quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Guiné 63/74 - P6866: O Nosso Livro de Visitas (97): José Pinto Ferreira, ex-1º Cabo Radiotelegrafista, CCS/BCAÇ 237 (Tite, Julho de 1961 / Outubro de 1963): Evocando o lendário Cap Curto (CCAÇ 153, Fulacunda, 1961/63)


Vila Real > Agosto de 1963 > CCAÇ 153 (Fulacunda, 1961/63) > O regresso a casa... Na foto, o 1º pelotão... Repare-se no fardamento, o caqui amarelo...

Foto:  Cortesia de João Baptista (2008), autor do blogue Fulacunda (entretanto falecido)

1. Mensagem do nosso leitor José Pinto Ferreira


Data: 13 de Agosto de 2010 23:18
Assunto: Memória Viva (Postes 2752, 3717, 3724, 3726 e 3731 (*)

Caros amigos:

Permitam-me que os trate assim. Chamo-me José Pinto Ferreira, fui nascido, baptizado e criado até aos 14 anos na freguesia de Ariz, concelho de Marco de Canaveses. Após aquela idade fui pregar para outra freguesia à procura de mais e melhores oportunidades de conquistar um futuro mais apetecível.
Já crescidinho regressei à terra natal onde resido, actualmente na Rua do Canto, nº 38,  4625-037 Ariz, Marco de Canaveses, com o telefone nº. 255589702, e em alternativa o telefone em horário laboral, nº.255589380.

Feita esta apresentação, um pouco corriqueira, vamos ao que me interessa colocar-vos à consideração e que entendi titular de Memória Viva.

Fui militar, classe de 1959. Pertenci á Arma de Engenharia, Batalhão de Transmissões , tendo sido telegrafista no R.E.2,e posteriormente no Centro de Transmissões do Quartel General da 1ª. R.M., nos anos 60/61. Neste Centro de Transmissões fui escravo da especialidade que tinha, trabalhando de noite e dia, com prevenções sucessivas como quando do assalto ao Santa Maria.

Em Julho/61 fui para a Guiné integrado no Comando do BCAÇ 237,aquartelado em Tite até Outubro/63.

Depois do que acima fica dito, quero dizer-lhes que a Guerra da Guiné merece ser contada sem paixões nem vaidades. Quase diariamente corro a persiana e espreito a janela do Vosso Blogue, o que me permite dizer ter a opinião de alguma crítica ao que é dito nos Postes referenciados.

Fui telegrafista muito activo ao serviço do Comando do BCAÇ 237, o que me permitiu assimilar algumas verdades nunca desmentidas. Dito isto, peço que aceitem e reflictam no que se diz nos Postes acima referidos:

(i) O Comandante da CCAÇ 153 foi o Capitão José dos Santos Carreto Curto, aquartelado em Fulacunda. Era um oficial corajoso, visto como inimigo fidalgal pela Rádio Conakry. Nunca terá cortado cabeças a ninguém, mas tão só sido acusado injustamente de um acto menos digno que terá sido praticado por um seu subordinado no IN, morto quando fugia para o Rio. ACTOS REPELENTES, sem confirmação,  não devem ser credibilizados.

(ii) Mudando o tema, quero dizer que as tropas que foram para a Guiné a partir de 1961 também eram portuguesas. Não tiremos a Verdade à História e saibamos com humildade dignificar os que foram antes, mas também os que partiram depois.

(iii) Para terminar digo-lhes que até hoje não me apercebi que alguém tenha referido o ex-Comandante Militar da Guiné, Coronel Bessa. Este Comandante visitou Tite em Janeiro/63, dia seguinte ao ataque do Quartel [23], tendo sido afrontado pelo Comandante do BCAÇ 237,  José António Tavares de Pina, de que ou resolvia rapidamente o problema da falta de meios humanos do Batalhão, ou arreava ferros e os seus homens fariam o mesmo.

Adeus,  Amigos

Até Sempre (**)

2. Comentário de L.G.:

Já em tempos, mais exactamente em 23 de Abril deste ano, fui contactado,  por telefone, pelo José Pinto Ferreira,  natural de (e residente em) Marco de Canaveses, concelho com o qual de resto tenho afinidades, pelo casamento e pela amizade. No essencial, o José Pinto quis dar-me alguns esclarecimentos sobre o Cap Inf José Curto, comandante da CCAÇ 153 / BCAÇ 237, subunidade que estava sediada em Fulacunda, aquando do ataque a Tite em 23 de Janeiro de 1963, data tradicionalmente tida como a do início da guerra na Guiné.

Sobre a lenda do então Cap Inf José Curto (de que eu própio me dei conta na visita que fiz ao Cantanhez, no início de Março de 2008, aquando realizaçãodo Simpósio Internacionalde Guiledje, Bissau, 1-7 de Março de 2008), o ex-1º Cabo Radiotelegrafista contou-me o que sabia, nestes termos:  houve um guerrilheiro que foi morto, já lá as bandas do Cantanhez, num ataque de surpresa a uma das barracas do PAIGC. Ao que parece, era um tipo importante da guerrilha, que estava no ínicio da sua organização, e que foi reconhecido pelo guia ou por um caipaio. Estávamos no início da guerra, com todo o sul já polvorosa. Um militar da companhia terá, à revelia, do seu comandante,  decepado o cadáver, para trazer, para Fulacunda,  uma prova da sua eliminação física.

Este terá sido o princípio da lenda... O capitão passou a ser o diabo, o terror do sul da Guiné, segundo a Rádio Conacry. Para o José Pinto, o capitão José Curto era um militar corajoso que foi apanhado pelo eclodir da guerra de guerrilha no sul (Regiões de Quínara e Tombali), e para a qual as NT estavam muito pouco ou nada preparadas, em termos humanos, psicológicos e militares... O raio de acção da sua companhia ia de Fulacunda a Cacine (onde tinha um Grupo de Combate!).

 Atenção: ele, José Pinto,  não presenciou este acto, "ouviu contar" à malta da companhia (que pertencia ao mesmo batalhão)... Fiquei de voltar a falar com ele, desta vez pessoalmente,  em Ariz, o que até agora ainda não se proporcionou... Recebo agora este mail em que ele volta a reabilitar a memória do Cap José Curto (hoje general reformado, ao que ele me diz).

Fico na dúvida se o José Pinto quer integrar a nossa Tabanca Grande. Se sim, faltam-nos as duas fotos da praxe. Terei muito gosto em inscrevê-lo como membro do nosso blogue, para mais sendo um homem da minha segunda terra. Fico, pois, à espera de notícias. Entretanto, para a semana talvez o possa encontrar pessoalmente.

Ao nosso blogue interessa apenas a verdade dos factos. Como é nossa norma, não fazemos juízos de valor sobre o comportamento, individual, de nenhum combatente da guerra colonial na Guiné, muito menos dos nossos camaradas operacionais (de soldado a capitão).

Sobre o episódio acima narrado, tenho uma outra versão, mais consistente e válida, de um graduado da própria  CCAÇ 153, e que estava com o seu comandante, Cap Inf José Curto,  nesse dia e local, e que portanto é uma testemunha privilegiada. Sei que, depois do regresso à metrópole, em meados de 1963, o pessoal da CCAÇ 153 nunca conseguiu reunir-se e muito menos com o seu comandante, sobre o qual de resto esse graduado confirma a opinião do José Pinto de ser um "oficial corajoso".

O nome deste camarada não será divulgado. Poderá no entanto vir a integrar a nossa Tabanca Grande, no caso de aceitar o meu convite. Até à data só tínhamos notícia do João Baptista, Fur Mil da CCAÇ 153, e açoriano, autor do blogue Fulacunda, mas infelizmente já  falecido há um ou dois anos.
____________

Notas de L.G.:

8 comentários:

Anónimo disse...

Ai,ai ai...aíb se vai mais um mito de um "cortador de cabeças e apêndices"...ai que tristeza, que lamento para os defensores ou que nutrem certos "amores" paigcianos....
Que chatice.

Assino em Maiúsculas e pergunto:
Quem atacou Mussa Iéro; quem assassinou e fuzilou, ditos colaboradores e ex militares do Exército a que eu pertenci?

A dita guerra de libertação ou os que dignamente se rebelaram contra um regime opressivo, cá e pelo dito império,estão logicamente fora disto!

A verdade e o orgulho de ser Português.

TORCATO MENDONÇA

Anónimo disse...

Caros Camarigos
Seria conveniente recolher junto do Camarada Octávio Sousa a versão dos factos desse incidente, para saber efectivamente a verdade dos factos.
Alfa Bravo
Luís Borrega

Luís Graça disse...

Luis Borrega:

Atenção, que o problema é delicado... A história da CCAÇ 153 é uma caixinha de Pandora... Quem a abrir, não vai ter de certo bom sono... O João Baptista bem tentou, em vida, a partir dos Açores, reunir os elementos tresmalhados. Açorianos eram só dois: o João e o Octávio, ambos furriéis milicianos, e amigos... O Octávio, se quiser abrir o livro, tem muito que contar... Tal como a Nau Catrineta...

Julgo que o pessoal da CCAÇ 153 nunca conseguiu reunir-se... Eles precisam no nosso apoio e incentivo.

Anónimo disse...

Meu Caro Luis

Como bem diz, e de facto um assunto delicado, tanto que o guerrilheiro decapitado... " era um tipo importante da guerrilha, que estava no ínicio da sua organização"...

Era de facto um alto responsavel do PAIGC, na altura na fase de mobilizacao das populacoes...tem familiares directos em Bissau...um deles um historico do PAIGC e ex primeiro ministro do pais...

Os restos mortais do guerrilheiro em questao repousam hoje no quartel da Amura... no Mausoleu Amilcar Cabral...

Nelson Herbert

Anónimo disse...

Depois se lerá. Uma coisa é certa: o capitão Curto teve uma carreira militar que parece brilhante. Foi, como brigadeiro, comandante da 1.ª Brigada Mista, foi condecorado pelo governo espanhol e chegou a general. No comando da CCaç 153, pouco há na Net: uma notícia sobre o trabalho da informação e contra-informação, a partir de um comunicado do PAIGC de que teria sido capturado o capitão Curto e a reacção à notícia, com uma entrevista ao capitão. Isto quererá, certamente, dizer que a CCaç 153 tinha fama na Guiné e era temida pelo PAIGC. Isto está de acordo com o que José Pinto Ferreira afirma: "[[o capitão Curto era] visto como inimigo figadal pela Rádio Conakry".
Abraço,
Carlos Cordeiro

Carlos Silva disse...

Guiné 63/74 - P6866: O Nosso Livro de Visitas (98): José Pinto Ferreira, ex-1º Cabo Radiotelegrafista, CCS/BCAÇ 237 (Tite, Julho de 1961 / Outubro de 1963): Evocando o lendário Cap Curto (CCAÇ 153, Fulacunda, 1961/63)

Neste Poste está escrito o seguinte:

(iii) Para terminar digo-lhes que até hoje não me apercebi que alguém tenha referido o ex-Comandante Militar da Guiné, Coronel Bessa. Este Comandante visitou Tite em Janeiro/63, dia seguinte ao ataque do Quartel [23], tendo sido afrontado pelo Comandante do BCAÇ 237, José António Tavares de Pina, de que ou resolvia rapidamente o problema da falta de meios humanos do Batalhão, ou arreava ferros e os seus homens fariam o mesmo.

1 - Sobre o início da Guerra, há vários Postes ex P3531 e Comentários e escritos por mim.
2 – O BCaç 237 só de nome, porque nem 1 Companhia constituiu, não tem História da Hunidade, vid

Estado-Maior do Exército - Comissão para o Estudo das Campanhas de África - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África [1961-1974] - 7º Volume - Fichas das Unidades - Tomo II - Guiné, 1ª edição, Lisboa 2002, págs 40 e 41.

3 - No AHM apenas existe 2 ou 3 Docs resumidos que tenho em m/ poder e num deles refere que até Maio de 1963 o Comando do BCaç 237 dispusera, praticamente, apenas de um pelotão operacional, o Pel. Mort. nº 19 do R I 6

Nesta data já tinha ocorrido ataque a Tite em 23-01-1963 e sobre este ataque apenas há uma Brochura “ Tite – Guiné – 1961/62/83 que contém excertos de um trabalho meu, escrita pelo meu amigo e conterrâneo Dr Gabriel Moura, já falecido, que antes de falecer teve o cuidado de recolher informação e que eu acompanhei nessa tarefa,junto dos camaradas do Pel Mort 19 e dos poucos elementos do chamado Bat Caç 237, que nos induz em erro, porque não tem semelhança, nem de longe nem de perto com os Batalhões do meu tempo 69/71 e não só, que integravam 600 militares ou mais.

4 – Nesse documento, único, no país e em todo o Mundo, o Gabriel relata exaustivamente os acontecimentos do dia 23-01-1963, claro a sua versão e de alguns camaradas e não se refere à presença em Tite do Cor Bessa, no dia seguinte ao ataque 24-01-1963, omissão que até admito possa ter acontecido, pois nem de tudo nos lembramos.
Sobre estes acontecimentos de alguma forma desenvolvida podem ver o meu Site:
www.calosilva-guine.com, embora eu não tenha transcrito todo o conteúdo da Brochura.

5 – Uma vez que tanto se fala na verdade dos factos, pelo menos, tanto quanto possível próximo da verdade, e uma vez que o nosso camarada José Pinto Ferreira da CCaç 153, que não era uma Companhia do dito BCaç 237, e que infelizmente nem sequer é referida no livro de Fichas do EME acima referido, chegou à Guiné posteriormente ao ataque a Tite, não tendo por isso presenciando o mesmo, agradecia que me informasse qual a fonte verbal ou escrita credível em que fundamenta a sua versão de que o Cor Bessa, esteve presente em TITE no dia seguinte ao ataque 24-01-1963 e teve aquela reacção para com o Maj Pina, Comandante do BCaç 237 ??? até 10-05-63, porquanto constitui um facto importante a juntar ou não à narração feita pelo nosso camarada Gabriel Moura.
Com os meus agradecimentos e um abraço amigo
Carlos Silva

Anónimo disse...

La que tinha fama...esse capitao Curto...tinha ! Cresci ouvindo "estorias" a respeito dessa controversa figura militar...

Nelson Herbert
USA

Anónimo disse...

Segundo comentário no blogue "Rumo a Fulacunda", inserido pelo ex-Fur Mil Octávio Sousa, a CCaç 153, depois da instalação do BCaç 237 em Tite, passou a pertencer-lhe "como tropa operacional e por questões de organização". V: http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:pWMgqArYKbMJ:rumoafulacunda.wordpress.com/+%22ataque+a+tite%22&cd=3&hl=pt-PT&ct=clnk&gl=pt


Abraço,
Carlos