sexta-feira, 24 de fevereiro de 2006

Guiné 63/74 - P562: Cartas da metade do céu e da metade do inferno (Luís Graça)

Guiné > Zona Leste > Bafatá > 1969 > Vista aérea da cidade, junto ao rio Geba.

Arquivo de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71)
© Humberto Reis (2006)


Amigos e camaradas de tertúlia:

Depois de resolvidos uns pequenos problemas técnicos na minha enxada de trabalho, tenho a alegria (e a honra) de comunicar, em meu nome e do Humberto Reis, que passam, a partir de agora, a estar disponíveis mais umas tantas cartas da nossa querida Guiné… Entenda-se: cartas dos ex-serviços cartográficos do exército, que datam da época em que eramos meninos & moços e em que Portugal ia do Minho a Timor...

A alma deste sonho (maluco, como todos os sonhos) é o Humberto que quer ver a Guiné - leia-se a "província da Guiné" - toda digitalizada: os rios, as lalas, as bolanhas, as savanas, os mangais, os palmeirais, as pontas (ou hortas), as tabancas, as picadas, as florestas, os buracos em vivemos, gozámos, f..., amámos, morremos (alguns do corpo e outros da alma…), cagámos, cagámo-nos de medo, apanhámos bebedeiras de caixão à cova, sofremos, fomos camaradas, fomos heróis e cobardes, homens e gigantes, gritámos abaixo o RMD, contestámos a guerra, lutámos pela pátria, apanhámos paludismo e esquentamentos, passámos fome e sede, mijámos, bebemos o próprio mijo, fomos emboscados, fomos presas e predadores… (As nossas camaradas São, Paula, Zélia e as nossas demais leitoras… que me desculpem a linguagem desabrida, própria da caserna dos machos...).

Como já temos dito, a divulgação destas cartas (com mais de meio século!) não tem quaisquer propósitos comerciais ou outros, de índole lucrativa, mesmos que outros (agências de viagens, empresas organizadoras de viagens em grupo, safaris, desporto-aventura, clubes de caça e pesca, etc.) possam vir a ganhar dinheiro com o nosso trabalho (é o risco de sermos generosos).

Pretende-se apenas prestar um serviço útil a todos os ex-combatentes da guerra da Guiné (1963/74), independentemente do lado em que combateram, e nomeadamente aos membros da nossa tertúlia.

Julgamos que estes mapas (ou cartas, amplamente usadas pelas NT durante a guerra colonal, no planeamento e execução da nossa actividade operacional, cuidadosamente plastificadas) podem ser úteis também a todos os demais amigos do povo guineense e até mesmo aos próprios guineenses (que não conhecem o seu próprio país!...), se bem que as cartas estejam desactualizadas: em mais de meio século, muita água correu pelos rios Cacheu, Mansoa, Geba, Corubal, Grande de Buba, Tombali, Cumbijã, Cacine...

Além de serem um documento de interesse historiográfico, estas cartas têm um enorme valor sentimental para nós, são importantíssimas para a reconstituição da memória dos lugares e a reorganização da memória (individual e colectiva) dos ex-combatentes, portugueses e do PAIGC, que estiveram aquartelados e/ou envolvidos em operações naquele pedaço de terra, que era metade de céu e metade de inferno.

Fica também aqui a nossa homenagem aos nossos valorosos cartógrafos militares portugueses. A cartografia portuguesa deu cartas (no duplo sentido do termo) ao mundo, é bom é dizê-lo. Às vezes (muitas vezes, quase sempre) tenho orgulho de ser (por)tuga. Estas cartas da Guiné são pequenas obras-primas, resultantes do levantamento efectuado aos longo dos anos 50 pela missão geo-hidrográfica da Guiné – Comandante e oficiais do N.H. Mandovi e do N.H. Pedro Nunes. A fotografia aérea é da Aviação Naval. O trabalho de restituição foi feita pelos Serviços Cartográficos do Exército. As fotolitografias e a impressão foram feitas em várias casas, de Lisboa, Porto, V.N. Gaia. A edição é da antiga Junta das Missões Geográficas e Investigações do Ultramar, do antigo Ministério do Ultramar. Digitalização efectuada na Rank Xerox (2005 ou 2006). Eu passei cada um destes pesadíssimos ficheiros (10 ou mais MB) para outros mais leves (da ordem dos 2 MB), procurando manter a qualidade da imagem (que tem alta resolução)...

O mecenas é o maluco do Humberto Reis a quem eu presto mais uma vez a nossa (minha e da tertúlia) gratidão pela sua generosidade e a nossa homenagem ao seu carinho pela Guiné-Bissau, pelos guineenses e pelos ex-combatentes…

Há ainda outras cartas para pôr na nossa página mas ficaram cortadas na digitalização (por ex., Binta e Teixeira Pinto)… Vou ver isto com o Humberto.

Agora divirtam-se, regressando a regiões como:

Bigene, Bissau

Farim, Jumbembem, Pirada, Tite

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