quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Guiné 63/74 - P3448: A guerra estava militarmente perdida (30)? Nem perdida, nem ganha. António Matos.

As minhas razões

António Matos

ex-Alf Mil
CCAÇ 2790
Bula 1970/72



Como combatente não-voluntário que fui;
Como indivíduo que andou os 24 meses da praxe no mato;
Como alferes de um grupo de combate que nem sempre teve os deuses consigo que lhe tivessem permitido não deixar mortos alguns camaradas de armas;
Como operacional que sempre foi aos locais onde me mandaram ir (mesmo que, porque estávamos em guerra, muitas vezes tivesse que me travar de razões com o IN);
Como elemento das forças militares que desenvolveu operações em conjugação com outras forças (pára- quedistas, comandos, nativos) e que nunca deixámos de examinar, in loco, o evoluir da situação militar;
Como homem que viveu e partilhou os dramas dos dois lados duma guerra;
Se calhar com mais outras 27.000 razões, tenho sempre grande dificuldade em aceitar a opinião de que a guerra estava perdida.


ATENÇÃO! Não me movem sentimentalismos de falso patriotismo nem vedetismo de Rambo nova geração!
Não fui militarista porque a tanto me impedia a maneira de ser e de pensar.
Também não fui objector de consciência sob cuja capa se esconderam muitos cobardes!
Fui o que foram 99% dos camaradas; arregimentado por circunstâncias bélicas próprias de um país em desdita que cumpriu uma determinação nacional sem a questionar demasiado, não por cega obediência ao status quo, mas sim porque a vida tinha um determinado rumo onde a deserção não tinha cabimento perante os projectos futuros.
Reconheço o direito a essa opção por outros e tenho grandes amigos entre eles.

Tenho discutido este tema – Guerra perdida, sim ou não? - E, olhos nos olhos, nunca ouvi nenhum deles afirmá-lo!
Claro que ao ter para mim que a guerra não estava perdida não estou a dizer que estava ganha!
Era uma situação de altos e baixos, ora agora havia mais intensidade no norte ora agora no sul; agora em Bula, amanhã também em Nhacra.
Parece-me ter sido o habitual efeito de yo-yo duma guerra de guerrilha.
Perante este tipo de conflito, a solução passa invariavelmente pela política e diplomacia.
A história não está feita, é muito cedo.
O historiador não pode ser um dos seus intervenientes. Isso desvirtua sistematicamente a realidade. É preciso distanciamento. Tudo o resto são meras estórias (!) para que as próximas gerações se possam debruçar e escrever a página que falta sobre a tragédia que esta foi para os países envolvidos.
Eles dirão de sua justiça...

___________


Notas:

1. Artigos do Autor em


2. Artigos da série em

3. Título do editor.

11 comentários:

Anónimo disse...

Finalmente alguem que tem a coragem de falar abertamente, na realidade nao se pode dizer que a guerra estivesse perdida ou ganha, devido as grandes pressoes do estrangeiro, Portugal estava praticamente sozinho, mas tenho grande honra de ser Portugues de coracao e poder dizer que Portugal foi o ultimo Pais a entregar as suas Provincias Ultramarinas (Colonias?)e isto apenas devido ao 25 de Abril. Afinal qual e a diferenca entre o Heroi e o Cobarde? Com apenas raras excepcoes,(como por exemplo o ex-capitao Saraiva)uns fogem para a frente(os herois) e outros fogem para tras, (os cobardes).
Julio Abreu ex-Comando do grupo Centurioes

Joaquim Mexia Alves disse...

Concordo com o escrito, que aliás vem na linha do muito que foi dito sobre o tema.

Só não compreendo esta parte do comentário anterior: «Finalmente alguem que tem a coragem de falar abertamente»!

Ou o Júlio Abreu, com todo o respeito, não leu os anteriores textos sobre o tema, ou então não consigo mesmo entender, pois em minha opinião, todos os textos sobre o tema, fossem de uma ou outra opinião, foram escritos abertamente e já agora corajosamente, julgo eu.

Abraço camarigo
Joaquim Mexia Alves

Anónimo disse...

A tibo dos "TUGAS" colonizou o terriório da Guiné.
Que outras tribos "empurraram"os Bijagós para as ilhas do mesmo nome?
Essas outras "trbos"(Fulas, etc...etc...)foram/são colonizadoras?
A.F.

Santos Oliveira disse...

Camarada António Matos
Comungo da opinião que sintetizas com muita eloquência. Há mais por dizer e por quem dizer.
"O historiador não pode ser um dos seus intervenientes" político ou politico militar.
A nós, cabe-nos contar o que, e como, vivemos esses tempos. Aos vindouros o coligir, separar, ordenar e reescrever dignamente a História.
Perder ou ganhar, visto posteriormente e a sem que o pó tenha assentado, não pode constituir um facto com fundamento.
Que o futuro não venha a trair o sacrifício que vivemos.
Um abraço, do
Santos Oliveira

Anónimo disse...

Cada um com seu ponto de vista.

Tosdos perderam esta guerra.

Mas a maior vítima neste caso foi o povo guineense.

Seria deselegância eu descrever neste blog, certas barbaridades que aqule povo sofreu à vista da comunidade internacional (ONU, ONG's) etc. desde fome, perseguições, que não há bandeira que justifique tanto sofrimento.

Como assisti à independência do RD do Congo que está comemorando 48 anos de guerra em independência, era eu Cabo miliciano na fronteira desse Congo, e vi o início desses 48 anos de guerra falar em perder ou ganhar, em africa, é muito complicado.

Antº Rosinha

António Matos disse...

Darmos por assumido que na guerra na Guiné quem mais vítima foi, foi o povo guineense é, a meu ver, demasiado castrador !
Para tanto, proponho que vás, camarada António Rosinha, fazer a pergunta aos pais, às mulheres, às namoradas, aos filhos, aos amigos de todos aqueles que tombaram e ainda àqueles que vieram estropiados, se concordam com esse ponto de vista.
Uma guerra é um assunto demasiado sério para concluirmos de ânimo leve qual dos beligerantes perdeu mais. A contabilidade não pode ser feita assim !
Não é um mero deve-e-haver assente num qualquer livro de mercearia !
Aliás, um raciocínio descontextualizado pode ser provocatório e ninguém neste blogue o quererá. Eu não quero !
Em tempo de paz tento respeitar aqueles que foram adversários mas não posso esquecer aqueles que ao meu lado se bateram e caíram em terra alheia e que ao fim de 40 anos ainda não descansam em paz por os seus corpos ainda não terem chegado a casa!
Parafraseando o General Spínola na recepção que nos fêz quando chegámos à Guine, direi apenas que "não estou chateado, estou apenas a defender com calor o meu ponto de vista".
António Matos

Anónimo disse...

Antonio Matos,

Eu terminei dizendo que falar de quem ganhou ou perdeu, em África é muito complicado.

É tão complicado que discordas de mim. E até eu discordo de mim próprio da maneira como apresentei o meu ponto de vista.

Eu, como vivi a guerra desde 1957, ano em que cheguei a Angola com 18 anos, até 1993 com 55 anos que saí da Guiné, já só consigo ver africa
mais numa prespectiva histórica do que numa prespectiva de 24 meses.

Eu tambem tive os meus 24 meses, em Angola, e foi o ALFERES FLORES, da minha companhia em Noqui, o primeiro Alferes a morrer na guerra do Ultramar, que eu considerarei por toda a vida como um assassinato. E que assassinatos continuam na maioria dos paises africanos, que não compreende as próprias fronteiras nem as respectivas bandeiras, porque é raro o país que não tem mais que uma bandeira.

Um abraço
Antº Rosinha

Juvenal Amado disse...

Na verdade discordo do «finalmente alguém teve coragem.......». Estou plenamente de acordo com o Mexia Alves pois pouco haverá por dizer sobre a polémica se a guerra estava ou não militarmente perdida. Aliás com é bem conhecido a minha opinião é bem divergente da do Mexia bem como a de outros companheiros do blogue.
O que os povos das antigas colónias fizeram da sua independência e dos horrores que se seguiram não elimina o seu direito à independência.
A História de Portugal é bem representativa das várias vezes que o Povo Português lutou e se livrou do jugo estrangeiro. Mas a História raramente faz relato dos massacres, injustiças, revoltas abafadas com sangue, que estão também nas fundações do nosso País.
Quando Julio Abreu fala de cobardes que se esconderam para não irem para África, nesse caso também sou forçado a discordar pois na minha opinião, foi necessária muita coragem para dizer não à guerra e assim, comprometer a sua liberdade pessoal bem como o bem estar familiar.
A visão deste camarada é aquilo que eu chamei na devida altura sonho neocolonial e fui possivelmente mal interpretado.
Culpar o 25 de Abril do abandono das colónias, quando se deveria culpar os dirigentes com Salazar à cabeça, que não souberam estár à altura do desafio que era negociar a independência com os movimentos de libertação e manter Portugal numa situação favorável é no minimo redutor do nosso pensamento como homens livres.
Por ultimo também não podemos deitar as culpas aos africanos que continuam a matar-se uns aos outros. As fronteiras que esses novos paises foram devidamente armadilhadas pelos franceses, ingleses, belgas etc... Quantos anos levou a Europa a redescrever as suas fronteiras? Ainda hoje se matam os Europeus pela suas terras.
Quem lucra na verdade com as constante matança em àfrica? Serão os africanos ou os interesses que outros povos tem nas suas riquezas?
Valeria pensar nisto tudo antes de mais.
O Santos Oliveira aconselha que se deixe assentar o pó, pelo o meu lado estou de acordo, mas deveremos discutir e é justo que todos apresentem o seu ponto de vista.
Um abraço para todos e venham mais opinões.

Juvenal Amado

Anónimo disse...

Caro Rosinha : não andei pela Guiné, mas estive em Noqui, como comandante do pelotão de Sapadores do B.Caç 3849. Num dos teus posts, referes um alferes Flores, que terá morrido em combate em Noqui. Certo? Que Batalhão? Que companhia ? Data aproximada desse triste evento. Andamos vários que passaram por Noqui a procurar reconstituir o que foram esses anos de brasa, e essa informação seria preciosa. Um abraço.

Anónimo disse...

toda a gente que esteve na Guiné em 1974 sabia que a guerra estava perdida bastava ver o exemplo de Copá e outros que na altura aconteciam, não sou muito pesimista,mas sabia de uma operação de grande envergadura que o PAIGC ia fazer o partir da zona leste da Guiné e se calhar não fosse o 25 Abril não estaria-mos agora a escrever neste blogue.

António Matos disse...

Não nasci dotado com poderes de bruxaria nem de adivinhação pelo que me limito a ouvir ( sem grande paciência ) estórias da Carochinha com 40 anos e com aquele tom ameaçador de "se não fosse o 25 de Abril ...."
Também não costumo perder demasiado tempo a comentar pr'ó boneco que é o que se passa quando se tenta dialogar com anónimos.
O assunto de sabermos se estávamos a ganhar ou a perder a guerra parece-me um tema ideal para conversa de café no despique dum campeonato de bisca.
Cada um de nós terá a sua versão de acordo com a noção que a sua guerra lhe deu.
Cada versão é tão válida quanto a antagónica defendida por outro e basta que sejamos capazes de argumentar em defesa da nossa para que o assunto passe automaticamente aos historiadores que trabalharão as diversas opiniões e os factos históricos para redigirem a História.
Por mim basta !