sexta-feira, 22 de julho de 2011

Guiné 63/74 - P8589: Histórias e memórias de Belmiro Tavares (9): Um jogo de Xadrez... muito especial

1. Em mensagem de 30 de Maio de 2011, Belmiro Tavares, (ex-Alf Mil, CCAÇ 675 Quinhamel, Binta e Farim, 1964/66), recebemos esta memória:

HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DE BELMIRO TAVARES (9)

Um jogo de xadrez... muito especial

Nota inicial: o conteúdo deste texto não diz respeito à guerra do Ultramar, mas o autor é um ex-combatente.

No final dos anos sessenta – século passado – o xadrez era já bastante praticado no Colégio Militar, muito mais e melhor que em qualquer outra escola de Lisboa. Em cada uma das quatro salas de jogos – uma por cada companhia de alunos – havia vários tabuleiros para que os jovens, nas horas vagas, praticassem entre si.

Entre oficiais e professores também se jogava em larga escala, pelo menos em quantidade; havia alguns professores que eram “barras” em meu entender; eu, pessoalmente, era aprendiz de moço de cego.

A Direcção do Colégio “contratou” o campeão nacional da modalidade – Joaquim Durão – para incutir nos alunos o gosto pelo xadrez, para lhes ensinar as regras básicas e acompanhar de perto a evolução dos praticantes.

Aquele senhor – era o campeão nacional crónico – organizou um assinalável jogo de “simultâneas” em que ele enfrentaria quase duas centenas de alunos, entre os dez e os dezassete anos, de todos (?) os estabelecimentos de ensino da capital.

Eu fui nomeado, em O.S., para acompanhar os académicos do C.M.; à chegada, fiquei verdadeiramente surpreendido ao verificar que os “meus” alunos (eram 80) representavam quase metade do total dos concorrentes – 170 alunos.

Os Pupilos do Exército (outra escola de filhos de militares) concorriam com 43 alunos. Os restantes (47) representavam várias escolas “civis” da capital.

Os jornalistas presentes, apercebendo-se da desproporção entre “civis” e “militares”, começaram a “morder” nas fardas: - “pensam que são melhores que os outros”; isto não devia ser permitido”; “não devia haver mais de dez alunos por escola”, etc.

Um jornalista mais prudente perguntou-me por que motivo “levava” tantos alunos; e eu respondi:

- A intervenção da Direcção foi quase residual; apenas nos foi sugerido que não concorressem mais de quinze alunos por cada “ano”; perguntámos ao organizador se havia limites; ele respondeu negativamente; houve alguns ”cortes” de acordo com a informação dos “graduados“ (alunos do 7º ano).

O jogo começou! O ambiente entre os jornalistas era tenso, preocupante.
O primeiro aluno a ser derrotado – cheque-mate – era do Colégio Militar!

Os jornalistas passaram a ser contundentes mesmo agressivos no ataque às “fardas”. Alguém teve de pedir “silêncio” na sala; estavam a perturbar o ambiente.

Ao fim de três horas de competição já só havia 70 alunos em jogo dos quais 50 eram do C.M.
Os jornalistas começavam agora a olhar as “fardas” com mais respeito; pelo menos já não barafustavam com tanto azedume.

Mais uma hora de jogo: havia 18 resistentes – 15 eram do C.M. – autênticos heróis!
A “partida” continuava com grande desportivismo e boa disposição.

A certa altura havia apenas cinco alunos em prova – todos do Colégio Militar.
Rapidamente quatro alunos foram postos fora de combate; o Sr. Joaquim Durão, muito honestamente e respeitando o adversário, comentou:

- Muito dificilmente conseguirei vencer esta partida; creio que talvez não perca; se concordares, terminamos com um empate.

Cumprimentaram-se com respeito e admiração mútuos.

Nesta altura (já era tarde para o almoço!) Já não havia jornalistas na sala; certamente envergonharam-se das suas atitudes nada simpáticas e exageradas mas não tiveram coragem nem desportivismo de esperar até ao fim e pedir desculpa; era o mínimo que podia esperar-se. Tinham saído sorrateiramente (covardemente)... com a viola no saco.

Lisboa, 30 de Maio de 2011

Belmiro Tavares
Ten. Mil. Inf.
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Notas de CV:

- Foto do Tabuleiro de Xadez retirado do Blogue Taverna do Guerreiro, com a devida vénia.

Vd. último poste da série de 20 de Julho de 2011 > Guiné 63/74 - P8577: Histórias e memórias de Belmiro Tavares (8): As guerras de Bissau

2 comentários:

Anónimo disse...

Parabens ao Belmiro Tavares por esta "estória" onde se demonstra que um empate pode ter sabor a vitória.
Quuanto à "ficha" de identificação do nosso Alferes permito-me discordar. A gloriosa C.Caç. 675 esteve em Binta e Guidage. Quinhamel e Farim não senhor.
Um abraço de Alcobaça, JERO
PS-Lembrei-me agora de uma "estória" de xadrez passada na minha terra nos tempos em que Zeca Afonso foi Professor em Alcobaça. Era um grande jogador de xadrez e jogava quase todos os dias com um filho de um solicitador chamado Zé Manel Almeida. Mas longas noites de jogatana no Café do sr. Isidro o Zé Manel nunca tinha pressa de abandonar o tabuleiro pois na sua vida profissional era filho do patrão e ...trabalhar fazia calos...Um dia o Prof Zeca Afonso, que tinha que se levantar cedo no dia seguinte para dar aulas, disse ao seu companheiro de luta. Estive a pensar nuns dizeres para a sua pedra tumular.O Zé Manel mudou de côr e perguntou qual era.«Aqui repousa quem nunca fez outra cousa»

Anónimo disse...

Belmiro Tavares

Vou enviar este post para alguns amigos a quem não se pode contar (nem imaginar contar...) uma história menos positiva sobre o Colégio Militar...
Vai fazer alevantar-lhes o EGO!

Alberto Branquinho