sábado, 14 de maio de 2011

Guiné 63/74 - P8271: Ser solidário (106): A Associação Tabanca Pequena de Matosinhos visitou Amindara (José Teixeira)


A alegria no meu coração não tem tamanho

Foi desta forma que uma mulher grande em Amindara começou o seu “discurso” de agradecimento, na recente visita que uma delegação da Associação Tabanca Pequena fez a esta Tabanca em plena mata do Cantanhez - Guiné-Bissau.

Apesar da nossa chegada coincidir com a hora do grande calor, que convida à sesta debaixo do mais frondoso poilão, Amindara esperava-nos em festa. O batuque já se fazia ouvir ainda não se avistava a tabanca.

A festa


De um lado da picada, a juventude. Tocadores e dançarinas, vestidas com a vestimenta de ir à missa, como se diz na minha aldeia, aprimoravam-se a espelhar a sua alegria e gratidão pelo poço de água aberto ali mesmo ao lado. Do outro lado, homens e mulheres mais velhos, as pessoas importantes da terra, também elas vestidas a rigor com o melhor traje, esperavam-nos com a mesa posta.


A mesa posta à nossa espera

O Pitéu

Algumas cadeiras vagas à volta da mesa indiciavam que se destinavam aos “ilustres” visitantes. Cumprimentos afetuosos e prolongados. Olhos nos olhos que teimavam em deixar escapar lágrimas de comoção. Abraços de quem nunca se conhecera antes, mas que se irmanara num sonho – ter água potável ali, mesmo no centro da tabanca.

A palavra “obrigado” era repetida continuamente, enquanto do outro lado da picada o batuque subia de tom para prazer dos nossos olhos e ouvidos enquanto as máquinas fotográficas não se cansavam de fazer clic.

Quão belo é todo este ambiente. Novos e velhos, africanos e brancos em animada festa, passados que são quarenta e tantos anos!

Tempo em que os olhos e ouvidos eram desviados para outros fins que não explorar a beleza do ser humano. Era preciso estar a atento a ruídos ou movimentos estranhos que nos podiam roubar a vida num segundo, e… as máquinas também eram outras.

Somos convidados a saborear um excelente petisco cozinhado para nós com todo o esmero e carinho. Esparguete salteado com ostras. Que saboroso petisco!

Infelizmente não nos avisaram, pois queriam fazer-nos uma surpresa. Para azar nosso tínhamos acabado de almoçar em Faro Sadjuma, ali mesmo ao lado um petisco não menos saboroso. O apetite era pouco, mas deu-se um jeito e lá e se fez o sacrifício. Estive tentado a pedir um taparwere e levar as sobras para Iemberém. eh! eh!

Eu bebi água fresca e potável em Amindara

As crianças de Amindara saboreiam o momento

Ainda há muito a fazer em termos de educação para uma vida saudável

Seguiram-se pequenos discursos em Nalu traduzidos pelo nosso anfitrião, o Abubakar, delegado da AD- Acção para o Desenvolvimento na Região. O Pepito andava atarefado na organização de um acampamento para 100 jovens em Varela e também porque queria que a festa fosse só nossa, pois foi a Tabanca Pequena que investiu em Amindara. Devo dizer que tive oportunidade de por duas vezes visitar tabancas juntamente com o Pepito. Ele é sempre recebido em festa, tal como fomos nós em Amindara, em Medjo e em Farim.

Discursou o jovem chefe de tabanca, que nos contou um pouco da história de Amindara e das dificuldades que têm tido em conseguir água. Até há um ano atrás ela era transportada de uma fonte no interior da mata e quando essa secava iam buscá-la à Tabanca de S. Francisco. Continuam a não ter escola.

Seguiu-se no discurso uma mulher. Começou com uma frase que dá que pensar.

A alegria no meu coração não tem tamanho, porque eu queria água dar de beber às crianças e não tinha; queria água para cozinhar e não tinha, queria água para lavar a roupa e não tinha…

Quando Pepito ouviu o nosso pedido e disse que iam construir um poço fiquei muito contente. Hoje sou uma mulher feliz.

Seguiu-se outra mulher no discurso. O tema foi o mesmo. Os benefícios para a população por ter água na tabanca. A higiene e limpeza, a pureza da água que reduz as doenças tantas delas fatais, sobretudo nas crianças, as hortinhas de legumes...

A mindjer garandi botou discurso pra partir mantenhas gradecer

 
Uma plateia atenta...

Para a posteridade

Agora só falta a escola, dizia-me um homem de cabelo branco.

Depois… as palavras parece que se recusavam a sair da minha boca, talvez um pouco aturdido com tanta alegria. Eu estava encantado e feliz, mas não conseguia expressar por palavras este estado de espírito.

Amindara foi o inicio de um projecto. Temos de seguir em frente. contrariamente ao que alguns afirmam, a Guiné-Bissau precisa de abrir muitos poços de água para poder atender às necessidades de uma população em crescimento, cuja idade média de vida é 47 anos.

[Texto e fotos de José Teixeira, membro da Direcção da Tabanca Pequena, Grupo de Amigos da Guiné-Bissau (ONGD), enviado em mensagem do dia 9 de Maio de 2011]
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 18 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8126: Ser solidário (105): 10 poços de água potável para o Cantanhez ... No dia Dia Internacional dos Monumentos e Sítios, dedicado à "Agua, cultura e património"... e 3 dias depois do Zé Teixeira realizar um sonho...

3 comentários:

Anónimo disse...

Terá valido a pena a nossa passagem pela guerra da Guiné?Tanta dor,tantos sacrifícios,tanto sofrimento,tanta destruicäo,tantas tragédias pessoais?Depois de ler este poste colocado no blog por um Amigo,Camarada,e näo menos,Companheiro na Tabanca de Mampatá,"respondo-me" (talvez pela primeira vez)..........Valeu! Um grande abraco.

Hélder Valério disse...

Caro camarigo José Teixeira

Tenho acompanhado com bastante interesse as notícias que costumam chegar sobre essas acções de solidariedade activa e com profundo significado para o desenvolvimento.

De facto a via escolhida de promover a abertura de furos, com depósitos, e a campanha das sementes, terá que dar frutos pois irá certamente 'provar' como se pode melhorar substancialmente o nível de vida daquelas populações.
Falam da falta de escola. É importante terem colocado essa prioridade, pois revela a preocupação com a vontade de saber mais.
Como opinião pessoal acho que há também um outro aspecto a considerar e que é o da construção de 'fornos ecológicos'. Será também necessário avançar por aí até como forma de tentar travar a desflorestação.

Secundando a afirmação do JBelo, acho também que sim, que valeu a pena, pois estes passos que hoje se dão certamente não seriam possíveis sem os laços que antes se teceram.

Um abraço
Hélder S.

Anónimo disse...

Camarigos Irmãos "Maiorais" de Empada, claro que valeu a pena, o que foi feito de bom e continua a ser oferecido ao amigo Povo da Guiné.

As minhas ofertas pecuniárias foram bem aplicadas, por esta forma outras mais virão e sendo só um pequeno grão para germinar.

Com um Abraço
Arménio Estorninho