, amiga dos nossos  grã-tabanqueiros JERO e Alice Carneiro... Esteve na Guiné-Bissau cerca de três meses (, de meados de janeiro a meados de abril de 2012), a trabalhar como voluntária no projeto do Ecoturismo, da AD - Acção para o Desenvolvimento, em Iemberém, Região de Tombali, Parque Nacional do Cantanhez. Chegou em Iemberém, do dia 17/1/2012. E fiquei hospedada nas instalações locais da AD, a ONGD que é dirigida pelo nosso amigo Pepito (*)


2. Diário de Iemberém, por Anabela Pires [, que escreve de acordo com a antiga ortografia]  > Parte II

 20 de Janeiro de 2012 [A adaptação]
São quase 10 horas da noite. Estou constipada. As noites e manhãs têm estado frescas, eu não trouxe um pijama de meia estação e só agora desencantei o meu xaile indiano que estava na mala que ainda não tive tempo de desmanchar. Os dias têm sido bem ocupados!

Hoje é sexta-feira, feriado na Guiné, e vêm 9 pessoas passar o fim-de-semana prolongado aqui aos bungalows. Estive até há pouco à espera deles com a Maria Pónu e a Satu mas, como se atrasaram, e me sinto adoentada, vim para casa.

A vinda destes clientes ocupou-me o dia de ontem e de hoje a acompanhar/ensinar a Mariama e a Maria Pónu a preparar os 3 bungalows que têm no conjunto 10 camas. Creio que ficaram acolhedores, com as condições existentes neste momento. Pela primeira vez colocaram uma jarra com flores em cada bungalow. As jarras foram feitas de garrafas de água de litro e meio (de plástico)! Não havia outras e aqui na tabanca também não as há à venda.

Muito há a melhorar mas a Mariama, que limpa estes alojamentos e faz as camas, pareceu-me com boa capacidade de aprendizagem e sensibilidade para este tipo de trabalho. As suas mãos alisavam os lençóis com delicadeza. Pela primeira vez limpou o chão com uma esfregona (costumam limpá-lo com um trapo molhado) e gostou. Disse-me que faz menos dores nas costas, que é mais fácil. Ainda não se atreve a falar português mas creio que compreende a maior parte do que digo.

À tarde estive com a Satu a fazer as Laranjas da Rosinda mas sem licor de whisky. Para além daqui não existir tal coisa, a Satu é muçulmana e como tal não poderia provar as laranjas se elas levassem álcool. A ideia é apresentar as laranjas de outra maneira que não seja ao natural, para variar.

A Satu cozinha muito bem mas carrega no sal! Hoje comi uns peixinhos fritos com um molho e batatas-doces fritas. Estava uma delícia, o almoço! Se não tiver cuidado, penso que em vez de emagrecer vou engordar! Ontem trabalhei com ela as ementas para este fim-de-semana. A maior dificuldade são os legumes que não existem por aqui. Com tantos afazeres acabei por não enviar uma SMS de parabéns à Fátima Real e ao Vasquinho do Celso. Não me esqueci dos aniversários mas aquilo que não fiz logo de manhã acabou por me passar!

E agora vou-me deitar pois de manhã terei de fazer, com a Satu, uma tarte de coco e banana, receita da Odile, para o almoço. Espero que não saia asneira pois nunca a fiz, não tenho balança e o coco em vez de seco é fresco! Bem, falta dizer que a Satu é a senhora que explora o restaurante que a AD construiu e que serve os turistas que cá vêm. Ah, e é minha vizinha, casada com o técnico agrícola da AD, o Abubacar Serra, responsável pelo sector de Bedanda. São aqui o meu “porto de abrigo”.

21 de Janeiro de 2012  [Os bangalós] 


[Foto à direita, créditos fotográficos: AD - Acção para o Desenvolvimento, 2008. Vd. aqui precário]

Levantei-me antes das 7 horas mas só agora, às 8 horas, começo a ver alguma coisa dentro de casa. É das coisas que mais me está a custar – a falta de luminosidade dentro das casas mesmo quando lá fora já é ou ainda é dia. Contribui para isto o facto de aqui existirem muitas árvores, enormes, entre as quais mangueiras, que fazem muitas sombras. É uma grande vantagem quando ando na rua mas dentro de casa há pouca luz. Sempre tive dificuldade em trabalhar com pouca luz e aqui tenho de lidar com isso. Ainda ontem, quando fomos limpar os bungalows quase não se via nada lá dentro. Têm umas janelinhas pequenas, para protecção do calor, mas dificilmente se vê o que está sujo. Assim é difícil fazer uma boa limpeza. Temos de pensar numa solução para isto.

Bem, tenho de me ir vestir mas queria registar que a esta hora oiço todos os dias o som do varrer dos meninos do Abubacar. Varrem as folhas que caem todos os dias em abundância no terreiro em frente às nossas casas. Estamos no Inverno, apesar de durante o dia eu transpirar. As vassouras são de pauzinhos e ainda assim, até agora, não consegui comprar uma e outra não tenho. Varrem curvados. Ainda terei de apurar se sofrem da coluna mais ou menos do que nós.

22 de Janeiro de 2012 [ Aqui há pão fresco]

[Foto à esquerda: meninos de Iemberém, 9 de dezembro de 2009; créditos fotográficos, João Graça, 2013]

Ontem à noite já não estranhei o restolhar que ouvia lá fora logo depois de apagar a luz. Há dias atrás, ouvi restolhar tanto lá fora a partir da meia-noite! Não imaginando o que pudesse ser, pensei que talvez andassem javalis por aqui à procura de comida.

De manhã levantei-me e vi o meu vizinho padeiro a trabalhar no forno do pão. Pensei que ele estava a começar o trabalho mas de repente vi que o pão já estava cozido! Então percebi que o barulho que tinha ouvido durante a noite era ele a varrer o forno do pão! Ri-me sozinha da minha ignorância e imaginação.

O meu vizinho padeiro começa a fazer pão à meia-noite e pela manhã, quando me levanto, vou à varanda buscar pão fresquinho. Só é pena ele não trabalhar todos os dias mas aqui os padeiros são amigos e têm estabelecida, entre si, uma rotação de produção. Ainda não sei quantos padeiros existem em Iemberém mas produzem rotativamente. Hoje comi pão acabadinho de fazer mas recebi visitas e logo de manhã o pão acabou. Por sorte o negócio correu bem ao meu vizinho e ele já está a fazer outra fornada, sem ainda ter dormido. Os pães são do tipo cacete e as pessoas andam com eles nas mãos como em França.


 [A visita da Cadi]

Falando nas visitas ….. a Cadi, mãe da Alicinha , foto à esquerda, maio de 2010,] , afilhada da Alice Carneiro, veio visitar-me. É tão bonita e elegante a Cadi! Como aliás muitas das mulheres guineenses. E que bem que se vestem, muitas vezes até quando andam a trabalhar mas sobretudo quando saem da sua tabanca e em dias de festa.

A Cadi já fala razoavelmente português. O seu marido [, António Baldé, fula de Contuboel, com casa em Caboxanque, futuro apicultor,]  está em Lisboa e há 2 anos que não vem cá. Ela mora em Farim de Cantanhez, uma tabanca que fica aqui a uns 10 km. É uma pena ela não viver em Iemberém, poderia ajudá-la a preparar-se para ir para Portugal ter com o seu marido. Mas o mais preocupante é que ela anda doente. Diz-me que sente calor na barriga, diz-me que é do estômago, que tem a tensão baixa mas …. não vomita, quis comer pão com queijo. Depois ouvi-a tossir e fiquei a pensar se não será algum problema pulmonar. Ela veio hoje a Iemberém, a pé, para tentar arranjar transporte para ir a Bissau ao médico.

(Continua)

[Legendas, subtítulos ou notas dentro de parênteses retos, a par das fotos, são da responsabilidade do editor]
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Nota do editor:

Último poste da série > 21 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10978: Diário de Iemberém (Anabela Pires, voluntária, projeto do Ecoturismo, Cantanhez, jan-mar 2012) (1): A chegada


2 comentários:

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