sábado, 8 de agosto de 2009

Guiné 63/74 - P4800: Em busca de... (85) O Fiat do Pilav Gil foi abatido em Janeiro ou em Março de 1974? (José Rocha)

1. Mensagem de José Rocha, Operador de Transmissões do BART 2857, Piche, 1968/70, emigrante em França, com data de 14 de Março de 2009, endereçada ao nosso camarada Francisco Palma:

Caro Amigo

Fui Op de TRMS do BART 2857, Piche de Nov68 a Ago70.

Como li vários comentários sobre Canquelifá de 72/74 feito por pessoas que nunca lá puseram os pés, o que eu li, feito por um operador de mensagens que esteve em Nova Lamego, que ajudou a descarregar dos helicópteros vários mortos e feridos, que os mortos ficavam lá na pista e que os feridos iam no Dakota para Bissau.

Também li que um Fiat tinha sido abatido em Março. Ora o mesmo Fiat do Piloto Gil tinha sido abatido em Janeiro e não em Março.

O Blog da Força Aérea indica que o Piloto foi a Dunane e depois até Piche e de lá para Bissau.

Será possivel saber a verdade?

Um abraço
José

Fiat G-91 da FAP
Foto de Soares da Silva, com a devida vénia



2. No dia 15 houve a seguinte troca de mensagens:

- Francisco Palma respondia ao José Rocha:

Caro J. Rocha

No meu tempo, de Agosto 1970 a Junho 1972, em Canquelifa, tivemos 4 mortos. Um em combate, 2 (1 Alferes e um milicia) por acidente com uma armadilha nossa, e outro suicidou-se.

Sofremos 15 ataques mais dois com misseis (foguetões 122) ao aquartelamento, e dois africanos foram feridos por rebentamentos de duas minas antipessoais e eu com o Unimog deflagrei uma mina anticarro, ficando eu ferido.

Em Piche ocorreu um acidente com uma roquete que rebentou dentro da caserna acionando o rebentameno de uma caixa de granadas de morteiro 60, ocasionando 4 mortos e vários feridos, 2 muito graves.

Quanto à estória do Fiat nunca ouvi nada, não posso comentar.

Houve uma Companhia de intervenção que sofreu várias baixas na nossa zona, mas não tantos para entupir a aviação de Nova Lamego.

Quanto a esses mortos que ouviste, não foram do meu Batalhão e nem ouvimos esses comentários

Um abraço e boa sorte
F. Palma


- Francisco Palma dirigia-se ao Blogue:

Bom dia Carlos Vinhal
Será possivel os arquivos do nosso blogue esclarecer melhor este nosso camarada emigrante em França?

Obrigado e um abraço
Francisco Palma


- Dirigi esta mensagem aos outros editores e ao nosso camarada Pilav Miguel Pessoa:

Boa noite a todos
Algum dos meus amigos poderá confirmar os desmentidos do camarada Rocha?

Um tri abraço e votos de uma boa semana.
Vosso camarada
Carlos Vinhal


- Resposta de Miguel Pessoa:

Caro Carlos;

O texto reproduzido há umas semanas no blogue sobre a "História do Strela na Guiné" está correcto no essencial.

O Ten. Gil foi abatido em 31JAN74, fugiu para o norte embrenhando-se no Senegal, onde dormiu; no dia seguinte chegou a uma tabanca onde negociou uma boleia de bicicleta que o levou a Dunane; não satisfeito com o pessoal do quartel (eram africanos) resolveu prosseguir até ao aquartelamento de Piche. Aí foi recuperado por um avião da Força Aérea (Dakota?) que o levou para Bissalanca.

A única dúvida que ainda tenho é sobre a identificação rigorosa de qual o aquartelamento a que o Ten. Gil fazia o apoio de fogo - Copá ou Canquelifá? Eu tinha a idéia que seria Copá, pelo que me foi dito na altura - mas estive de folga nesse dia e tenho que confiar no que o António Martins de Matos refere - Canquelifá.

Mas continuo com algumas dúvidas, pois a ejecção foi quase junto à fronteira - e quem andava aflito naquela altura era o pessoal de Copá.

Abraço.
Miguel Pessoa
__________

Notas de CV:

Sobre os Strela na Guiné, ver postes de:

9 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3859: FAP (6): A introdução do míssil russo SAM-7 Strela no CTIG ( J. Pinto Ferreira / Miguel Pessoa)

16 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4197: FAP (23): O poder aéreo no CTIG, 'case study' numa tese de doutoramento nos EUA (Matt Hurley / Luís Graça)

26 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4418: O poder aéreo no CTIG: uma pesquisa de Matthew M. Hurley, Ten Cor, USAF: Trad. de Miguel Pessoa (1): Parte I

27 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4423: O poder aéreo no CTIG: uma pesquisa de Matthew M. Hurley, Ten Cor, USAF: Trad. de Miguel Pessoa (2): Parte II

27 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4430: O poder aéreo no CTIG: uma pesquisa de Matthew M. Hurley, Ten Cor, USAF: Trad. de Miguel Pessoa (3): Parte III (Bibliografia)

Vd. último poste da série de 7 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4795: Em busca de... (84): André Manuel Lourenço Fernandes, ex-Fur Mil não sabe o número da sua Companhia (José Martins/Carlos Vinhal)

4 comentários:

Amilcar Ventura, Furri. Mecân. 1ª Comp. 8323 disse...

Amigo e Camarada de Guiné Miguel Pessoa o Fiat abatido a tiro em 31 de Janeiro de 1974 foi em Copá, estava lá um pelotão da minha Companhia e tinha pedido apoio aéreo e um Strela mandou-o abaixo, eles viram o pilote se injectar e saíram logo vários homens há procura do piloto, e durante alguns dias decorreram várias operações, mas todas elas sem o encontrar, até que soubemos da história com a bicicleta.

JD disse...

Camaradas,
Li recentemente um texto policopiado do sold.condutor António Rodrigues(?), que se refere aos dias que antecederam a saída de Copá, e cita que no dia 31 foi abatido um Fiat. Não refere naturalmente o nome do piloto, mas tudo leva a crer ser este o evento.
Abraços
J.Dinis

Hélder Valério disse...

Caros amigos e camaradas, em particular o José Rocha, das Transmissões do BART 2875 de Piche.
Como parece que o que escrevi é muito extenso, vou dividi-lo em duas partes que devem ser lidas de seguida.
Não sou a pessoa mais indicada para responder às dúvidas que ele apresenta e mesmo um ou outro aspecto não entendo bem.
No entanto vou tentar alinhar algumas informações/respostas que podem ajudar.
Na área onde o José Rocha esteve, Piche, já pudemos ler aqui no Blogue que a organização territorial mudou à medida da evolução do esforço de guerra e das suas vicissitudes. Não indo mais atrás no tempo, temos que o BART 2857, esteve na zona de 68 a 70, sendo depois substituído de 70 a 72 pelo BCAV 2922, o qual, por sua vez foi substituído pelo BCAÇ 3883. Os dois últimos Batalhões tinham como área, para além da "sede", Piche, Companhias colocadas em Buruntuma e Canquelifá e seus Destacamentos, sendo que o do José Rocha também tinha inicialmente Bajocunda, salvo erro.
Também se fala muito de Copá, que pertencia organizacionalmente a Pirada, mas que, segundo o livro/relato da história da CCAÇ 3545 feito e publicado por Fernando Sousa Henriques, Alf. Mil. Op. Esp. daquela Unidade, como ficava no limite da sua área de intervenção, era algumas vezes apoiada por eles.
Sobre os "comentários sobre Canquelifá de 72/74 feito por pessoas que nunca lá puseram os pés", não sei bem a que é que o José Rocha se refere, mas é realmente verdade que há um P1216 de António Santos, das Transmissões do Pelotão de Morteiros 4574/72 que na época estava adstrito ao Batalhão sediado em Nova Lamego e que diz: "Copá foi extinto em 14 de Fevereiro de 1974, após violentas flagelações, Mareué idem em 11 de Março de 1974, mas o aquartelamento mais sacrificado foi o de Canquelifá, que sofreu flagelações a toda a hora. Neste caso a arma mais utilizada foi o morteiro 120, e houve abrigos que não resistiram.

A 20 de Março de 1974, entrou em cena o Batalhão de Comandos Africanos, com as três companhias que dele faziam parte integrante. Saíram de Nova Lamego em coluna composta por viaturas militares e civis e dirigiram-se para o local. A operação durou 3 dias, de 21 a 23 de Março 1974. Segundo os canhenhos militares, capturaram 3 Mort. 120, 1 RPG, 2 espingardas, 367 granadas de Morteiro e deixaram 26 mortos do lado IN (do nosso lado nada dizem)...

Mas cá o rapaz, no dia 22 [de Março de 1974], como não fazia nada, e porque o condutor da ambulância era do meu pelotão e foi chamado à pista, eu fui com ele. Chegados ao local, era um vaivém de helicópteros que traziam mortos e feridos. Eu dei uma mãozinha para pegar nas macas. Retirava dos Helis e, segundo instruções do médico, ora pousava na pista (estava morto), ora colocava num Dakota que estava logo ali (estava muito ferido)... Vi pernas destroçadas por estilhaços de não sei de quê!"
Calculo que a referência aos tais "comentários sobre Canquelifá por pessoas que nunca lá puseram os pés" seja, de facto, retativa ao que o António Santos relata, mas fico sem saber se o que o José Rocha pretende é algum tipo de esclarecimento sobre o que o António Santos diz, por se estar a falar dum local que em tempos anteriores tinha pertencido à área de acção do Batalhão do José Rocha e ele, José Rocha, não ter tido conhecimento (o que o A. Santos refere é passado em Março de 74...) ou porque a "coisa" lhe parece "mal contada".

Hélder S.

Hélder Valério disse...

2ª parte

Nessa época eu também já não estava na Guiné, por isso só posso "ajudar" relatando o que a propósito está no tal livro com a história da CCAÇ 3545, Companhia que estava em Canquelifá, e que diz, para esse dia:
"A 22 de Março, pelas 08H30, um grupo IN, estimado em mais de 200 elementos, emboscou uma coluna constituída por duas Chaimites, uma White, três Berliet e quatro Unimog, no itinerário Piche-Nova Lamego, na região de Bentem, causando às NT 6 mortos, 15 feridos graves e 3 feridos ligeiros, que se discriminam a seguir".
No livro referido ("No Ocaso da Guerra do Ultramar", de Fernando de Sousa Henriques) apresentam-se então os nomes dos vitimados, que foram:
-mortos: Fur. Manuel Joaquim Sá Soares, responsável pela Chaimite; Fur. José António Teixeira, responsável pela White; Sold. Vítor Manuel Jesus Paiva; Sold. João da Costa Araújo; Sold. Bambo Nanqui; Sold. Bailo Baldé.
- feridos graves: Fur.Carlos Manuel Fanado (ficou sem as duas pernas); Fur. Carlos M. Charifo; Fur. Cherno Jaló; 1º Cabo Manuel da Silva Saavedra; 1º Cabo Silvino Neto de Matos; 1º Cabo José Bacar Sané; Sol. Adelino Dias; Sold. Numar Camará; Sold. Carlos Alberto Queba; Sold. Braima Balde; Sold. Seco Maru Baldé; Sold. Rachide Bari; Sold. Ingala Embaló; Sold. Pedro Dias; Sold. Ba Turé.
- feridos ligeiros: Fur. Pedro Manuel dos Santos; Sold. Joaquim Rolando Pinto; Sold. Domingos Dias Salgado.
Após a listagem das nossas baixas, o relato remata com " nesta forte emboscada, em que o IN, que se encontrava instalado do lado Sul da estrada e com elementos seus em cima das árvores, sujeitou toda a coluna a intenso fogo de RPG-2 e RPG-7, assistiu-se, logo de início, à destruição de 1 viarura Chaimite, que ardeu juntamente com o condutor e o Furriel que a comandava, de 1 White e de 1 Berliet. O IN capturou ainda 3 espingardas G3, 1 metralhadora HK21 e 1 Racal TR-28. De registar o facto de o 1º Cabo Augusto Nunes da Graça ter resgatado da Chaimite, já em chamas, o Capitão Fernando Ferreira e o Furriel Pedro Santos".
Espero que estes dados possam ajudar o António Santos a dar corpo à notícia que tinha dado antes sobre as consequentes evacuações a partir de Nova Lamego e que possam também satisfazer as dúvidas do José Rocha.
Aproveito para relembrar o José Rocha que ao tempo dos acontecimentos acima descritos a estrada Piche-Nova Lamego já era toda alcatroada e bem desmatada em ambos os lados, o que dava uma (falsa) sensação de segurança, pela ideia que se tinha que seria possível ver á distância qualquer problema que o IN eventualmente pretendesse colocar.
Isto que acima relatei foi o que aconteceu em parte do 1º trimestre de 74, sendo que no que diz respeito aos tempos de 70-72, ou seja do Batalhão que sucedeu ao do José Rocha, isso já está no que o Francisco Palma escreveu.
No que diz respeito à questão do Fiat abatido, na zona, tudo o que li, no Blogue e no livro que dei conta, foi de facto em 31 de Janeiro de 74. O mês de Março foi também muitas vezes indicado como um mês funesto para a nossa FAérea, por força dos abates de Fiat's, mas em 1973, nunca vi nada referido a 74, mas também não consigo ler tudo.
Relativamente à história do piloto do avião abatido em 31 de Janeiro, que andou pelo Senegal, utilizou bicicleta, passou por Dunane e foi até Piche, já foi tudo contado, recontado e reafirmado.
Espero ter ajudado.
Um abraço
Hélder S.