segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Guiné 63/74 - P5163: Viagem à volta das minhas memórias (Luís Faria) (21): A CCAÇ 2791 em Teixeira Pinto - CAOP 1

1. Mensagem de Luís Faria, (*), ex-Fur Mil Inf MA da CCAÇ 2791, Bula e Teixeira Pinto, 1970/72, com data de 25 de Outubro de 2009:

Amigo Vinhal
Com um abraço para ti e demais co- Editores segue outro dos capítulos de “Viagem…” há já uns tempitos interrompidos.

À restante Tertúlia um outro abraço, com votos de paz e serenidade, único modo de conseguirmos objectivar com clareza os eventuais caminhos a percorrer na procura da resolução dos nossos problemas.

Luís Faria


Teixeira Pinto – CAOP 1
Por Luís Faria

Chegados ao nosso novo destino - Teixeira Pinto - e libertos da formatura em Parada na apresentação ao Comando do CAOP 1, há (julgo) que distribuir uns abraços por pessoal do 4.º GCOMB que já lá se encontrava desde o princípio do ano, procurar as novas suites e dar uma vista de olhos aos cantos da casa. Depois e certamente… umas súrbias no agradável Bar dos Comandos, que também passaríamos a frequentar.

O quartel tinha pouco a ver com o de Bula. Era muito maior e se bem me recordo, espraiando-se da cidade até ao rio, com melhores instalações e com muita maior densidade populacional militar.

A FORÇA - CCAÇ 2791 a três GCOMB, colocada às ordens do CAOP, estava prestes a iniciar uma nova etapa naquela ZO do Cacheu, que se iria prolongar por aproximadamente cinco meses, entremeados por três semanas em que os três GCOMB foram deslocados para a defesa de Bissau, dos últimos de Julho a terços de Agosto.

Em coabitação no quartel e em termos operacionais de intervenção, havia uma Companhia de Páras (128?, 127?), outra de Comandos (28ª?, 29ª?) e um Destacamento de Fuzileiros Especiais, para além de um Esquadrão Daimmler (não recordo se este coexistia no mesmo espaço, mas estou em crer que não).

Os três GCOMB da 2791 foram integrar estas forças de intervenção, passando a breve trecho a rodar com elas.

Àquela data era lá a sede do CAOP 1, sob o comando do Cor Pára-quedista Rafael Durão (era mesmo durão !!) que não deu descanso à nossa Companhia durante os meses em que lá estivemos, pondo-nos a trabalhar em força mas com contrapartidas, como adiante explicarei.

Ao Cor Durão, que fazia jus ao seu nome, julguei-o como um homem correcto e forte de carácter, e um Militar de grande carisma e competência. Dizia que os camuflados usados em Operações deviam cheirar a mato (mal) e não a lavados, para se confundirem nos odores daquelas matas onde o embrulho era mais que provável, como viríamos a constatar. Tinha razão, mas não era novidade.

O pessoal da 2791 foi usado em alternância com a tropa especial, como se de uma se tratasse. Actuávamos em bi-grupo (raramente completo) nas matas belicosas de um e outro lado da estrada Teixeira Pinto - Cacheu, passando por norma 36 horas em operação e 24 em descanso.

Provas dadas, começamos a ter direito a alimentação e ração de combate especiais e também a reforço de armamento. Se a memória não me atraiçoa, cada Grupo, quando saía, para além da dotação normal, acrescentava duas MG e mais um lança-rockets, não tendo a certeza de um morteiro 60. As rações de combate passaram a ser iguais às dos Fuzileiros.

Dava gozo e prazer vermo-nos com aquele armamento! Sentíamo-nos confiantes e até…importantes! Não esqueçamos que no conceito(?) de alguém(uns(?)) éramos um Bando do Arame (??!!)! Mas pelos vistos… privilegiado, por essas alturas!!

Que diferença de condições e tratamento comparando com Bula, onde fomos usados e abusados sem qualquer apoio ou contrapartida!!!

Em Teixeira Pinto, o Cor Durão exigia mas, como se vê, proporcionava-nos condições e apoio efectivo. Carregando na mão a sua Kallash chegou mesmo a integrar o bi-Grupo da FORÇA numa operação embrulhada, sob comando do Alf Mil Barros (2.º GCOMB), demonstrando ao pessoal a sua confiança e talvez ao mesmo tempo, aquilatando da nossa preparação e competência.

Para fugir daquela pressão toda a que passamos estar sujeitos, e que fez com que a dada altura o horizonte de futuro pessoal passasse (falo por mim) a ser o dia seguinte, meia dúzia de nós resolveu alugar uma vivenda situada na esquina de uma paralela à avenida principal.

Nela e nos intervalos das operações, o stress passou a ser vencido com cerimónias entre camaradas amigos, em que as frescas bazucas e o Casal Garcia, o Demole com ou sem Coca-Cola, e o petisco, passaram a ser omnipresentes. De certo modo festejávamos mais um dia ganho e tentávamos não pensar no dia seguinte.

Nessas ocasiões, a música ouvida, tocada e cantada muitas vezes a(o) desafi(nad)o, era um dos complementos alienadores dos nossos receios e pensamentos sombrios, levando-nos por vezes para momentos (continuo a falar por mim) desenraizados da nossa realidade e da nossa maneira de ser, transportando-nos em visões animadas e coloridas de esperança, umas vezes, sombrias e difíceis de suportar… outras, que nos isolavam e acabrunhavam!

Quando estas últimas aconteciam… aparecia sempre, pelo menos, um amigo que nos dava o ombro e ajudava a ultrapassar esses momentos mais penosos e difíceis.
Andávamos pelos vinte anos, com uma vida já estropiada e um futuro de incertezas.
A nossa adolescência esfumara-se rapidamente para passado!

Um novo homem ia surgindo, arcando para toda uma vida marcas profundas, ganhas durante essa transição brusca, fora de tempo e afinal… sem reconhecimento e pelos vistos sem sentido!

Luís Faria

Luís Faria em Teixeira Pinto

Teixeira Pinto > Avenida Principal

Teixeira Pinto > Igreja Católica
A nossa vivenda em Teixeira Pinto

Teixeira Pinto > "Cerimónia" na Vivenda

Fotos (e legendas): © Luís Faria (2009). Direitos reservados
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 6 de Setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P4907: Convívios (158): 8.º Encontro da CCAÇ 2791, dia 26 de Setembro de 2009 em Torres Vedras (Luís Faria)

Vd. último poste de 28 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4874: Viagem à volta das minhas memórias (Luís Faria) (20): Adeus Binar, até sempre

9 comentários:

MANUEL MAIA disse...

CARO LUIS,
COM QUE ENTÃO UMA GUERRA COM VIVENDAS E TUDO...
E ALI ESTAVA FOTOGRAFIA A ILUSTRAR.

NÃO HÁ DÚVIDA QUE ATÉ PARA ESTAR NA GUERRA HAVIA FILHOS E ENTEADOS...

A NÓS RESERVARAM-NOS AQUELES BUNGALOWS EM CAFAL BALANTA,SEM DIREITO A RECLAMAÇÃO...

MAS POR OUTRO LADO TIVEMOS A FELICIDADE DE ESTARMOS SOZINHOS POR ALI.
nÃO HAVIA SALAMALEQUES MILITARES,
NÃO HAVIA O PEDANTISMO IRRITANTE (COMO O DO TAL TEN.COR,QUALQUER COISA COELHO QUE REPREENDIA OS ALFERES QUANDO OS APANHAVA A JOGAR COM GENTE MENOR COMO AQUELA PRAGA QUE ERAM OS FURRIEIS...

HOJE,DEPOIS DE LER O QUE ESCREVERAM ALGUNS CAMARADAS QUE ESTIVERAM EM CIDADES OU COISAS PARECIDAS)NÃO TROCAVA O MEU MATO DE ISOLAMENTO TOTAL,A VIVER EM BURACOS ESCAVADOS NO SOLO,
POR NENHUM DESSES "PARAÍSOS"...

É QUE A LIBERDADE DE CIRCULAÇÃO SEM CRUZAMENTOS PERIGOSOS COM GENTE DO TIPO COELHO OU AB,NÃO TINHA PREÇO( AO QUE SEI AGORA...)

UM ABRAÇO
MANUEL MAIA

Anónimo disse...

Caro Luis Faria
Agora que chegaste ao CAOP 1, no dia 25MAI71, tinha eu 22 dias de permanência em T.Pinto, pois cheguei a 4 desse mesmo mês.
No dia 25 apontei "CAÍRAM AS PRIMEIRAS CHUVAS (MUITO POUCA COISA É CERTO) Á NOITE".
Agora compreendo a razão de não me recordar de vocês. Praticamente viviam fora e eu estava lá dentro (do aquartelamento), e as minhas saídas naquele tempo (felizmente para mim) não eram para o "embrulhanço", mas para as localidades a sul do rio Costa(Pelundo), com excepção do Bachile. Quem me escoltava era o pessoal da(s) CCaç(s) de quadrícula(?).
Julgo que quando chegaste, o Cmdt do CAOP ainda era o Cor Art Gaspar Freitas do Amaral, pois o Cor Pára Rafael Durão (que o Graça de Abreu não gosta de escrever o nome!) só deve ter chegado em Junho.
Podes crer que sei muito bem dar valor ao que vocês passaram pois, ainda que não estivesse ligado às operações que era do "pelouro" do Maj Barroco enquanto eu estava ligado ao Maj Santos Costa para os assuntos da ACAP/POP(?), estava sempre conhecedor daquilo que vos calhava em sorte.
Sei que terão muito que contar, podes crer.
Abraços
Jorge Picado

Antonio Graça de Abreu disse...

Pois, o nosso CAOP 1.
Cheguei a Teixeira Pinto em Junho de 1972, fui substituir o alf. Carvalho, que deves ter conhecido, meu caro Faria.
Foram sete meses em Teixeira Pinto, com algumas mordomias, é verdade. Está tudo contado no meu Diário da Guiné, com fotografias e tudo.Depois o CAOP foi transferido para Mansoa, ainda com o coronel Durão, e finalmente para Cufar, em Julho de 1973, com o coronel paraquedista Curado Leitão. Por lá fiquei até Abril de 1974.
No meu Diário da Guiné não escrevi o nome do coronel Rafael Ferreira Durão, o meu comandante. Aparece sempre como coronel D., tal como o major de Operações Pimentel da Fonseca aparece como major P. Quando publiquei o livro o coronel Durão ainda era vivo, estava já muito doente na sua casa de Setúbal, creio, e eu não o quiz magoar. Basta ler o meu Diário para se entender o enorme respeito que tenho por ele, como militar, pela sua coragem. Mas também falo dos murros monumentais que dava nos soldados. O major Pimentel também arraiava nos soldados, Eu sei que eram outros tempos e tal prática não era rara entre os páraquedistas.
Estás a entender, meu caro Picado, porque escrevi coronel D. e não coronel Durão?
Se um dia o meu Diário da Guiné tiver 2ª. edição, escreverei o nome todo, Rafael Ferreira Durão, até porque o coronel merece, era um grande militar.
E tu, Faria, quando saíste do CAOP 1? Ainda nos cruzámos?
Um abraço,
António Graça de Abreu

Manuel Peredo disse...

As três companhias de páras passaram por Teixeira Pinto.Eu pertencia à 122 e foi em Teixeira Pinto que comecei a minha comissão em Novembtro de 1971.Se tiveste conhecimento dos distúrbios entre páras e fuzileiros,eu estava lá e por sinal era eu que estava de sargento de guarda.Por estar de serviço,fui chamado ao gabinete do coronel Durão e confesso que ia com o rabo entre as pernas pois eu já sabia que ele gostava de resolver os problemas a murro,como se veio a verificar.Dessa vez foi sobre um 1°cabo da minha secção que mostrou os seus dotes de pugilista.

Anónimo disse...

Graça Abreu

Não nos cruzamos,pois saimos dessa ZO nos principios de Dezembro de 971.

Quanto ao Coronel realmente parece que gostava de uns pugilatozitos...sem resposta.Mas tambem houve Capitães de colhões que lhe fizeram frente. è uma outra estória.!

Manuel Peredo
Realmente não me recordo.Na altura desses acontecimentos que mencionas,estavamos em Capó,acampamento improvisado com barreiras de terra e instalações concebidas com ramos e folhagem.

O Manuel Maia teria gostado,de certeza.Por lá só havia capinadores e nós.Não havia lugar para "salamaleques" ou "cruzamentos perigosos"como ele refere.

Jorge Picado
Sobre o comando do CAOP não quero jurar,mas estou convencido que foi ao Cor Durão que nos apresentamos.Que me lembre,não conheci outro.

Um abraço a todos
Luis Faria

Anónimo disse...

Caro Graça Abreu
Compreendo perfeitamente a maneira como escreveste e digo-te que para a minha sensibilidade também não gostava daquela forma de tratar as coisas entre os Páras, mas aquilo para mim não era novidade. Já tinha tido outros contactos com essas tropas especiais, nomeadamente em Mansabá e sabia que preferiam ou antes, creio que era norma desde os tempos de instrução, resolverem assim os problemas de RDM, para que as cadernetas nunca ficassem manchadas.
E de entre os militares de carreira que conheci, foi talvez aquele que admirei pela sua coragem.
Agora quanto ao Maj Pimentel da Fonseca que referes ter sido Of Oper, creio já não ser do meu tempo.
Luís Faria
Quanto à "instância balnear" de Capó, de que o Manuel Maia teria gostado, diz-me lá se ela não estava situada no lado Sul e perto duma zona em que a "estrada" fazia uma grande curva quase em angulo recto e com vários "carreiros"?
É que dou tratos à imaginação para situar uma foto tirada num meio, quando vinha do Cacheu.
Abraços
Jorge Picado

Anónimo disse...

Uma ligeira correcção ao comentário que acabo de enviar.
Quanto ao falecido Cor Durão, deve ler-se "MAIS admirei".

Sobre a foto que me refiro, faltou-me a palavra "aéreo", ou seja "tirada num meio aéreo".
Jorge Picado

Jorge Fontinha disse...

Por ter andadado acupado com outros afazeres, ainda não tinha tido oportunidade de deitar uma vista de olhos pelo Blogue, pelo que ainda o não comentei.Tenho sido dos primeiros a faze-lo, nomeadamente quando são teus, todavia, os últimos por vezes podem ser os primeiros.Folgo tenhas chegado finalmente a Teixeira Pinto, onde a nossa envolvência se irá novamente restabelecer.No meu último Post., já havia referênciado a vivenda que nos servia de repouso e á qual dediquei quase em exclusivo, o texto.Foram bons momentos, que eu por já não ser "Pira" em Teixeira Pinto, usufruí mais intansamente.É a partir desta altura que nos envolvemos mais abertamente em Operações de grande envergadura e nomeadamente a que mensionaste, com o Sr.Coronel Rafael Durão.Foi um grande Ronco...Quase que ias disparando sobre uma mulher com o "Puto" ás costa, quando emergia da Bolanha para não sufocar!Valeu os teus tão famosos reflexos, para o evitar.Essa operação ficou-me sempre gravada pois veio na sequência duma outra ao mesmo local, 12 horas antes...
Foi uma das delibrações dadas na hora, pelo Sr. Coronel, por uma imprudência de relatório, no final da primeira...
Nessa 1ª eu até me tinha dedicado tanto á minha especialidade de conduzir rápido e eficientemente tanto á ida ao obgectivo como a evita-lo, contorna-lo e retirando o mais rápido possível...Lembras-te que o Antonino Chaves até me apelidou de "inhalazinho"?Não era por acaso que todos vós preferiam que eu fosse á frente, com o inseparável Octávio Domingos!
Insto é apenas um cheirinho.Havemos de nos esbarrar noutros.
Aquele abraço.
Jorge Fontinha

Júlio César Ferreira disse...

Luís amigo
Foi efectivamente nesse dia 6 de Junho que foste de férias. Lembro-me bem. Eu tinha chegado um dia antes. Encontramo-nos em Bissau, lembras-te? Penso que no Café Portugal. Sabia que logo após as minhas férias, que tinham começado em maio, voltaria para o Cacheu, onde estava o resto da CCAÇ. 2659, a minha Cª. Mais tarde, já depois de teres regressado de férias, voltei a T.P. e aí bebemos uns bons copos. Fui visitar-te a Capó e mais tarde, já no Cacheu, comemos peixe da tabanca acompanhado com White Horse. Agora uma correção... O Rafael Durão chegou a T.P. pouco antes de eu ir de férias, portanto no inicio de Maio de 1971, acho eu...
Um grande abraço
Júlio César
C.Caç. 2659 - Cacheu
B.Caç. 2905 - Teixeira Pinto
1970/1971