quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Guiné 63/74 – P9051: Memórias de Gabú (José Saúde) (14): Festa no quarto e uma equipa de “craques”

1. O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabú) - 1973/74, enviou-nos mais uma mensagem desta sua série.


FESTA NO QUARTO E UMA EQUIPA DE “CRAQUES”

MOMENTOS DE LAZER E DESPORTO

Das minhas “Memórias de Gabú” ficaram momentos inesquecíveis que marcam ainda hoje pedaços de uma vida que conheceu ápices bons e maus. Por inteira justiça trago, com a devida vénia, à estampa instantes vividos quando malta se divertia e se entretinha a jogar à bola. A guerra passava então de lado!

E a verdade é que esses episódios inolvidáveis enriquecem no presente a minha suculenta montra dos “troféus” conquistados. Com o peso da idade (já sou sexagenário) recorro amiúde ao meu sentimento nostálgico e ele, muito grato, remete-me para pausas que me levam a cruzar épocas e escrever pequenos apontamentos sobre a guerrilha na Guiné.

Era domingo! No quarto impregnado de fotos - mulheres semi-nuas, equipas de futebol, motos de alta cilindrada, carros de corrida (fórmula 1) entre outros motivos atraentes – a rapaziada divertia-se. O som ambiente emitido pelo Sanyo (ronco comprado numa loja de monhés em Gabú) enternecia as nossas almas.

Corpos elegantes, nada trespassados por inusitados pingos de celulite, dançavam de acordo com a solenidade da música. Os meus companheiros, entusiasmados com o evoluir da dança, tentavam seguir os meus acelerados passos de bailado. Tudo batia certo!

A dada altura, um outro rádio, em onda média, que nos trazia da Metrópole o relato entre o FC Porto e o Vitória de Setúbal dava-nos em directo a notícia infeliz da morte do Pavão, médio azul e branco, em pleno terreno de jogo.

Nós que lidávamos permanentemente com o imprevisto concluímos que o eco do eterno adeus ocorre em qualquer parte do Mundo, não obstante o lugar mais recôndito onde por ventura nos encontremos.

Fluxos de prazer ocasionais que se misturavam com momentos de dor! Talvez que naquele preciso momento algures em território guineense alguém chorasse, também, a morte de um companheiro que acabara de tombar em combate no palanque da guerra.

À parte dessa inequívoca realidade o pessoal curtia momentos do jogo da bola. O futebol era uma bênção que nos preenchia em finais de tarde de calor intenso. Um campo, duas balizas, as equipas constituídas (cinco para cada lado) e toca a jogar.

Aliás, o futebol foi sempre o meu grande sonho desportivo. Os craques mostravam qualidades quanto baste para realizar aqueles “grandes derby´s” que entretanto se protelavam no tempo, levando, contudo, a raríssima assistência ao rubro. Eram giros os instantes da entrega da malta ao jogo!

De pé: Santos, Dias, “Maia” e Fonseca. De cócoras: eu e o Rui

O “Charles Bronson” (como amiúde lhe chamávamos face às suas parecenças com o ilustre actor cinematográfico de Hollywood) e o Rui, parecem atentos aos meus geniais passos de dança.

Um abraço a todos os camaradas,
José Saúde
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523

Fotos: © José Saúde (2011). Direitos reservados.
Mini-guião de colecção particular: © Carlos Coutinho (2011). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

 7 de Novembro de 2011 > Guiné 63/74 – P9010: Memórias de Gabú (José Saúde) (13): Bafatá, cidade acolhedora

2 comentários:

António Rodrigues disse...

Caro José Saúde!

Recordo-me perfeitamente do dia em que faleceu o Pavão do FCP, não me recordo da data, mas sei que andou ali à volta do Natal de 1793, também eu nessa altura me encontrava na região do GABÚ, mais precisamente em Copá.
Estava-mos a ouvir o relato do referido jogo e à uma cena que nunca mais me esqueceu,estava a meu lado um camarada (entretanto já falecido)que era um Portista ferrenho e ao saber da morte do Pavão chorava copiosamente como uma criança.

António Rodrigues
1ª. BCAV 8323
Pirada Bajocunda Copá
Guiné 1973-1974

Hélder Valério disse...

Caro camarigo José Saúde

Continuas, e bem, a desfiar as tuas memórias.
E, a propósito desta última, percebe-se bem que mesmo em locais de maior acção operacional as recordações não são só de operações, tiros, emboscadas, flagelações... também há lugar ao descanso, ao divertimento.
Aliás, acho até que o contraponto entre essas diferentes situações ajudaram a reflectir e a perceber muitas coisas.
Também no caso que relatas, o da morte do Pavão, que ocorreu num 'local improvável', pelo menos assim se pensaria e era justo fazê-lo por quem estava em zona de conflito, foi possível fazer a reflexão e entender que a fragilidade da vida humana pode ser independente do local onde se encontra e das circunstâncias vividas.

Vai-te lembrando de mais coisas e partilha connosco.

Abraço
Hélder S.