sexta-feira, 8 de dezembro de 2006

Guiné 63/74 - P1350: Ataque ao navio patrulha no Rio Cacheu (Victor Tavares)

Guiné > Rio Cacheu > 1973 > Tropas paraquedistas e militares africanos a bordo de um navio patrulha.

Guiné > 1973 > o 1º cabo paraquedista Victor Tavares e o marinheiro Diogo, seu conterrâneo.

Guiné > Algures no mato, em operações > 1973 > O ex-1º Cabo paraquedista Victor Tavares (BCP 12, CCP 121, Guiné 1972/74), com a sua metralhadora ligeira HK21, de fita.
Fotos e texto: © Victor Tavares (2006). Direitos reservados.


Ataque ao navio patrulha,
por Victor Tavares (1)

Estimado amigo Luís: Como prometi , envio-te mais um pequeno texto, este relativo à viagem de regresso entre Ganturé e Binta, da CCP 121 - Companhia de Caçadores Paraquedistas 121, num navio patrulha do qual era comandante o Capitão de Fragata Luppi.

Na noite do dia 19 para 20 de Maio de 1973, os paraquedistas da 121, vindos de Bigene, embarcaram por volta das 23 horas e 30 minutos no respectivo navio com destino a Binta. Encontravam-se também a bordo alguns militares africanos.

Depois de toda a tropa se instalar o mais comodamente possível - o que era difícil derivado à quantidade de pessoal -, o navio entra em movimento, rio Cacheu abaixo. Passado algum tempo de viagem, aparece um elemento da guarnição do navio, meu conterrâneo, a perguntar por mim. Eu encontrava-me deitado na proa junto à peça de artilharia Metralhadora e, como era escuro, ele lá vinha saltando e perguntando.

Eu não dei sinal de vida, e ainda dei indicação ao meu camarada Ventura que se encontrava de pé, encostado aos cabos de aço dos resguardos de protecção, para não dizer nada. Quando ele ia para se retirar e, como se encontrava ao alcance da minha mão, puxei-lhe as calças brancas típicas dos marinheiros, à boca de sino, levantei-me e abraçámo-nos: era o meu amigo Diogo que eu não fazia naquele lugar .

Entretanto convida-me para ir beber uma cerveja, acedi prontamente e lá descemos até ao bar aonde conversámos enquanto saboreávamos a cerveja.

Pouco faltava para a meia noite, hora que ele ia entrar de serviço às maquinas, pegámos em mais uma cerveja e subimos as escadas, ele na frente até a um patamar e, logo em seguida, desce outras escadas para a casa das máquinas.

Ele já se encontrava lá em baixo quando eu iniciei a descida, iria eu no terceiro quarto degrau, quando se ouve um rebentamento logo seguido de outro. Ele pôs as mãos a cabeça e disse:
-Vamos morrer todos.

Eu recuo chego ao patamar que antecede as escadas, quando deparo com dois marinheiros a fechar as portas, gritei-lhes para me deixarem sair, o que aconteceu .

Quando saio olho e vejo uma confusão doida na parte da frente do navio, eram chamas e explosões junto à peça da frente, que tinha sido atingida por uma das duas roquetadas até aí dadas. Encontravam-se vários marinheiros com mangueiras a tentar apagar o fogo, as explosões eram bastantes, o meu equipamento, arma e munições estavam no meio daquela confusão, até que baixaram as chamas, eu arrisquei e fui rápido a recolher a minha HK21 e o meu cinturão com o restante equipamento. Ao mesmo tempo agarrei também a Degtyarev do 1º Cabo Paraquedista Ventura. Consegui recuperá-la porque estava junto à minha .

Quando vinha com ela a fugir das chamas, vai que os guerrilheiros do PAIGC disparam pelo menos mais 2 roquetadas da margem direita no sentido que seguíamos, eu ainda com a Degtyarev nas mãos viro-me para a margem e abro fogo descarregando o tambor. Como utilizávamos munições tracejantes algumas ficavam espetadas nas árvores da margem ainda incandescentes. Foi quando da torre do navio se ouve:
- Façam fogo para margem que eles estão a fumar.

A partir daqui foi um autêntico festival de fogo, durante dois ou três minutos.

Nesta altura já o navio se atravessava no rio correndo o risco de embater na margem, só não acontecendo por o rio naquele sitio ser largo.

Entretanto no meio de tanta confusão, diziam que tinham caído à agua alguns militares, tendo os fuzileiros ainda saído com 2 ou 3 zebros. Falso alarme , afinal estavam todos no navio, o único que esteve fora do navio foi o Ventura que com o sopro da explosão de um RPG foi projectado borda fora mas por sorte nesse movimento conseguiu agarrar-se a um dos cabos de aço ficando pendurado da parte de fora do navio.

Entretanto havia vários feridos nos militares africanos. Sorte para os parquedistas que no meio de tanta confusão apenas sofreram pequenas escoriações.

E estivamos em Binta para na manha seguinte partir para Guidaje.


Estimado amigo, despeço-me com grande abraço, para ti e todos os tertulianos.

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Nota de L.G.:

(1) Vd. último post > 26 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1316: A participação dos paraquedistas na Operação Ametista Real: assalto à base de Kumbamory, Senegal (Victor Tavares, CCP 121)

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