quinta-feira, 12 de março de 2009

Guine 63/74 - P4017: As abelhinhas, nossas amigas (2): Desbaratavam uma coluna, uma companhia, um batalhão... (Rui Silva)

1. Mensagem do Rui Silva (ex- ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67):

Caros Luís, Vinhal e Briote:

Muita saúde e bom humor nas Vossas pessoas é para já o meu primeiro e grande desejo.

Envio-vos um trabalho sobre as abelhas africanas e conto alguns estragos que elas fizeram na 816.

Julgo que sobre as abelhas na Guiné devem haver muitos camaradas nossos com histórias para contar. Não sei se este trabalho terá cabidela no Blogue. Se não tiver, passem adiante e tudo como dantes. Sempre amigos. Um abraço, Rui Silva


2.ABELHAS (*)
por Rui Silva

Caro Luís;

Abriu-se aqui há pouco um item no Blogue sobre o macaco-cão na Guiné e com histórias muito interessantes. E porque não abrir agora um item sobre as abelhas (as célebres abelhas africanas) que não queriam mesmo nada com os Tugas ?

Ai daquele que lhes tocasse ou fizesse ruído perto!

Deve haver por aí “menino” que terá muito que contar… É curioso que, em praticamente 2 anos, nunca foi picado por uma abelha que fosse, mas foi mordido por um macaco-cão!Este, propriedade de um militar da 643 (Olá, Águias Negras, da 643) estava preso junto à tasca da D.ª Maria e do Sr. Maximiano (julgo cabo-verdianos) aonde íamos comer, em Bissorã.

Metia-me sempre com ele puxando-lhe o pelo sobre a cabeça, mas, num certo dia, ao tentar recuar com mais rapidez do que ele investia, estava um colega atrás de mim que me atropelou…

ABELHAS!!!... era este o grito de alerta. Era este o grito que fazia o pessoal da Companhia, a correr a sete pés.

Assustava mais este grito, que o grito ”Aí estão eles!”, grito que acontecia no milésimo de segundo imediato a um tiro do inimigo.

Duas histórias para contar:

Certa vez, vinha a Companhia de regresso ao quartel de Olossato e, como sempre, extenuada, de uma operação muito perto da base de Morés.

Sei que naquela zona evitávamos sempre que possível os trilhos, pois sabíamos e alguns até, infelizmente, na pele, que naqueles trilhos era frequente aparecerem minas anti-pessoais.

A certa altura, já perto do aquartelamento do Olossato (aproximadamente 1 Km.), voltamos inevitavelmente a um trilho.

Vínhamos em fila indiana e, cada um, como já era usual, vinha com a atenção redobrada, o coração a rebater forte e a respiração sustida e vinha a ver aonde o da frente punha os pés para pôr os dele também, pois assim julgava livrar-se ele da causa directa do accionamento duma mina e das respectivas consequências. Lembro que o indivíduo que tinha a desdita de pisar uma mima A/P, normalmente ia a bota e o pé dentro pelos ares. Esta atenção obrigava a Companhia a deslocar-se com alguma lentidão e morosidade.

Chegou-se até fazer o levantamento de uma mina A/P.

De repente, um pouco atrás de onde eu ia na coluna, alguém grita: ABELHAS!!! Foi como o tiro de pistola num prova de 100m, nas Olimpíadas.

Toda a gente enceta uma correria (que me fez lembrar o filme “A Revolta dos Cossacos” onde neste filme vê-se uma frente alongada de soldados a fugir) em direcção ao quartel. Esqueceram-se as minas, deixou-se o trilho, acabaram os cuidados com emboscadas e… foi, mas, um “ver se te avias”.

Um nativo, ao arrancar num arbusto uma espécie de lianas ou coisa parecida, para fazer uma rodilha para pôr as granadas de morteiro à cabeça, não reparou que estava lá um enxame, daí…

Lembro-me que um pouco depois, já no quartel, vi o Flector irreconhecível. As pálpebras de tal modo inchadas e os lábios mais grossos do que os de um nativo, a cara e o pescoço todo inchado, se não me dissessem que era o Flector (o morteirista da minha secção) eu julgaria que estava ali um extra-terrestre. Houve um colega que chegou mesmo a perguntar-me se eu conhecia dalgum lado aquela figura. Confesso que estive longos segundos a ver se acertava.

Mas não passou do susto… e das pequenas, e logo contornadas, consequências para o Flector, que com mais injecção menos injecção ficou logo pouco tempo depois operacional. (Ai a força dos 20 anos!)

Mas não foi só o Flector o atingido. Houve muitos a queixarem-se

Houve mais alguns casos (isolados) com as abelhas, mas tudo passava passadas algumas horas e com tratamento na enfermaria.

Soube no entanto mais tarde, através de um oficial, hoje na reforma, que houve um caso numa outra Companhia, que um soldado foi vítima de tal ataque das abelhas, que praticamente o cobriram, e que ele num acto desesperado matou-se com a sua própria G3. Foi verdade? Vai pelo mesmo graveto. Se alguém sabe efectivamente deste caso, pode contar. Eu rendo desde já sentida consternação e o lamento pelo infortúnio desse infeliz camarada.

O meu camarada Martins (Furriel também da 816), também tem uma história para contar, quando foi picado por grande quantidade de abelhas, quando foi pôr abaixo, julgo com TNT, uma árvore de grande porte, junto ao aquartelamento de Olossato e que vinha servindo de abrigo ao inimigo sempre que este nos vinha “visitar”. Deu-se o estoiro e… estava lá um enxame… e elas escolheram-no a ele…

O Martins apareceu cheio de pintas vermelhas (parecia a rubéola) mas dizia ele que não lhe doía mas a quem olhava para ele até parecia que ficava mesmo com dores.


3. Algumas curiosidades sobre as Abelhas (reproduzido com a devida vénia...)

Abelhas (Apis mellifera) são insectos himenópteros (com 2 pares de asas membranosas) que polinizam as plantas, produzem mel… e também picadas mortais.

Há cerca de 20.000 espécies de abelhas no mundo. O seu tamanho varia de 2 mm a 4cms. Algumas são pretas ou cinzentas, mas há as de cor amarelo brilhante, vermelhas, verdes ou azul metálicas.

As abelhas africanas ou “abelhas assassinas”, são originárias do Leste da África e são mais produtivas e muito mais agressivas.

São menores e constroem alvéolos de operárias menores que as abelhas europeias. Sendo assim, suas operárias possuem um ciclo de desenvolvimento precoce (18,5 a 19 dias) em relação às europeias (21 dias), o que lhe confere vantagem na produção e na tolerância ao Ácaro do género Varroa.

Possuem visão mais aguçada, resposta mais rápida e eficaz ao feromônio de alarme. Os ataques são, geralmente, em massa, persistentes e sucessivos, podendo estimular a agressividade de operárias de colmeias vizinhas.

Ao contrário das europeias, que armazenam muito alimento, elas convertem o alimento rapidamente em cria, aumentando a população e libertando vários enxames reprodutivos.

Migram facilmente se a competição for alta ou se as condições ambientais não forem favoráveis.

Essas características têm uma variabilidade genética muito grande e são influenciadas por factores ambientais internos e externos.

O ferrão da abelha, que se situa na extremidade posterior do abdómen da abelha fêmea, é um sistema complexo, compreendendo uma parte glandular, na qual se produz o veneno, e uma estrutura quitinosa e muscular, que serve para ejecção do veneno e profusão e introdução do ferrão. Apresenta rebarbas na sua superfície que dificultam sua saída, de tal sorte que, após a ferroada, todo o sistema é destacado, permanecendo na vítima. E a abelha morre logo a seguir. Geralmente, a profundidade de inserção é de 2 a 3 milímetros. No local, movimentos reflexos de sua estrutura muscular fazem com que o ferrão se introduza cada vez mais.

Na rainha, as farpas do ferrão são menos desenvolvidas que nas operárias e a musculatura ligada ao ferrão é bem forte para que a rainha não o perca após utilizá-lo.



Um cacho de Abelhas algures (podia ser ....na Guiné.. Ai daquele que lhe tocasse ou fizesse barulho perto!!! ... Impressionante, eram milhares de abelhas)


P.S. - Foto e texto em itálico tirados do sítio Abelhas (com a devida vénia..)

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Nota de L.G.:

(*) Vd. poste anterior desta série > 10 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4008: As abelhinhas, nossas amigas (1): Com NEP ou sem NEP ... (Luís Graça / António Matos)

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