segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Guiné 63/74 - P7624: A guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (42): Na Kontra Ka Kontra: 6.º episódio





1. Sexto episódio da estória Na Kontra Ka Kontra, de Fernando Gouveia (ex-Alf Mil Rec e Inf, Bafatá, 1968/70), enviado em mensagem do dia 16 de Janeiro de 2011:


NA KONTRA
KA KONTRA


6º EPISÓDIO

O Radiotelegrafista tinha montado uma antena dipolo orientada para Galomaro, tendo logo nessa tarde chegado a primeira mensagem do Comando, ordenando que se fizesse no dia seguinte uma operação de reconhecimento, na zona da antiga tabanca de Padada.

Lá se ia, novamente, por água abaixo a conversa com o João.

Havia que combinar tudo: Pessoal que ia, armamento que se levava e sobretudo deixar instruções bem definidas ao pessoal que ficava na tabanca. Caso ouvissem rebentamentos para o lado de Padada pediriam apoio aéreo, pois não há meios rádio móveis. Adiada a conversa resta a esperança. Seria no dia seguinte? Provavelmente não. Iriam ser percorridos uns 25 ou 30 quilómetros carregados com armas, carregadores e granadas, debaixo de uma temperatura a rondar os 40 graus com uma humidade de cem por cento e, portanto, iriam todos chegar exaustos.

Manhã bem cedo parte-se em direcção a Padada, para Sul portanto. Primeiro caminha-se ao longo da picada mas em determinada altura o Alferes Magalhães determina que se saia da picada, caminhando paralelamente a esta a uma distância considerada segura. Durante os primeiros quilómetros caminha-se descontraidamente tendo-se atravessado clareiras lindíssimas pejadas de morros de formigas, não de baga-baga, mas de umas que constroem o que parecem cogumelos gigantes.

Uma clareira lindíssima.

Numa dessas clareiras não deixa de haver o habitual ataque de abelhas. Não provoca muitos “estragos”, só duas ou três picadas, mas foi o suficiente para desorganizar completamente a coluna o que deu para imaginar o que poderia ter acontecido se em simultâneo houvesse uma emboscada do PAIGC.

A partir daí nova ordem: Caminhar sempre pela mata, que não sendo muito cerrada dava para uma progressão a bom ritmo, e necessariamente em absoluto silêncio. Quando já se estava perto de Padada começam-se a cruzar trilhos recentes e bem marcados no capim de um palmo de altura, com toda a certeza por guerrilheiros, ou por elementos da população afecta ao PAIGC. Claro que houve alguma tensão nos elementos da coluna. Em qualquer momento podia desencadear-se um recontro e se houvesse mortos ou feridos, mesmo vencendo a batalha, seria muito penoso carregá-los no regresso. O Alferes Magalhães não tinha muita fé nas possíveis evacuações aéreas.

Nada acontece e chega-se à que tinha sido a tabanca de Padada, vendo-se apenas os restos das moranças calcinados. O local no entanto não deixava de ser belo. Pelo meio do mato que ia crescendo no que foi a tabanca, ainda se podem ver restos de plantações de bananeiras.

Tendo cuidado em não caminhar pelo carreiro deu-se uma volta pela antiga tabanca.

Chegados ao destino havia que repor as reservas de água que entretanto se tinham esgotado. Um elemento da milícia, conhecedor do local, conduz a coluna para a antiga fonte da tabanca. Logo que o pessoal enche os cantis, o Alferes monta um cordão de segurança à volta do local e dá ordem para comer as rações de combate que se levavam.

Logo a seguir e, cumprindo a ordem de operações, monta-se uma emboscada no trilho com mais probabilidades de passagem de elementos do PAIGC. Passadas umas três horas em silêncio absoluto e porque nada aconteceu foi levantada a emboscada e inicia-se o regresso a Madina Xaquili caminhando agora paralelamente ao trilho anterior. Chega-se à tabanca ao anoitecer mas a horas de ouvir o relato dum Sporting/Académica.

Claro que nessa noite não há conversa com o João, o cansaço falou mais alto. Já na cama o Alferes Magalhães não deixa de pensar na Asmau, cuja imagem já se começa a desvanecer. Torna-se imperioso voltar a vê-la. Se não fosse o cansaço talvez não pregasse olho nessa noite mas, dadas as circunstâncias, acaba por adormecer.

Fim deste episódio

Até ao próximo camaradas.
(Fernando Gouveia)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 14 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7612: A guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (41): Na Kontra Ka Kontra: 5.º episódio

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