domingo, 15 de agosto de 2010

Guiné 63/74 - P6855: Controvérsias (102): Polémica M.Rebocho / V.Lourenço, resposta a António Graça de Abreu (José Manuel M. Dinis)

1. Mensagem de José Manuel Matos Dinis* (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), dirigida a António Graça de Abreu, com data de 12 de Agosto de 2010:

Meu Caro António

Acabei de ler o teu post 5275, já com um tempinho, que deriva da publicação de uma tese de doutoramento sobre a formação de oficiais, mas tem servido mais para alimentar a polémica sobre a rivalidade entre pessoal do QP e do QC, principalmente ao nível de comandantes de companhias de combate. Digamos, que nesta dicotomia, está contida uma desvirtuação ao conteúdo do livro. E assim, o arriscado, é embrenharmo-nos na polémica, sem o conhecimento suficiente dos dados em questão, que nos dêem suporte e racionalidade às intervenções.

Constatei que, quando escreveste o post, ainda não tinhas lido o livro. Mas manifestas, mais uma vez, o teu carinho pelos oficiais do QP, defendendo-os como se, entre eles, não houvesse bons, assim-assim e maus. Devo dizer-te que houve. Não posso, naturalmente, é quantificá-los conforme as espécies. Mas isso é como tudo e em todas as profissões: no Sporting nem todos os jogadores dão o mesmo rendimento, nem todos revelam o mesmo empenho. Lembro-me do Oceano, quando era bastante tosco, e que acabou a carreira com grande nível, porque foi sempre empenhado. Mas em todas as actividades encontras pessoas mais ou menos diligentes.

Ao longo da sua explanação, o Rebocho enaltece vários oficiais, e desanda noutros. Nunca transmite essa ideia bipolar de que o pessoal do QP aferia por igual e era cobarde. O que ele sustenta, com recurso a diferentes conceitos e experiências, é que o comportamento desses oficiais do QP que se refugiaram da guerra, ou que se revelaram inaptos para a guerra, resultou da má estruturação dos métodos de selecção e da qualidade dos cursos ministrados. A tese do Rebocho não pode ser reduzida a uma vingança, antes, deve ser avaliada pelas diferentes análises ali expostas, e que terão criado um fio condutor relativamente às conclusões finais (são várias as conclusões, em função da conjugação de muitos e diferentes dados). Digamos que a tese pode ser comparada a um estudo sobre a proeficiência de uma empresa.

Portanto, ousaste escrever o post com base num artigo jornalístico, provavelmente de muito má qualidade, que vai além do objecto da questão, e explora sentimentos desavindos em 25 de Novembro. De que interessa as acções judiciais que correm termos, entre o autor e o V.Lourenço, para apreciação das ideias-chave? E porque é que vens referir que no blogue tem havido alguns defensores da tese da derrota militar na Guiné? Acaso não levas em consideração que uma qualquer guerra torna-se um conjunto de vários factores de influência, que tem mostrado, com frequência, serem os mais fracos a obterem o melhor resultado? Então nos centros de decisão que frequentaste essas questões não eram debatidas? Ou nunca tiveste acesso a esses níveis?

A tua formação é em História, curso que não frequentei, mas adivinho que os historiadores sejam alertados para as fontes, que aprendam técnicas, que sejam instruídos na selecção dos meios que permitam identificar o facto histórico. Por isso pisco-te o olho, por teres tomado uma manipulação jornalística, como uma fonte para a apreciação das élites militares em Portugal, no que respeitou à guerra de África.

E quando leres o livro, certamente ficarás surpreendido com as declarações prestadas pelo teu ídolo, o general Durão. E ainda mais, quando chegares à página 488 e não encontrares a frase que citas da peça jornalística. No entanto, eu tenho memória de um ou mais conteúdos daquela frase, juntos ou separados, embora contextualizados, sem o valor meramente especulativo da inserção que fazes. Falta de cuidado!

Quanto ao estudo já escalpelizado da autoria do Sr Coronel Morais da Silva, porque não apresenta argumentos, apenas a crueza da evolução dos números, se tiver que ser utilizado neste processo, só pode confirmar que cada vez havia mais milicianos no comando das companhias de combate, e o autor, relativamente ao remanescente dos anos anteriores, não sabe onde é que se encontravam, ou o que teria influenciado as alterações relativamente a capitães do QP, o que fragiliza qualquer intervenção.

Decorre do anterior, arrisco eu, a resposta à tua pergunta final: o que é que te tem levado a alinhavar tantas páginas?

Se não te importas, darei conhecimento deste texto aos editores, para eventual publicação no blogue.

Entretanto, recebe um abraço com muita amizade.
José Dinis
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 14 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6730: Controvérsias (95): Não me move, nem alimento, qualquer querela QP-Milicianos (José Manuel M. Dinis)

Vd. último poste da série de 4 de Agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6825: Controvérsias (101): Puros e Espúrios 2 (Mário Gualter Rodrigues Pinto)

14 comentários:

Anónimo disse...

No livro, vem na página 456. Quando o artigo foi publicado, o livro não estava ainda editado. A paginação do volume da tese (policopiado) será, naturalmente, diferente.
Carlos Cordeiro

Anónimo disse...

Camaradas,
Aquela frase vem na citada pag.456, como corolário de um pensamento relativo às Elites Combatentes, iniciado a pag.452, já no período das Conclusões.
A este propósito, o do aproveitamento da experiência para a formação de novos combatentes, já citei o Sr General Soares Carneiro que, durante as Conferências relativas a Estudos sobre as Campanhas de África, no âmbito do IAEM, Dezembro de 1996, referiu o seguinte:"em 1974, a situação era extremamente preocupante: nas fases de instrução básica e especial,todos os quadros eram, na prática, só oficiais e sargentos milicianos".
"Com o decorrer das Campanhas, foi evidente a degradação da preparação técnica e da formação moral na instrução ministrada na Metrópole, com consequências ao nível da eficiência e da eficácia das Unidades".
A proximidade de pensamento entre o Sr General e o Manuel Rebocho é, nesta matéria, inequívoca.
À cautela, volto a referir que muitas vezes, não devemos formar opinião pelo diz-que-disse, ou pelo já ouvi-isso, e o nosso camarada tertuliano tem sido bastante crucificado.
A tese é um fio condutor de muitas entrevistas, com vista a várias conclusões, e, tendo sido tantos e tão prestigiados os entrevistados, não me consta que algum se tenha queixado de falta de coesão, e mandasse retirar a sua citação.
Abraços
JD

AQUILES disse...

Muito interessante.

José Grave

Anónimo disse...

Mais uma vez Dinis ilude o problema.
Rebocho diz na pg 488 da tese:
5.“… Nestas condições e porque os Oficiais dos anos 60 fugiram da Guerra, não reuniram as características de elites...o Exército desmoronou-se...".
O estudo do Cor. Morais Silva prova que isto não é verdade e demonstra-o contrariamente ao que Dinis continua a afirmar.
Já não é a primeira vez que Dinis "esquece" o essencial para rebater quem entende que a tese Rebocho não prestigia quem a aprovou.
Leiam o documento que o Morais da Silva enviou à universidade de Évora que, como sabem, não tugiu nem mugiu.

João Mendes

Anónimo disse...

Camaradas:
Mendes refuta-me, e vai buscar uma frase constante da página 488, da tese do Rebocho, já na fase de conclusões. Dá de barato o que se disse nas 487 páginas anteriores. Provavelmente, também contesta os inúmeros testemunhos de oficiais generais e superiores. Provavelmente não leu o livro.
Continua a agitar o estudo do Sr Coronel Morais Silva, que, no meu entender, só ajuda a perceber o que o Rebocho afirma. Com números pois então: não é verdade que o nº. de capitães do QP, que comandaram companhias de combate, foi reduzindo, na inversa, relativamente a capitães milicianos?
Mendes obstina-se a dizer o contrário, como se a matemática, neste caso, permitisse especulações.
Mendes, a seguir, escreve um belo naco: "já não é a 1ª.vez que D. "esquece" o essencial para rebater quem entende que a tese Rebocho não prestigia quem a aprovou".
A grande objectividade reside em "quem entende que", e não precisa de mais nada, subverte o sentido dos números, sob a forma de estatísticas; nem de outros argumentos, para além do não, porque não.
Se Mendes tiver capacidade para ler o livro, e fazer uma sinopse dos factos, contrapostos a uma REALIDADE diferente; se nos demonstrar que os diversos testemunhos são falhas de quem os produziu; e que as quase 500 páginas, por isso, provam que o júri da U. de Évora falhou, então, Mendes terá razão.
A U.Évora não tugiu, nem mugiu, porque o "estudo" não reuniria fundamentos para o que se propunha, digo eu.
Até lá, Mendes, julgo mera perda de tempo, os exercícios de convencimento psicológico a que nos quer submeter (a mim, e aos leitores que partilhem da minha interpretação). Nota: o objectivo da tese não é anunciar que os capitães do QP se refugiaram da guerra, não! A questão essencial centra-se na formação e nas consequências.
Já agora, por curiosidade, porque não se junta o Mendes à Tabanca Grande, enriquecendo-a com as suas intervenções?
JD

Anónimo disse...

"Continua a agitar o estudo do Sr Coronel Morais Silva, que, no meu entender, só ajuda a perceber o que o Rebocho afirma. Com números pois então: não é verdade que o nº. de capitães do QP, que comandaram companhias de combate, foi reduzindo, na inversa, relativamente a capitães milicianos?"
Caramba Dinis.
Ainda não viu que a inversão resulta da falta de "produção" de capitães QP? Ninguém fugiu como o Rebocho afirma e você reitera!
O que é que testemunharam os oficiais ouvidos pelo Rebocho? Que o QP fugiu da guerra? Onde leu tal disparate?
Quanto ao livro li o bastante para nele ver azedume a rodos e um propósito: denegrir os oficiais do QP, em particular os páraquedistas! Exemplar lição de camaradagem e de auto elogio bacoco.
Já basta deste assunto.
Que o blogue continue a servir para o Dinis e não só puxarem das pistolas quando ouvem falar em QP.

J.Mendes

Anónimo disse...

Mendes:
Aos costumes, nada disse.
Quando Mendes pergunta se ainda não vi que a inversão resultou da falta de "produção" de Capitães QP, respondo, que vi isso há muito tempo. Era um factor a considerar e a exigir outras medidas do que as tomadas.
Porém:
1 - O "estudo" não refere este argumento como justificação para a evolução verificada, apesar de apresentar um quadro sem especiais referências, logo, não pode ser aceite como tal;
2 - Ainda assim, se em 1974, nos 3 TO, havia 118 capitães QP a comandar companhias de combate (apenas 19 na Guné),onde estavam os restantes, já que, segundo o Gen. Soares Carneiro, a instrução estava entregue a milicianos? (vide meu 1º.comentário).
Já referi que não alimento polémicas QP/Milicianos, pelo que, se sobre esta matéria vier a referir-se, acho que deve ter em conta o meu comentário anterior.
Este assunto só pode interessar para verificar eventuais erros de percurso, e tomar providências futuras, principalmente ao nível da selecção e da experiência.
Outra coisa, não simpatizo com tiros.
Durante a comissão, quase gastei um carregador. Rebentei duas perdizes, dei 4 tiros na parada, e o resto foi na refrega. Fui muito poupadinho, com a preocupação de ser certeiro.
Vá lá, já dei um pretexto para levar uma "porrada".
JD

Anónimo disse...

Mendes:
Peço perdão por um esquecimento: sugiro a leitura da página 346, da Roma Editora.
JD

Anónimo disse...

A instrução não era ministrada por capitães mas sim por subalternos. O que o Gen SC queria referir era a tremenda escassez de subalternos do QP... que, obviamente se reflectiria no número de capitães.
Não é difícil concluir que se a guerra continuasse por mais 5 anos os capitães QP seriam aves raras que não chegariam sequer para manter a máquina administrativa, logística e da guarnição do continente a funcionar quanto mais ir comandar companhias de combate. O Exército fecharia as portas.
É curioso que ao tudólogo Manuel Rebocho escapou este "pequeno detalhe"substituído aliás pela patranha da deficiente formação do QP.

João Mendes

Anónimo disse...

Mendes:
Não posso extrair a mesma conclusão relativamente à afirmação do Sr General, que me parece uma reflexão crítica.
Também no que se refere à possibilidade do prlongamento, revela uma visão estática e fatalista, quando o que se exigia, era clarividência, quebra de tabus, e o acautelar do futuro daqueles territórios. Portanto, uma concertação político-militar, bem objectivada, e de prazo tão curto quanto possível, em que aos militares fosse exigido um papel de firmeza nas relações com os independentistas.
E, claro, alguma originalidade e eficácia na gestão do pessoal.
JD

Anónimo disse...

Mendes:
Clarifico raciocínio sobre o Gen. Soares Carneiro. É que ele refere a experiência como vector fundamental para a instrução, donde, os subalternos inexperientes e escassos, estariam excluídos da sua intervenção.
JD

Anónimo disse...

"Também no que se refere à possibilidade do prlongamento, revela uma visão estática e fatalista, quando o que se exigia, era clarividência, quebra de tabus, e o acautelar do futuro daqueles territórios.Portanto, uma concertação político-militar, bem objectivada, e de prazo tão curto quanto possível, em que aos militares fosse exigido um papel de firmeza nas relações com os independentistas."

Estou certo de que muita gente ficaria agradecida se o Dinis trocasse por miúdos este naco de prosa que desafia o que de melhor disse o Abranhos.

JM

Anónimo disse...

Mendes:
Acabou o seu tempo de chalaça e palavras cruzadas.
Quem não tem argumentos, com frequência faz estes jogos de dispersão.
Ficou o registo.
JD

Anónimo disse...

Hoc opus, hic labor est
JM