segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Guiné 63/74 - P8623: In Memoriam (87): Fur Mil João Fernandes Machado da Silva da CCAÇ 816, morto numa emboscada no dia 1 de Agosto de 1965 (Rui Silva)

1. Mensagem de Rui Silva (ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67), com data de 28 de Julho de 2011:

Caros amigos Luís Graça e Vinhal.
Recebam um grande abraço, extensivo ao meu querido amigo Magalhães Ribeiro e a outros co-editores e colaboradores e a toda a Tertúlia do Blogue.

No dia 1 de Agosto de 1965 faleceu em combate o meu querido amigo Fur Mil Silva da minha Companhia (816).
Gostava que tal desditosa efeméride fosse evocada no nosso Blogue, precisamente no dia 1 de Agosto próximo.

Obrigado
Rui Silva


Gostava de prestar (e julgo que também todos os camaradas da CCaç 816 - Guiné 65-67) através do nosso Blogue (que melhor sítio?) uma sentida homenagem ao nosso querido amigo Fur Mil João Machado Silva que sucumbiu em combate no dia 1 de Agosto de 1965 na célebre e fatídica estrada do K3 (Olossato-Farim) com pouco mais de dois meses de Guiné.
Saúdo também os seus familiares que seguramente viverão este dia com muita mágoa e emoção.

 Fur Mil João Fernandes Machado da Silva
morto em combate em 01AGO1965

Localização de Joboiá, na estrada Olossato/K3, onde se deu a emboscada do dia 1 de Agosto de 1965 que vitimou o Fur Mil Silva

Alguns extractos do relato desta operação nas minhas memórias “ Páginas Negras com Salpicos cor-de-rosa”:

…“Naquele célebre domingo, dia 1 de Agosto de 1965, pelo alvorecer, a caravana pôs-se uma vez mais a caminho do K3….

…Ainda me recordo do desventurado do Silva aquando da altura das queixas deste e daquele, dizer-me, no sítio onde dormíamos e quando calçava as alpercatas a preparar-se para a partida: “Eu tenho um forte motivo para ficar, pois tenho os pés cheios de bolhas”, (daí ele ter calçado sapatilhas em vez das habituais botas de campanha) e apontava-os ao dizer-mo, “mas eu vou”. Lembro-me também que ele usava um grande terço religioso à volta do pescoço…

…1 de Agosto, dia de pleno verão na metrópole; as praias por certo, ou não fosse domingo, cheias de gente folgazona a gozar das delícias do mar e da areia e, nós ali, em cenário de guerra, guerra latente, aberta e declarada. Que contraste, meditei eu…, se bem, que, passageiramente pensei nisto, pois logo me conformei ao lembrar-me que tinha de ser assim… talvez… talvez…

…Extenuados, física e psicologicamente, aproveitamos aquela breve paragem para descansarmos um pouco. Deitados no chão, de braços e pernas abertas, olhando o céu e esquecendo por momentos aquela clima de guerra, assim se prostrou a maioria da malta ganhando força e alento para a derradeira mas “longa etapa”: o regresso, o sempre temeroso e difícil regresso à base: o nosso aquartelamento de Olossato…
Era para cima de uma dezena de quilómetros que teríamos de vencer para chegar ao Olossato…

…Mas, num ápice e em potência eis que rebenta a emboscada. A terrível emboscada!...

Esta é desencadeada à base de lançamento de granadas de mão. Estas chovem de todos os lados e ouvem-se também tiros de metralhadoras ligeiras e pesadas do lado deles.

…A emboscada que marcaria de forma indelével a Companhia 816…
…Jamais outra causaria tantas vítimas e traumatizasse tanto o espírito da malta…
…Jamais outra, e agora no sentido positivo, nos espicaçaria tanto o brio e nos ferisse tanto o orgulho com evidentes resultados em operações futuras…

O tributo pago foi alto, e testemunha o desventurado do Silva, a grande e principal vítima daquela violenta e surpreendente emboscada, Sim, em Joane, Famalicão, jaz o saudoso Silva, o Silva… o que tinha os pés cheios de bolhas e que quis vir à operação…

…Os feridos, onde estão? - Perguntei eu. Alguém apontou-me um Unimog. Passei pelo Ludgero, que chorava e me dizia que o Silva morrera. Saltei para a viatura e então tive uma terrível visão: no chão da carroçaria jaziam uns poucos de corpos envoltos numa toalha de sangue. Uns gritavam de dores, outros de desespero e, entre eles, de olhos vidrados, estava o Silva. Todos se mexiam, menos o Silva que, inerte, parecia completamente alheio ao cenário que o rodeava. O Silva estava morto. Sucumbiu logo ali na emboscada. Não viveu nem um minuto, disse depois alguém…

…A noite caiu então sobre aquele fatídico e triste dia, e a noite, negra, de negro pôs ainda mais tudo.

Demos o nome de: “O dia mais longo” a esta operação de retirada de abatizes.

Rui Silva
____________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 30 de Junho de 2011 > Guiné 63/74 - P8492: Doenças e outros problemas de saúde que nos afectavam (6): A Doença do Sono (Rui Silva)

Vd. último poste da série de 30 de Julho de 2011 > Guiné 63/74 - P8620: In Memoriam (86): Recordando o Joaquim Vicente Silva, 1º Cabo At da 3ª CCCAÇ/BCAV 8323, falecido em 23JUL2011 (Abreu dos Santos)

6 comentários:

Anónimo disse...

Meu caro Rui Silva

A MINHA SENTIDA HOMENAGEM AO MACHADO DA SILVA E RESTANTES ELEMENTOS DA CCAÇ 816.

Despertou-me a atenção ao dizeres que a emboscada foi à base de lançamentos de granadas de mão.
Gostava de saber quais as circunstâncias para que isso fosse possivel, pois como todos sabemos é preciso estarem reunidas várias condições(tipo de terreno,forma de progressão das nt..etc) para que o in possa actuar dessa forma.
Não é minha intenção julgar ou criticar seja quem for..até porque,como sabes,os erros na guerra pagam-se muito caros por quem os comete.
Trata-se apenas e só de um exercício mental da minha parte, até porque não tenho conhecimento que isso tivesse acontecido muitas vezes.
Um alfa bravo

C.Martins

Rui Silva disse...

Caro C. Martins:
Em breve te direi como tudo aconteceu nesta emboscada que, reitero, foi feita à base de granadas de mao.
Depois te contarei pois nao estou no meu computador.
Recebe um grande abraco.
Rui Silva

Henrique Cerqueira disse...

Camarada Rui Silva.Estou plenamente de acordo que queiras prestar homenagem ao teu camarada Fur.Mil João Fernandes Machado ao qual aqui presto a minha homenagem.Mas camarada quanto a mim não seria necessário descreveres com tantos pormenores estado de Cadáver do nosso camarada Furriel falecido.Penso que não é a melhor maneira de homenagear a sua memória assim como a dor dos seus familiares.Penso eu na minha humilde opinião que há narrativas de diversos camaradas que usam com frequência excesso de pormenores no que respeita a mortos.Que diabo será que os familiares dos falecidos gostarão de ver esses pormenores constantemente descritos?Não se estará a evitar que as famílias façam o seu "LUTO".
Camarada Rui Silva,eu só manifestei a minha opinião e em especial por esta situação descrita,por tal entende que é unicamente a minha opinião pessoal.
Um abraço.
Henrique Cerqueira Ex.Fur.Mil 72/74

Rui Silva disse...

Caro Henrique Cerqueira:
De facto nao teria havido necessidade de lembrar a parte tragica.
No entanto, devo-te dizer que eu mesmo, pesoalmente, entreguei o extracto completo das "minhas memorias" a familiares dele ainda ha bem pouco tempo.
Por outro lado essa tambem foi a realidade dos factos, mas concordo contigo em que podia ter alguma contencao.
Pensei duas vezes em fazer ou n
ao a parte final.
Recebe um grande abraco e agradeco a tua atencao.
Rui Silva

Henrique Cerqueira disse...

Caro Rui Silva
Grato pelas tuas palavras em relação ao meu comentário ,pois que estava algo receoso de não ser compreendido e tal como escrevi era só uma opinião pessoal.
Um grande abraço
Henrique Cerqueira

Anónimo disse...

Seria possível conseguir o contacto do Sr. Rui Silva? O meu email é o seguinte: tdrvch@gmail.com