terça-feira, 3 de março de 2009

Guiné 63/74 - P3966: Nuvens negras sobre Bissau (8): Verto uma lágrima por ti, Povo Irmão (Vasco da Gama)

Guiné > Região de Tombali > Aldeia Formosa > Janeiro de 1973 > CCAV 8351 (1972/74) > Festa do carneiro, Janeiro de 1973. O Cap Mil Vasco da Gama, seguindo atrás do Cherno Rachide, o mais alto dignatário muçulmano da Guiné, aliado do PAIGC, no início da luta, na altura em que Nino era um jovem comandante, no sul, e depois aliado dos tugas, no tempo de Spínola...

Foto: © Vasco da Gama (2008). Direitos reservados

1. Mensagem de Vasco da Gama:



Não a esta ordem de poder!
Não a estes poderosos!



Não há petróleo!
Não há diamantes!
Não há riquezas fáceis!
Como enriquecer rápido, como esses que têm tudo?
Narcotráfico, leio, espantado, no nosso blogue e ouço nas notícias!
Nem precisamos produzir! Basta-nos entregar!
Porque não? Estamos de acordo!
Respondem dirigentes de corpo anafado e luzidío!
O lucro é fácil e a partilha também!
Para nós, somos uma dúzia,:
A abastança,
a opulência
a fartura,
o luxo,
a ostentação,
a ganância insaciável...
Para o povo,
A miséria,
o sofrimento,
a dor,
a mágoa,
os infortúnios,
as privações...
Povo da Guiné, Povo Irmão,
Povo desgraçado que nasceste para sofrer,
Mesmo assim, com um sorriso lindo nos lábios!
Paz, Felicidade, Progresso,
Tão fácil e tão longe..
è por ti Povo Irmão que eu verto uma lágrima.

Vasco da Gama

___________

Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste desta série > 2 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3965: Nuvens negras sobre Bissau (7): Ao combatente Nino Veira, um poema de Joaquim Mexia Alves

2 comentários:

Anónimo disse...

Camarada Gama
Acabei de colocar um comentário no Postado do Mexia Alves.
Não vou repetir, apenas dizer que por outras palavras te expressas-te igualmente de forma sentida e bem.
Daqui o meu acompanhamento.
Jorge Picado

joão coelho disse...

O assassinato de Amilcar Cabral constituiu uma perda irreparável para o PAIGC e para a África sub-sahariana. Homem profundamente marcado pela cultura portuguesa - era adepto ferrenho do Benfica, apreciador da nossa culinária e do nosso vinho - sempre fez a distinção, na sua luta, entre o povo português e o sistema colonial. Julgo que, se tivesse sobrevivido à guerra, a Guiné - e até a África negra - teriam tido um futuro diferente.
Entretanto, a divisão entre guineenses e caboverdeanos a seguir à independência, fez com que os melhores quadros saíssem da cena politica de Bissau, ficando o poder entregue aos homens da guerrilha, bons combatentes, mas sem preparação intelectual para as tarefas de construção de um país novo. O primeiro sinal dessa debilidade surge quando, ganha a independência, o grande projecto para o país é o de.. construir automóveis..qualquer coisa de absurdo num território que tinha acabado por passar por uma guerra tão violenta. O resto, era previsível; depois de algum tempo de calma, desencadeia-se a luta pelo poder, entre antigos camaradas de armas e, pelo meio, vão aparecendo pseudo-investidores, alguns portugueses, que mais não buscam que a delapidação dos recursos guineenses,nomeadamente no sector das pescas. Quando lá estive, no começo dos anos 90, já a situação era confrangedora; por exemplo, os funcionários públicos não eram pagos à meses, em Bissau vivia-se de expedientes e da ajuda que os franciscanos e os missionários italianos iam conseguindo distribuir pela população.
Havia, no entanto, um oásis; um grupo de jovens,que, trabalhando para um Instituto oficial (já não recordo a designação correcta, era qualquer coisa tipo Instituto para o Desenvolvimento) avançava com estratégias interessantes para o futuro do país. Carlos Lopes, hoje alto funcionário da ONU, era um dos elementos desse grupo que, julgo, se desfez com o passar dos anos. Tudo isto faz impressão,num país que possui, com abundância, algo que é um "tesouro" em África: a água.
Pela nossa parte, também não soubemos construir uma relação efectiva com os PALOP's - basta lembrar que Portugal foi, se não erro, o 53º país a reconhecer Angola, porque Mário Soares não gostava do MPLA - não entendendo que, para além da Europa, era vital que tivessemos sabido manter uma ligação, forte, com as ex-colónias. Porque tive a sorte de estar nos 5 países de lingua portuguesa em África, pude ver como a chamada "cooperação" era isso mesmo..um simulacro de cooperação, sempre a esbarrar em más vontades e inépcias, apesar dos frequentes discursos a prometer grandes empenhamentos. Criou-se entretanto a CPLP, mas não se têm visto resultados da sua actividade,para além das polémicas relativas às benesses recebidas por alguns dos seus responsáveis.
Salvam-se as ONG's, algumas acções das Igrejas, católica e protestante, e atitudes de cidadãos, do nosso país ou dos PALOP's, que vão procurando, na medida das suas possibilidades, alterar, por pouco que seja, a situação.
Pelo meio, vou conhecendo jovens guineenses formados, quer em Cuba ou na antiga URSS, nas mais diversas profissões que, terminados os cursos, optam por ficar em Portugal, por falta de condições de vida na Guiné-Bissau. E também vou vendo o cada vez maior número de cidadãos guineenses que chegam a Lisboa, fixando-se aqui..dando até a impressão que, um destes dias, não haverá população em Bissau.
No entanto, quando penso na Guiné, tenho sempre presente, um "fantasma" ainda mais grave: o de um conflito entre etnias da Guiné..julgo que com Kumba Yalá se andou por lá perto..mas espero bem que não se chegue a esse ponto, para bem - o bem possível - de um país que marcou tão profundamente gerações de portugueses (como se constata neste blogue).

João Coelho