domingo, 15 de novembro de 2009

Guiné 63/74 - P5279: Estórias do Jorge Fontinha (8): A propósito de férias

1. Mensagem de Jorge Fontinha*, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2791, Bula e Teixeira Pinto, 1970/72, com data de 12 de Novembro de 2009:

Carlos Vinhal,
Aqui vai mais uma das recordações da Guiné. Vão saindo a saca-rolhas.
Espero que contribua para se fazer mais um pouco de História.

Um abraço.
Jorge Fontinha


A PROPÓSITO DE FÉRIAS

O Luís Faria abriu um novo capítulo, nas suas Estórias. As férias. Isso leva-me a pensar nas minhas, no ano de 1971.
Parece que, quando tudo está previsto para correr bem, há sempre algo que tem forçosamente de correr mal.

Jorge Fontinha a caminho das Férias

As minhas férias estavam previstas para se iniciarem no dia 10 de Junho de 1971 e tinha avião TAP marcado para o final da tarde do dia 12, vésperas de Santo António, em Lisboa.

No dia 9, apanho a coluna de Bula para Bissau, onde ainda iria almoçar, por sistema, no SOLAR DOS 10, o belo Bife à Solar e a indispensável garrafa 0,75 de Casal Garcia geladinho. É claro que antes, teria de passar pelo Pilão

A tarde é passada na 5.ª Rep, já vestido à civil. Umas cervejolas, bons camarões, umas ostras e boa cavaqueira com uns camaradas de Alijó. Estando já de férias, esperava pelo dia 12, pois ainda queria ir passar o Santo António ao Bairro Alto.
De repente, três valentes estrondos e algo a passar sobre nós, colocou toda a gente em pânico e a correr em todas as direcções, como baratas tontas. Que diabo! Estávamos em Bissau e não era suposto nem previsível um ataque à capital.

Impensável! Os projécteis, em voo rasante, acabaram por cair no rio, ao fundo da avenida e tanto quanto sei, não provocou danos físicos a ninguém. Não sei se houve danos materiais.

Foi a primeira vez que Bissau foi atacada com mísseis e eu tinha que lá estar! Irra...**

Finalmente o dia 12 e o meu embarque. Primeiro, o alívio, depois uma soneca e finalmente a Portela à vista e o aterrar suave sobre a pista. Saída do Aeroporto e tomada de um táxi.

-Para a Baixa, ou antes deixe-me ao Chiado - digo eu ao taxista.

Por alturas da passagem pelos Restauradores, violento estrondo e algo a brilhar nos céus de Lisboa. Segue-se violento ribombar de foguetada, próprio das festas de Santo António. Atónito, pergunto ao taxista, o que se está a passar? O homem olha para mim, não menos atónito e pergunta-me:

- Oh homem, de onde é que você vem?

- Da Guiné e leve-me para uma residencial o mais longe possível daqui!

Levou-me para Oeiras!
Estava mesmo apanhado, não estava?

Um abraço para a Tertúlia
Jorge Fontinha
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 28 de Outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5169: Parabéns a você (37): Jorge Fontinha, ex-Fur Mil da CCAÇ 2791 (Editores)

(**) Sobre o ataque a Bissau no dia 9 de Junho de 1971, vd. postes de:

1 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2146: PAIGC - Instrução, táctica e logística (3): Supintrep nº 32, Junho de 1971 (III Parte): Deslocamentos (A. Marques Lopes)
e
3 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2147: Ainda os ataques com foguetões a Bissau (Carlos Vinhal)

Vd. último poste da série de 31 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4888: Estórias do Jorge Fontinha (7): A nossa Casinha

5 comentários:

Hélder Valério disse...

Caro Jorge Fontinha

Nessa ocasião dos foguetões sobre Bissau estava na chefia do "Centro de Escuta" e, é claro, gerou-se logo alguma ansiedade porque se pensa sempre que as antenas são sempre um ponto de referência...

Quanto ao foguetório do Santo António, parece que foste mais um dos que contribuiu para que as pessoas comuns se aprecebessem melhor de como as situações que se viviam "na guerra de África", estavam a alterar os comportamentos da juventude...
Um abraço
Hélder S.

Anónimo disse...

Amigo Fontinha

Tu "denunciaste-te" com uns foguetes???!!! tsss!
Claro que não estavas nada habituado a esses"sons(???!!!)...compreende-se!!
Ora diz lá,quiseste foi dar uma nas vistas,não?

Pois quando cheguei a Lisboa ,nas férias,não me aconteceu nada semelhante.
A única coisa foi ter ficado a olhar para a porta do elevador como um "boi para um palácio", até a porteira com olhar inquiridor me dizer para carregar no botão de chamada. Claro que agradeci!!

Um gr abraço
Luis Faria

Anónimo disse...

Caro Jorge Fontinha
Se calhar o responsável pelo ataque a Bissau foste tu. Não andariam eles atrás de ti e não te queriam deixar seguir de férias?
Mas foi preciso ter "muito galo" para acertares no dia em que eles resolveram acagaçar o pessoal da capital.
Aliás nessa noite em que atacaram Bissau com 6 foguetes 122, também atacaram ao mesmo tempo: Cumuré, Nhacra, Chugué, Dugal,Bindoro, Jugudul e Mansoa.
Ou seja, mantiveram todas as tropas daquele "corredor" ocupadas, para que não pudessem ir apanhar os que atacaram Bissau, julgo eu.
Abraços
Jorge Picado

Hélder Valério disse...

Pois é verdade, camaradas, nessa ocasião o IN concebeu e levou à prática uma operação com alguma complexidade consistindo, tal como refere o Jorge Picado, em criar 'manobras de diversão' e ao mesmo tempo de condicionamento de acção da NT, ao atacar e/ou flagelar vários locais.
Tenho a idéia de que teriam sido 9 os locais, o que a ser verdade implica acrescentar mais 2 à lista indicada.
Seja como for, o resultado prático do ataque em si foi insignificante.
O que ficou foi então a demonstração de que seria possível (será que seria repetível? já não haveria novidade!) criar alguma intranquilidade na capital, que não seria mais um baluarte inexpugnável, alvo de ataque em dia de comemorações da portugalidade, e moralizando as forças da guerrilha.
Em todo o caso ainda faltavam cerca de 3 longos anos de conflito e muitos mortos e feridos a lamentar.
Um abraço
Hélder S.

M.Castro disse...

Estarei convosco No próximo ano.
Abraço para todos. M. Castro.
( BAR DOS SARGENTOS )