terça-feira, 23 de setembro de 2008

Guiné 63/74 - P3226: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (1): Honório, Sargento Pil Av de DO 27 (Jorge Félix / J. L. Monteiro Ribeiro)

Logótipo do blogue do nosso amigo e camarada Victor Barata, Especialistas da Base Aérea 12, Guiné 65/74 . O Victor foi Melec/Aviões/Instrumentos-BA2 EMEL BA2 BA4 BA12 BA5 BA2 AB1. O blogue existe desde Junho de 2007 e tem tido uma crescente aceitação por parte do público-alvo a que se dirige, os antigos especialistas da BA12 (Bissalanca, 1965/74).

Foto: ©
Victor Barata (2008). Direitos reservados (com a devida vénia...)


1. Mensagem de Jorge Félix, de 24 de Maio de 2008, publicado no blogue do nosso amigo e camarada Victor Barata, Especialistas da Base Aérea 12, Guiné 65/74:


O Ar quente da Guiné >
223-Jorge Félix
Ex-Alf Pilav Helis
Braga

Caro Victor:

Depois de tanto silêncio, escrevo-te pela terceira vez. Desta feita é por causa de um poste do amigo e camarada José Luis Ribeiro Monteiro que esteve em Bissalanca na mesma altura que eu, Outubro de 68 a Julho de 70. (O post é de 28 de Setembro 2007).

Falam-se de assuntos que eu vivi também e outros de que não estou de acordo. Talvez por já terem passados muitos anos alguns factos são 'adulterados' sem outra intenção que não seja falar duma vivência que parece que aconteceu.

Ora vamos lá aos casos pontuais.

1- Quando o José Monteiro chegou a Bissau já por lá voavam os Fiat. Já tinham abatido um (Ten Coronel Costa Gomes) poucos meses antes. Voavam nessa altura o Cap Vasquez, o Cap Nico e o Ten Cruz, em Fiat.

2- Outra confusão que está a fazer é com o Sarg Honório, excelente piloto, na época a voar somente DO 27.

O Honório nunca voou helicópteros como piloto, e se fizer um esforço de memória lembrará que o Honório passava muitas épocas no destacamento de Nova Lamego, com as DO 27. Quem está ainda vivo e pode dizer quem era o Piloto do Spinola, se é que havia um piloto, é o Sr General Almeida Bruno. Ele deve ter uma memória disso. Pela minha parte não quero ter o epíteto de piloto de ..., mas o certo é que voei muitas e inesquecíveis manobras com os dois Senhores referidos, Capitão Almeida Bruno e Brigadeiro Spínola.

Victor, posta o que melhor entenderes, como fizeste com a minha estória do Borrachão, e dá esta memória ao camarada José Monteiro a quem envio um forte abraço.

Escutámos as mesmas mornas e bebemos da mesma chuva.

Um abraço

Jorge Félix

2. Comentário do editor do blogue, L.G.:

Amigos e camaradas, brancos, pretos e mulatos, gente da nossa Tabnaca Grande:

O Honório é uma figura que perdura na nossa memória. E foi aqui tão oportuna como justamente evocado pelo Alberto Branquinho. Não tanto por ser cabo-verdiano (cuidado com a demasiada ênfase nas questões da 'cor da pele'...), como sobretudo por ser, aos olhos do comum militar no TO da Guiné, um 'gajo maluco', popular, que gostava do seu copo e que fugia um bocado aos cânones do militar-como-mandava-a-puta-da-sapatilha... (Passe, aqui, a expressão que era/é linguagem de caserna...)

Quem é que não ouviu falar dele, do Honório, nomeadamente na Zona Leste ? Não privei pessoalmente com ele, mas viu-o várias vezes em Bambadinca, no período em que lá estive, com a malta da minha CCAÇ 12, entre Junho de 1969 e Março de 1971. E sempre a pilotar a D0 27.

Foi por isso que achei que valia pena criarmos, no nosso blogue, uma série só para os Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras... Os primeiros postes podem ir para o Honório, com toda justiça, propriedade e oportunidade... Os próximos para o António Lobato.

Há já material suficiente, incluindo os postes que já foram publicados no blogue do nosso camarada Victor Barata, Especialistas da Base Aérea 12, Guiné-Bissau 1965/74... Há lá intervenções do Jorge Félix e do J. Mexia Alves (e do Monteiro Ribeiro, melec) que eu recuperei em devido tempo...

Depois pode ser que apareçam mais depoimentos de gente da FAP ou até dos TACV. Gostava de saber, por exemplo, como é que ele lidou com as questões de fractura, conflito e transição: o PAIGC no poder, na Guiné e em Cabo Verde... Como é que ele chega aos TACV, por exemplo...

Por outro lado, temos o nosso Jorge Félix e eventualmente outros Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (o epíteto é um elogio, é um mimo, é uma ternura!) que andam por aí, sem eventualmente quererem ou poderem dar a cara...

Talvez o Jorge e o Victor nos possam ajudar nesta nobre tarefa de 'reabilitar e valorizar a memória dos nossos camaradas da FAP'... Também gostaria de fazer o mesmo para a Marinha, o terceiro ramo das nossas FA... É tempo, de resto, de enterrarmos de vez os nossos estereótipos sobre tropas de elite, topa-macaca, filhos e enteados, ricos e pobres...

Isto sem querer entrar, de modo algum, em competição, antes pelo contrário, com o blogue do Victor, que tem um público-alvo diferente do nosso... e que é um blogue 'especialista' (enquanto o nosso é 'generalista') e com o qual nós queremos manter uma saudável e frutuosa relação de mútuo apoio, de troca e até de complementaridade...

De resto, o Victor (a quem eu saúdo pelo sucesso do seu blogue) sabe bem que não precisa de nos 'pedir licença' para usar os nossos materiais, bastando para tal citar a fonte; e nós faremos o memso sempre que houve notícias que interessem ao pessoal da Tabanca Grande. Um Alfa Bravo. Luís

_________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 26 de Setembro de 2007, publicado no blogue do Victor Barata, membro da Tabanca Grande,

Uma lufada de ar quente da GUINÉ!
17-Mensagem do José Luis Ribeiro Monteiro
OPC 3ª/66
Bissalanca 1968/1970

Companheiro de armas, Victor.

Por aquilo que tenho lido no teu Blog sobre a Guiné e que retrata uma determinada realidade encontrada por nós e especialmente por ti,e considerando que:
-Estive na BA12,no período de 09.10.68 a 14.07.70;
-Provavelmente e quase de certeza que as condições de Guerra e logística foram diferentes daquelas que eu encontrei, isto é, foram outros tempos, sendo que em termos de guerrilha as que encontraste foram piores;
-Quando cheguei á Base os meios aéreos existentes era o velho T6G, DO27 e Dakota. Só mais tarde chegaram os Fiat G91;
-O tempo passado neste "Teatro" de Guerra foi terrível, nunca mais me hei-de esquecer dele.

Assim começando por falar daquilo que eu assisti em termos de alimentação dir-te-ei que era uma miséria. Quando fui pela primeira vez ao refeitório, fiquei com uma fome dos diabos, não comi nada, mas o espectáculo ficou-me na retina (cabeças de peixe com cigarros a arder na boca e arroz colado ao tecto do referido refeitório). Os nossos camaradas mais velhos matavam a fome com cerveja o que levava a que fossem evacuados para Lisboa com destino ao hospital com doenças do fígado, era uma forma de deixarem a Guiné!

As valetas das ruas da Base estavam sempre cheias de garrafas de cerveja vazias, o que levava a que quando havia ataques simulados à Base, muitos dos nossos camaradas fossem parar á enfermaria com feridas,porque segundo as instruções de defesa que nós somos obrigados a cumprir, passava por sair das camaratas e metermo-nos nas valetas.

Com a chegada e inicio de funções do Coronel Pilav já falecido, Diogo Neto(foi no mesmo avião que eu),começou por se inteirar do que se estava a passar,já que entrávamos no refeitório para não comer. Sendo que e passado pouco tempo deixámos de ir ao refeitório, o que criou alguns problemas ao Capitão encarregue dos refeitórios, somente a Polícia Aérea e o Serviço Geral, porque tinham que fazer formatura,iam.

Para resolver o problema o Comandante da Base demitiu o Capitão encarregue dos refeitórios e nomeou outro.A partir dessa altura passámos a ter uma alimentação muito melhor e eramos tratados doutra forma (o capitão perguntava-nos o que queríamos comer), sendo que por volta das onze horas da manhã tínhamos direito a entrada que consistia em carnes verdes e sumos.

Foi nessa altura que foi reconstruído o bar,parecia mais um Pub que outra coisa. Também foi nessa altura que começaram a construção das infraestrutura desportivas e do novo Centro de Comunicações. Nunca lá operei, já que somente ficou operativo em 1970,altura em que me vim embora, com destino ao GDACI-Monsanto.

Daquilo que tenho lido sobre a guerra, especialmente no que diz respeito às condições, clima e dificuldades devidas á morfologia do terreno [...].

Recordo-me, não sei se em 1969 se em 1970,de uma viagem que o General Spinola fez a Lisboa,esteve ausente da Guiné um mês,constando que tinha sido preso por querer dar a independência,com negociação com Amílcar Cabral, por se julgar na altura que nunca íamos vencer a guerra.

De vez em quando havia festa na Base em que actuava o conjunto A Voz de Cabo Verde e num certo dia disseram-nos que a Amália Rodrigues e outros artistas iriam lá actuar, ficámos muito satisfeitos, simplesmente essa actuação não se chegou a realizar, porque tinha havido um massacre de um dos majores e, se não estou em erro, capitães e motoristas, para os lados de Serpa Pinto, pela Fling, outro movimento existente na Guiné. Iam ter uma reunião com o o PAIGC, aliás,o Gen Spínola,tinha reuniões de vez enquanto com eles.´Quase todas as manhãs saía de Helicóptero, cujo o piloto era o Sarg Honório,caboverdiano, já falecido.

Do Teatro de guerra na Guiné, no período que lá esteve, assisti a ataques constantes dos chamados terroristas,ataques esses que não ficavam sem resposta,quer pela Força Aérea, incluindo os pára-quedistas,quer pelas outras forças no terreno. Foram milhares de toneladas de bombas as lançadas e também,material de guerra apreendido aos guerrilheiros, possuía fotografias desse material. Nesse período,os guerrilheiros já possuíam misseis terra-ar, o que se tornava difícil para os meios aéreos no terreno. Felizmente nenhum avião foi abatido, porque havia constantes bombardeamentos diurnos e nocturnos às bases dos guerrilheiros, especialmente Madina de Boé,onde eles declararam a independência e outras localidades como Guileje, Gadamael, Farim e ainda outras que não me recordo do nome.

Lembro o Cap Pilav Nico, actualmente Gen Pilav ,que não dava descanso aos Fiat, muitas vezes,quando estava de serviço às operações,comunicava ao dito que havia ataques em tal sitio, ele pedia autorização ao Comandante Diogo Neto ou era eu a solicitar,por ordem dele,autorização para levantar voo com o Fiat G91.Era certo que mal ele levantava da pista acabava o ataque,o que induz que havia informadores infiltrados na BA12 ou nas proximidades, na aldeia de Bissalanca.

De qualquer forma pelo andar da carruagem, tinha-se a noção de que a guerra ia acabar o mais rápido possível. Não foi mais cedo porque Lisboa não deixou e nós é que pagámos as favas [...].

Depois de ter estado na Guiné e regressado a Lisboa,e quando passei á disponibilidade,fui para Angola [...].

José Luís Monteiro Ribeiro
OPC 3ª/66

(**) Resposta do J. L. Monteiro Ribeiro, publicado no mesmo blogue, em 25 de Maio de 2008:


QUE BONITO!

226-José Ribeiro
Ex-Esp Opcart Guiné
Lisboa
BA12


Amigo, Victor Barata.

Depois de lida a mensagem do amigo Jorge Félix, julgo de me pronunciar sobre o conteúdo da mesma (...):

Quanto ao que [disse] o ex-camarada de armas, piloto de helicópteros, Jorge Félix, tenho que agradecer as correcções feitas pelo ele ao texto por mim elaborado e publicitado por ti.

É um facto que muitas das realidades que nós assistimos enquanto militares em África – porque não muito marcantes – são às vezes um pouco modificados pelo tempo passado da ocorrência e o de hoje. Chama-se a isso lapsos de memória.

De qualquer forma, tendo em atenção a correcção bem feita pelo ex – camarada de armas, Jorge Félix, em dois aspectos referidos por mim, há que considerar o seguinte:

- No que se refere ao falecido Sargento, Honório, falava-se na Base que era o piloto do General Spínola – afinal não era, como referiu o amigo Jorge;

- Em relação aos Fiat G91, quando cheguei à Base pouco ou nada os vi operar. Ainda possuo uma foto da primeira (julgo) aterragem de um F91 na ex-BA12. Os T6 eram os mais operacionais, daquilo que me apercebi. Progressivamente estes aviões deixaram de operar. Não me lembro se quando me vim embora algum ainda operava.

O falecido sargento piloto, Honório, era um artista. Quando vinha de Nova Lamego, em regra, aterrava com o motor da DO27 desligado. Segundo constou na altura, foi algumas vezes chamado à atenção pelo facto.

Lembro-me do capitão piloto Monteiro, segundo ouvi dizer já falecido em Portugal em desastre aéreo. Foi atingido várias vezes em ataques aéreos. Uma vez fui ver o Fiat G91, estava todo furado por balas, sendo que conseguiu trazê-lo até à Base e aterrar em segurança.

Também me lembro do capitão piloto Rodrigues e do cabo especialista MAE, não me lembro do nome, mortos no desastre em Bafatá, contra uma antena de rádio, senão estou em erro, não havendo na altura qualquer hipóteses de os salvar (morreram queimados).

José Luís Monteiro Ribeiro, OPC 3ª/66.

3 comentários:

Luís Graça disse...

Amigos e camaradas:

1. Recordam-se do filme, que passou nos nossos cinemas em meados dos anos 60 ?

Título original 'Those Magnificent Men in Their Flying Machines' (1965 - 132m. Realizador: Ken Annakin. Produção: 20th Century Fox, EUA.

SINOPSE

Trata-se de uma versão cómica, hilariante, de uma histórica corrida aérea entre as cidades de Londres a Paris, em 1910, um pretexto para conhecer os maiores e melhores aviadores do mundo e testemunhas as suas incríveis acrobacias.

Há um o editor de um jornal, cheio de guita mas chato para burro, que decide patrocinar uma corrida de aviões atravessando o Canal da Mancha. E há um prémio de 10 mil para o vencedor.

Há seis equipas de concorrentes, Americana, Britânica, Francesa, Alemã, Italiana e Japonesa... As rivalidades nacionalistas vêm ao de cima.

O filme está editado em DVD, com legendas em português:

http://www.dvdpt.com/g/gloriosos_malucos_das_maquinas_voadoras.php

2. Não sei se este filme, que passou na época em Portugal, contribuiu, muito ou pouco, para o aumento da oferta de pilotos aviadores, voluntários, para as fileiras da nossa FAP... Na época já havia guerra e já se abatiam (ou pelo menos se alvejavam) aviões...na Guiné.

Não penso, em todo o caso, que fosse pêra doce pilotar um Fiat, um T6, um heli ou uma D0 nos céus da Guiné... Como dizia o outro, também para isto era preciso ser "doido"...

Tiro o chapéu aos nossos "gloriosos malucos das máquinas voadoras".

LG

Anónimo disse...

Levantei-me e corri em busca de um espelho para ver a minha cor...o dia decorreu mal e podia ter provocado alteração...olhei e, reflectido no dito, apareceu um velho "pêra" quase branca, olheiras de noitada ou...Estarrecido dei um passo atrás e voltei. Porra esqueci-me de ver a cor, isto pode ser a senilidade ou pior a vir...!
Mas: Conheci o Piloto Honório, era antigo aluno das agricolas, deu-me uma boleia até Bigene, carregaram um caixão e viemos até Bissau...era amigo do Cap. Neto que estava em Nova Lamego..."passou", o Neto, pelo desastre do Cheche e contou-me... Tratava o Honório por Irmão e vice-versa. Lastimo, mas lastimo mesmo a morte de um Ex-Camarada que era um Homem estimado pela "malta apeada" e não só. Não me lembro a cor da sua pele.
A Nônô, em noite de amor quando despi a camisa perguntou-me de onde eu era...era mais clara que eu...é do Sol, disse-lhe eu...mas isto da cor tem porras...misturem o verde e o azul, ou o vermelho e o preto e por ai fora. Querem falar de homens? Aí é mais fácil _ há uma raça A HUMANA...e ponto.
Abraços do Torcato

Luis Nascimento disse...

O Cabo mecânico do desastre do heli em Bafatá de seu nome Machado, mais conhecido por "Machadinho", natural de Viseu, meu amigo e companheiro.

Paz à sua alma.

Luis Nascimento (Assassan)
1º Cabo Op. Cripto