sábado, 6 de fevereiro de 2010

Guiné 63/74 - P5775: Efemérides (44): O desastre de Cheche, 41 anos depois(José Martins)

1. Mensagem de José Marcelino Martins* (ex-Fur Mil, Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), com data de 4 de Fevereiro de 2010:

Caríssimos
Junto texto, sujeiro às fixações que acharem oportunas.

Um abraço
José Martins




O Che-Che ainda está presente!

6 de Fevereiro de 1969 / 6 de Fevereiro de 2010

41 anos depois


O Luís Graça, em telefonema de hoje, lançou-me o repto. Voltar a escrever sobre o desastre do Che-Che que, ainda que lateralmente, vivi intensamente!

De imediato pensei, não escrever, mas procurar no blogue referências ao acontecido.

Encontrei, creio, a minha primeira participação no blogue. O tema era o Desastre do Che-Che, e das baixas que causou.

24 Outubro 2005 > Guiné 63/64 - CCLVII: A contabilidade dos mortos na operação de retirada de Madina do Boé

Caro Luis Graça:

Ví no blogue-fora-nada o texto sobre a retirada de Madina do Boé (1). Na realidade morreram nesse desastre quarenta e sete homens, apesar da maioria das referência apontar para 46. Efectivamente a 47ª vítima era um caçador nativo (2), pelo que não consta das estatísticas militares.

Sei do que se passou, dado ter sido eu, na altura, Furriel de Transmissões da CCAÇ 5, de Canjadude (3), a proceder ao levantamento dos desaparecidos, junto de cada companhia, e de ter redigido a mensagem que foi enviada, momentos depois, para todos os escalões superiores.
Em nota de rodapé, registe-se a preocupação dos sobreviventes, traduzida na tentativa de enviar TELEGRAMAS, para avisar a família de que se encontravam bem. Não foi enviada nenhuma mensagem/telegrama, dado que, mesmo que transmitidos para o batalhão os enviar depois via Marconi, seriam fatalmente censurados no percurso (4) (5).

Um abraço do camarada
José Martins

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Notas de L.G.

(1) Vd. post de 2 de Agosto de 2005 > Guiné 63/74 - CXXXIII: O desastre de Cheche, na retirada de Madina do Boé (1969)

(2) Presumo que o autor do texto quer dizer soldado africano de um Pelotão de Caçadores Nativos, tropa regular, embora de recrutamento local, que deve ser confundida com as milícias.

(3) Vd. Carta da Guiné (1961). Na zona leste da Guiné, hoje região do Gabu, entre Nova Lamego (hoje Gabu) e Cheche (ou Ché Ché), na estrada Nova Lamego-Madina do Boé que atravessa o Rio Corubal precisamente em Cheche, sítio onde se deu a tragédia que vitimou os 47 militares.

(4) Madina do Boé tem um significado mítico tanto para nós, que fizemos a guerra colonial, como para os guerrilheiros do PAIGC. Depois da nossa retirada, o aquartelamento, abandonado e armadilhado pelas NT, terá sido imediatamente ocupado pelos sitiantes.

(5) Em Julho de 1973, o PAIGC realiza em Fulamor, a oeste de Madina do Boé, o 2º seu Congresso. E, finalmente, em 24 de Setembro de 1973 é ali proclamada a Independência Unilateral da Guiné-Bissau pelo PAIGC, sendo Luís Cabral eleito Presidente do Conselho de Estado.

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Antes, em 2 de Agosto de 2005, tinha sido publicado o post

02 Agosto 2005 > Guiné 63/74 - CXXXIII: O desastre de Cheche, na retirada de Madina do Boé (5 de Fevereiro de 1969)

1. Este documento, que me chegou às mãos através do Humberto Reis, relata a dramática operação em que participou a CCAÇ 2405, sedeada em Galomaro, e pertencente ao BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70), operação essa que tinha em vista retirar as NT da posição insustentável de Madina do Boé, cercada pelo PAIGC (e depois ocupada logo a seguir, no mesmo dia, a 6 de Fevereiro de 1969, após a retirada das NT).

Na passagem do 37º aniversário desta infausto acontecimento, escrevi “Madina do Boé – Contributos para a sua história”, que veio a ser publicado, em três partes;

18 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1292: Madina do Boé: contributos para a sua história (José Martins) (Parte I)

15 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1370: Madina do Boé: contributos para a sua história (José Martins) (Parte II)

21 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1388: Madina do Boé: contributos para a sua história (José Martins) (III parte)

Jangada para travessia do Rio Corubal, no Che-che.
© Foto de José Azevedo Oliveira, com a devida vénia.


A foto acima, da autoria do ex-Furriel Miliciano Oliveira (CCaç 5, que esteve destacado no Che-Che integrado num grupo de combate), é a anterior à que sofreu o acidente.


Muito foi escrito pelos camaradas que, directa ou indirectamente, estiveram ligados ao acontecimento ou ao local.

8 de Maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2819: Lista dos militares portugueses metropolitanos mortos e enterrados em cemitérios locais (4): 1968-1973 (Fim) (A. Marques Lopes)

Guiné-Bissau > Região de Bafatá > 1 de Março de 2008 > O Rio Corubal, visto da margem direita, junto ao Saltinho... Neste rio (o único verdadeiro rio da Guiné, segundo dizia o Amílcar Cabral), morreram afogados 46 militares portugueses das CCAÇ 1790, CCAÇ 2405 e outras unidades, além de um civil guineense, no dia 6 de Fevereiro de 1969, na travessia junto ao Cheche, na sequência da evacuação de Madina do Boé (Op Mabecos Bravios). Nenhum dos corpos foi recuperado (1).


O nosso camarada Armandino Alves, que esteve em Madina do Boé e em Beli, dois dos vértices do “Triângulo do Boé”, também escreveu



14 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4518: Controvérsias (19): Sob a evacuação das NT de Madina do Boé (Armandino Alves)

15 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4533: Controvérsias (20): A minha análise pessoal do desastre com a jangada no Cheche, na retirada de Madina do Boé (Armandino Alves)

O Armandino Alves foi 1.º Cabo Enf da CCAÇ 1589 (1966/68), em Beli, Fá Mandinga e Madina do Boé, apresentou um comentário em 13 de Junho no poste:

Guiné 63/74 - P2984: Op Mabecos Bravios: a retirada de Madina do Boé e o desastre de Cheche (Maj Gen Hélio Felgas †), que merece ser poste:

Também os que chegaram depois do acontecido, vieram a observar o que o acidente influenciou os que iam chegando ao teatro de operações:

1 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5745: José Corceiro na CCAÇ 5 (2): A primeira saída para o mato (1ª parte)

"- Tu chegaste hoje, dia 13 sexta-feira, e amanhã vais logo para o Cheche, onde há quatro meses perderam a vida perto de meia centena de militares (47), isto não é, convém que se diga, uma colónia de férias, para vires com discos e gira-discos na bagagem. Isto aqui é a guerra amigo e não vais ter propriamente vida facilitada, até porque os nossos graduados não são flor que se cheire, as surpresas, não vão ser glico-doces para o teu lado.

Houve, inclusivamente, empenho festivo para receber com a dignidade possível e agradecimento merecido, os martirizados heróis que deixavam Madina de Boé. Eu sou testemunha ocular que passados 4 meses após a infausta tragédia, existirem ainda a cerca de 1km de Canjadude, na picada que liga ao Cheche, fachas de pano passadas de árvore a árvore, por cima da picada, onde se podiam ler coisas como: “Canjadude saúda-vos”.

Pelo menos 1 ou 2 dessas fachas estavam por lá e só a acção do tempo as destruiu. Assim como haviam algumas folhas de palmeiras atadas nas árvores, ao longo da picada, como que a saudar e louvar os heróis. É lógico que os indícios preliminares de festividade deixaram de ter sentido após a aziaga tragédia.

Creio que ainda há história para contar, sobre a martirizada companhia que esteve e fechou Madina de Boé. Aqui não me alongo mais porque não fui testemunha.

Presto a minha homenagem pessoal a estes heróis, os que ficaram e os que partiram.


Também recordo que, na página de “ultramar.terraweb.biz” há texto sobre o acontecimento, com especial chamada para “Madina de Boé - 47 Militares morreram no Rio Corubal” que apresenta diversos recortes de jornal, com entrevistas a sobreviventes.

Termino como terminei a primeira parte do meu texto já citado, com os parágrafos que antecediam o nome de cada um dos HERÓIS/MARTIRES:

Naquela tarde de 6 de Fevereiro de 1969, o Corubal roubou, a todos e a cada um de nós, quarenta e sete amigos e camaradas, dos quais, poucos viriam a ser encontrados e sepultados nas margens do Rio Corubal.

É com emoção, que quando falo ou escrevo sobre este tema, me curvo perante a memória daqueles que não voltaram, me perfilo em continência e os meus lábios murmuram uma oração.

José Martins
5 de Fevereiro de 2010
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 31 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5734: Ser solidário (53): Que muitas Runas se levantem (José Martins)

Vd. último poste da série de 4 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5768: Efemérides (43): 4 de Fevereiro de 1961, O princípio da Guerra Colonial (José Marques Ferreira)

Guiné 63/74 - P5774: Notas de leitura (63): Salgueiro Maia (2): Guidaje numa descrição digna do Apocalypse Now (Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) , com data de 29 de Janeiro de 2010:

Carlos e Luís,
Aprende-se toda a vida, foi a lição que tirei deste texto.
Posso agora perceber a força daqueles versos do Manuel Alegre, no elogio ao Salgueiro Maia: “Ficaste na pureza inicial /do gesto que liberta e se desprende /Havia em ti o símbolo e o sinal /havia em ti o herói que não se rende”.

Um abraço do
Mário


Salgueiro Maia:
Guidage numa descrição digna do Apocalypse Now


Beja Santos

Salgueiro Maia recebe ordens de ir apoiar a abertura do cerco a Guidage. Em 26 de Maio chega a Binta com uma companhia desfalcada, estão lá três capitães, pouca comida e há que dividir as munições por todos. Não há um só oficial superior para comandar a operação. Começa aqui a sua descrição:

“No dia 29 de Maio, pelas 5 horas, iniciámos a abertura do itinerário Binta-Guidage. Cerca das 10 horas, ao ser picada, foi accionada uma mina anti-carro, de que resultou um morto (ficou somente com um bocado do tronco, pois o resto desapareceu), um furriel cego e dois feridos ligeiros. Foi ordenado ao pelotão a que pertenciam as baixas para, em dois Unimogs, fazer evacuação para Binta, onde a companhia local os evacuaria para Farim e daqui para Bissau, por já não haver evacuações aéreas no local, devido à existências de mísseis terra-ar. O pelotão que fez a evacuação aproveitou a oportunidade e não voltou, como lhe tinha sido ordenado, e assim ficámos com menos duas viaturas e cerca de 30 homens. Talvez para que o mau exemplo não se espalhasse, esta deserção colectiva em frente do IN, apesar de constar do relatório da operação, não originou qualquer procedimento disciplinar”. A progressão faz-se a corta-mato, com algumas viaturas à frente, os cunhetes vão abertos, prontos a utilizar: este regime em self-service ir-se-á revelar providencial. Prova que o PAIGC mudara de táctica e queria levar o cerco de Guidage até às últimas consequências a que cada um dos seus homens armados levada dois a três carregadores para o substituir. Pelas 12 horas, as forças do PAIGC começaram a atacar a coluna, foram repelidos várias vezes. As tropas de Salgueiro Maia estão sem água, há homens desmaiados, felizmente que a coluna de reabastecimento de Bissau ia progredindo. Mais adiante, na região de Ujeque, do corta-mato passou-se para uma antiga picada, tentou-se progredir por aqui, arrebentou uma nova mina debaixo de um Unimog 404, um soldado milícia ficou sem uma perna. Mais adiante conseguiu-se contacto com o destacamento de fuzileiros retido em Guidage. Pelas 19 horas entraram em Guidage que tinha um aspecto irreal. Dá-se de novo a palavra a Salgueiro Maia:

“O chão estava lavrado por granadas, as casas, todas atingidas, pareciam ruínas, os homens viviam em buracos, luz e água não havia... como que para nos cumprimentar, pelas 21 horas somos flagelados por um morteiro de 82, com as granadas a cair em grupos de cinco e, para cúmulo, granadas nossas de 81 mm, das capturadas na coluna de reabastecimentos, agora disparadas contra nós. No dia seguinte, pouco depois do alvorecer, inicia-se a coluna de regresso com o pessoal que, até à data, tinha sobrevivido e que, para além dos sofrimentos de que já padecia, deitado sobre colchões velhos, saltava como pipocas cada vez que a Berliet passava num buraco”.

E a descrição que ele faz de Guidage é perfeitamente dantesca:

“A enfermaria e o depósito de géneros tinham sido praticamente destruídos; como assistência sanitária, tínhamos um sargento enfermeiro e alguns maqueiros. O pessoal dormia e vivia em valas abertas ao redor do quartel. Esporadicamente, errava-se por lanços por entre os edifícios ou o que deles restava. Como dormir no chão não é muito agradável, na primeira oportunidade passei revista aos escombros e tive sorte: descobri dentro de um armário que tinha pertencido a um alferes madeirense que ficou sem uma perna uma farda nº 3, o que me permitiu lavar o camuflado e, como prenda máxima, um bolo de mel e uma garrafa de vinho da madeira quase cheia e inteira no meio de tudo partido. Com isto fiz uma pequena festa com três ou quatro homens, porque era perigoso juntar mais gente. Nesta altura pensei em, depois de regressar a Bissau ir ao HM 241 saber quem era o alferes para lhe agradecer tão opíparo banquete, mas tal não foi possível e ainda hoje tenho esse peso na consciência.

Nas minhas visitas pelos escombros, desci ao abrigo da artilharia, onde houvera quatro mortos e três feridos graves. O abrigo fora atingido em cheio por uma granada de morteiro 82 com retardamento; a granada rebentou a meio de uma placa feita com cibes; o resto do abrigo ficou totalmente destruído; o chão tinha um revestimento insólito – consistia numa poça de sangue seco, cor castanha com 2 a 3 mm de espessura, rachada como barro ressequido. O odor envolvente era um pouco azedo, mas sem referência possível; o sangue empastava os colchões e as paredes. A minha preocupação era encontrar um colchão. Depois dar volta aos oito que lá se encontravam, escolhi o que estava menos sujo. Tirei-lhe a capa, mas o cheiro que emanava de dentro era insuportável; mesmo assim, consegui trazê-lo para a superfície, onde ficou a secar debaixo da minha vigilância, para não ser capturado por outro. Depois de bem seco e com os odores atenuados, levei a minha conquista para a vala, onde, para caber, tive de o cortar ao meio, fazendo bem feliz o meu companheiro do lado que, sem esforço, ganhou um colchão, e sem saber de onde ele tinha vindo”.

Assim foram aqueles tempos em Guidage: sem horas para comer, com arroz e salsicha ao jantar, o resto estava desfeito, enquanto se comia caiam à volta morteiradas para ninguém se esquecer que se estava em guerra.

Esta descrição, dura e crua, bem devia ser apresentada nas escolas, para se ter uma imagem da bestialidade da guerra que se desenvolvia na Guiné. Tenho encontrado muitos relatos sobre a violência, a crueldade, o horror das matanças, das perseguições, o caos das populações no meio de tanta destruição. Julgava que “Kaputt”, de Curzio Malaparte, tinha lá tudo o que o demónio da guerra comporta, o inumano, o truculento, os muitos medos desavindos, imprevistos. Salgueiro Maia ensinou-me que há sempre surpresas, basta, como lhe aconteceu, ter saído de Binta para Guidage, aquele inferno inesquecível de Maio de 1973. Um relato para a história, até para se perceber como aquele homem tinha razão fundada em ter chegado ao Largo do Carmo, naquele dia 25 de Abril.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 4 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5763: Notas de leitura (62): Salgueiro Maia (1): Crónica dos Feitos por Guidage (Beja Santos)

Guiné 63/74 - P5773: Parabéns a você (77): José Belo, se o calor da nossa amizade chegasse a Kiruna, a tua Lapónia era o Alqueva (Os Editores)



Suécia > Lapónia > Kiruna > Tabanca da Lapónia > 4 de Fevereiro de 2010 > O trenó do José Belo no dia de anos... Ninguém escreveu ao Capitão!... Falhou a Operação Apaga a vela, ó Zé!

"Vou tentar apresentar o mais frequentemente possível notícias locais, para que os Lusitanos saibam o que se vai passando a, só, 140 kilómetros do Círculo Polar Ártico. Coisas exóticas , tipo esta foto, quando pela manhä se procura o.....automóvel!

"Nos últimos dias, temperaturas quase Estivais! Os termómetros subiram dos 37 graus negativos para os 17 graus negativos. A partir de agora a luminosidade aumentará de 4 minutos por dia. Com isto quero dizer que estamos a passar das 24 horas de escuridão para um......aumento gradual do lusco-fusco até, dentro de alguns meses, vir a atingir as 24 horas de luz diária do tão falado Sol-da-Meia Noite.

"Para as donas de casa informo que está a haver uma acentuada subida dos precos da carne de rena (a tal, só com 4% de gordura e 24% de proteínas) devido a uma diminuição  do número de animais abatidos em relação  ao ano passado.Em 2009 foram abatidas 54.000 e no ano transacto  71.000.

"De acordo com as declaracoes do Sr. Lars-Ove Jonsson, porta voz do Parlamento Autónomo Lapão, este facto deve-se a um considerável aumento do número de predadores (lobos,ursos e linces).Foram estabelecidas cotas de ursos a serem abatidos (60),e lobos (80).

"Já agora,e por curiosidade,são abatidos anualmente em todo o País 70.000 (!!!!) alces para manter um equilíbrio na espécie.COMPREENDO QUE É COISA QUE VOS NÃO INTERESSA LÁ MUITO mas...não deixa de ser erótico! (Perdão, EXÓTICO!).-

"Gostaria de lembrar a todos os AMIGOS e CAMARADAS que a Tabanca da Lapónia-Lusitana (LIVRE) está aberta de par-em-par à muito bem vinda colaboração de todos" (...).

Fonte: Blogue do José Belo > Tabanca da Lapónia  (com a devida vénia...)


1. O José Belo [foto à esquerda, soba mira de um snipper...] faz aninhos no dia 4 de Fevereiro. O mesmo é dizer, que hoje ainda é  infante... A Op Apaga a Vela, ó Zé!, que deveria ter sido devidamente planeada e executada, abortou.  Ou melhor: nem sequer constava do mapa de operações. A cadeia de comando falhou de alto a baixo: do major de operações ao cabo radiotelegrafista, não havia sinais de vida... Por acaso, o general fizera uma ronda, pelo telefone, a partir de Lisboa, do Estado-Maior do Regabofe, e apanhou o major, em casa, a 300 quilómetros (!), com os trolhas da caserna a remodelar-lhe as casas de banho!... Uso e abuso de poder! Desvio de homens e, quiçá!, de materiais!... É coisa para Tribunal de Guerra!

Mas o mais grave, é que deixou o Cap José Belo sózinho com as suas renas, em Kiruna, a 140 km do objectivo, que era chegar primeiro que a concorrência  ao Círculo Polar Ártico!... De derrota em derrota, como vamos ganhar a guerra ? E ainda para mais com a ampulheta do tempo a despejar os grãos de areia, que emperra as máquinas e dão cabo dos neurónios dos homens...

Zé: No final, não houve festa de arromba, como tu querias... Ou nem é isso: apenas as palavrinhas de apreço e reconhecimento: Missão cumprida, capitão! Parabéns!... Enfim, lá apagaste as velas, triste, e mais velho, com tuas renas, mudas e quedas... No teu iglô faltou o calor humano da Tabanca Grande. E, como é pior a emenda do que o soneto, não te vamos dar os parabéns requentados... Por que, como diz o Álvaro de Campos, há coisas que não se podem servir nem comer frias, a dobrada à moda do Porto, o amor, a amizade:

Um dia, num restaurante, fora do espaço e do tempo,

Serviram-me o amor como dobrada fria.
Disse delicadamente ao missionário da cozinha
Que a preferia quente,
Que a dobrada (e era à moda do Porto) nunca se come fria. (...)

Vamos só dizer-te que já ganhaste, há muito, o nosso apreço, estima, amizade e camaradagem. Acredita: se o calor da nossa amizade pudesse chegar a Kiruna, tu a estas horas estavas com os pés de molho nas águas tépidas do Alqueva!...

Vamos, pois,  desejar-te que continues em forma, embora sempre sempre com saudades da tua terra natal e da boa gente que lá tens. A Op Apaga a Vela, Zé! vai ser montada e fica pronta para ser executada em qualquer dia do ano, sob o melhor dos pretexto, que és tu, grande lapão lusitano, espécie raríssima do nosso bestiário!...

A gente da Tabanca Grande vai runir-se, pela 5ª vez, talvez em Maio... Se cá estiveres, vais de certo aparecer para a gente finalmente se conhecer ao vivo, tirar a tua pinta, marcar-te, abraçar-te e nunca mais te esquecer no dia de anos e dos restantes 364 dias do ano... A vinculação, no nosso blogue, também passa por estes rituais: o tabanqueiro é como o filho da zebra que, ao nascer, se não  fixar logo instantaneamente o código de barras da mãe, está tramado, morre trucidado no meio de um milhão de patas.

Zé, no teu caso, acredita, essa do provérbio "Longe da vista, longe do coração",já não se aplica... Afinal, estamos tão perto uns dos outros, ao alcance de um clique... O que pode acontecer, é andarmos "desenfiados", como aconteceu ao Maior deste... Temos que repor a disciplina da caserna!...Na tropa, não há desculpas nem se pede desculpas, dá-se porradas...Aqui tens a palmatória... e a nossa mão!

Luís Graça

PS - Apreciamos também, de sobremaneira, o teu tão especial humor luso-lapónico...Temos as orelhas a arder... Mas deixa-me dizer-te: o Carlos Vinhal é o melhor major de operações que eu jamais conheci... E olha que eu trabalhei com dois batalhões... e vários senhores majores.

2. Aqui segue, para memória fitura (que a gente aprende com os erros e também sabe dar a mão à palmatória!) o folhetim das mensagens abortadas:

2.1. Do luso-lapão José Belo, de Kiruna com camaradagem e amizade (?), 5 de Fevereiro de 2010:~

Caros Camaradas e Amigos(?).

Há desgostos e........DESGOSTOS! Os que me conhecem pessoalmente sabem que, definitivamente, não sou....dessas coisas.

Quando me pediram a data do meu aniversário pensei pelo menos quatro vezes (e para mim é muito!) antes de colaborar. Não será por acaso que decidi aqui viver isolado tantas décadas. Regressado do CALOR AMIGO da Tabanca do Centro (que ainda sinto no coracão), sentei-me ontem, rodeado por uma manada de renas expectantes, frente ao computador, para em conjunto com elas apagar as "velinhas" do bolo de aniversário.............Nada!

As renas, extraordinariamente silenciosas devido à solenidade do momento (e só lhes digo que uma manada de renas faz mais barulho que um debate na Assembleia da República!) só abanavam a cabeça, por não me atrever a escrever...os cornos!

Enfim....lá lhes tive que explicar o tão antigo ditado Lusitano....."Longe da vista......" E, quando já estava disposto a um compromisso sentimental entre o "bolo com velinhas" ou um simples prato com "coubinhas cozidas"......chegou a meia-noite.

Hoje está mais escuro ,e mais frio, nesta Tabanca da Lapónia. Um abraço do José Belo.

2.2. Do nosso major de operações, Carlos Vinhal (entre outros programas, o responsável pelo "Parabéns a você", que é um caso de sucesso) (*):

Caro José Belo

Estou de rastos, sinceramente. Não tenho palavras para me justificar a não ser que neste momento estou atolado de coisas de ordem pessoal para resolver.

Por outro lado sou estúpido por querer assumir coisas que podia dividir com os meus camaradas que de boa vontade me ajudavam, mas sou assim e não há volta. Eles ainda trabalham e a minha intenção é não sobrecarregá-los.

Falhei contigo, ia falhando com outro camarada que faz anos amanhã, ia falhando com o Brás que faz anos no dia 10, e com o José Teixeira que faz anos também a 6. Repara que estes dois, como tu, não fazem parte da lista.

Esqueci-me completamente de registar os últimos dados que me foram enviados. Não tenho justificação.

Com a força da tua razão, foste no entanto acutilante ao dizer longe da vista, longe do coração. E o Zé Teixeira que ia passando, não fosses tu dar o alerta? Não saberás, mas ele sabe-o, tenho por ele uma consideração enorme, mas isso não impede vir ao de cima os meus limites.

Se não te importares, vou publicar a tua mensagem e esta minha resposta na série Dando a mão à palmatória, para que não fiquem dúvidas que no Blogue não há, nem haverá, tertulianos ordenados por qualquer critério objectivo ou subjectivo.

Não sabendo mais que te dizer para que me perdoes, desejo-te o melhor da vida e quero que fiques na certeza de que, se o calor da nossa amizade chegasse à Suécia, não haveria neve nessas paragens.

Este mail, segue com conhecimento dos meus camaradas Eduardo e Luís.

Um abraço amigo para ti do,

Carlos Vinhal

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Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste da série: 6 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5772: Parabéns a você (76): José Teixeira, ex-1.º Cabo Enfermeiro da CCAÇ 2381, Mampatá, 1968/70 (Editores)

Guiné 63/74 - P5772: Parabéns a você (76): José Teixeira, ex-1.º Cabo Enfermeiro da CCAÇ 2381, Mampatá, 1968/70 (Editores)

Hoje, dia 6 de Fevereiro de 2010, acrescenta mais um ano de vida, o nosso camarada José Teixeira, que foi 1.º Cabo Enfermeiro na CCAÇ 2381, Mampatá, nos anos de 1968 a 1970.

Ao Zé, desejamos um feliz dia de aniversário, como ele merece, junto de sua esposa e filhos, assim como da restante família e dos numerosos amigos que tem.

Que a tua vida seja tão longa quanto possível, não só por ser bom sinal para ti, mas porque tens muito para dar aos outros.



Falar de José Teixeira parece fácil e no entanto é muito difícil.

Trata-se de um ser humano que tem como divisa fazer bem ao próximo. Como se entende então que tenha ido para a tropa e para a guerra? Por sorte e acaso, tirando a melhor Especialidade que lhe permitia fazer o bem, o de Enfermeiro. Se em momento combate a sua acção se dirigia a socorrer os seus camaradas de armas, e por que não o próprio inimigo, no aquartelamento dedicar-se-ia ao bem estar das populações, especialmente jovens mães e respectivos filhotes. São inúmeras as sua estórias onde o seu humanismo é evidente, seja na acção de enfermeiro, seja no relacionamento puro e simples com os naturais.

Sendo um dos fundadores, ou pelo menos, um dos elementos mais antigos da Tabanca de Matosinhos, quis, ele e outros companheiros que os encontros das quartas-feiras fossem mais do que isso. Se bem pensaram, melhor fizeram, e hoje a "Tabanca Pequena, Grupo de Amigos da Guiné-Bissau", é já uma realidade. Seria injusto não falar neste momento de Álvaro Basto, outro elemento activo desta novel Associação, cujos Estatutos e primeiros Corpos Gerentes foram votados em Dezembro passado, aquando do jantar de Natal que a Tabanca de Matosinhos promove.

O seu espírito de solidariedade não se fica pela "Tabanca Pequena, Grupo de Amigos da Guiné-Bissau". Há umas semanas atrás foi visualizada uma sua entrevista na televisão, aquando do imenso frio que se fazia sentir na Cidade do Porto, porque integrava uma equipa de apoio aos sem abrigo. Estas acções são efectuadas durante a noite, chova ou faça sol, enquanto a esmagadora maioria de nós está no quentinho dos lençóis. Trabalho que não acaba e não tem visibilidade. Perfeitamente anónimo, não fosse o acaso televisão andar à procura de notícia e ir acompanhá-los naquela noite. Vindo o calor, só o Zé e os seus amigos continuarão a sua tarefa. Quanto à televisão, talvez os volte a acompanhar para o ano.

Não vamos publicar fotografias do Zé exibindo armas mortíferas. Se em tempos foi publicada uma no nosso Blogue, logo o Teixeira se aprestou a esclarecer-nos que aquilo era pose, pois sempre se recusou a levar para o mato, além do equipamento de enfermeiro, qualquer tipo de arma.

Aconselho vivamente a que procurem no lado esquerdo da nossa página os marcadores/descritores "José Teixeira", "Estórias de Zé Teixeira", "Tabanca de Matosinhos" e "Ser solidário". Se lerem a muita colaboração que o Zé tem neste Blogue, não darão por mal empregue o tempo que perderam, perdão, que ganharam.


Como diria o nosso Torcato Mendonça, aqui ficam estas fotos falantes:













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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 6 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5771: Parabéns a você (75): Fernando Franco, ex-1.º Cabo do Pel Int 9288, Guiné 1973/74 (Editores)

Guiné 63/74 - P5771: Parabéns a você (75): Fernando Franco, ex-1.º Cabo do Pel Int 9288, Guiné 1973/74 (Editores)

1. Todos os anos, no mês de Fevereiro, mais propriamente no dia 6, há festa rija em casa do nosso camarada e meu particular amigo Fernando Franco.
Está-se mesmo a ver que neste dia, desde há muitos anos (e por muitos mais ainda, assim desejamos), se festeja o seu aniversário.


Como todos os que não pertecem ao grupo dos S.Exa. tem o Franco uma porcaria de idade, coisa que o tempo vai curar, não tarda muito.

Que o Fernando, a Guida, seus filhos e a minha favorita Mafaldinha, passem um dia pleno de alegria. Estão de parabéns também os pais do nosso camarada, felizmente ainda entre nós.

É minha convicção que a tertúlia subscreve os meus votos, porque estamos perante um camarada, que não participando muito, escrevendo, nos lê e nos acompanha nos Encontros Anuais, desde o memorável na Ameira, em 2006.

Vamos em frente camarada, mesmo que nos vão tirando uma ou outra peça, que acaba por nem fazer falta. Um abraço colectivo para ti.


Há inúmeras fotos do Fernando, mas acho que estas são significativas da sua presença, em corpo e alma, onde deve estar, junto dos camaradas.


Fernando Franco em Bissau

O grande Fernando Franco acompanhado de uns pequenos habitantes da tabanca local.

Lisboa, 10 de Junho de 2007. Fernando Franco acompanhado de Vacas de Carvalho, à esquerda da foto e de Hugo Moura Ferreira à direita. De referir a presença de uma senhora na foto, cuja identidade desconhecemos.

Fernando Franco e António Baia, num convívio com camaradas da Intendência.

Ameira 2006. O Encontro dos Encontros. Fernando Franco, que julgo se ter dirigido ao Blogue pela primeira vez, precisamente para falar deste Encontro, escuta com a maior atenção o nosso baladeiro/fadista, grande camarada e amigo, Vacas de Carvalho. Na foto, algumas das senhoras presentes. De azul, Alice, a esposa do Chefe Luís. Este apontamento é só para ver se tenho aumento de ordenado.

II Encontro da Tertúlia em Pombal. Estava previsto o ataque pelo flanco esquerdo, daí a barreira, mas o fotógrafo surpreendeu o Fernando pela frente. Este é o momento em que ele se delicia com um leite-creme.

III Encontro da Tertúlia em Ortigosa. Foto curiosa de três barbas, ou peras, bem marcadas pela contagem do tempo. Os sempre presentes Fernando Franco, David Guimarães e Carlos Marques Santos.

IV Encontro da Tertúlia em Ortigosa. Franco, que nunca faltou a um Encontro, tendo ao seu lado esquerdo a Guida, companheira de uma vida.


Aqui ficam os poste do Fernando Franco que foi 1.º Cabo no Pel Int 9288, nos anos de 1973/1974:

20 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1195: Ameira: O nosso encontro fez-me bem à alma (Fernando Franco)

16 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1283: Os nossos intendentes, os homens da bianda (Fernando Franco / António Baia)
e
Guiné 63/74 - P1284: A Intendência também foi à guerra (Fernando Franco / António Baia)

20 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2462: Convívios (38): Minitertúlia da Intendência / Administração Militar, Belém, Lisboa, 18 de Janeiro de 2008 (Fernando Franco)

26 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3943: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (5): Quero exprimir a minha revolta (Fernando Franco)

18 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4370: O mundo é pequeno e o nosso blogue... é grande (10): Reencontrei o meu Comandante (Fernando Franco)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 4 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5762: Parabéns a você (74): Mário Silva Bravo, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 6, Bedanda 1971/72 (Editores)

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Guiné 63/74 - P5770: Núcleo Museológico Memória de Guiledje (15): Um visita virtual (Parte II)








Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico Memória de Guiledje (*) > Fotos (sem legendas) enviadas pelo nosso amigo Pepito >  Reconhecem-se, nas primeiras quatro imagens, documentos relativos à presença portuguesa:  (i) a célebre foto aérea tirada pelo José Neto, em finais de 1967, quando a unidade de quadrícula de Guileje era a CART 1613 (1967/68);  (ii) espólio doado pelo Cap Mil Abílio Delgado, comandante da CCAÇ 3477, Os Gringos de Guileje; (iii) objectos diversnas encontrados nas ruínas do aquartelamento (incluindo 1 pistola, 1 lata de conservas, pratos de alumínio) ...

Fotos: © Pepito / AD - Acção para o Desenvolvimento (2010). Direito reservados

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Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste desta série > 5 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5769: Núcleo Museológico Memória de Guiledje (14): Um visita virtual (Parte I)

Guiné 63/74 - P5769: Núcleo Museológico Memória de Guiledje (14): Um visita virtual (Parte I)






Fotos (sem legendas) que nos chegaram da AD - Acção para o Desenvolvimento, a ONG de Bissau a quem competiu a concepção, a construção e a montagem do Museu Memória de Guiledje, com diversos apoios, incluindo, da parte portuguesa, a importante colaboração técnica da Fundação Mário Soares (com destaque para os Drs. Alfredo Caldeira e Vitor Santos). Do lado da AD, deixem-me mencionar aqui dois nomes: Pepito e Domingos Fonseca... Sem a sua paixão por Guileje (e pelo seu país), esta ideia nunca se teria concretizado.

Em termos individuais, o Museu também é devedor a uma série de antigos combatentes portugueses que doaram peças e sobretudo centenas de fotos e documentos (seria injusto citar alguns e esquecer outros)... Injustíssimo seria também omitir o nome do Nuno Rubim, o capitão fula (como era conhecido pela população local), o grande investigador de Guileje (seguramente o maior),   é o autor que concebeu e executou o diorama do quartel de Guileje, além de outros materiais documentais que passam a figurar no Museu.  Enfim, refira-se igualmente o papel, mais discreto, do nosso próprio blogue que desde finais de 2005 tem vindo a acarinhar e apoiar esta ideia.

O espaço do Núcleo Museológico, além do museu, integra ainda a Capela e a Mesquita (*).
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Nota de L.G.:

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Guiné 63/74 - P5768: Efemérides (43): 4 de Fevereiro de 1961, O princípio da Guerra Colonial (José Marques Ferreira)




1. O nosso Camarada José Marques Ferreira, ex-Sold. Apontador de Armas Pesadas da CCAÇ 462, Ingoré - 1963/65 -, enviou-nos a seguinte mensagem, com data de 4 de Fevereiro de 2010:

Camaradas,

Estava eu de volta do teclado, quando me apercebi que hoje, dia 4 de Fevereiro, é uma data que se salienta, por estar conotada com o início dos movimentos de libertação (assim designados), pela autodeterminação e independência africanos, nos quais se incluíam os territórios sob administração portuguesa.

Sendo assim, envio este meu modesto contributo de forma a que ainda vá a tempo de se incluir no «blogueforanadaevaotres».

Melhor dizendo, vão mais que três. Muitos...

E assinalo a data com as estórias dos infelizes falecimentos de dois camaradas da CCaç 462.

4 de Fevereiro de 1961
O princípio da Guerra Colonial

O dia 4 de Fevereiro de 1961, é a data em que se assinala de «forma oficial», o início da Guerra Colonial, em Angola, em que Portugal se viu envolvido durante 13 anos. Pouco tempo depois foi a vez do início das hostilidades na Guiné e em Moçambique.
Foram anos duros, que marcaram pela negativa toda uma geração de jovens, com repercussões que ainda hoje influenciam muitas das suas vidas e dos seus estados de saúde.

Eu entrei nessas fileiras, donde muitos viriam a desertar, em Janeiro de 1963 (já expliquei tudo em anteriores postes no blogue).

O que é certo, é que em Julho de 1963, desembarquei na Guiné, e, durante dois anos, não sofri muito, mais pela sorte que me tocou, que por muitos outros factores. Regressei em Agosto de 1965, tendo chegado a Lisboa em 14 do mesmo mês, num navio que passou sob a recém acabada de construir ponte, a que chamaram Salazar, e, que em 1974, foi rebaptizada para ponte de 25 de Abril, que se mantém ainda hoje.

A minha unidade militar (uma companhia), dormiu nesse dia da chegada em Lisboa e, ao outro dia por volta das sete da manhã, embarcou de comboio em direcção a Chaves, onde tinha decorrido a sua instrução e formação.

O BC 10 (Batalhão de Caçadores 10, agora denominado Regimento de Infantaria de Chaves), foi uma das unidades militares que preparou e «forneceu» muito pessoal para a dita Guerra Colonial.

Percebe-se hoje porquê. Como outras Unidades Militares ainda existentes pelo país, a sua geografia local, a flora, os trilhos, os caminhos, etc. eram perfeitamente propícios ao treino de ambientação militar para a guerra de guerrilha em África.

Chaves, tinha tudo para a preparação de militares deste conflito. Aliás, as especificidades da guerra de guerrilha africana, era novidade então surgida no mundo (tal como é agora o terrorismo).

Fenómeno que surgiu, logo a seguir ao término da II Grande Guerra e cujo objectivo era a emancipação e autodeterminação dos povos de vários países.

Os tipos de acções, armadas e violentas, a que raros exércitos estavam preparados para enfrentar, de manifesta revolta contra o dominador, quando o dominado era pobre e tinha poucas possibilidades de reacção, permitia e estes últimos, mesmo com escassos recursos, a recorrer a esta via guerreira, com o intuito de provocar o desgaste físico e psíquico contínuo aos adversários e a consumir energias políticas e económicas do país dominador.

A aposta era que, mais tarde ou mais cedo, o colonizador cedesse às pressões de todo o tipo e restituísse os poderes administrativos, económicos e políticos.

Foi quase o que aconteceu com Portugal, porquanto alguns historiadores e políticos, já antes de Abril de 1974 diziam e escreviam, que as coisas, tal como estavam nas Províncias Ultramarinas, não poderiam durar muito mais. Não fosse a «revolução dos cravos», como ficou conhecido o 25 de Abril de 1974, e, na Guiné, a guerra com o PAIGC estava, no mínimo, muito complicada, havendo alguns episódios que confirmavam, no terreno, isso mesmo.

Conflitos em que morreu muito português e muitos africanos. Da minha freguesia apenas um homem faleceu (natural da Aguieira), e, pelo que julgamos saber aqui, a sua morte foi motivada por doença.

Muitas pessoas ficaram deficientes fisicamente e psiquicamente, para as suas vidas inteiras.

Da minha companhia, entre cerca de 130 militares, apenas dois faleceram.

Um foi o José Gonçalves Ruas, 1º cabo de Minas e Armadilhas, de Penude - Lamego, que faleceu em 27 de Agosto de 1964, próximo de uma localidade junto à fronteira com o Senegal (chamada Sedengal), ao ser atingido pelos efeitos de uma armadilha que estava a montar e que explodiu, atingindo-o mortalmente.

Nesse dia eu não estava em Ingoré, tinha ido ao comando de Batalhão, a Bula, e foi lá que eu soube pelos camaradas de transmissões, o que se tinha passado naquele local. Nesse mesmo dia e ao princípio da tarde, os meus camaradas da companhia, passaram em Bula a toda a velocidade em direcção a Bissau, levando o corpo do infeliz Ruas, como todos lhe chamávamos. Está sepultado ainda, segundo creio, no cemitério de Bissau, na campa 1020.

O segundo falecimento, foi o do 1º cabo atirador, Artur Branco Gonçalves, de Vilarelho da Raia - Chaves, no dia 13 de Outubro de 1964, no Hospital Militar 241, em Bissau, para onde fora evacuado de helicóptero, por motivo de doença. Está também sepultado em Bissau na campa 1108, admito. A doença que o vitimou, embora eu não tenha a certeza, terá sido uma úlcera gástrica, que, certamente, pelo seu estado, já não foi a tempo de qualquer intervenção cirúrgica.

Esta e outras efemérides, estou certo, não se apagarão, mesmo depois de desaparecerem todos os protagonistas que nela participaram, durante aqueles treze anos.

A este assunto voltarei mais tarde.

Os meus cumprimentos para toda a tertúlia desta Grande Tabanca,
J.M. Ferreira
Sold Ap Armas Pes
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Nota de M.R.:

(*) Vd. último poste da série em:

Guiné 63/74 - P5767: Contraponto (Alberto Branquinho) (5): Nojo, ou um alferes descomposto

Mais um texto para a série Contraponto, enviado pelo nosso camarada Alberto Branquinho (ex-Alf Mil de Op Esp da CART 1689, , Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), ao Blogue no dia 1 de Fevereiro de 2010:


CONTRAPONTO (5)

NOJO

Era a segunda vez que o alferes ia almoçar àquela tabanca fula, a convite do Bacar e do Jau, soldados do seu pelotão.

Feitos os cumprimentos às várias mulheres e depois de umas brincadeiras com a garotada, estava o alferes a passear pela morança com os dois soldados, quando as mulheres começaram a chamar para o almoço.

Balaios e alguidares esmaltados estavam já colocados no interior de um círculo de esteiras, colocadas no chão batido. Arroz, muito arroz, peixe miúdo da bolanha em molho de palma, galinha em pequenos pedaços e condimentos.

As mulheres ficaram do lado da casa, com as crianças. No lado oposto o alferes, no meio dos dois soldados nativos. Todos sentados no chão, com as pernas cruzadas, em cima das esteiras e por baixo do telheiro, também feito de esteira.

Começou o almoço e a conversa. As mulheres deram indicações sobre comida e temperos e os homens passaram-nas, em crioulo, ao alferes.

Falaram sobre a última operação, sobre os outros militares, sobre os vizinhos, enquanto as mulheres algaraviavam entre elas, no meio gargalhadas.

Comiam fazendo as habituais bolas de arroz com a mão direita ou esquerda (ao jeito de cada um), que, depois, uma a uma, eram molhadas nos condimentos dos alguidares mais pequenos, acrescentadas do conduto, depois mordidas, mastigadas, engolidas. Toda a gente conversava em fula, excepto quando os soldados falavam com o alferes em crioulo.

As mulheres tinham que se levantar continuamente para obrigar as crianças mais pequenas e fugidias a dar as suas dentadas na bola de arroz ou a petiscar pequenas doses, agarradas entre o polegar e o indicador.

A meio do almoço o alferes notou uns risos abafados e brejeiros de duas ou três mulheres à sua frente. Logo a seguir um dos rapazes, com cinco ou seis anos, levantou-se e colocou-se atrás delas. Com ar enojado e mantendo sempre a sua bola de arroz na mão, começou a olhar o alferes no rosto e, alternadamente, para as pernas. Depois começou a cuspir, cuspir, cuspir para o chão, ao mesmo tempo que limpava, com os pés, as cuspidelas do chão.

O alferes olhou para as suas pernas e viu que o testículo esquerdo se tinha libertado do controle das cuecas e assomava, curioso, espreitando para fora dos calções. Discretamente levantou-se, arrumou o indiscreto como pôde e… tudo voltou ao seu lugar.

O almoço decorreu sem mais incidentes.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 31 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5573: Contraponto (Alberto Branquinho) (4): Desenraizado

Guiné 63/74 – P5766: Estórias do Tomás Carneiro (2): Rotinas em Jugudul


1. O nosso Camarada Tomás Carneiro, ex-1.º Cabo Condutor da CCAÇ 4745 - Águias de Binta, Binta, Cumeré e Farim – 1973/74, enviou-nos mais uma mensagem, com data de 3 de Fevereiro de 2010:

Olá Camaradas,

Dando continuidade aos meus escritos sobre a minha passagem pela Guiné, aqui vai mais um fragmento das minhas memórias.


Depois de passada a 1ª noite dentro do arame em Jugudul, no 2º dia recebemos ordem de “despejo” e toca a mudar o acampamento, para junto de uma casa que ficava ao lado do quartel.

Diziam que a instalação era uma escola, não tinha portas nem janelas, mas lá montamos a “barracada” de novo.

Durante o dia tínhamos visto uma cobra, cujo comprimento não tinha mais que 30 centímetros. Esquecemos a raio da bicha nas ocupações rotineiras, mas, já noite serrada (nós dormíamos em colchões insufláveis), ouvimos qualquer coisa que fazia um “barulhão” e logo nos assaltou a comum e inquietante fobia às desgraçadas das cobras. Então para semear melhor a confusão e o pânico, alguém gritou: “Cobra”, e logo começou um alvoroço diabólico, com o pessoal a revirar os tarecos todos, mas não encontramos nada vivo nem rastejante.

Quanto à segurança nesse acampamento, fora do arame, não me lembro se a tínhamos montada, ou não!

Por ali ficamos uma temporada, trabalhando de dia no quartel de Polibaque, onde havia muita coisa para fazer, como o forno cozinha e o corte e preparação dos bidões para os banhos do pessoal.

A água íamos buscá-la ao rio Jugudul e a areia para as obras tirávamo-la do mato em frente à porta de armas do aquartelamento de Jugudul, e, enquanto 5 ou 6 homens carregavam a viatura, outros 2 ou 3 garantiam a segurança. Imaginem se aparece-se o IN nestes momentos!

Com o decorrer dos trabalhos da frente da estrada Jugudul/Bambadinca, foram empregues muitos trabalhadores Guineenses, que era preciso transportar de, e, para as suas casas no Dugal e em Mansoa.

Esta tarefa dividia-me entre dois quartéis, porque tinha que dormir todos os dias em Jugudul, para levar o pessoal nos dias seguintes para o trabalho. Nessas andanças, travei boas amizades com alguns dos nativos locais.

A princípio eu tinha algum receio de circular a toda a hora sozinho com os nativos, muitas vezes sem qualquer segurança, mas eles diziam-me que não havia problema e até chegaram a oferecer-me cervejas, como prova dessa amizade.

De tempos a tempos transportei cibos já cortados, para obras nas suas moranças e, algumas vezes, cheguei a transportar caçadores com as suas peças de caça, que, em compensação, sempre me davam um naco de carne para fazer apetitosas petiscadas.

Com o Carnaval à porta recordo-me de uma cena. A “ferrugem” tinha comprado uma cabrita, para preparar uma petiscada que ficou combinada para a segunda-feira (ao fim da tarde), antes do Carnaval. Eu ainda estava nas obras da estrada e não sabia se se trabalharia nessa terça-feira. Disseram-me que sim e fiquei danado.

Vi os tabuleiros a serem preparados para irem ao forno e fiquei chateado por ter que ir, mas lá fui de muito má vontade. Lembro-me que nesse dia me desloquei a Mansoa e quando regressei a Jugudul, me disseram que afinal não se trabalhava no dia de Carnaval.

Peguei na arma, saltei para a viatura e pus o motor a trabalhar. Comecei a rolar devagarinho, para ninguém perceber o que eu ia fazer e saí do quartel. Depois foi pé na “chapa” e toca a “voar” até ao Polibaque. A noite começou a cair rápida e, com os faróis nos médios, lá segui até reencontrar os meus camaradas, que ficaram admirados comigo e com a estória que lhes contei deste “desenfianço”. Enfim lá petiscamos no meio de grande convívio, algazarra e satisfação.

Quando acabamos a refeição disseram-me que tinha correio na secretaria e desloquei-me para lá, mas ao atravessar a parada, que ainda era larga, senti mesmo ao meu lado, um grande rebentamento. Atirei-me de imediato de cabeça para o chão, mas acabei por verificar que afinal era o obus local, que estava a bater a zona. Levantei-me e fui então ao correio.

Já na estrada, de volta a Jugudul, ainda ia com o “coração nas mãos”. Hoje, penso que não repetiria tal doidice, mas, com os 21 anitos de então, até deu para isso e muito mais que viesse…

Na foto vê-se a barraca dos mecânicos.

Um Abraço desde o meio do Atlântico,
Tomás Carneiro
1º Cabo Cond CCAÇ 4745

Foto: © Tomás Carneiro (2009). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:

Vd. primeiro poste desta série em: