domingo, 4 de novembro de 2012

Guiné 63/74 - P10617: Histórias e memórias de Belmiro Tavares (28): Colégio de Oliveira de Azeméis (1) Parte I

1. Em mensagem do dia 31 de Outubro de 2012, o nosso camarada Belmiro Tavares (ex-Alf Mil, CCAÇ 675, Quinhamel, Binta e Farim, 1964/66), enviou-nos mais uma das suas histórias e memórias:


Colégio de Oliveira de Azeméis C.O.A.

Parte I 

O colégio de Oliveira de Azeméis, antiga Casa Escola, foi fundado em 1932, pela primeira e única Diretora, Srª Dª. Maria Adília Algria Martins; ela exerceu aquele cargo até 1972, durante precisamente 40 anos. Nesta data, as instalações do vetusto colégio passaram a funcionar como uma extensão do Liceu Nacional de Aveiro, que nos anos 50 substituíra o antigo Liceu José Estêvão, nome de um tribuno afamado, mediante pagamento de volumosa renda-tinha de ser.

O seu crescimento foi lento mas alicerçado, durante vários anos, até que Dª Maria Adília casou com um seu ex-aluno - Sr. António Almeida – que veio dar nova vida, outra dinâmica àquela, já célebre escola. O Sr. António Almeida - ou Sr. Diretor – como lhe chamávamos, porque era marido da srª Diretora-fez aquela escola crescer imenso, diria até quase desmesuradamente, muito em especial a partir do início dos anos cinquenta.

Havia alunos de todos os quadrantes: Guiné, Angola, Trás-os-Montes para citar apenas os de mais long;os distrititos do Porto e Viseu também estavam representados. De várias origens, o sr. Almeida colhia informações sobre hipotéticos candidatos que se preparavam para iniciar os estudos secundários principalmente no interior-centro do país. Ele logo partia ao encontro dos pais destes jovens para os convencer a enviar os filhos para o seu colégio; com frequência levava a água ao seu moinho. Recordo o meu caso. Fiz a 4ª classe; meu pai, confiado nuns cobres acumulados, durante anos, no canto do baú, decidiu pôr-me aos estudos. Voltei no ano seguinte à escola lá da terra ( ficáva a mais dedois km de casa, trilhando caminhos de cabras), onde uma professora bairradina (natural de uma aldeia chamada Fogueira), boa mestra, excelente educadora e soberba condutora de crianças, assumiu levar-me ao exame de admissão ao Liceu. Fiz também exame de admissão à Escola Comercial; se falhasse num tinha outra saída.

Em meados de Janeiro daquele ano lectivo, o director do colégio de Albergaria-a-Velha, acompanhado por um professor apareceu lá em casa a fim de convencer o meu pai a enviar-me para a sua escola. O meu progenitor logo alegou que não tomava naquela hora qualquer decisão; teria de conversar de novo com a professora. Em desespero de causa o professor mandou-me conjugar o presente do indicativo do verbo” remir”; eu não sabia! O professor comentou:- está a ver?! O seu filho está atrasado em relação aos nossos alunos! Meu pai manteve a sua posição.

Obs.: mais à frente falaremos de novo daquele verbo “remir.”

No dia seguinte, meu pai deslocou-se à casa onde a professora residia a fim de colocar os pontos nos “ii”; depois de algumas perguntas e respostas, avanços e recuos ela concluiu: - Já levei vários alunos ao exame de admissão e nenhum reprovou; não posso garantir que o seu filho “vai passar” mas eles também não podem dar essa certeza; a decisão é sua!

De seguida contei-lhe a estória do verbo que eu não soube conjugar; ela comentou que “ainda” não é tarde para aprenderes a conjugar aquele verbo: “ foi uma brincadeira de gosto duvidosos da parte deles! Referiu a professora.
Logo ali meu pai decidiu que eu continuaria ás suas ordens até ao exame final. Como se depreende, naqueles tempos, a luta para conseguir mais alunos era (tinha de ser) dura, persistente e até, por vezes, feroz.

Mais tarde, já depois de ter feito exame de admissão, passei férias em Espinho e, não sei como, fui ali matriculado, no Colégio S. Luis.

Volvido um mês ou perto disso, o director do colégio de Oliveira de Azeméis apareceu em minha casa, já noite escura; vinha acompanhado dum médico (estomatologista) que era um grande amigo do meu pai. Ele foi a arma decisiva. Depois de argumentos vários, o Sr. Almeida assumiu que tratava da anulação da minha matrícula em Espinho e em Outubro seguinte cruzei pela primeira vez o portão “monumental” (o portão de hoje ainda é o mesmo… mas com mais 60 anos )– nunca me arrependi.

Nos tempos que correm, os jovens alunos não sabem, nem sequer imaginam ou sonham como era o dia a dia dum estudante interno metido entre as quatro robustas paredes austeras dum qualquer internato.

Havia escolas cujos alunos eram todos externos: permaneciam intra-muros durante as aulas e também nas horas de estudo mas tomavam as refeições e pernoitavam em casa;. não sofriam com o isolamento forçado em relação à família.

Os alunos internos viviam em autêntica clausura; saíamos do colégio ao sábado depois das 17 horas, quando não eramos obrigados a permanecer na escola durante o fim de semana devido a castigo por más notas ou por atos de indisciplina.Mais tarde saíamos a partir das 13:00 horas. Na 2ª feira de manhã estávamos de volta para mais uma semana fora do conforto do lar; melhor ou pior era sempre diferente; era o nosso lar!

Todos os internatos tinham determinados defeitos mais ou menos comuns a todos, mas também tinham algumas virtudes… uns mais que outros.A maior mazela era “arrancar” crianças, a partir dos nove/dez anos aos afectos da família, “enclausurando-as”, autenticamente entre severas paredes.

Vivi cerca de oito anos lectivos como aluno interno no C.O.A.; ainda recordo com saudade e carinho – apesar de tudo – o tempo e o ambiente daquela casa ,os bons e maus momentos (muitos assim assim); com certeza foram mais aqueles do que estes, até porque eu sempre procuro enviar para as calendas o lado mau da vida ou, no mínimo, não lhe dar relevância, guardando no “disco rígido” da minha cabeça, apenas (ou quase) a parte boa das coisas por que passei.

In illo tempore – no tempo em que frequentei aquele colégio – o internato era uma inevitabilidade; refiro-me aos anos 50 do século passado, época em que muitos jovens do interior, ainda não despovoado, não poderiam estudar se não houvesse internatos.

Havia liceus nas capitais de distrito; os colégios surgiam apenas nas cidades ou em vilas de maior dimensão: na capital do meu concelho não havia ensino para além da primária; surgiu ali um colégio nos fins dos anos 50 ou nos primeiros anos da década seguinte

No meu caso (e no de tantos outros), quando podia ir a casa ao fim de semana, faltava às duas primeiras aulas de 2ª feira; na melhor das hipóteses eram só duas. Saía de casa pelas 7 horas da manhã e chegava ao colégio pelas 11, se tudo corresse bem.A meio do percurso mudava de autocarro. Se houvesse lugares vagos no onibus que vinha de Coimbra, tudo bem; se não houvesse vagas naquele autocarro, chegaria ainda mais tarde, perdendo todas as aulas da manhã.

O dia a dia de um aluno interno era terrivelmente duro! Havia quem chorasse copiosamente! Tal era a bomba! Para os semi internos a pílula não amargaria tanto – iam dormir a casa diáriamente

Dura lex sed lex! A disciplina é dura… mas é disciplina! – e se ela era rígida, inflexível, naquela casa! Não fora a imaginação e a ousadia da rapaziada para tentar adoçar a pílula (algumas vezes conseguia-se; outras vezes as contas saiam furadas, e sofríamos as consequências) e a nossa vida seria ainda mais atroz, quase insuportável

O aluno nunca era expulso da aula; este tipo de castigo não estava previsto. Havia castigo corporal! Naquele tempo, já era proibido por Lei… mas era prática mais ou menos corrente – mais corrente que menos. Regra geral, não podíamos fazer queixa aos nossos pais, porque, na maioria dos casos… levávamos a dobrar.

Nenhum pai (quase) ousava discutir esse assunto com a Direcção; intransigentemente o sr. Almeida alegava que “era para o bem do aluno” e tinha em conta, também os encargos monetários dos pais. “Naquele tempo o dinheiro era muito caro! Rareava quase em absluto!

Os internos podiam ser impedidos (e eram-no com frequência) de ir passar o fim de semana com os pais, acontecia sempre que havia más notas ou eram indisciplinados. Para o colégio seria até um prejuízo material mas, felizmente, a direção (os proprietários da escola) preferiam que os alunos tivessem boas notas e fossem bem comportados, perdendo eles alguns escudos referentes à sua alimentação dos alunos castigados durante o fim de semana.

A nossa tarefa iniciava-se, diariamente, às 6:30 horas da manhã (excepto ao domingo); às 7:00 horas, entrávamos no salão de estudo e ali permanecíamos até às 8:45, tempo para o pequeno almoço. As aulas iniciavam-se às 9:00. Depois do almoço havia um intervalo (cerca de uma hora) para dar uns pontapés na bola ou ver jogar. O período das aulas terminava às 19 horas; depois do jantar havia um intervalo até às 20:30 horas; seguia-se nova sessão de estudo para, sob vigilância do prefeito, preparar as aulas do dia seguinte; às 22 horas íamos dormir num edifício mais recente, voltado para a avenida principal; era no rés do chão deste edifício que tomávamos as refeições – no rés-do-chão. Em véspera de prova (ponto) era permitido estudar até mais tarde. Por vezes enquanto a maioria dos alunos dormia, sem a presença do prefeito, uns estudavam , outros aproveitavam a hora de pretenso estudo para surripiar umas laranjas do quintal da Direcção ou fazer uma incursão na adega (por baixo do salão de estudo) donde se retirava uns pedaços de carne de porco salgada e até umas garrafas de vinho; tudo bem regado! No edifício mais antigo, voltado para o recreio havia uma porta diferente, algo estranha, que dava acesso a uma garrafeira que também chegou a ser visitada por alunos.

Com os restos da comida, a direcção, mandava alimentar uns suínos, cuja carne era depois servida aos alunos; assim tínhamos oportunidade de compreender, na prática, que Lavoisier tinha razão!

No nosso “horário” não havia “furos”; estes eram ali substituídos pela palavra “estudo”; ou seja, entravamos num salão enorme onde passávamos 50 minutos a estudar… no mínimo éramos obrigados a olhar para o livro… e, em silêncio absoluto – ouvia-se nitidamente a mosca que ousasse penetrar aquele espaço – íamos preparando as aulas que se seguiam.

Se um professor faltava – acontecia apenas quando o rei fazia anos (ao contrário dos tempos de hoje) os alunos não entravam na sala de aula, ou abandonavam-na de seguida e dirigiam-se ao salão de estudo.

Uma característica terrivelmente sádica era a “segregação” total por sexos; rapazes e raparigas só podiam ver-se (apenas ver) nas aulas. Conversar com uma moça era um risco extremamente grave que ninguém de bom senso ousava correr sem tomar avultadas cautelas e mesmo assim… a segurança era quase sempre diminuta. O perigo rondávanos!

A menina Dina, pessoa de absoluta confiança da diretora, tinha um excelente jogo de cintura para agradar a gregos e a troianos (alunos e diretores); era uma solteirona “de pai e mãe” seca de carne, elegante, sem nada dever à beleza, afável, delicada e sempre bem disposta, era empregada da secretaria e dava umas arrojadas badaladas na sineta; logo os rapazes corriam para as suas salas de aula; só quando já não havia rapazes nos corredores, as meninas podiam avançar para as respectivas salas; no fim da aula os rapazes só podiam ir para o recreio quando os corredores estivessem totalmente vazios (sem as “pequenas”).

Constava (no mínimo era… parcialmente verdade) que a directora mantinha, “impunha” esta austera, quase ignóbil, separação por sexos, porque ela, sendo já dirigente, casou com um ex-aluno, cerca de década e meia mais novo que ela. Dizia-se até que ela casara com um aluno…, mas na verdade, casou com um ex-aluno. Durante o fim de semana o horário continuava rígido, especialmente para os alunos castigados; para os outros havia um pouco mais de abertura.

Sábado à noite, depois do recreio que se seguia ao jantar, mantinha-se o estudo obrigatório durante hora e meia; ao domingo a “alvorada” era às 8 horas; depois do café da manhã, dirigíamo-nos à Igreja Matriz onde assistíamos à missa das 9 horas; de seguida passávamos cerca de meia hora a dar voltinhas ao jardim da vila (hoje cidade); era o nosso “picadeiro”. Mas constava, entre os rapazes, que apenas as moças davam a volta completa ao jardim… circundando a estatueta ao fundo… para dar uma olhada à pilinha do menino – esta estatueta, em bronze, foi recentemente roubada; assim já não há motivo – se é que havia! - para dar a volta completa . Seguia-se nova sessão de estudo durante 90 minutos, cerca das 10:30 às 12, continuando a ser obrigatório olhar para o livro, no mínimo.

Depois do almoço, se o tempo estivesse chuvoso, podíamos ir ao cinema; Se o sol brilhasse, o leque de divertimentos alargava-se de acordo com os gostos individuais: uns iam ao cinema, outros iam ver a Oliveirense jogar, outros escolhiam dar umas voltas no parque de La Salette, outros ainda decidiam fazer uma visita, a pé e “não guiada”, ás aldeias vizinhas; um último grupo dos não castigados ficava intra-muros a dar uns furiosos pontapés de má qualidade numa infeliz bola de borracha – muda aos cinco e acaba aos dez. Os que passavam o fim de semana no colégio, por castigo, não podiam sair à rua no domingo à tarde; passavam grande parte do tempo no salão de estudo; com frequência a directora aproveitava para dar umas aulas da sua especialidade. E assim se passava um domingo… em beleza.

No dia 18 de Março havia confissões gerais (mais ou menos obrigatórias) para os alunos do colégio; no dia 19, dia de S. José, comungávamos e cantávamos na missa especial celebrada em honra do santo na Igreja Matriz. Nesse dia havia “rancho” melhorado.

Alimentação

Os alimentos eram mais ou menos bons e bem confecionados (dependia do clima) e em boa quantidade. Às duas refeições principais, havia dois pratos – caso raro ou único em internatos – exceto no dia em que o almoço constava de bacalhau cozido com todos (apenas couves e batatas) e ao jantar de domingo em que, para aligeirar a carga horária do pessoal da cozinha, comíamos massa de meada cozida ou (guisada), com alguma carne, normalmente bofes.

O segundo prato era invariávelmente arroz; constava ( até seria verdade) que este cereal era fornecido pelo pai do Sr. Diretor, marido da diretora; Ele era proprietário de um ou mais moinhos de tracção por água para descascar arroz e moer outros cereais, em Santiago de Riba Ul.

Naqueles tempos, como o dinheiro não abundava; os pequenos agricultores pagavam o descasque (acontecia o mesmo com a moedura do milho e/ou centeio) em espécie – entregavam ao moleiro uma determinada percentagem do cereal trabalhado (moído ou descascado). Eis o motivo (dizia-se) por que éramos “obrigados” a comer arroz duas vezes por dia. Não consta, porém, que um qualquer aluno tenha ficado com os “olhos em bico” (olhos de chinês) por causa disso. A directora impunha, (quase só aos mais novos) que “todos” os alunos, por uma questão de boa educação, deviam comer (eram obrigados a) tanto do 1º prato como do segundo. Nós entendíamos que ela pretendia apenas ajudar o sogro… a esgotar o arroz das maquias (trabalho pago em espécie).

Certo domingo, no meu primeiro ano, uns 15/20 alunos ficaram no colégio; ao almoço sentámo-nos todos à volta de uma mesma mesa grande. A refeição era salada russa… seguida de arroz… como tinha de ser. Cada aluno encheu completamente o seu prato; eu era talvez o mais novo… mas sendo um “bom garfo” também atestei o meu. Logo a diretora me avisou que eu, (apenas eu) porque era o mais puto, tinha de comer igual quantidade do segundo prato. Frequentemente ela sentenciava o mesmo a qualquer miúdo mas, por vezes, esquecia-se. Daquela vez tal não aconteceu. Apercebendo-se que eu tinha comido a salada russa, pegou no meu prato, colocou-o sobre um aparador e encheu-o de arroz, recolocando-o à minha frente. Fiquei abismado! Os meus amigos, ao verem a minha cara de quase pânico, logo me ofereceram papéis de jornal e envelopes usados para neles embrulhar o arroz exedente e levá-lo para o exterior do refeitório, para ser colocado no lixo.

A diretora, porém, ao contrário do que habitualmente acontecia, estava atenta; colocou-se estrategicamente nas imediações, e olhava-me pelo canto do olho. Enfardei aquela montanha enorme de cereal. De seguida, levantei-me e transmiti-lhe (respeitosamente ) que queria mais um pouco de arroz. Ela assustou-se! Mas ordenou que colocassem outra travessa na mesa; eu retirei dela apenas meia colher de “alpista” para meu prato e comi. Foi remédio santo! Ela não esqueceu! E nunca mais pretendeu que eu comesse tanto do segundo prato como do primeiro! Passei a ser tratado como um dos “grandes”

O diretor, o Sr. Almeida, porém, tinha opinião diferente – só não queria que os alunos saíssem da sala de refeições com apetite; podíamos comer a quantidade desejada de um só prato, à nossa escolha. No meu tempo havia uma refeição semanal de açorda e outra de “farinha de pau”; (mandioca) estes pratos foram banidos ainda no meu primeiro ano – não sei o motivo mas adorei que tal tivesse acontecido; detestava pão “mastigado” por outrem!

Às refeições principais tínhamos direito a vinho; um pequeno copo mais ou menos a meio. Alguns alunos não gostavam da “pinga”… mas faziam o seu negócio vendendo o vinho aos colegas apreciadores do precioso néctar

Salazar dizia – constava – que “beber vinho é alimentar um milhão de portugueses”! A direcção do colégio aplicava ali os ditames do 1º ministro… para o bem e para o mal

Aproveitamento escolar

Regra geral os alunos do C.O.A. apresentavam bons resultados finais (acima da média) em cada um dos liceus habituais (Aveiro e Porto); distinguiam-se pela positiva. Havia ali bons professores; cito apenas alguns, os que mais me agradaram: Dr. Vide, Prof. Santos, Dr.ª Maria José Mourão, Dr. Abel Gandra, Dr. Magalhães Lima, entre outros.

Os direcores (tanto a Dª Maria Adília como o Sr. Almeida) davam aulas de “empreitada”. Próximo dos exames aproveitavam todos os tempos livres… para mais uma aula. Que seca!

No meu 5º ano, o Sr. Almeida comunicou-nos, logo no início, que nunca tinha dado Geometria no Espaço… nem como aluno nem como professor; durante o Verão recebeu aulas do Dr. Fachada… e nós fomos as cobaias… mas houve resultados muito satisfatórios… também nessa disciplina. O Leonel Castro Nunes conseguiu na prova escrita de matemática uma nota excelente – 19,8. Constou que não lhe “deram” o 20 porque ele deixou o resultado da expressão algébrica em √4; não acrescentou = 2; – entendeu que o examinador devia saber que raiz de 4 era 2.

Nesse ano, numa aula de matemática, o Sr. Almeida, comunicou-nos que determinado problema estava mal apresentado, pois o proposto tinha sentido ambíguo. O Leonel logo comentou: - “ai o umbigo” O Sr. Almeida aproximou-se dele e perguntou agressivo, ameaçador:

Sabes o quer significa “ambíguo”? não esperou pela resposta e acrescentou: quer dizer dos dois lados! E logo lhe afinfou uma sonora bofetada em cada face… e não se fala mais disso!

Educação física

Esta era uma situação caricata! Coisa anormal mesmo há 60 anos! Esta disciplina existia somente no… horário. Na verdade, o Prof. Costeira, pai ( que também era professor de português e ciências naturais do 1º ano e era chefe de secretaria) raramente – muito raramente mesmo – comparecia no recreio (o ginásio foi construído mais tarde e não era usado para esse fim) para ministrar aquela disciplina; quando aparecia vinha “equipado a preceito”: sobretudo vestido e cigarro no canto da boca; os alunos compareciam nesta aula “equipados” tal como para as outras disciplinas. Assim nos iniciávamos(?) na Educação Física.

Ele teria sido furriel na tropa… e entenderam que, assim sendo, estaria (?) qualificado para ser o responsável por aquela disciplina. Certamente ainda não haveria o INEF ou quejandos. Era um bom professor de português… mas na Educação Física deixava muito (tudo) a desejar… ponham muito nisso!

Trimestralmente, porém pagávamos determinada verba (creio que 20$00) para actividades da M.P.(Mocidade Portuguesa) a que todos éramos obrigados a pertencer. Não seria assim tão má pois no verão de 2012 o coordenador dos nossos atletas olímpicos defendeu públicamente que seria aconselhável que se recriasse a M.P. – e porque não?!

Um dia, um grupo de alunos pediu ao Sr. Almeida que comprasse uma rede e uma bola para jogar voleibol. Resposta na ponta da língua, eficiente (curta e grossa). - Essa disciplina não consta do horário do colégio! Mas lá comprou aqueles apetrechos para a malta se divertir, treinando sozinhos para participar nos campeonatos da M.P.

A “Escola Livre” (creio que foi mais tarde aglutinada à UDO??) tinha uma equipa das camadas mais jovens que era campeã ou vice-campeã nacional de hóquei em patins. Apenas um desses jovens não era aluno do colégio! Pediram ao Sr. Almeida que comprasse equipamentos próprios para concorrer aos campeonatos da M.P., pois teriam sérias (todas) as hipóteses de ser campeões nacionais daquela salazarista ( ou salazarenta) organização. A resposta foi um rotundo NÃO! Nada a fazer! O Sr. Almeida estava mais interessado nos estudos do que na componente fisíca; convinha-lhe que os alunos tivessem boas notas que ele podia exibir perante os progenitores dos novos candidatos; Naquela altura os romanos” ainda” não teriam inventado e espalhado pelo mundo de então a sua célebre frase: “mens sana in corpore sano”. Frequentámos o colégio demasiado cedo.

Fim da 1ª parte Outubro de 2012
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 13 de Setembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10378: Histórias e memórias de Belmiro Tavares (27): O "Engrácio"

1 comentário:

Anónimo disse...

Pois é caro camarada Belmiro

Exceptuando pequenos pormenores é quase uma "fotocópia" dos meus tempos de interno num colégio no interior "desquecido e ostracizado".
Aos dez anos iniciei a minha vida escolar com um regime quase militar,a bem dizer era pior,não guardo boas recordações...só me serviu para enfrentar a vida adulta com outra perspectiva e maturidade.
Um alfa bravo

C.Martins