sábado, 19 de fevereiro de 2011

Guiné 63/74 - P7819: Notas de leitura (206): Antologia Poética da Guiné-Bissau (1) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 18 de Fevereiro de 2011:

Queridos amigos,
É inadiável fazer-se uma viagem sobre a poesia da Guiné-Bissau.
Peço o grande favor a quem possui outros livros que não esta antologia que me faculte a leitura de outras incursões poéticas de novos nomes da lírica guineense.

Um abraço do
Mário


Os poetas da Guiné-Bissau: Construção do país, construção do texto

Beja Santos

“Antologia Poética da Guiné-Bissau” com prefácio de Manuel Ferreira (Editorial Inquérito, 1990) é porventura o último grande exercício de compendiação dos principais nomes da lírica do país. Inclui poemas de Amílcar Cabral, Vasco Cabral, Helder Proença, Agnelo Regalla, António Soares Lopes Júnior, José Carlos Schwartz, Pacoal D’Artagnan Aurigemma, Francisco Conduto, Carlos Alberto Alves de Almada, Jorge Cabral, Nagib Farid Said Jaud, Félix Sigá, Domingas Samy e Eunice Borges. Referindo-se a compilações poéticas anteriores, Manuel Ferreira destaca Mantenhas para quem luta! (1977) e Antologia dos novos poetas/Primeiros momentos da construção (1978), isto sem prejuízo de obras individuais, a partir dos anos 80. A generalidade destes poemas move-se em torno dos ideais de libertação, há as elegias em torno do amor, da terra, a poesia de combate social exprimindo contradições, erguendo bandeiras de ideologia revolucionária. Todos eles cantam um povo que merece sorrir, há em muitos destes poemas uma exaltação da nova comunidade, um brado ao destino histórico do povo independente. Obviamente que muitos destes poemas têm temas repetitivos quanto à ideia de África, a solidariedade, o futuro ou a esperança. Ninguém ignora que a lírica guineense está em profunda crise parece ter perdido ou adiado as causas da esperança, da vida melhor e da liberdade, insinua-se neste silêncio um acabrunhamento à dimensão das inquietações em que vive o país.

Os poetas mais velhos são nitidamente da formação clássica, não iludem uma lírica neo-realista e uma organização da mensagem seja panfletária, recorrendo por vezes aos estribilhos e às palavras de ordem. Amílcar Cabral distingue-se pela sua nostalgia de ilhéu, curiosamente é a sua vertente cabo-verdiana que, com o filtro do tempo, ganhou mais corpo. Oiçamo-lo no poema:


Ilha

Tu vives – mãe adormecida –
nua e esquecida,
seca,
batida pelos ventos,
ao som da música sem música sem música
das águas que nos predem…

Ilha:
teus montes e teus vales
não sentiram passar os tempos,
e ficaram no mundo dos teus sonhos
– os sonhos dos teus filhos –
a clamar aos ventos que passam,
e às aves que voam, livres,
as tuas ânsias!

Ilha:
colinas sem fim de terra vermelha
– terra bruta –
rochas escarpadas tapando os horizontes,
mar aos quatro cantos prendendo as nossas ânsias!

(Continua)
____________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 18 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7815: Notas de leitura (205) A Última Missão, de José de Moura Calheiros (2) (Mário Beja Santos)

1 comentário:

Anónimo disse...

Manuel Ferreira

Grande foi a sua perda em pleno trabalho de laços e nós, da malha estreita
da rede da palavra que havia de nos envolver melhor para um entendimento maior desta irmandade dos que na África, sem conceder na afirmação das suas raízes, afinal, tão ricamente se expressam lusos
José Brás