terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Guiné 64/74 - P3905: PAIGC Actualités (Magalhães Ribeiro) (4): O nº 54, Outubro de 1973, dedicado à proclamação da independência: pp. 7-8

IV (e última) parte da revista mensal PAIGC Actualités, nº 54, Outubro de 1973, um número histórico de que nos foi enviado uma cópia, digitalizada pelo nosso amigo e camarada Eduardo Magalhães Ribeiro, mais conhecido na Tabanca Grande como o pira de Mansoa.

O Eduardo foi Fur M Op Esp na CCS do BCAÇ 4612 (Guiné, 1974). Como ele gosta de recordar, foi o útimo português a arrear, em 9 de Setembro de 1974, a última bandeira portuguesa no antigo CTIG, no quartel de Mansoa, na presença de representantes do PAIGC que, por sua vez, hastearam a bandeira da nova República da Guiné-Bissau.



As páginas 7 e 8, agora transcritas, foram traduzidas do francês para português pelo Vasco da Gama, ex-Cap Mil da CCAV 8351, os Tigres de Cumbijã (1972/74). (*)







Militante nº 1 do nosso PARTIDO e fundador da nação, AMÍLCAR CABRAL - inspirador e dirigente de todas as mudanças e realizações efectuadas no nosso país durante os últimos dezassete anos, tinha anunciado a 31 de Dezembro de 1972, na sua mensagem de ano novo ao nosso povo e aos novos combatentes, um acto transcendente da história do nosso povo :


O NASCIMENTO DO NOSSO ESTADO SOBERANO
















Foto ( a toda a largura das pp. 7 e 8) (legenda): "Fiéis á memória imortal do nosso Partido, os 120 representantes legítimos do nosso povo completam a tarefa daquele que está nas origens de todas as nossas vitórias".

"No decurso do corrente ano e logo que possível e achado conveniente, reuniremos a Assembleia Nacional Popular da Guiné, para cumprimento da primeira missão histórica de que foi incumbida: a proclamação do nosso Estado, a criação de um executivo para esse Estado e a promulgação de uma lei fundamental - a primeira Constituição da nossa história- que constituirá os fundamentos da vida activa da nossa nação africana.

"Quer isto dizer: Representantes legítimos do nosso povo escolhidos pelas populações e eleitos livremente por cidadãos conscientes e patriotas do nosso povo:servirá para afirmar perante o mundo que a nossa nação africana forjada na luta, está irreversivelmente decidida a caminhar para a independência, sem esperar pelo consentimento dos colonialistas portugueses, e que portanto baseado neste princípio, o Executivo do nosso Estado, será sob a direcção do nosso Partido, o PAIGC, o único, verdadeiro e legítimo representante do nosso povo face a todos os problemas nacionais e internacionais que lhe digam respeito.

"Da situação de colónia que dispõe de um movimento de libertação, cujo povo já libertou durante os dez anos de luta armada a maior parte do território nacional, passamos à situação de um país que dispõe do seu próprio Estado e que tem uma parte do seu território nacional ocupado por forças armadas estrangeiras.

"Esta mudança radical na situação do nosso país corresponde à realidade concreta da vida e da luta do nosso povo da Guiné, baseando-se nos resultados concretos da nossa luta, e tem o apoio firme de todos os povos e governos africanos, tal como de todas as outras forças anti- colonialistas e anti - racistas de todo o mundo.

"Enquadra-se nos princípios da Carta das Nações Unidas e nas resoluções adoptadas por esta organização internacional, nomeadamente na sua XVII sessão.

"Nada, nenhuma acção criminosa ou manobra ilusionista dos colonialistas portugueses impedirá que o nosso povo africano senhor do seu próprio destino e consciente dos seus direitos e deveres, dê este passo transcendente e decisivo em direcção ao objectivo fundamental da nossa luta: a conquista da independência nacional e a construção, na paz e na dignidade reconquistadas, do seu verdadeiro progresso, sob a direcção exclusiva dos seus próprios partidários e sob a bandeira gloriosa do nosso Partido.

«...Futuramente, com a evolução da nossa luta, criaremos igualmente a primeira Assembleia Nacional Popular nas Ilhas de Cabo Verde. A reunião conjunta dos membros destes dois organismos formará a Assembleia Suprema do povo da Guiné e de Cabo Verde".


Total apoio dos Países não-alinhados ao movimento de libertação nacional

O nosso camarada Aristídes Pereira, secretário geral do Partido, assistiu á quarta Conferência magna dos Países não alinhados que teve lugar em Argel de 5 a 9 de Setembro. O nosso dirigente foi indicado para usar da palavra em nome dos movimentos de libertação africanos.

A conferência dos chefes de Estado e dos governos dos países não alinhados, ao tomarem conhecimento que o nosso Partido vai em breve proclamar o Estado da Guiné Bissau, pediu aos estados membros do movimento dos não-alinhados, que apoiem política e diplomaticamente o nosso Estado, logo que este seja proclamado.


PAIGC ACTUALITÉS - Boletim de informação editado pela Comissão de Informação e Propaganda Comité Central do PARTIDO AFRICANO PARA A INDEPENDÊNCIA DA GUINÉ E CABO VERDE. Correspondência: C.P. 298 - Conacri (República da Guiné) - C. P. 2319 - Dacar (Senegal)
__________

Nota de L.G.:

(*) Vd. postes anteriores desta série:

2 de Fevereiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3828: PAIGC Actualités (Magalhães Ribeiro) (1): O nº 54, Outubro de 1973, dedicado à proclamação da independência: pp. 1-2

5 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3846: PAIGC Actualités (Magalhães Ribeiro) (2): O nº 54, Outubro de 1973, dedicado à proclamação da independência: pp. 3-4

10 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3864: PAIGC Actualités (Magalhães Ribeiro) (3): O nº 54, Outubro de 1973, dedicado à proclamação da independência: pp. 5-6

7 comentários:

Luís Graça disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Luís Graça disse...

Uma pergunta para a qual ainda não encontrei resposta:

(i) As autoridades portuguesas (e em especial o COM-CHEFE e a nossa polícia política, a DGS)sabiam que no dia 24 de Setembro de 1973, o PAIGC iria proclamar unilateralmente, com pompa e circunstância, a independência, numa "região libertada", a sudeste, neste caso na região do Boé, perto da fronteira com a República da Guiné-Conacri...

(ii) Gostava de saber em que sítio exactamente teve lugar a cerimónia da independência... (Alguém conhece as coordenadas? ).

(iii) A movimentação de pelo menos 120 representantes do Partido, mais os convidados estrangeiros, mais os dirigentes, mais as forças de segurança (não falando dos 'figurantes'...) não poderia facilmente passar despercebida à FAP, que de resto tinha voltado a ser dona dos céus da Guiné...

(iv) Por que é que a FAP não actou nesse dia, sob os céus do Boé ? Não para provocar um massacre de civis (incluindo estrangeiros, o que poderia ter graves repercussões diplomáticas...) mas para afirmar a "nossa soberania" ou, pura e simplesmente, como prova de força...

O Nº 54 da revista PAIGC Actualités não fornece quaisquer dados para uma resposta a esta questão. Era um órgão de propaganda... para consumo externo. Obviamente.

Luís Graça disse...

Há tempos, há dois anos e tal, por ocasião do funeral da mãe de uma amiga minha, engenheira agrónoma, de origem angolana, conheci o Eng Mário Cabral, que pertenceu ao primeiro governo da Guiné-Bissau, saído da declaração de independência em Madina do Boé. O nome dele e o cargo são, resto, referidos neste nº do PAIGC Actualités, de Outubro de 1973: Eng MÁRIO CABRAL, Sub-Comissário para o Controlo Económico e Financeiro...

O Mário Cabral deu-me o seu cartão de visita, mas confesso que nunca se proporcinou mais nenhum encontro ou troca de emails.

O Mário Cabaral (que não tem qualquer parentesco com o Amílcar Cabral nem o Luís Cabreal)é hoje um dos muitos quadros guineenses que viev fora do país, neste caso em Portugal. Creio que na altura era Mário Cabral o Presidente do Conselho de Coordenação da Guineáspora, precisamente uma associação de quadros guineenses na diáspora.

Na conversa que tive com ele, na altura (embora em local pouco apropriado, um cemitério), ele contou-me que estava em Madina do Boé e da preocupação dos militares do PAIGC em relação à segurança. O ambiente era de festa, havia decorações penduradas nas árvores, havia muitas cenetans de pessoas espalhadas pela mata, havia muitas mesas e cadeiras, etc., nada que não se visse do ar... Ele na altura era um jovem, engenheiro, um quadro do xterior (julgo que nunca andou na guerrilha), e compreensivelmente não se sentiria muito confortável num lugar como ele, num país em guerra...

O que poderia ter acontecido, se a nossa Força Aérea tivesse recebido ordens para bombardear as posições do IN, no dia 24 de Setembro de 1973 ?

Na altura não tive tempo de fazer essa pergunta ao Mário Cabral... Mas gostava de a fazer hoje, a ele, e outros dirigentes e militantes do PAIGC, ainda vivos, que viveram esse momento histórico...

E já agora aos nossos pilotos... O que diz as suas cadernetas de voo nesse dia ?

Um Alfa Bravo. Luís

Anónimo disse...

Pertinentes as questões que colocas. Quantas vezes me interroguei sobre isso??! Aquela Guerra tem ainda muitos "mistérios" e mereciam ser esclarecidos. Ou não? Talvez certos mitos se apresentassem, posteriormente, perante nós e, mais sobre a futura História, de outra forma...silêncios ensurdecedores ou de conveniência. Contamos estórias, relatos de um quotidiano vivido naqueles dois anos, sem pretendermos ir além do simples e despretensioso relato factual. Só que não dizemos ou tocamos em certos temas; não dizemos tudo o que sabemos quer vivido, ouvido de fonte fidedigna quer fruto de estudo posterior. Depois há algo mais; algo mais em muito de nós, eu neles me incluo. Ainda a outra parte e deles só levas um pouco... ou então, se não faleceram (mortos não falam) ou estão na diáspora...e...
Fico Camarada Luís Graça. O blogue está cada vez melhor. Eu gosto.
AB Torcato

Anónimo disse...

Eu também não entendo porque a Força Aérea não actuou. A cerimónia terá sido mesmo em Madina do Boé, dentro da Guiné?
Na altura eu soube que um mês depois da proclamação da Independência, o general Bettencourt Rodrigues foi de héli a Madina do Boé, até levou um jornalista alemão que fez uma reportagem.Não encontraram rigorosamente ninguém. Escrevi
isso no meu Diário e há dois anos atrás em conversa com o cap. mil, José Blanco, secretário pessoal do Spínola e do Bettencourt (1972/74), o meu velho amigo José Blanco confirmou-me que era mesmo verdade, o Bettencourt tinha ido mesmo a Madina do Boé, de héli.
Talvez os nosso homens da Força Aérea possam acrescentar mais dados.
Um abraço,
António Graça de Abreu

Anónimo disse...

Meus caros Camaradas
A pertinência dos vossos comentários, leva-me também a fazer uma pequena intervenção.
Todas as dúvidas colocadas, também a mim me assaltaram ao ler o boletim de propaganda do P.A.I.G.C..Como é que eu sei que as fotos são de Madina do Boé e não das matas do..."Buçaco"? Então,na altura, enviei ao nosso chefe L.G. um pequeno comentário para lhe dizer que um dos "ministros" do governo nascido da proclamação unilateral da independência da Guiné havia sido meu colega no início da década de sessenta no colégio Nuno Álvares em Tomar.Reconheci de imediato o Eng.Júlio Semedo.
Ao aderir à Tabanca, constatei de imediato que me havia rodeado de pessoas mais sabedoras e passei a pertencer a um núcleo de gente, que alia a sua sabedoria ao amor pela Guiné. Então, temos entre nós uma plêiade capaz de lançar o "desafio" ao pessoal do P.A.I.G.C., que tem primado pelo silêncio, para que nos possamos encontrar e cara a cara conversarmos com toda a honestidade sobre tantas dúvidas que nos assaltam.No colégio,lembro-me que o Júlio tinha um irmão, Inácio de seu nome,havia também um Filinto,todos eles com participação activa em governos do P.A.I.G.C.. Vamos a isto? Como escreveu o camarada Torcato, o blogue está cada vez melhor.
Vasco da Gama

Luís Graça disse...

Vasco:

Deves ter enviado essa mensagem (particular) para o meu mail de casa, lgraca@clix.pt ... Mais logo vejo na caixa do correio.

O Eng Júlio Semedo deve ser irmão do Inácio Semedo, que foi embaixador da Guiné-Bissau.

Sobre os Semedo, tem aqui dois postes:


15 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3317: Em busca de ... (45): Inácio Semedo Jr, ex-guerrilheiro e quadro do PAIGC, de Bambadinca (Berry Lusher / L. Amado / L. Graça)

26 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3359: Em busca de ... (46): Inácio Semedo, agricultor de Bambadinca, um histórico do nacionalismo guineense (Pepito)

Um abraço. Luís

PS - Concordo contigo: temos que envolver mais esta gente, que teve responsabildiades na luta e/ou no poder... Vou ver se retomo os contactos com o Doutor Inácio Semedo, que vive aqui em Lisboa, e que é amigo de dois membros da nossa Tabanca Grande, o Pepito e o Leopoldo Amado.