quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Guiné 63/74 - P8928: A nossa expedição à Guiné (Tina Kramer) (1): Gabu - Lugadjole (de 28 de Março a 7 de Abril de 2011)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 17 de Outubro de 2011:

Queridos Amigos,
A Tina envia este relatório para o blogue. Por mim, não mexeria no português, é tudo compreensível, afectuoso, um olhar compenetrado de uma antropóloga que descobriu um povo amável com gente da nossa idade ferida até ao tutano, os do PAIGC, que se sentem desprezados e ignorados pelas novas gerações, os que combaterem sob a nossa bandeira que aguardam uma reparação na velhice.
Enfim, sofrimento a rodos, um constrangimento para nós.

Um abraço do
Mário


2. Mensagem de Tina Kramer* para Mário Beja Santos:

Querido Mário,
Como está e como corre o trabalho?
Falei com o Abdu na semana passada e ele contou-me me que foi assaltado. Que horrível! Espero que ele esteja melhor agora.


Enfim escrevi um pequeno relatório sobre a nossa viagem à Guiné. Espero que não tenha muitos erros e que seja aceitável para o blog. Caso tenha dúvida, avisa.

Senão tenho mais uma pergunta: O Mário sabe onde eu podia encontrar informações quanto aos leis portugueses e guineenses sobre as reformas para os antigos combatentes?

Um abraço
Tina


A nossa expedição à Guiné
Escrito por Tina Kramer

Para a minha tese sobre as memórias da Guerra Colonial/Luta de libertação eu fui para a Guiné no mês de Fevereiro até Junho em 2011

Felizmente através do Doutor Mário Beja Santos eu conheci o Abduramame Serifo Sonco, um homem muito inteligente e bem educado, oriundo da Guiné e um neto do grande Régulo Infali Sonco de Missirá, perto de Bambadinca. O Abdu passou a ser o meu assistente na Guiné e acompanhou-me a maior parte do tempo lá. Graças à indispensável ajuda do Mário antes da minha partida e do Abdu durante a minha estada, a Guiné foi uma experiência extraordinária para mim e eu podia colecionar muitos dados interessantes para o meu trabalho. De seguida queria mostrar alguns aspectos da nossa viagem.

Logo depois da nossa chegada em Bissau o Abdu apresentou-me à família dele e como a família é grande também durante as viagens ao interior do país encontrámos outros membros da família. Todos foram muito hospitaleiros e assim muitas vezes tivemos um alojamento em família.

Durante a minha estada em Bissau fiquei na Pensão Central. Felizmente eu podia ainda conhecer o encanto da Pensão e sobretudo da avó Berta. Gostei muito dos almoços deliciosos, quando havia visitas e a avó fazia o seu sorriso cheio de alegria e humor. Também apreciei muito os momentos à noite com a avó e os empregados dela na varanda quando a avó começava a cantar e contar algumas anedotas da vida dela. Parece que com a partida da avó Berta de Bissau uma parte importante da história da Guiné do século vinte terminou.

Na totalidade fizemos mais ou menos três viagens prolongadas no interior do país. Como os transportes públicos não são muito seguros e não chegam a todas as localidades que nós queríamos visitar, comprámos uma motorizada pequena para começar a nossa aventura.

Avó Berta e eu em Bissau, 18 de Fevereiro de 2011
Foto ©: Tina Kramer

O Abdu com a nossa motorizada em Lugadjole, 2 de Abril de 2011
Foto ©: Tina Kramer

1. Gabu - Lugadjole (de 29 de Março a 7 de Abril 2011)

A nossa primeira viagem levou-nos ao nordeste do país (Bambadinca-Bafatá-Gabu-Beli-Lugadjole). Por causa dos buracos na estrada empanámos muitas vezes o que nos deu a possibilidade de ver tabancas (=aldeias) outras que planificadas e de falar com a gente lá. Ao contrário de Bissau com o seu barulho, o lixo, os abutres e a poeira, as tabancas da Guiné são calmas, lindas e limpas. Os habitantes são simpáticos, a peito descobertos, solícitos e hospitaleiros.

Durante todas as viagens que fizemos foi fácil encontrar antigos combatentes do PAIGC que estavam prontos para uma entrevista. Mesmo em tabancas pequeninas pelo menos um. Ao contrário foi difícil para nós encontrar antigos combatentes do exército português que queriam falar connosco. Muitos ainda têm medo de falar sobre a guerra e de mostrar que eles combateram do lado português. A perseguição e os fuzilamentos dos camaradas deles pelos combatentes do PAIGC logo depois da independência são ainda experiências traumáticas na memória destes guineenses.

Mas quando tínhamos chegado a Gabu, encontrámos dois combatentes da Associação dos Ex-Militares das Forças Armadas Portuguesas na Guiné. Iniciada pelos membros da Liga do Combatente e legalizada em 2002 esta associação e bem conhecida também noutras partes da Guiné, por exemplo em Bissau, em São Domingos e em Buba. Mas por causa dos grandes problemas financeiros não executam actividades há alguns anos. Muitos dos antigos combatentes do exército português com quem falámos desejam um apoio e sentem-se atraiçoados pelo governo português. Também muitos queriam entrar de novo em contacto com os antigos camaradas portugueses, mas não têm meios para isso.

Ao lado do mercado em Gabu, 31 de Março de 2011
Foto ©: Tina Kramer

Deixámos Gabu atrás de nós com os seus comerciantes Fulas, as mulheres bonitas, tantos burros e vacas, bicicletas e motorizadas. Continuámos para Lugadjole com a sua colina Orre Fello, onde no dia 24 de Setembro 1973 o PAIGC proclamou a independência da Guiné-Bissau. Com um trajecto de ca. 100 km pensámos que íamos chegar logo, mas o caminho foi muito mais difícil do que esperávamos. Com uma estrada de terra batida e cascalhos grandes e calores que podíamos sentir durante umas caídas com a mota. Sofremos sede e fome e queimámos no sol rigoroso. Assim eu podia imaginar um bocado como os antigos combatentes deviam sofrer durante as marchas extensas no mato.

Finalmente chegámos e encontrámos uma tabanca que não tinha luz nem captação, mas com habitantes hospitaleiros e generosos, que nos deram um telhado e comida. No dia seguinte de madrugada um antigo combatente do PAIGC e o filho dele que trabalha como professor mostraram-nos o sítio histórico no Orre Fello. Infelizmente só existem ruínas duma pequena casa, o que o Amílcar Cabral devia habitar. Mas o orgulho está ainda visível nos olhos do velho e a gente da aldeia esperam um apoio do governo guineense para recuperar este lugar importante para a história da Guiné.

Ruínas da proclamação da independência em Lugadjole (Madina de Boé), 2 de Abril de 2011
Foto ©: Tina Kramer

(Continua)
____________

Nota do Editor:

(*) Vd. postes de:

22 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6774: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (1): Pedido de colaboração da doutoranda alemã Tina Kramer

26 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6791: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (2): Tina Kramer, etnóloga, Universidade de Frankfurt, em trabalho de campo, em Lisboa

31 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6813: Tabanca Grande (234): Tina Kramer, 27 anos, etnóloga, da Universidade de Frankfurt, Alemanha

16 comentários:

Anónimo disse...

ESCLARECIMENTO

A fotografia do monumento da proclamação da independência da guiné..não precisa de comentário.
Está em lugdajole..é verdade,só que duvido que a proclamação da independência tenha sido nesse local,porque já lá estive, e como os dirigentes do paigc não eram estúpidos,seria uma péssima escolha.
Vi fotografias da cerimónia e esta foi feita numa mata..ora naquele local não existem matas..logo branco é galinha o.....

Mais uma mentira dos factos históricos.

Um dia perguntei a um antigo comissário político do paigc se de facto confirmava se a cerimónia tinha sido na zona do boé...como resposta tive uma sonora gargalhada..e depois "você acha que éramos estúpidos".

C.Martins

Carlos Silva disse...

Meus Caros Camaradas & Amigos

1 - Sempre se falou que a independência da Guiné, foi proclamada em Madina de Boé.

2 - Entretanto, há algum tempo atrás, veio publicado no Blogue, uma notícia do nosso camarada Patrício se não estou em erro, o qual vive na Guiné há 3 dezenas de anos, em que dizia que afinal, a independência não foi declarada em Madina de Boé, mas em Lugdajole.

3 - Vem agora o C Martins afirmar que esteve nesse local e que tem dúvidas que a independência tenha sido ali proclamada...

4 - Afinal em que ficamos? Ninguém sabe onde de facto foi proclamada a independência, a não ser os protagonistas que estiveram presentes e que podem testemunhar? Já são poucos os principais responsáveis do PAIGC que lá estiveram e que ainda sobrevivem.

5 - Se não falam, ficaremos sempre na dúvida.
Um abraço
Carlos Silva

Anónimo disse...

Caro amigos,

De acordo com o PAIGC assistiram à cerimónia de independência representantes de vários países, sobretudo comunistas. Entre esses representantes havia embaixadores.

Alguém, em seu perfeito juízo, pode acreditar que as nossas tropas não sabiam exactamente do sítio onde a cerimónia iria ter lugar e a ser dentro das fronteiras da Guiné não teriam actuado?

Como podemos acreditar que esses países tenham permitido que os seus altos representantes diplomáticos assistissem a essas cerimónias adentro das fronteiras da Guiné, sujeitando-os a serem capturados ou mortos? Pensem só na bronca em direito internacional que qualquer um desses cenários teria causado.

Vamos imaginar o que teria acontecido ao PAIGC, à sua imagem, à mentira que era a clamação das suas áreas libertadas, se algum dos cenários do parágrafo anterior tivesse acontecido. Alguém acredita que o PAIGC fosse tão forte e tão senhor do território da Guiné para correr estúpidasmente esse risco?

Na verdade o cenário foi bem montado na altura. Disso não tenhamos dúvids. Tanto assim é que as dúvidas persistempara alguns.

O C Martins, mais uma vez, põe o dedo na ferida.

Claro que os estrategas do PAIGC não eram estúpidos. Hoje, ao fim de todos estes anos, continuam a escamotear a verdade e ainda contam com arautos a perpetuar aquilo que constitui, em minha opinião, uma pérfida mentira.

Infelizmente, ainda falta muito para que a história da Guiné seja escrita. E a culpa não está no nosso lado.

Com amizade,
José Câmara

Anónimo disse...

Caros camaradas

Este assunto já foi debatido neste blogue.
É evidente que a cerimónia da proclamação da independência foi feita na guiné-conakri.
Só que para a propaganda do paigc tinha todo o interesse em dizer que foi na guiné.
A região do boé estava abandonada, logo poderia parecer que era o local ideal, só que tinha um grande inconveniente era e é uma zona de savana, e uma grande concentração de pessoas não passaria despercebida para não falar de prováveis fugas de informação.
Correriam grandes riscos se o fizessem..foram inteligentes..só.
O resto é propaganda.
Sei de um caso em que um capitão..hoje general muito conhecido...levou um grupo de jornalistas até nhacra.. claro dando umas voltas pelos arredores de bissau..dizendo-lhes que estavam na fronteira com o senegal..não se podiam correr riscos..fez-se o que era mais seguro..não sei se "engoliram" a "pêta"..como propaganda serviu.

C.Martins

Anónimo disse...

Joseph Ki Zerbo ,político,
advogado, investigador e expoente maximo da historia africana
(1922/2006) ficou igualmente conhecido por esta sua 'achega" a investigacao da historia de Africa :

“Enquanto os leões não tiverem
os seus próprios historiadores,
as histórias de caça continuarão a glorificar o caçador”.

E convenhamos, esta da cerimónia da proclamação da independência da Guine ter sido feita na guiné-conakri, vem pois confirmar o quanto aquele "mais velho" intelectual africano e burkinabe de origem, tinha a "razao" do seu lado !

Alguem de direito que me esclareca
onde (e ja agora quando) por sinal ganhei uma patria, a Guine Bissau !!!

Nelson Herbert

Luís Graça disse...

Ah! o nosso leitor C. Martins, filho de Hipócrates, camarada, "outsider", com o seu gosto pela contraguerrilha e o seu humor de artilheiro!...

Recomendo-te, caro Martins, que leias o poste do Patrício Ribeiro, mais conhecido em Bissau pelo cognome de "pai dos portugueses", um antigo fuzo, hoje empresário...

O Patrício já tirou a limpo, em 4/9/2009 (*). essa questão de "Madina do Boé, berço da nacionalidade"... e foi o primeiro a falar aqui de (e mandar-nos fotos sobre) LUGAJOLE...

É sítio onde nenhum de nós foi, pelo menos aqueles que habitualmente aqui escrevem... A Tina Kramer foi lá, ao que parece. E tirou o "postal turístico" da ordem...

Para quê continuar a discutir aqui o "sexo dos anjos" ? De há muito sabemos que a proclamação da independência não foi exatamente em Madina do Boé, alvo fácil da nossa avição... A guerrilha ("pequena guerra", em castelhano) é isso mesmo: um jogo do gato e do rato...

Percebo,por outro lado a reação do nosso amigo Nelson Herbert... Eu também o não gostaria de ver um "estrangeiro" a questionar o "berço da nossa nacionalidade"... Os vimaranenses, por exemplo, não gostam mesmo nada... E há historioradores com dúvidas sobre a "legimitidade" de Guimarães... Mas isso o que importa. 800 e tal anos depois do gesto rebelde do Afonso Henriques e seus camaradas ?

Agradeço à Tina as notas do "diário de bordo"... Por exemplo, nunca tinha ouvido falar da "colina Orre Fello", onde se situa Lugajole, e onde ainda há umas ruínas duma pequena casa que "o Amílcar Cabral devia habitar"... Devia ? Deveria ? Chegou a habitar ?...

Duvido, mas um etnólogo também tem de saber distinguir a "factualidade oral" e a "prova histórica"...

Os "mitos" têm, sempre tiveram e continuarão a ter um enorme "força", uma eficácia simbólica que vai para além do rigor histórico e da legimitidade política...

Os meus parabéns vão para a Tina, que é uma verdadeira "mulher de armas" e cujo português, mais desenvolto, me surpeendeu! Boa sorte para a continuação do seu relatório científico (ou tese de doutoramento)... Vem aí o inverno germânico, foram-se os calores tropicais, não há melhor estação (nem melhor país) para se escrever uma boa tese de doutoramento em etnologia... E sobre um tópico, com pouca ou nenhuma (até agora) "procura científica": As memórias da guerra colonial/luta de libertação na Guiné-Bissau!... E essas ninguém as pode roubar, nem as dos "tugas", nem as dos "combatentes da liberdade da pátria", verso e reverso da mesma história... LG

_______________


(*) Vd. poste de 4 de Outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5050: Efemérides (27): Declaração da Independência em 24 de Setembro decorreu não em Madina do Boé mas Lugajole (Patrício Ribeiro)

Luís Graça disse...

Na esteira do comentário do Carlos Silva, é bom lembrar que muitos dirigentes e combatentes do PAIGC que estiveram em 24 de Setembro de 1973, na cerimónia de proclamação da independência da Guiné-Bissau, já morreram...

Um dos últimos foi o comandante Bobo Keita (1939-2009), que era jogador da seleção da província portuguesa da Guiné quando "foi no mato" em 1960...

Norberto Tavares de Carvalho acaba de publicar um livro com as suas "conversas" com o comandante Bobo Keita, que vivia desde 1980 em Cabo Verde. depois do golpe do Nino, e que morreu, de doença prolongada, em 29 de Janeiro de 2009, no Hospital Amadora-Sintra...

Infelizmente, o seu biógrafo não esclareceu a questão do topónimo "Madina do Boé".

Keita foi nomeado em Julho de 1973 para o "Conselho Superior da Luta" por ocasião do 2º Congresso do PAIGC, que se realizou em "Madina do Boé"... E estava, naturalmente, na cerimónia da independência... em "Madina do Boé". Nunca poderia esquecer, de resto esse dia, ainda para mais por 2 razões adicionais: 1º porque fazia 34 anos; e 2º porque teve uma prenda de aniverário, um rádio oferecido pelo Aristides Pereira...

Bobo Keita, natural de Bissau, conhecia o mato, de lés a lés,mas seguramente não utilizava as cartas dos tugas, nem sabia nada de cartografia, não perdendo tempo a distinguir topónimos, como Madina do Boé ou Lugajole... Foi ele quem comandou as tropas que, vindas do leste, chegaram a Bissau em 8 de Setembro de 1974.

O guineense Norberto Tavares de Carvalho, o "Cote", vive na Suiça. O nosso camarada A. Marques Lopes deu-lhe uma ajuda preciosa não só na elaboração do livro, como conselheiro militar e profundo conhecedor da guerra na Guiné, como depois na publicação. O livro foi recentemente lançado no Porto mas é edição de autor. Não é conhecido o distribuidor. Irei publicar algumas notas de leitura.

Luís Graça disse...

... Dos vivos que tiveram o privilégio de estar em "Madina do Boé", em 24 de Setembro de 1973, estou-me a lembrar do doutor Júlio Semedo, engenheiro agrónomo, que vive em Lisboa e com quem já falei ao telefone. Mas contrariamente ao Bobo Keita, o Júlio Semedo não era um dirigente de "dentro", estava no estrangeiro...Vou ver se o voltop a contatar.

Anónimo disse...

"Bobo Keita, natural de Bissau, conhecia o mato, de lés a lés,mas seguramente não utilizava as cartas dos tugas, nem sabia nada de cartografia, não perdendo tempo a distinguir topónimos, como Madina do Boé ou Lugajole..."

Caro Luis creio radicar nessa percepcao desencontrada, o pomo da discordia e o cerne do debate!

Das conversas mantidas ao longo de todos estes anos, com historicos da guerrilha do PAIGC, incluindo o proprio ex presidente Luis Cabral ( algumas registadas em audio) em momento algum deixam transparecer qualquer distincao "fronteirica" entre o que na toponimia portuguesa seria a Madina de Boe versus a tabanka de Lugajole ..tambem ela no leste e parte do sector baptizado pela guerrilha, de Colinas... de Madina de Boe"...


Mantenhas

Nelson Herbert

Joaquim Mexia Alves disse...

E assim, devagarinho e "sem dor", vamos transformando o mito em "realidade histórica"!

Meu caro Luís

Comparar o nascimento de Portugal, acontecido numa época em que ainda quase se "escrevia na pedra", com acontecimentos de uma época em que já se comunicava sem dificuldades com o mundo inteiro, embora perceba a tua intenção, parece-me um pouco forçado.

E também te digo que se foi em Guimarães ou em Coimbra, "pouco" me interessa, porque a verdade é que Portugal nasceu da "ideia" de um homem a quem outros homens seguiram.

Outro tanto aconteceu, "grosso modo", na Guiné-Bissau.

A diferença é que, quanto a mim, a localização verbal em Madina do Boé, (e deixemo-nos de eufemismos), era apenas e só propaganda politica, a qual, tenho de reconhecer, muito bem conduzida e aproveitada.

Até por isso mesmo, pela capacidade de propaganda do PAIGC, a mesma devia agora ser dada a conhecer como uma brilhante estratégia politica.

Para que não se compare algo tão importante como a Declaração de Independência, com as declarações, também "propagandisticas" de alguns antigos combatentes do PAIGC que continuam a afirmar que destruiram isto e aquilo, como Companhias de Comandos, etc.

Um abraço para todos

Luís Graça disse...

Nelson:

E a propósito das memórias do Bobo Keita... fui encontrar, no livro do "Cote" (Norberto Tavares de Carvalho) uma foto da seleção nacional da Província da Guiné, na Gâmbia, nas comemorações da entronização da Rainha Isabel II, de Inglaterra... Na foto está o teu pai, Armando Lopes (UDIB)... A foto é do arquivo do João Burgo Correia Tavares, o Joãozinho Burgo do Benfica... O Bobo Keita, mais novo (1939-2009) também jogou pelo Benfica... As equipas de futebol deram bastantes militantes ao PAIGC... Era interessante saber porquê... No caso do Bobo Keita, foram decisivas as viagens ao estrangeiro (Ghana, Nigéria...) com a seleção nacional, até 1960, ano em que ele passou à clandestinidade...

Vou-te mandar uma imagem digitalizada dessa foto (p. 41), que vem no livro do Norberto Tavares de Carvalho, "De campo em campo: conversas com o comandante Bobo Keita" (edição de autor, páginação, impressão e acabamento na Uniarte Gráfica , SA, Porto, 24/9/2011).

Mantenhas

Carlos Vinhal disse...

Permito-me discordar do Luís Graça quando compara Guimarães e Madina do Boé.
Da nossa nacionalidade não fomos parte activa, logo não podemos discutir com objectividade, mas da nacionalidade de Guiné-Bissau somos contemporâneos, actores e conhecedores da "verdadeira" verdade.
Passados quase 9 séculos, continuamos a lembrar o nosso D. Afonso Henriques como obreiro de Portugal e a cidade de Guimarães como berço da nacionalidade, mas ponho em dúvida que na Guiné-Bissau daqui a 9 séculos alguém se lembre do "D. Afonso Henriques" deles, Amílcar Cabral, e do local da proclamação independência, uma mistificação.
O nosso amigo Nelson tem razão, país que se preze tem de ter uma História, uma Bandeira e um Hino.
A História da Guiné-Bissau ainda não foi devidamente contada pelos guineenses.
Ab
Carlos Vinhal
Leça da Palmeira

Luís Graça disse...

"Das conversas mantidas ao longo de todos estes anos, com históricos da guerrilha do PAIGC, incluindo o próprio ex-presidente Luís Cabral ( algumas registadas em áudio) em momento algum deixam transparecer qualquer distinção 'fronteiriça' entre o que na toponímia portuguesa seria a Madina de Boé 'versus' a tabanca de Lugajole ...também ela no leste e parte do sector baptizado pela guerrilha, de Colinas... de Madina de Boé"...

O Nelson Herbert, guineense, jornalista, editor, da 'Voz da América', não podia deixar de ser mais claro (e, para mim, arguto e convincente)...

Digamos que uns e outros não usam o mesmo GPS, metaforicamente falando... A leitura geográfica ou cartográfica que fazemos do território da antiga província da Guiné não é a mesma da generalidade dos guineenses, nem dos antigos dirigentes e combatentes do PAIGC, sobretudo estes que eram verdadeiros "homens do mato"...

Meu caro Joaquim: sabes bem que não pactuamos com operações de branqueamento, sejam elas quais forem, sobre a realidade da guerra no TO da Guiné... Daí termos este e outros dossiês abertos, ou sempre em abertop... Mas nenhum de nós, que escreve, tem meios, por enquanto, de fazer investigação por conta própria, a sério (análise de arquivos, entrevistas com sobreviventes, etc.). Daí a cautela que temos de ter com os diferentes depoimentos, de um lado e do outro.

Não se trata de transformar "mitos" em "factos históricos"... Eu refiro-me à "força dos mitos" (nós também temos os nossos, todos os povos têm os seus, e não é mau que assim seja)...

Temos é que saber filtrar os discursos (com os seus enviesamentos, incluindo a propaganda)... Os manuais de leitura na Guiné-Bissau continuarão a ensinar à atual geração que a independência da sua pátria foi declarada em Madina do Boé, em 24 de Setembro de 1973... Isso é independente de tu, eu, e os leitores do nosso blogue saberem, de há muito, que essa "Madina" (e há tantas na Guiné-Bissau!) não é exatamente a mesma que conhecemos, ouvimos falar ou ainda hoje podemos "ver" na "nossa carta" de 1958, escala 1/50000...

http://www.ensp.unl.pt/luis.graca/guine_guerracolonial28_mapa_madinaboe.htm

À nossa modesta escala, sem qualquer revanchismo ou sobranceiria, também procuramos, aqui, no nosso blogue, fazer todos os dias a "pedagogia" da verdade histórica que começa pelo rigor dos detalhes (topónimos, datas, nomes de personagens, etc.), sem descurar a importância que é também, este espaço, como "ponto de cambança", como rede de comunicação, aberta, multilateral... Se os antigos combatentes daquela guerra (não me refiro aos generais nem aos políticos), de um lado e do outro, não conseguirem falar uns com os outros, 50 anos depois, vão falar em cantos separados, e sobretudo vão desperdiçar a oportunidade (única) de comunicarem uns com os outros, de partilharem algumas coisas em comum que têm todos os combatentes, em todos os tempos, em todas as guerras (por exemplo, o mesmo apreço pela paz, dignidade e respeito).

Um abração para os dois. Luís

Joaquim Mexia Alves disse...

Meu caro Luís

Tudo bem!

Até agora ninguém me deu motivos para acreditar minimamente que o PAIGC, apesar do que dizes, entrevistas, etc., não sabia exactamente aquilo a que os Portugueses chamavam Madina do Boé.

Madina do Boé tinha a importância de ter sido evacuado pelas Forças Armadas e como tal era objecto da propaganda bem montada do PAIGC.

Como todas as coisas passado um tempo vêm a saber-se, convém agora arranjar uma justificação para o facto de Madina do Boé, não ser Madina do Boé.

Tudo bem outra vez.

Esse é um assunto que compete aos guineenses apurarem com toda a veracidade, se o quiserem fazer.

Ainda a "talhe de foice" repara, sem mais palavras, neste texto que consta do site oficial da Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau:

«Guerra de libertação

Após o massacre dos estivadores, em greve no porto de Pinjiguiti em Bissau em Agosto de 1959, o PAIGC decide optar pela luta armada a qual começou efectivamente em 1963. Em 1969, o PAIGC, com a ajuda substancial da URSS e de Cuba ganhara o suporte das bases e controlara quase dois terceiros do território. Apesar da resistência árdua dos portugueses e o assassinato de Amílcar Cabral, em Conakry, no início de1973, o PAIGC ajudado pela URSS, China e Cuba declarara unilateralmente a independência da Guiné-Bissau o 24 de Setembro de 1973. Assim terminou uma das mais longas lutas de libertação em África. A maior parte dos países-membros da ONU, reconhecera rapidamente o novo governo e Portugal, após a queda da ditadura (Revolução dos cravos) em 1974 agiu do mesmo modo e a 10 de Setembro de 1974 reconheceu a independência do País.»

Referencio esta passagem:

«declarara unilateralmente a independência da Guiné-Bissau o 24 de Setembro de 1973. Assim terminou uma das mais longas lutas de libertação em África.»

Com todo o respeito pela Guiné-Bissau, pelo povo guineense e por ti, informo no entanto que não voltarei ao tema, até que haja dados seguros e fidedignos sobre o mesmo, e não apenas declarações que já conhecemos do anterior.

Um abraço para ti e para todos

Torcato Mendonca disse...

FRANCAMENTE!

Há necessidade de aparecerem comentários assim?

Para mim NÃO!

Ab T.

Anónimo disse...

FRANCAMENTE

O lugar onde foi proclamada a independência, para mim, é completamente irrelevante.
Que não foi em Medina do Boé, nem sequer no território da Guiné-Bissau, não foi.
Foi-me confirmado por um quadro do PAIGC,que assistiu à cerimónia, essa sim relevante.Não digo o nome porque ainda é vivo.
Sobre mitos históricos..o próprio D.Afonso Henriques não proclamou a independência de Portugal, mas sim a do Condado Portucalense, do Reino de Leão..onde a proclamou é completamente irrelevante.
Que a história também é feita de mitos, é verdade...a portuguesa ou a de qualquer outra nação..ponto final parágrafo.

C.Martins